NOÇÕES INTRODUTÓRIAS AOS TIPOS DE GUARDA EXISTENTES NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

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O presente trabalho abordará as modalidades de guarda, conceitos e previsão legal.

INTRODUÇÃO

O Estado, enquanto regente e mantenedor da sociedade, tem o dever de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta primazia, a conservação e aplicação de seus direitos adquiridos como indivíduos únicos.

Até 1916, estes eram tratados como propriedade de seus genitores e esta qualidade implicava nas decisões da guarda.

Posteriormente, um ambiente saudável para o desenvolvimento físico e psicológico da prole tornou-se um dos principais critérios para determinação da guarda, com embasamento nos princípios: melhor interesse da criança, proteção integral, convivência familiar e dignidade da pessoa humana.

O instituto da guarda deteve algumas dificuldades na  compatibilização de seu regime devido à situação de pandemia da Covid-19 e todos os desafios que esta trouxe, sobretudo no cumprimento da quarentena.

Por fim, será exposto os tipos de guarda, seu conceito, evolução histórica e diferenças apresentadas pela legislação, mas todo o contexto está voltado em conservar o melhor interesse da criança e do adolescente, visto que a legislação presume a sua vulnerabilidade.

  1. Conceito de Guarda e suas Modalidades

A guarda dos filhos, seja criança (12 anos de idade incompletos), ou adolescente (entre 12 anos completos e 18 anos incompletos de idade) em regra é atributo do poder familiar, visto que ambos os genitores após a dissolução da sociedade conjugal têm o dever e não a mera faculdade de ter seus filhos menores em sua companhia. (ASSOCIADOS, 2015, p.1), (MADALENO, 2020, p.762).

Em razão disso, ante a vulnerabilidade e fragilidade dos filhos menores e incapazes, carecem, portanto, de uma especial proteção de ambos os genitores que passa pela presença física, psicológica e afetiva dos pais, sendo esse um dos principais pressupostos da responsabilidade parental. (MADALENO, 2020, p. 762).

Para ilustrar o instituto da guarda, apresentaremos uma tabela, extraída da obra de Delgado e Ortega (SILVA, 2017), que explica os tipos de guarda e as principais características de cada uma delas.

TABELA

Modalidades De Guarda No Ordenamento Jurídico Brasileiro

TIPOS DE GUARDA

PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

Guarda unilateral

Atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua

Guarda alternada

Não há previsão legal a não ser que haja consentimento dos pais, mudança constante de residência dos filhos

Aninhamento ou Nidação

Sem previsão no ordenamento jurídico pátrio, prevê a permanência dos filhos na residência em que vivia o casal antes do divórcio. Os pais se retiram de casa e retornam em períodos fixos pré-estabelecidos, e criança não tem qualquer alteração em sua rotina espacial.

Guarda compartilhada

Responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns

Fonte: Silva, 2017, p. 2, Delgado, 2018, p. 1, Ortega 2018, p. 4.

No tocante às modalidades de guarda existentes no ordenamento jurídico brasileiro temos a guarda unilateral, sendo esta atribuída a apenas um dos genitores quando um deles declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor (Art.1.584, § 2º), ou na falta de um deles, alguém que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade com o menor (art. 1584, parágrafo 5º).

Apesar de apenas um dos genitores exercer a guarda, não significa que o outro não tenha direitos no que refere ao seu filho. Tais direitos existem e devem ser exercidos como o direito de convivência, o de fiscalizar os interesses do filho, podendo inclusive, solicitar informações em assuntos que digam respeito á saúde física, mental, e a educação dos filhos, e ainda o de exigir prestação de contas. Segundo Código Civil no art. 1.631, o poder familiar se dá:

Art.1.631CC/02- Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.

No entanto, assim como expõe o art. 1.635, extingue-se o poder familiar:

Art. 1635 CC/02 [...]

I-pela morte dos pais ou do filho;

II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único;

III - pela maioridade;

IV - pela adoção;

V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. (BRASIL, Código Civil, 2002)

Para manter a convivência, que é um direito fundamental da criança, o genitor que não detenha a guarda terá a seu favor a regulamentação de visitas para manter o convívio com o filho que será regulado por um acordo entre os pais ou por determinação judicial, que vai descrever os dias e horários de convívio. (MAIOR, 2018, p.2).

Existe também em nosso ordenamento jurídico a guarda compartilhada, que será exercida por ambos os pais numa responsabilização conjunta para o exercício do poder familiar, ou seja, o genitor que não estiver com a guarda irá participar ativamente nas decisões e interesses a respeito dos filhos menores. (CHAVES, 2011, p. 17).

Lamentavelmente, a guarda compartilhada só era possível de ser aplicada se ambos os genitores concordassem e houvesse a tolerância e compreensão do Juiz responsável pela homologação do acordo.

Entretanto, com o propósito de avançar a legislação, a Lei nº 11.698/2008 deu nova redação aos art.1583 e 1584 do Código Civil, estabelecendo que a guarda dos filhos pode ser unilateral e compartilhada, ficando assim definidas:

Art. 1583 CC/02. A guarda será unilateral ou compartilhada.

§1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5º) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns; [...].

§5º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos.

Art. 1.584 CC/02. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:

I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar;

II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com  mãe. [...] (JÚNIOR, 2008, p. 62) (BRASIL, Código Civil,2002)

Portanto, esta modalidade de guarda ficou estabelecida como regra nas ações litigiosas de divórcio, visto que o fato dos pais estarem separados não pode significar para a criança um bloqueio ao direito de convivência com ambos os genitores.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DIVÓRCIO LITIGIOSO C/C GUARDA UNILATERAL E ALIMENTOS. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA INDEFERIDA EM PRIMEIRO GRAU. MATRÍCULA DA FILHA MENOR NA MESMA ESCOLA QUE O IRMÃO JÁ FREQUENTA. POSSIBILIDADE. DIREITO À EDUCAÇÃO. PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA. DECISÃO REFORMADA. 1- O caput do artigo 300 do CPC/2015 estipula que, para ocorrer o deferimento da tutela provisória de urgência, tanto de natureza cautelar como antecipada, é necessária a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 2- Tanto a Constituição Federal como o Estatuto da Criança e do Adolescente apontam na probabilidade do direito invocado pela parte agravante, no sentido da filha menor ser matriculada na mesma escola que o irmão já frequenta, devendo todas as despesas consequentes da sua inserção na escola serem suportadas por ambos os genitores, a fim de prestigiar o direito à sua educação plena. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO.

(TJ-GO - AI: 01167391820188090000, Relator: ITAMAR DE LIMA, Data de Julgamento: 14/09/2018, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 14/09/2018) (BRASIL, Tribunal de Justiça de Goiás/GO, 1986)

Este tipo de guarda pode ser requerida por um ou ambos os genitores na ação. Nesse sentido preleciona Paulo Lôbo (2011):

A guarda compartilhada pode ser requerida ao juiz por ambos os pais, em comum acordo, ou por um deles nas ações litigiosas de divórcio, dissolução de união estável, ou, ainda, em medida cautelar de separação de corpos preparatória de uma dessas ações. Durante o curso de uma dessas ações, ao juiz foi atribuída a faculdade de decretar a guarda compartilhada, ainda que não tenha sido requerida por qualquer um dos pais, quando constatar que ela se impõe para atender às necessidades específicas do filho, por não ser conveniente que aguarde o desenlace da ação. A formação e o desenvolvimento do filho não podem esperar o tempo do processo, pois o seu tempo é vida que flui. (LÔBO, 2011, p.199, apud ORTEGA, 2016, p.7/8)

Em contrapartida, importante se faz mencionar que existe ainda a modalidade de guarda alternada, onde é comumente confundida com a guarda compartilhada, mas possui suas próprias características, pois quando é fixada ambos os genitores revezam o período exclusivo da guarda do infante/adolescente, cabendo ao outro genitor o direito de visitas.

Esta modalidade de guarda não possui previsão legal no ordenamento jurídico pátrio, porém podemos encontrá-la nas doutrinas e jurisprudências brasileiras.

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIVÓRCIO. GUARDA COMPARTILHADA. POSSIBILIDADE. Diploma legal incidente: Código Civil de 2002 (art. 1.584, com a redação dada pela Lei 13.058/2014). Controvérsia: dizer se a animosidade latente entre os ascendentes, tem o condão de impedir a guarda compartilhada, à luz da nova redação do art. 1.584 do Código Civil. A nova redação do art. 1.584 do Código Civil irradia, com força vinculante, a peremptoriedade da guarda compartilhada. O termo "será" não deixa margem a debates periféricos, fixando a presunção - jure tantum - de que se houver interesse na guarda compartilhada por um dos ascendentes, será esse o sistema eleito, salvo se um dos genitores [ascendentes] declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor (art. 1.584, § 2º, in fine, do CC). Recurso conhecido e provido. (STJ - REsp: 1626495 SP 2015/0151618-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/09/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/09/2016 RMDCPC vol. 74 p. 124 RSTJ vol. 243 p. 570) (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, 1988)

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Um exemplo de guarda alternada seria quando o infante/adolescente fica uma semana residindo com a genitora e na outra semana reside com o genitor, ou quando passa a residir 6 meses na residência de um genitor e 6 meses na residência do outro genitor. Nota-se que existe uma alternância na exclusividade da guarda com cada genitor.

Diante disso, ressalta-se que mesmo na modalidade de guarda alternada o genitor que não estiver com a guarda do infante/adolescente naquele momento não perderá seus direitos e deveres em relação ao filho, visto que tais deveres e obrigações incumbidas ao genitor decorre do poder familiar.

Esse tipo de guarda, conforme entendimento de alguns doutrinadores, não é mais aconselhada. Alguns dos motivos são que a criança ou adolescente podem apresentar adversidades na adaptação devido a mudanças na sua rotina, e podem até perder a referência familiar.

Um outro tipo de guarda que também é pouco comum em nosso ordenamento pátrio, mas que pode ser encontrada em algumas doutrinas e jurisprudências é a chamada guarda de nidação ou aninhamento, onde o pai e a mãe já separados moram em casas diferentes e a criança permanece no mesmo domicílio onde vivia o casal, revezando-se os pais na companhia das crianças/adolescentes.

Deste modo, como os pais se retiram do domicílio e retornam em períodos fixos pré-estabelecidos, a criança não sofre nenhuma alteração em sua rotina espacial, uma vez que não precisam se retirar do núcleo familiar, priorizando assim seu bem-estar emocional.  

No Brasil, não há uma vedação legal para essa modalidade de guarda se consentida pelos genitores. Porém, devido aos altos custos financeiros para manter três residencias, não é a mais aplicada. Vejamos a seguir como Pablo Stolze e Pamplona Filho (2020) conceitua esse modelo de guarda:

Espécie pouco comum em nossa jurisprudência, mas ocorrente em países europeus. Para evitar que a criança fique indo de uma casa para outra (da casa do pai para a casa da mãe, segundo o regime de visitas), ela permanece no mesmo domicílio em que vivia o casal, enquanto casados, e os pais se revezam na companhia desta. Vale dizer, o pai e a mãe, já separados, moram em casas diferentes, mas a criança permanece no mesmo lar, revezando-se os pais em sua companhia, segundo a decisão judicial. Tipo de guarda pouco comum, sobretudo porque os envolvidos devem ser ricos ou financeiramente fortes. Afinal, precisarão manter, além das suas residências, aquela em que os filhos moram. (Haja disposição econômica para tanto! (2020, p. 2031).

Como podemos observar, esta modalidade de guarda não é a mais utilizada em nosso ordenamento jurídico, visto que ela demanda um alto custo de mantença e a realidade para grande parte da população brasileira  é diversa, não podendo arcar com os custos de três residências.

1.2 Evolução histórica da guarda de crianças e adolescentes no Brasil

Para que se possa falar em um histórico evolutivo do instituto da guarda das crianças/adolescentes e suas modificações ao longo dos anos, no que tange ao seu exercício, modalidades e aspectos, deve-se fazer um retrocesso ao desenvolvimento da família brasileira e, consequentemente, seu comportamento além das suas alterações ao longo dos séculos. (GALINDO, 2015, p. 44)

Bento (2016) aponta que o Código Civil do ano de 1916, disciplinava que em casos de “desquite” (separação de corpos de um casal), os filhos menores ficavam com o cônjuge considerado inocente á dissolução conjugal. No entanto, nos casos em que a dissolução matrimonial fosse amigável seguia-se o acordo realizado entre os genitores quanto a guarda dos filhos. (BENTO, 2016, p. 01-02)

Ainda, nos casos em que existisse culpa de ambos os cônjuges na dissolução da relação conjugal, os filhos menores ficariam sob a guarda da mãe, desde que o magistrado entendesse que esta convivência não traria prejuízo de cunho moral aos menores, observando-se toda uma discricionariedade deste para decidir, garantindo também ao outro cônjuge o direito de visita. (BENTO, 2016, p.1)

Em contrapartida, com a publicação da Lei nº 6.515 de 1977, Lei do Divórcio, estabeleceu-se como regra a guarda materna onde o filho natural enquanto menor, ficaria sob o poder e cuidados do genitor que o reconheceu e, se ambos os genitores o reconhecerem, ficaria ainda sob o poder da mãe, desde que desta solução não advenha prejuízo ao menor. Determina o art. 10, caput e § 1º da referida Lei:

Art 10 - Na separação judicial fundada no " caput " do art. 5º, os filhos menores ficarão com o cônjuge que a e não houver dado causa.

§ 1º - Se pela separação judicial forem responsáveis ambos os cônjuges; os filhos menores ficarão em poder da mãe, salvo se o juiz verificar que de tal solução possa adv prejuízo de ordem moral para eles. (BRASIL, Lei n°. 6.515, 1977)

Portanto, diante destas Leis descritas anteriormente, que doutrinam sobre proteção da pessoa dos filhos, o legislador manifesta o desejo em determinar a guarda exclusiva a somente um dos cônjuges, dando prioridade a mãe, e, como forma de impedir disputas judiciais, ao não guardião foi definido o direito de visita e fiscalização, fundamentado no preceito do melhor interesse do menor, porém contradizendo com o princípio da igualdade, disciplinado nos §5º do art. 226 e §6º do art. 227, ambos da Carta Magna de 1988. (BENTO, 2016, p.1).

Dito isso, o Código Civil de 2002, atento as modificações sociais das famílias modernas, onde a mulher adquiriu uma posição fora do lar desvinculando-se dos traços da antiguidade que lhe incumbia, foi retirado do código a culpa como fator de estabelecimento da guarda dos filhos restando disciplinado que aquele cônjuge que detém melhores condições exercerá a guarda dos filhos menores, observando-se os princípios do melhor interesse da criança e do adolescente.

Art. 1583 CC/02.[...]

§ 2 oA guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores:

I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;

II – saúde e segurança;
III - educação.  (BRASIL, Código Civil, 2002 – Revogado)

No entanto, no ano de 2014, foi publicada a Lei nº 13.058, que revogou a redação do referido art. e seus incisos, passando a valer da seguinte forma o caput e o § 2º: 

Art. 1.583 CC/02 – [...] 

§ 2 o Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos. (BRASIL, Código Civil, 2002)

Fica evidente que o legislador ficou cada vez mais vinculado aos princípios constitucionais que envolvem as crianças e os adolescentes a fim de atender aos interesses destes e não dos genitores deles, posto que os filhos menores estão, na maioria das vezes, sendo utilizados como instrumento de disputa no momento de dissolução conjugal.

Sendo assim, estabeleceu-se outra modalidade de guarda que não só a exclusiva/unilateral, mas também a guarda compartilhada, possibilitando, assim, que ambos os cônjuges tenham igualdade de condições na convivência com seus filhos.

Para Waldyr Grisard Filho (2013):

A guarda compartilhada surgiu da necessidade de se reequilibrar os papéis parentais, diante da perniciosa guarda uniparental concedida sistematicamente à mãe, e de garantir o melhor interesse do menor, especialmente, as suas necessidade afetivas e emocionais, oferecendo-lhe um equilibrado desenvolvimento psicoafetivo e garantindo a participação comum dos genitores em seu destino. (FILHO,2013, apud MAFORT, 2015, p.4).

1.3 Diferenças ao instituto da guarda no Direito Civil e Estatuto da Criança e Adolescente

Existe certa divergência doutrinária quanto a aplicação da guarda perante o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente, visto que parte da doutrina afirma que a guarda dos pais quanto aos filhos menores previsto no Código Civil é diferente da guarda de menores prevista no ECA.

O Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 8.069/90, estipula que a guarda dos filhos menores não é um poder entregue livremente nas mãos de alguém para que este exerça a autoridade familiar, mas sim um dever imposto aos pais ou responsável por uma razão de ordem pública, que visa estabelecer vínculos, regularizar a convivência de fato entre o menor e o guardião, ficando este responsável por representá-lo juridicamente. (DIREITO DIÁRIO, 2016, p.3).

Em casos em que ocorre a violação desse instituto injustificadamente, o genitor poderá ser responsabilizado administrativamente, penalmente e civilmente, visto que é obrigação do(s) genitor(es) proporcionar qualidade de vida aos filhos menores, além de ser um direito da criança e do adolescente receber toda e qualquer tipo de assistência para que se possa garantir seu desenvolvimento. Deste modo expõe o art. 19 do ECA:

Art. 19. ECA/90. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. (Brasil, Lei nº 8.069,1990)

              No que se refere à aplicação do instituto da guarda no Estatuto da Criança e Adolescente, esta geralmente acontece nos casos de risco que envolvem as crianças e adolescentes, tendo como exemplo as famílias que abusam de sua autoridade perante os filhos castigando-os de forma imoderada, faltando com os deveres a eles inerentes, ou até mesmo nos casos em que ocorre a destituição do poder familiar, onde o menor será recolocado em uma família substituta ou associação até que seja definido seu destino.

Deste modo prevê o art. 28 da referida Lei: A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei”. (BRASIL, Lei nº 8.069,1990).

              A guarda do menor que for deferida judicialmente á pessoa diferente dos pais, visa regularizar a posse de fato da criança ou adolescente com seu detentor, e a concessão desta medida poderá ser de forma liminar ou incidental nos procedimentos de tutela e adoção. E após ser concedida a guarda do menor ao detentor este ficará obrigado a prestar toda e qualquer assistência necessária ao desenvolvimento do menor, além de lhe ser garantido o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. Neste sentido expõe o art. 33 e § 1º da referida Lei:

Art. 33 ECA/90. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros. (BRASIL, Lei nº 8.069,1990)

Importante se faz lembrar que nos casos de dissolução da sociedade conjugal, o genitor que não detentor da guarda não será destituído do poder familiar, sendo assegurada aos filhos menores a condição de dependente para todos os fins de direito, ou seja, ainda que rompido os vínculos entre os genitores é assegurado aos filhos todo e qualquer tipo de assistência advindos dos pais, se não vejamos:

Art. 21 ECA/90. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. (BRASIL, Lei nº 8.069,1990)

Dessa forma, deve-se entender que é tutelado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente os interesses dos menores de idade e não os conflitos pertinentes a dissolução conjugal entre os genitores, sendo que é possível manter o instituto da guarda  entre a criança e o adolescente ao mesmo tempo em que se mantém um vínculo familiar. (DIREITO DIÁRIO, 2016, p.1).

No que tange ao Código Civil de 2002, este não estabelece de forma explícita o conceito de guarda dos filhos menores, porém este instituto se aplica em razão do poder familiar exercida por ambos os cônjuges e, ocorrendo a dissolução da relação conjugal é necessário estabelecer uma relação de convívio entre o menor e os genitores sem que haja a suspensão/dissolução do poder familiar.

Em seu art. 1.583 ficou estabelecido os tipos de guarda dos filhos menores que divide-se em duas modalidades:

Art. 1.583 CC/02. A guarda será unilateral ou compartilhada.

§ 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.(BRASIL, Código Civil,2002)

Já no art. 1584 do Código Civil, é possível verificarmos que mesmo sendo deferida a guarda unilateral ou compartilhada, ainda assim se observa o princípio do melhor interesse do menor que se objetiva a proteger integralmente os interesses da criança/ adolescente. Vejamos:

Art. 1584 CC/02 [...]

§ 3 o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar à divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe.

[...] § 5 o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda a pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade. (BRASIL, Código Civil, 2002)

Dessa forma, diante dos institutos mencionados acima, podemos verificar que a guarda no Estatuto da Criança e do Adolescente e guarda no Código Civil são dois institutos diferentes, sendo que o ECA trata dos casos de guarda quando existem riscos para os menores, sejam estes físicos, psicológicos ou sociais, onde os processos são de competência das Varas da Infância e Juventude e a guarda é uma das estapas do processo de adoção.

Já o Código Civil 2002 trata dos casos de guarda quando há o rompimento da sociedade conjugal ou desfazimento de namoro, noivado ou união estável em que a residência do menor era em conjunto com pai e mãe sendo que os processos de guarda deverão ser encaminhados às Varas de Família e Sucessões. (COSTAL, TEIXEIRA, 2018, p.2).

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BRASIL. STJ - REsp: 1626495 SP 2015/0151618-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/09/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/09/2016 RMDCPC vol. 74 p. 124 RSTJ vol. 243 p. 570. Site: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/862924052/recurso-especial-resp-1626495-sp-2015-0151618-2                 

Sobre as autoras
Daniela Galvão Araújo

Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Euripedes de Marília (2002), Pós-graduação em Direito Processual: Civil, Penal e Trabalho e Mestrado em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Euripedes de Marília (2005). Atualmente é professora e coordenadora do curso de Direito da UNILAGO (União das Faculdades dos Grandes Lagos). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Teoria do Direito, Teoria do Estado, Direito Civil, Direito Processual Civil, Direito Penal, Direito Constitucional.

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