A essência do interesse público

19/10/2021 às 13:21
Leia nesta página:

O Estado brasileiro existe como fruto de um pacto social que une a sociedade ao redor de necessidades básicas e do bem comum

Os recentes vetos presidenciais aos projetos de lei que possibilitariam aos planos de saúde custearam a quimioterapia oral, como aquele referente ao auxílio do Estado às mulheres em situação de pobreza menstrual, chamaram a atenção da sociedade. Os projetos foram vetados por serem contrários ao interesse público, segundo consta.

Em uma análise estritamente técnica, entendo que a expressão “interesse público”, utilizada como justificativa para o veto presidencial, não se ajusta ao contexto dos projetos. Explico:

O projeto referente à facilitação de quimioterapia oral para pacientes oncológicos auxiliaria, e muito, o tratamento dessas enfermidades. Aos pacientes pouparia tempo de deslocamento, facilidade nos protocolos e tratamentos menos invasivos, alcançando maior qualidade de vida a esse grupo.

Já o auxílio estatal para as mulheres de baixa renda que não possuem condições de adquirirem absorventes higiênicos para os períodos menstruais mensais, evitaria infecções, garantiria maior grau de higiene e conforto. O mínimo que se precisa para passar por esse desconforto mensal.

Ambas as situações, direcionadas a grupos específicos é evidente e não afastam o caráter social e público que atinge não apenas os beneficiados, mas indiretamente a sociedade.

O Estado brasileiro existe como fruto de um pacto social que une a sociedade ao redor de necessidades básicas e do bem comum. Isso se traduz em interesse público. A união de forças sociais visa a garantir a cada um aquilo que necessita, na medida da sua necessidade. A igualdade é isso: tratar os desiguais de forma desigual, alcançando àqueles menos favorecidos ou com dificuldades de saúde, por exemplo, aquilo que mais necessitam. Ou seja, o interesse público não possui viés apenas financeiro, mas se traduz no interesse da maioria para alcançar o bem de todos, o bem comum.

Portanto, a meu juízo, a justificativa de veto é meramente formal, não material, eis que a sociedade brasileira possui, sim, interesse público na aprovação dos dois projetos. Não fosse isso, essa mesma sociedade não estaria mobilizada para a derrubada do veto presidencial.

Sobre a autora
Andrea Teichmann Vizzotto

Advogada, consultora jurídica, professora universitária. Procuradora Municipal do Município de Porto Alegre aposentada. Graduação em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1985). Especialista em Direito Municipal pela Faculdade Ritter dos Reis e Escola Superior de Direito Municipal (2000). Especialista em Revitalização de Patrimônio Histórico em Centros Urbanos pela Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2005). Mestre em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2008). Doutora em Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio grande do Sul (2018). É professora de Direito Urbanístico e Municipal em cursos de extensão e pós-graduação da Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Já lecionou em cursos preparatórios para concursos públicos nas disciplinas de Direito Urbanístico, Direito Administrativo e Direito Municipal. Autora da obra Cidade Justa: a distribuição de ônus decorrente do processo de urbanização pela recuperação de mais-valias urbanas. Coautora das seguintes obras: Temas de Direito Urbano-Ambiental, Direito Municipal em Debate e Direito Urbanístico para concursos. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/8237337317019554

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