O PODER FAMILIAR E A GUARDA COMPARTILHADA SOBRE O ENFOQUE DOS NOVOS PARADIGMAS DO DIREITO DE FAMILIA
Msc. Amanda Cabral Fidalgo [1]
INTRODUÇÃO
A partir da década de 70, é realidade nacional, o aumento em percentuais das separações, dos divórcios e dos novos casamentos - a alteração, portanto, do perfil da família brasileira. A emancipação da mulher, sua inserção cada vez maior no mercado de trabalho, o tratamento igualitário no plano constitucional e a busca da efetividade desta isonomia com os homens em todos os setores da sociedade tornam urgentes, também, a reforma e a alteração na forma de partilhar, de dividir, as importantes e fundamentais obrigações de criar, educar, prover e manter a prole.
É na prioridade do bem-estar do menor, de sua proteção efetiva, de sua educação em termos totais, que reside a grande esperança de que possamos alcançar a tão almejada justiça social. Tem-se, pois, que o estigma da separação dos pais pode marcar fundo a personalidade da criança e do adolescente.
O pressuposto da guarda é a ruptura conjugal. Daí vários elementos convergem para a efetivação da guarda do menor, porque somente a partir de uma perda é que se dá a mudança da situação familiar do menor.
Perdas sempre são difíceis de serem trabalhadas no plano psicológico e afetivo, ainda mais quando a ruptura provém de litígio entre os pais. Por isso, necessário neste momento - em não havendo acordo entre os pais, o que resultaria na probabilidade de concordarem com a chamada guarda compartilhada, partilhando a guarda jurídica do filho - buscar, tanto o pai quanto a mãe, o entendimento claro e importante de que o que foi rompido foi o laço conjugal e não o laço tutelar, entre pai e filho, entre mãe e filho.
A premissa sobre a qual se constrói esta guarda é que o desentendimento entre os pais não pode atingir o relacionamento destes com os filhos. A família desunida permanece biparental. Ou, sintetizando Défossez e Vauvillé, o que se pretende é “manter o casal parental (comunidade dos pais) apesar do desaparecimento do casal conjugal”. Assim é que os cônjuges deixam de ser cônjuges, mas não deixam de ser pais.
A insurgência da guarda compartilhada visa atender as deficiências que outros modelos de guarda, principalmente o da guarda dividida, onde há o tradicional sistema de visitas possuem. Tais modelos, ao privilegiar sobremaneira a mãe, na esmagadora maioria dos casos, levam a profundos prejuízos aos filhos, tanto de ordem emocional quanto social, no seu desenvolvimento.
O instituto da guarda compartilhada priorizando o melhor interesse dos filhos e a igualdade dos gêneros no exercício da parentalidade, é uma resposta mais eficaz à continuidade das relações da criança com seus dois pais na família dissociada, semelhantemente a uma família intacta.
1 FAMÍLIA: NOÇÕES GERIAS
1.1 Fato históricos
No alvorecer do século XIX, era atribuição do pai deter a guarda exclusiva e o pátrio poder dos filhos, enquanto a mãe se submetia às suas determinações. Tal era a decorrência de uma ideologia cristalizada numa legislação que considerava a mulher relativamente incapaz para exercer os atos da vida civil; consequentemente, era ela inibida, legalmente, de dividir as responsabilidades inerentes aos deveres relativos ao vínculo matrimonial.
Com a industrialização, e a passagem da família dita extensa para a família nuclear, onde só havia o casal e filhos, o pai passa a trabalhar, e despender a maior parte do tempo fora do lar. Somado isto ao advento da capacidade plena da mulher, passou a ser ela a considerada mais apta a guarda dos filhos, em casos de separação, por ter, entendia-se, por natureza, o amor aos filhos, e a inata capacidade de bem deles cuidar. Ao pai, então, coube a incumbência de prover as necessidades materiais da família, enquanto a mulher se dedicava às prendas do lar.
Todavia, a revolução sexual, a inserção cada vez maior da mulher no mercado de trabalho, e a divisão mais equânime das tarefas de educação de filhos, levaram a uma mudança na estrutura familiar, e no próprio entendimento que confere primazia à mãe na atribuição da guarda. A mudança social ocorrida selou o alicerce para a construção de novas teorias sobre a guarda, buscando, sempre, um exercício mais equilibrado, onde a manutenção do contato do filho com ambos os pais deve continuar tal qual o era antes do rompimento.
Assim, hoje, já se percebe que, nem sempre, a atribuição da guarda à mãe atende ao melhor interesse da criança. Neste contexto, surgiram fortes correntes, quer nos campos da Psicologia, Psicanálise, Sociologia e, como não poderia deixar de ser, do Direito, a teorizar acerca da guarda compartilhada, de modo que, em muitos países, já é comumente aplicada, e concebida como a melhor forma de manter mais íntegros os laços decorrentes da relação parental.
2. ASPECTOS CONCEITUAIS DE GUARDA
Segundo o art. 1º, § III da Constituição Federal (CF), o conceito de guarda surge de um valor maior protegido, que é o bem-estar, a preservação do menor enquanto ser em potencial, que deve ser educado, e sustentado, para atingir a maioridade com completa saúde física e mental, capacitação educacional, e entendimento social, de forma a atender o princípio fundamental de ser sujeito de uma vida digna, fundamento do próprio Estado de Direito insculpido em nossa Carta.
Para Pontes de Miranda, Guarda: “é sustentar, é dar alimento, roupa e,quando necessário, recursos médicos e terapêuticos; guardar significa acolher em casa, sob vigilância e amparo; educar consiste em instruir, ou fazer instruir, dirigir, moralizar, aconselhar”.
Nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, art. 33): “A guarda obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.”
3. TIPOS DE GUARDA
3.1 Exclusiva ou unilateral
Segundo a art. 1.584,§ 5 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 200 a guarda exclusiva é a atribuída, isoladamente, a um só dos genitores ou por alguém que o substitua. Possibilita que o exercício da guarda fique concentrado nas mãos de uma única pessoa, qual seja, a que melhor traduzir os interesses do menor, denominada de guardião.
Sendo este à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade. No caso dos genitores será a guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores: afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; saúde, segurança e educação.
Frise-se que mesmo na guarda exclusiva o poder familiar continua com ambos e que há necessidade de fixação da cláusula de visitação, consoante os ensinamentos do art. 1.121, II da Lei adjetiva civil.
É bastante criticada, tanto pelas ciências da saúde mental, quanto pelas ciências sociais e jurídicas, uma vez que proporciona o gradual afastamento entre pais e filhos, até que se verifique o fenecer da relação, bem como afronta os princípios constitucionais da isonomia e melhor interesse do menor.
3.2. Alternada
Na guarda alternada, cada genitor exerce, alternativamente, a guarda do filho com todos os atributos que lhe são próprios. É aquele modo que possibilita aos pais passarem a maior parte do tempo possível com seus filhos.
Caracteriza-se pelo exercício da guarda, alternadamente, segundo um período de tempo pré-determinado, que poder ser anual, semestral, mensal, ou mesmo uma repartição organizada dia-a-dia. Ao término do período, os papéis invertem-se.
É bastante criticada em nosso meio, uma vez que contradiz o princípio da continuidade do lar, que deve compor o bem estar da criança. Objeta-se, também, que se queda prejudicial à consolidação dos hábitos, valores, padrões e formação da sua personalidade, face à instabilidade emocional e psíquica criada pela constante mudança de referenciais.
3.4 Dividida
A guarda dividida se impôs como o recurso de exercício de autoridade parental mais propício à criança, já que ela viverá num ‘lar’ determinado e usufruirá da presença do outro genitor - a quem não foi atribuída a guarda - através do direito de visita.
3.5 Compartilhada
Guarda compartilhada é a guarda jurídica atribuída a ambos os genitores; “é a situação em que fiquem como detentores da guarda jurídica sobre o menor pessoas residentes em locais separados.
A guarda compartilhada vem sendo utilizada em diversos países da Europa e nos Estados Unidos da América, sendo instituto novo, em face da problematicidade humana sentimental, emocional, moral, psicológica, social.
Em nosso país, vem sendo examinada a partir das últimas três décadas.
Segundo a art. 1.584 da Lei nº 11. 698, de junho de 2008 a guarda compartilhada, poderá ser:
I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar;
II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.
§ 1o Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.
§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.
§ 3o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar.
§ 4o A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas de convivência com o filho.
§ 5o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade.” (NR)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13058.htm Dia: 04/10/21 hora do acesso: 17:00h
https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10616897/artigo-33-da-lei-n-8069-de-13-de-julho-de-1990 Dia: 04/10/21 hora do acesso: 17:00h
CONCLUSÃO
A guarda compartilhada almeja assegurar o interesse do menor, com o fim de protegê-lo, e permitir o seu desenvolvimento e a sua estabilidade emocional, tornando-o apto á formação equilibrada de sua personalidade. Busca-se com efeito a completa e a eficiente formação sócio psicológica, ambiental, afetiva, espiritual e educacional do menor.
Não há diferença entre os termos guarda conjunta e guarda compartilhada. No entanto, o termo compartilhada expressa, semanticamente, idéia mais conforme com o instituto da guarda conjunta, da guarda pelos dois genitores. Entende-se um sistema onde os filhos de pais separados permanecem sob a autoridade equivalente de ambos os genitores, que vêm a tomar em conjunto decisões importantes quanto ao seu bem estar, educação e criação.
Consiste em um dos meios de exercício de autoridade parenteral, quando fragmentada a família, buscando-se assemelhar as relações pai/filho e mãe/filho que naturalmente tendem a modificar-se na dissociação conjugal.
Assim, tem o instituto da guarda compartilhada por escopo tutelar, não somente o direito do filho à convivência assídua com o pai, assegurando ao filho o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social completo, além da referência masculina/paternal.
Isto posto, vale ressaltar que na guarda compartilhada, um dos pais pode manter a guarda física do filho, enquanto partilham eqüitativamente sua guarda jurídica. Assim, o genitor que não mantém consigo a guarda material, não se limita a fiscalizar a criação dos filhos, mas participa ativamente de sua construção. Decide ele, em conjunto com o outro, sobre todos os aspectos caros ao menor, a exemplo da educação, religião, lazer, enfim, toda a vida do filho.
[1] A formação acadêmica :Bacharelado em Direito. FACI- Faculdade Ideal, conclusão em 2010, Especialista em Processo Civil, Trabalhista, Penal, Administrativo e Constitucional- Uninassau, concluído em Junho de 2013., Mestra em Direito Processual Constitucional- Universidade Nacional Lomas de Zamora concluído em Dezembro de 2014, Defesa realizada em 12/07/2017, e Revalidado pela UFRN PPG Nº 000471, Advogada em exercício. Oab nº 28.158.PA