A independência dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas

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Em breve análise, busca-se evidenciar a importância da independência funcional dos Auditores de Controle Externo para os Tribunais de Contas exercerem uma das importantes atribuições de controle externo sobre a Administração Pública

A independência dos Auditores da área de controle dos Tribunais de Contas*

 

* Alcindo Antonio Amorim. B. Belo (Advogado licenciado OAB-PE, Pós-Graduação em Administração Pública e Controle Externo - FCAP/UPE e Auditor de Controle Externo do TCE-PE)

 

A atuação independente dos Auditores da área de controle dos Tribunais de Contas corresponde a um requisito essencial para uma análise técnica das contas dos agentes públicos no intuito de emitir o Relatório de Auditoria.

Cabe frisar de início que o controle de instituições privadas e públicas constituem um dos pilares dos regimes democráticos e do livre mercado, porquanto um corolário do dever de prestar contas e da aferição tanto da performance dos gestores à frente de cada instituição, quanto da conformidade com as regras aplicáveis.

Auditores independentes, nomenclatura adotada na esfera privada, revela-se adequada à fiscalização ampla e emissão de relatório de auditoria sobre a conta examinada. Na Constituição Federal designa-se Auditor quando se trata de cargo com atribuição de julgamento, distribuição originária ou em substituição aos titulares - Ministros, no âmbito Federal, e Conselheiros, DF, Estados-membros e Município, onde houver (PASCOAL, 2021). Nesse sucinto texto, a referência a Auditores da área de controle concerne aos cargos com a competência de fiscalizar as contas dos agentes públicos.

Importante frisar que os Tribunais de Contas, assim como o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho do Ministério Público, têm natureza administrativa e constituem um dos Órgãos constitucionais a que compete efetuar o controle externo sobre o Poder Público.

Têm funções híbridas, mas independentes, que se interrelacionam de modo constante num processo. Um quadro de Auditores fiscaliza as contas dos administradores públicos. Um corpo de Julgadores delibera após se formar a relação processual com a citação dos agentes públicos para apresentarem defesa. Isso com o desiderato de que cada um atue com imparcialidade, formando o convencimento de forma devidamente motivada, mas independente, embora mantenham concomitante a intercomunicação necessária à viabilidade operacional do Tribunal de Contas no papel do controle externo.

Nesse modelo preconizado pela Carta Magna, artigos 71 a 75, assim, as auditorias representam uma etapa de investigação. A partir de um prévio planejamento, a inspeção visa a apurar fatos, por meio da coleta de documentos e informações, e responsabilidades (subjetiva, por conduta comissiva ou omissiva, de cada agente público), a fim de emitir um parecer eminentemente técnico sobre as contas dos gestores, que contém a necessária ressalva de que a fiscalização não detecta necessariamente todas as possíveis infrações.

Por consequência, a despeito de cada Relator presidir e instrução nos termos das normas processuais previstas em Leis Orgânicas dos TCs e subsidiariamente Código de Processo civil, cada auditor possui independência funcional para adotar os procedimentos adequados de fiscalização e formar o convencimento baseado nos elementos coletados e nos preceitos da ordem legal para expedir o Relatório de Auditoria nos termos de preceitos constitucionais, especialmente do artigo 71, de Normas Gerais de Auditoria, das próprias Leis Orgânicas os TCs e das Leis que regulamentam os cargos de auditoria,.

Com o advento do Relatório, que finaliza a fase inquisitorial, devem ser citados os responsáveis indicados nesse Parecer Técnico, porquanto inaugura a relação processual, em observância ao postulado do Devido Processo Legal e consectários Ampla Defesa e Contraditório, CR, artigo 5°, LV e LV. A exceção, de mencionar, diz respeito à apreciação da legalidade de ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão (art. 71, III, da CF/88), em que a relação se estabelece entre o TC e o órgão, dispensável citar interessados que possam ser afetados indiretamente pela decisão.

Uma vez emitido o opinativo técnico e concedida a oportunidade de se exercer o contraditório e a ampla defesa, com vistas dos autos e se requerer a produção de provas cabíveis, o processo estará concluso para julgamento.

Por outra vertente, caso não respeitados contraditório e a ampla defesa, gera-se vício insanável, devendo-se anular a decisão emitida e reabrir a instrução para oportunizar o inafastável exercício da ampla defesa. Profícuo citar o incontroverso entendimento do STF a respeito:

 

“Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão” (Súmula Vinculante nº 3 do STF). Acórdão do TCU que, sem intimação da servidora interessada, determinou que se procedesse à cobrança de valores recebidos a título de adicional de dedicação exclusiva. Incidência do entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal.  Segurança concedida para garantir o exercício do contraditório e da ampla defesa.” (MS 27760, Relator: Min. Ayres Britto, DJe 12/04/2012)

 

 

“Decisão pelo TCU de um processo de representação, do que resultou injunção à autarquia para anular licitação e o contrato já celebrado e em começo de execução com a licitante vencedora, sem que a essa sequer se desse ciência de sua instauração: nulidade. ... A oportunidade de defesa assegurada ao interessado há de ser prévia à decisão, não lhe suprindo a falta a admissibilidade de recurso, mormente quando o único admissível é o de reexame pelo mesmo plenário do TCU, de que emanou a decisão.” (MS 23550. Relator: Min. Marco Aurélio, Redator do acórdão: Min. Sepúlveda Pertence. DJe 31/10/2001)

 

 

Nesse espectro, importante frisar a impertinência de Gestores e respectivos Advogados buscarem o acesso a documentos da auditoria - planejamento, papéis de trabalho, entre outros -, e coletados na inspeção, bem como para que  haja audiências com os fiscalizados, numa espécie de contraditório antecipado.

Consoante exposto, a auditoria, que possui natureza inquisitorial, corresponde a fase interna da instrução dos processos nos TCs. Os procedimentos adotados na fiscalização para obter elementos consistem em etapa de execução do planejamento da auditoria, descabendo interferências que possam prejudicar a independência funcional no exercício do controle externo. Há de haver tal submissão quando exarado o Relatório e o Relator do processo determinar citar os responsáveis destacados no Relatório de Auditoria.

Pode a fiscalização se reunir com jurisdicionados para esclarecer questões na apuração dos fatos. De anotar que a palavra auditoria originária no latim “audire”, que significa ouvir, o que revela a índole de interação entre auditor e auditado para esclarecimento adequado das condutas analisadas. Desse modo, há uma interligação inerente entre auditores e fiscalizados em razão do dever de um investigar, e de outro, de prestar contas e comprovar a regularidade e a efetividade da gestão.

Não se pode deslembrar que ser fiscalizado gera uma apreensão compreensível. Contudo, imanente numa democracia prestar contas e ser objeto de controle. O trabalho de fiscalização deve seguir normas gerais de auditoria e buscar, com devida urbanidade e respeito, mas de modo objetivo e transparente, exercer o controle externo. Ademais, os Pareceres podem se constituir meio de fomento para aprimorar a Administração Pública ao indicar desconformidades e deficiências, que podem ser objeto de retificações necessárias por parte dos gestores.

Vale ressaltar ainda que o Relatório de Auditoria inaugura a instrução processual e representa o opinativo técnico da fiscalização, e não o juízo de valor das contas dos gestores, esse de incumbência privativa dos Ministros e Conselheiros das Cortes de Contas formar quando finalizada a instrução processual, sopesando a visão da inspeção e as contrarrazões dos agentes públicos.

Por conseguinte, descabe interceder perante os setores de fiscalização ou os próprios Relatores para se ter acesso a documentos ainda em coleta e análise, bem assim obter audiências com os auditores, que estão a desempenhar com a imprescindível independência funcional na apuração de fatos e responsabilidades. Sobre o tema, profícuo se reportar a precedentes de Jurisprudência do STF e do TCU:

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“O término da etapa de instrução do processo administrativo no Tribunal de Contas da União ocorre no momento em que o titular da unidade técnica emite seu parecer conclusivo, consoante predica o art. 160, § 2º, do Regimento Interno do TCU. O Regimento Interno do Tribunal de Contas da União prevê diversas oportunidades para que as partes produzam as provas necessárias à elucidação dos fatos e à comprovação da regularidade dos atos por elas praticados.” (MS 36369, Relator: Min. Luiz Fux, DJe 29/05/2019)

 

1. O estabelecimento do contraditório em procedimentos iniciais de apuração de materialidade de atos objeto de denúncia perante o TCU não é obrigatório, pois, nessa fase, há mero ato investigatório, sem formalização de culpa. Precedentes.

2. De acordo com previsão do art. 12, II, da Lei Orgânica do TCU (nº 8.443/92), é no processo da tomada de contas que o apontado como responsável tem a oportunidade de exercer seu direito ao contraditório e à ampla defesa, o que foi observado no caso dos autos.”  (MS 34296 AgR. Relator: Min. Dias Toffoli. DJe 28/05/2018)

 

 

 

Buscou-se evidenciar, nessas breves ponderações, ser imprescindível a independência funcional dos Auditores para apurarem fatos e responsabilidades de forma ampla e imparcial numa das principais atribuições de controle externo, investigar as contas dos agentes públicos, dos Tribunais de Contas.

 

   

  

 

Referências:

 

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1998. Brasil, Congresso Nacional, [1988]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso 06 out. 21.

 

PASCOAL. Valdecir Fernandes. Regime remuneratório dos TCs: salvaguarda para a judicatura de contas. Conjur, 2021. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2021-out-08/pascoal-regime-remuneratorio-tribunais-contas>. Acesso em 11 out.21

 

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MANDADO DE SEGURANÇA. MS 27760. Relator: Min. Ayres Britto, DJE 12/04/2012. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur207160/false>. Acesso em 09 out. 2021.

 

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MANDADO DE SEGURANÇA. MS 23550. Relator: Min. Marco Aurélio, Redator do acórdão: Min. Sepúlveda Pertence. DJ 31/10/2001. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur100349/false>. Acesso em 13 out. 2021.

 

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MANDADO DE SEGURANÇA. MS 36369. Relator: Min. Luiz Fux, DJe 29/05/2019. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur404580/false>. Acesso em 09 out. 2021.

 

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. MS 34296 AgR. Relator: Min. Dias Toffoli, DJe 28/05/2018. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur385548/false>. Acesso em 09 out. 2021.

 

 

 

 

Sobre o autor
Alcindo Antonio Amorim Batista Belo

Bacharel em Direito e Administração pela UFPE. Pós-graduação em Administração Pública e Controle Externo pela FCAP/UPE. Advogado OAB-PE licenciado. Auditor de Controle Externo do TCE-PE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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