A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) são vestais da educação superior

01/10/2021 às 12:57
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Uma critica aos exames da OAB e do CFC que obrigam os bacharéis em Direito e Contabilidade a cumprirem um anacrônico teste, na obsoleta crença de que mais um teste é capaz de definir competência e eficiência do futuro profissional.

Por Raimundo Aben Athar

    Os concluintes dos cursos de Direito e de Ciências Contábeis, cumprem, em 48 meses, não menos que 3.000 horas, entre sala de aula e outras atividades acadêmicas. São submetidos a até dezoito (18) provas ou testes, com farto uso da teoria clássica do teste e da teoria da resposta ao item[1]. Além das respostas aos testes e suas teorias, os graduandos são avaliados em diversos tipos de trabalhos acadêmicos, envolvendo pesquisas, discussões, seminários em sala de aula e etc. Lembrando que os testes são apenas produtos, os quais mensuram objetivos e comportamentos. Já, as avaliações, não, elas são processos, procedimentos que ajustam os objetivos e as orientações para os testes.

     Os graduandos dos cursos de Direito e de Ciências Contábeis, são submetidos a mais dois exames, aplicados pelo exame nacional de desempenho dos estudantes (Enade). O Enade é um dos procedimentos de avaliação do sistema nacional de avaliação da educação superior (Sinaes). Tal exame nacional é componente curricular obrigatório, regido pela lei 10.861/2004, e é aplicado periodicamente aos estudantes de todos os cursos de graduação, durante o primeiro (ingressantes) e último (concluintes) ano do curso.

       Segundo o Ministério da Educação, o Enade tem como objetivo o acompanhamento do processo de aprendizagem e do desempenho acadêmico dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares do respectivo curso de graduação. Seus resultados produzem dados por instituição de educação superior, categoria administrativa, organização acadêmica, município, estado, região geográfica e etc e, assim, serão construídos referenciais que permitiram a definição de ações voltadas à melhoria da qualidade dos cursos de graduação por parte de professores, técnicos, dirigentes e autoridades educacionais.

     A obrigatoriedade do Enade deriva da Constituição Federal, no título VIII, da ordem social, no capítulo III, da educação, da cultura e do desporto, na seção I, da educação, onde preconiza no artigo 209:

 

O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I -  cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II -  autorização e avaliação de qualidade pelo poder público

 

    Focando a atenção no inciso II do artigo 209, não há dúvida: A autorização e a avaliação de qualidade dos cursos superiores é atribuição do Estado, mas parece que entidades classistas também aplicam um “último teste”, na anacrônica crença de que mais um teste é suficiente para aprovar e indicar quem merece a “carteirinha” para o exercício da profissão escolhida por milhares de jovens que cursaram uma IES autorizada e avaliada pelo Estado e dada como apta a ministrar cursos superiores de Direito e de Ciências Contábeis.

     Nunca é demais lembrar: A Ordem dos Advogados do Brasil e o Conselho Federal de Contabilidade, nada mais são do que duas entidades classistas, cujas atribuições precípuas são fiscalizar a profissão e registrar os profissionais daquelas respectivas classes, todavia, tais entidades, se arvoram em aplicar mais um teste e pior: um teste em que nada difere dos dezesseis ou dezoito testes já aplicados pelas IES. Ou seja, produz-se, apenas, e não mais que apenas, outro teste, dentre todos aqueles já aplicados pelas IES ao longo da graduação e ainda aqueles praticados pelo Enade.

      O anacronismo do CFC e da OAB é de uma falta de senso, inominável, posto que vivemos na era da informação e, pelo visto, desconhecem aquelas entidades classistas que o “sr. mercado” é letal para os incompetentes. O “sr. mercado” leva para o “balcão” e para o “banco de um veículo”, com todo o respeito que o comércio e o motorista de aplicativos devem ter, os bacharéis incompetentes.

  No mundo das inovações, no mundo das tecnologias, enfim, no mundo da informação, os privilegiados são aqueles que conseguem perceber que o “sr. mercado” exige algo mais que aprovação em simples testes que aferem respostas exatas e nada mais além disso.

       É pertinente indagar: Um teste a mais, “prova” alguma coisa? Claro e evidente que não. Por anos, a memorização de datas, fatos, eventos e fórmulas foi incentivada na Educação. OAB e CFC, alegam que há falhas no ensino e que as IES “não ensinam nada”, “não testam nada” e entendem as entidades classistas que “passando mais uma provinha” irão resolver o problema das falhas educacionais, onde a educação superior na área privada caminha para o domínio absoluto das sociedades empresárias e estas, como qualquer sociedade empresária, querem margem e share.

        OAB e CFC, ao invés de um temido desgaste com o Ministério da Educação, preferem “enganar” a sociedade com a alegação de que mais uma prova irá resolver o problema de formação dos Advogados e Contadores.

     Anacrônico é um adjetivo que “diz”, na maioria dos dicionários “algo ou coisa que está em desacordo com os usos e costumes de uma época”. Em que época estamos? Há milhares de exemplos de petições na internet, assim como há milhares de análises de balanços. Há ainda, na área do Direito e nas Ciências Contábeis, milhares de pareceres disponíveis em sítios eletrônicos de universidades renomadas e autores idem. O Advogado ou o Contador possuem tais informações na palma das suas respectivas mãos. Onde está o gênio que assegura que mais uma “provinha” irá mudar esta condição do século XXI?

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         Se há instituições de ensino superior que não formam seus graduando para estes novos tempos, que OAB e CFC exerçam ações políticas para mudar isso, mas aplicar mais uma provinha?

         É de uma clareza solar que uma instituição de ensino superior, credenciada pelo Ministério da Educação, tenha procedido a diversas avaliações de aprendizagem, ao longo dos quatro anos em que esteve com o graduando, objetivando atingir os vários objetivos para o exercício de cada profissão. Se as IES não estão cumprindo corretamente esse papel, o “sr. mercado” irá fazer cumprir. Contudo, não nos afastemos um milímetro: A empregabilidade depende de mérito, depende de competência, depende, claro de informação.

             OAB e CFC não são vestais da educação brasileira.

 


[1] A Teoria Clássica dos Testes (TCT) tem por objetivo a interpretação da resposta, ou seja, o que soma dos itens diz sobre o sujeito. Já a Teoria da Resposta do Item (TRI) tem o propósito de medir a habilitação do sujeito de acordo com as respostas dadas a cada item. Ou seja, a TCT analisa o resultado final e a TRI analisa partes e probabilidades que geram o resultado final (Pasquale, 2003)

Sobre o autor
Raimundo Aben Athar

DOUTORANDO EM CONTABILIDADE E CONTROLADORIA - FUCAPE MESTRE EM ECONOMIA - UCAM MBA FINANÇAS - UFRJ ESPECIALISTA EM FINANÇAS - FGV PERITO CONTADOR MEMBRO DA COMISSÃO DE DIREITO CONTÁBIL OAB-CRCRJ

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