RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo explicar os eventos que ocorreram no Brasil e envolver a área de Compliance a fim trazê-la como uma ferramenta para inserção de uma nova cultura empresarial no país, como também ser objeto de combate à corrupção. Em uma ordem cronológica explica o surgimento de Compliance no Brasil e os pilares de Compliance. Faz uma análise da Lei Anticorrupção que trata da responsabilidade da pessoa jurídica nas esferas administrativa e civil, explicando suas prerrogativas e o processo jurídico que a compõe. Conta sobre o maior escândalo de corrupção, a operação Lava Jato, e quais foram os danos empresariais que os envolvidos tiveram, menciona os acordos de leniência fazendo uso das estratégias de Compliance como uma solução para redução da condenação. A coleta de informações e dados deste trabalho justificam o aumento da procura de Compliance após a Lava Jato e traz os resultados das empresas envolvidas no escândalo de corrupção por meio da instauração de programas de Compliance. Este trabalho contribui para uma melhor compreensão de como as ferramentas de Compliance são eficazes trazendo a solução para mudança comportamental empresarial no Brasil e melhorando os setores político, econômico e social.
Palavras-Chave: 1. Compliance. 2. Lei Anticorrupção. 3. Operação Lava Jato. 4. Reestruturação. 5.Empresas privadas.
INTRODUÇÃO
Esse trabalho tem como objetivo analisar e compreender as mudanças comportamentais empresariais, principalmente após o escândalo da Lava Jato, e como Compliance tem sido uma ferramenta eficaz para mitigar os riscos de atos ilícitos e auxiliar o Poder Público com o combate à crimes financeiros. A necessidade da estar em conformidade com as leis trouxeram uma busca maior para instauração de programas de governança corporativa, e dessa forma, as empresas vem investindo fortemente na área de Compliance, ajudando o país com a reputação no mercado global.
A Operação Lava Jato trouxe consequências relevantes para o Brasil, consequência esta, que refletiu e ainda reflete no setor econômico do país, na sociedade e na política. Podemos considerar que a área de Compliance teve um boom dentro das corporações brasileiras, pelas estratégias e governança aplicadas nas empresas que foram atingidas pela Lava Jato, que tem como foco estruturar de forma eficaz, dar proteção as empresas e mitigar seus riscos através de programas de integridade. A área de Compliance busca medidas para mitigar os riscos e garantir que as regras internas e até mesmo as leis entrem em conformidade dentro e fora das corporações. Por isso tem se tornando destaque na trajetória das empresas brasileiras, além de ressignificar os negócios nas empresas atingidas pela Lava Jato.
Portanto, esse tipo de governança tem mudado a forma de consolidar as estratégias de uma empresa, como por exemplo a mudança comportamental dos negócios. Isso porque, o lucro financeiro costumava ser o centro do negócio empresarial, os planos de atingir o sucesso financeiro giravam em torno do setor econômico e dos lucros que a empresa traria. Hoje em dia, se tem a ideia de que para atingir tais objetivos as organizações precisam estar em conformidade com as legislações e livre de escândalos de corrupção. É importante mencionar o quanto Compliance tem sido o braço direito dos negócios das empresas por trazer todas as ferramentas que refletem na transparência, ética e principalmente na mitigação dos riscos para obtenção de sucesso dentro de uma corporação.
É, de grande relevância compreender quais ferramentas essenciais o Compliance tem para uma mudança comportamental dentro das organizações, que por consequência reformará a cultura brasileira acerca da corrupção.
É importante ressaltar que tais mudanças podem ajudar a reconstruir a imagem de todo o setor econômico brasileiro abrangendo todos os tipos de sociedades empresárias, das quais, perdeu-se a confiança para novos investimentos e negociações.
Para apresentação desta monografia, será explicado o que é Compliance, e como tem sido um instrumento eficaz para as empresas criarem um método de proteção contra os perigos dos crimes financeiros, que é um dos maiores problemas do Brasil, afetando não só o setor econômico, como também a sociedade. Para isso, a área de Compliance estabelece programas de integridade e governança corporativa. Por ser um assunto de grande relevância dentro do setor empresarial, o Compliance pode ser usado como uma ferramenta que pode ajudar o Brasil no combate a crimes como corrupção, lavagem de dinheiro entre outros, trazendo benefícios no setor econômico, empresarial e social.
Para uma empresa atrair investidores e se consolidar no mercado é de extrema importância que ela não seja envolvida em escândalos de corrupções, criando uma imagem positiva e consequentemente trazendo solidez ao seu negócio. Grande parte dessa ideia de mitigar tais risco vieram com a Operação Lava Jato, em meados de 2014, onde pudemos acompanhar um grande esquema de corrupção expondo empresas, que além de cair em descrédito, tiveram uma perda significativa financeira acarretada por multas e sanções bilionárias.
Dessa forma, a área de Compliance pode ser usada como um instrumento para ajudar as empresas atingidas na Lava Jato a voltarem às suas atividades financeiras e recuperarem seus nomes, quanto para as empresas que procuram mitigar esses riscos e não ser mais um exemplo de empresa a cair em tal crise reputacional e financeira, criando uma imagem mais séria e idônea, para seus credores, investidores, e inclusive para a sociedade.
Portanto, a questão central desse trabalho é relacionar a Operação Lava Jato com o resultado de uma reestruturação e mudança comportamental das empresas privadas brasileiras advindas dos planos de ação de Compliance, trazendo maturidade empresarial e ajudando no combate de crimes financeiros que assola o país frequentemente, e melhorando a imagem que as empresas brasileiras têm no cenário econômico mundial.
O presente trabalho tem como objetivo trazer à tona as medidas de Compliance e como elas são importantes para as empresas privadas se consolidarem no setor empresarial, mostrar como os programas de Compliance são eficazes para as empresas que buscam mitigar os riscos reputacionais e financeiros. Trazer uma melhor compreensão da Lei Anticorrupção nº 12.846/2013 que trata da responsabilização de pessoas jurídicas para atos lícitos dentro das esferas administrativa e civil, além de questionar a responsabilidade penal. Tem como objetivo, descrever o que foi a Operação Lava Jato e contar de uma forma suscinta a participação das empresas privadas no escândalo. Trazer o destaque que Compliance obteve com Lava Jato e como a investigação influenciou na aderência dos programas de Compliance. Além de demonstrar a reestruturação das empresas envolvidas nos crimes de corrupção, o aumento da procura dos executivos para implementação da área mudou o pensamento do setor empresarial, aumentando o investimento em programas de Compliance.
Inicialmente quanto ao tipo de pesquisa, a metodologia usada é de caráter exploratório cujo objetivo é buscar familiaridade com o problema de pesquisa, (METTZER, 2018), construindo hipóteses envolvendo pesquisa bibliográfica, experiências práticas das situações vividas dentro do contexto da Lava Jato e agentes ativos na área de Compliance e inclusive exemplificando as situações a fim de trazer melhor compreensão. A pesquisa teve caráter explicativo, analisando em detalhes e descrevendo todos os objetos deste estudo. Quanto a abordagem do tema foi realizada de forma qualitativa (METTZER, 2018), utilizando dados para demonstrar a aderência de Compliance das empresas privadas brasileiras, justificando o aumento de procura de implementação dos programas de Compliance, inclusive após a Operação Lava Jato, houve também um comparativo, trazendo dados de pesquisa acerca da reestruturação de empresas atingidas pela Lava Jato de forma objetiva, buscando trazer informações minuciosas. (METTZER, 2018).
No primeiro capítulo, descreverá as noções introdutórias de Compliance no exterior e no Brasil, analisando os motivos pelos quais o mercado econômico global teve a preocupação de regulamentar o mercado financeiro. Foi utilizada obra da autora Marcella Blok, que traz uma linha histórica, desde o século XIX até os dias de hoje, até se dar origem a Compliance. Estabelecido a ordem cronológica, foi explicado o que é Compliance, seus objetivos, programas etc. Foi utilizado outros autores, que descrevem as funções de Compliance. Por fim, é explicado a origem de Compliance no Brasil como ela se desenvolveu e se adequou ao modelo de mercado global explicando os pilares de Compliance.
O segundo capítulo explica a Lei Anticorrupção (12.846/2013), sua origem, aspectos, aplicabilidade e as necessidades da responsabilização da pessoa jurídica nas esferas administrativa e civil. Neste capítulo trouxe duas leis internacionais que são referências para a estrutura da Lei anticorrupção, bem como o quadro comparativo delas, criada pela autora Marcella Blok, em seu livro analisando as prerrogativas das leis. A obra dos autores Francisco Mendes e Vinicius de Carvalho foi de suma importância para melhor compreensão da aplicabilidade da lei, dessa forma mencionados em diversos tópicos desse capítulo. Por fim, foi mencionado o acordo de leniência, fazendo uma relação com os programas de integridade que a área de Compliance proporciona.
O terceiro capítulo busca descrever como foi a investigação da Operação Lava Jato desvendo o esquema de corrupção dentro do país que envolve as empresas privadas brasileiras, para tal, foi utilizada a obra de Vladimir Netto, que conta detalhes minuciosos dos bastidores da operação da polícia federal. Este capítulo traz em detalhes o envolvimento e as condenações dos executivos das empresas privadas e os impactos que refletiram nas empresas, no cenário político e para a sociedade brasileira.
No quarto e último capítulo, será aludida as questões acerca da reestruturação de Compliance, trazendo o exemplo da empreiteira Odebrecht e como os programas de conformidade estão auxiliando a empresa para melhorar sua reputação. Os resultados do último capítulo foram com bases em pesquisas de maturidade da KPMG e artigos de jornais conhecidos no Brasil. Este capítulo trouxe também o aumento da procura da área de Compliance. Por fim, para melhor ilustração foi trazida imagens e artigos jornalísticos à título de exemplo que demonstram o desempenho das empresas, que buscam uma nova imagem reputacional no Brasil e no exterior.
1. COMPLIANCE E SUA ORIGEM
1.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS PARA A ORIGEM DE COMPLIANCE
Para melhor entendimento da origem de Compliance, é necessário compreender o histórico mundial econômico e como as situações derivadas de fraude, corrupção e lavagem de dinheiro trouxeram à tona a importância de criar mecanismos para as empresas terem um bom comportamento reputacional e idôneo, haja vista que, como a preocupação dos negócios de uma empresa sempre foram voltados a seus investimentos e seus lucros, os crimes financeiros trouxeram perdas significativas não somente econômicas, mas também danos reputacionais, danos civis, empresariais e criminais.
Podemos afirmar que diante de um cenário de uma empresa totalmente globalizada, com negócios fluindo, investimentos de grande escala e principalmente fluxos financeiros listados na bolsa contribuindo para o sucesso de uma empresa, um escândalo de corrupção não lhe cai bem. O que significa que as perdas financeiras consideráveis poderiam levar uma empresa deste nível à falência, prisões, multas altíssimas e principalmente a diminuição de investimento, pois, quem se interessaria a investir em uma empresa que está na mídia devido a escândalos de corrupção?
Veja o quão danoso é para uma empresa se deixar levar por atos ilícitos e como a ausência de programas de integridade e programas que se atentem às regulamentações podem trazer riscos aos negócios. Todas essas situações fazem parte de um grande iceberg sobre os problemas de uma corporação.
Em paralelo a isso, temos também o interesse público em minar tais atos ilícitos, visto que tais condutas trazem impactos negativos à sociedade, principalmente porque estão diretamente ligados a administração pública, como por exemplo, crimes como o abuso do poder econômico, que envolvem funcionários públicos, e inclusive políticos. Por isso, a solução para esse problema é trazer regras para regulamentar o relacionamento entre o Estado e a Pessoa Jurídica.
Se analisarmos os fatos históricos, no século XX, como por exemplo, a quebra da bolsa de Nova York em 1929, que por conseguinte, no mandato do presidente Franklin Roosevelt trouxe a solução do new deal, para a recuperação econômica nos EUA[1], podemos observar que esse fato teve como reflexo a preocupação, não só com a recuperação econômica, mas também com a regularização do mercado. Isso porque, de certa forma, com o mercado regularizado e com a criação de leis mais severas podemos ter um bom funcionamento econômico, trazendo benefícios não somente para o Estado, como para as empresas, que se prestarem atenção nos atos regulatórios poderão criar mecanismos para evitar as fraudes e corrupções e suas consequências.
Diante da necessidade de regulamentar o mercado, em 1933 nos EUA, criou-se no Congresso Americano a Securities Act, que visava a proteção de títulos de valores mobiliários e seus investidores, conforme relatado pela autora Marcella Blok em sua obra:
(iv) 1933/34:
a) Congresso Americano vota medidas com vistas a proteger o mercado de títulos de crédito de valores mobiliários e seus investidores Securities Act.
b) Criação da SEC Securities and Exchange Commission; com exigência de registro do prospecto de emissão de títulos e valores mobiliários.
(BLOK, 2020, p. 23)
Essas medidas, no entanto, é um dos exemplos de construção de conhecimento inicial de Compliance nos EUA, visto que, após uma sequência de fatos históricos a atenção voltada em aplicar medidas que coíbem as práticas negativas que envolvem fraudes e esquemas corruptos vêm crescendo ao longo da área econômica, é importante colocar em destaque a fala da autora Marcella Blok (2020), que em 1950, houve a criação da legislação nos EUA Prudential Securities, a contratação de advogados para acompanhar a legislação e monitorar as atividades com valores mobiliários, que abrangeu, portanto, a área jurídica também.
Mais tarde, ainda nos EUA, em 1960 tivemos um grande marco histórico, e Era do Compliance, a SEC (Securities and Exchange Commission), de acordo com a autora Marcella Blok:
A SEC passa a insistir na contratação de Compliance Officers, para criação de procedimentos Internos de Controles, treinar pessoas, monitorar, com os objetivos de auxiliar as áreas de negócios e ter a efetiva supervisão.
(BLOK, 2020, p.24)
A partir dessa fase linear, podemos entender o que originou o Compliance, estes foram os reflexos que tornou o Compliance uma ferramenta para mitigar os riscos, e não se limitando a isso, auxiliar a criação de procedimentos de controles internos. Para melhor entendimento:
Primeiro, vamos explicar o significado da palavra compliance. Ela vem do verbo inglês to comply, que significa estar de acordo, se comprometer e estar submetido a uma regra ou pedido. Neste sentido, o substantivo compliance pode ser entendido como complacência, conformidade. (LEC, 2018) [2]
Podemos entender que Compliance procura adequar uma empresa às conformidades de ética, e principalmente ações voltadas às regulamentações e leis. Significa dizer, que Compliance possui programas de controles que buscam prevenir possíveis crimes e ou regulamentações que possam causar um dano altamente nocivo a uma empresa. Francisco Mendes e Vinicius Carvalho entendem que um programa de Compliance visa estabelecer mecanismos e procedimentos que tornem o cumprimento da legislação parte da cultura corporativa. (CARVALHO e MENDES, 2017, p. 31).
O objetivo do Compliance vai muito além de se proteger dos crimes de fraude, corrupção e lavagem de dinheiro, ele visa a criação de uma cultura idônea, a fim de construir uma imagem reputacional honesta e confiante dos negócios de uma empresa privada.
A preocupação das empresas com relação aos seus resultados e as mudanças comportamentais do mercado ficaram diretamente ligadas aos impactos positivos e negativos que tais empresas trazem para sociedade, pensando nisso a área de Compliance traz diversos mecanismos e procedimentos para implementar dentro das corporações às regulamentações de mercado, leis e principalmente controles internos que auxiliará Compliance a mitigar os riscos e criar um perfil comportamental nos funcionários juntamente com a adoção de uma cultura honesta e positiva dentro do ambiente corporativo.
1.2 PROGRAMAS DE COMPLIANCE E SEUS MÉTODOS
Conforme apresentado no tópico anterior, podemos ter uma visão clara de como o Compliance é relevante dentro das organizações, isso porque, o Compliance se mostra bastante efetivo quando se trata de diminuição de riscos que claramente podem levar uma organização à ruídos.
O Compliance tem o poder de influenciar positivamente em uma cultura idônea impulsionando uma organização à alta credibilidade entre de stakeholders, isto é funcionários, clientes, prestadores de serviços, investidores, consequentemente elevando o padrão da organização com relação a competitividade entre outras organizações do mesmo ramo, construindo uma estrutura organizacional forte, com códigos de condutas éticas, boas práticas e principalmente níveis baixos de riscos financeiros e reputacionais que geram danos significativos.
Mas por que o Compliance é tão importante? E por que, as empresas deveriam adotar os programas de Compliance? Sabemos que o mercado está em constante movimento, e para atender e alcançar essa movimentação devemos estar em conformidade com diversas leis e regulamentações. É importante ressaltar que os ambientes que regulam tais atividades econômicas se encontram mais rigorosos, os autores Francisco Mendes e Vinicius Carvalho apresentaram em sua obra um gráfico que demonstra claramente o crescimento de tais regulamentações no sistema financeiros:
Figura 1 - Gráfico que demonstra crescimento de regulamentações nos EUA.
Fonte: CARVALHO e MENDES (2017)
Além do crescimento de sanções que podem gerar consequência mais graves, a adoção do Compliance para as organizações se mostra eficaz com relação a diminuição de custo, pois se observarmos melhor, uma organização que comete um ato ilícito pode ter multas aplicadas à valores altíssimos. Ora não seria melhor adotar medidas de Compliance para reduzir o risco de ser penalizado e arcar com multas milionárias?
Por conseguinte, a adoção de programas de Compliance traz o aumento da eficiência de uma organização, visto que a implementação de um sistema de controles de integridade pode fiscalizar melhor os atos praticados pelos colaboradores, tomar conhecimento dos riscos que tal atividade empresarial está exposta e criar mecanismos para classificar potenciais danos que a organização poderá ter. Além de poder criar políticas e códigos de condutas que podem destacar a cultura idônea da empresa e inspirar seus funcionários a terem melhor comportamento inclusive ressaltando a imagem reputacional da organização. Esses são exemplos de como a adoção de programas de Compliance podem mudar positivamente.
Não visando somente tais benefícios empresariais, o incentivo à adoção de Compliance não se limita entre organizações, o interesse do Poder Público em gerar tal cultura dentro das organizações traz benefícios inclusive para sociedade, pois as funções de Compliance pode trazer a diminuição de crimes empresariais. Como por exemplo evitar o crime de lavagem de dinheiro. Os atos de lavagem de dinheiro podem beneficiar e facilitar crimes tais como: tráfico de drogas e terrorismo. Para melhor compreensão, podemos relembrar o escândalo que envolveu instituições financeiras acusadas de lavar dinheiro acerca de financiamento de tráficos de drogas e terrorismo:
O banco britânico HSBC expôs o sistema financeiro dos Estados Unidos a uma ampla rede de lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e financiamento de terroristas devido ao seu fraco sistema de controle, diz um relatório do Senado dos Estados Unidos que investigou as filiais do banco no país por um ano.[3]
(grifos meus)
Observa-se que a notícia citada acima destaca que o financiamento de tais crimes advém também do fraco sistema de controles internos que as filiais do banco nos EUA possuíam, e isso mostra a importância da adoção de Compliance e como ele pode contribuir com a sociedade em diversos âmbitos. Ressalte-se que, a adoção de programas de Compliance são incentivadas também pelo Poder Público trazendo benefícios a uma empresa caso esta seja responsabilizada por atos ilícitos advindos de corrupção. Caso uma organização comprove a existência de programas de Compliance, que demonstre uma estrutura efetiva, pode conseguir uma redução de multas administrativas impostas pelo Estado, segundo Francisco Rocha Junior (2018, p.136).
O Compliance pode se estender em diversos setores empresariais, e cada atividade empresarial tem suas necessidades e atenção na adoção de leis, por isso demonstra a vasta gama de implementações e programas que são ligados em diversos âmbitos jurídicos:
Uma das dificuldades ligadas ao tema do compliance é a abrangência do fenômeno, porque as normas que se aplicam à atividade empresarial vão desde o âmbito trabalhista, ambiental, tributário, penal etc., além de normas específicas do setor de atividade da empresa (por exemplo, indústria farmacêutica). (VERÍSSIMO. 2017, p. 84)
Pensando nisso, podemos compreender que o Compliance abrange diversas áreas do Direito, visto que a sua relação se dá não somente com a pessoa jurídica, mas também com a pessoa física, os funcionários de uma organização por exemplo, quando se trata de Direito trabalhista, o Compliance possui obrigações com as relações de trabalho entre funcionários. No tocante ao Direito Ambiental, as organizações, que necessitam do uso de matérias primas, para seu empreendimento, tem obrigações legais acerca do cuidado ao meio ambiente, entre outros.
Por isso, e inclusive pelos inúmeros setores empresariais, o Compliance não tem uma implementação totalmente padrão, isso porque toda atividade empresarial tem suas obrigações legais próprias e específicas e para a implementação de um programa de Compliance efetivo, é necessária uma análise de cada uma delas. Não obstante, o Compliance possui funções e princípios que, de uma forma muito clara, podem ser aplicados em todos os setores empresariais. Visando a aplicação efetiva dessas funções, foi criado o Comitê de Basiléia que supervisiona as funções de Compliance:
O Comitê de Basiléia trata Compliance como função e não como uma estrutura fixa, tal como uma diretoria ou departamento, por causa das diferenças existentes em função da jurisdição, porte, tipo de instituição e natureza das atividades desenvolvidas. Por meios de princípios, foram apresentadas recomendações sobre as atividades de Compliance. (BLOK, 2020, p.26)
Segundo a autora Marcella Blok (2020), os princípios de Compliance estão ligados à alta administração de uma organização, focando principalmente em estabelecer um programa efetivo de Compliance, a alta administração tem a função de supervisionar o trabalho de Compliance, tomar ciência dos riscos mitigados pela área de Compliance, o Conselho de administração tem de avaliar a efetividade da área de Compliance, no mínimo, uma vez ao ano, aprovar políticas e códigos de condutas criados por Compliance. Além de estar diretamente relacionada com a alta administração, o Compliance tem a função de ser independente, não ter conflitos de interesses, ter um responsável por coordenar a área de Compliance, ter acesso ilimitado diante das informações dentro da organização e ter meios suficientes para desenvolver suas funções de maneira eficaz. O Compliance passa por avaliações de auditorias internas periodicamente, devem atender as normas legais e regulamentações sob jurisdições aplicáveis a organização, devem atender às responsabilidades de acordo com as regras de cada região, entre outros princípios.
Portanto, como vimos anteriormente, o Compliance tem sido o braço direito das empresas para criação de uma cultura idônea, tem ajudado na estrutura empresarial fazendo com que uma organização entre em conformidade com as leis, regulamentações de suas respectivas localidades e setores. O Compliance tem dado um auxílio efetivo para o Poder Público no combate aos crimes financeiros, ajudando inclusive a melhorar a imagem de um país e de uma sociedade. Além de auxiliar na evolução das regulamentações, atendendo toda e qualquer atividade empresária que impacta no desenvolvimento do mercado econômico, e consequentemente viabilizando melhorias para a economia de um país.
1.3 COMPLIANCE NO BRASIL
Inicialmente, é importante destacar que a corrupção e a falta de transparência têm causado um grande problema para o Brasil, principalmente porque tal ato ilícito advém da Administração pública e das organizações, causando um prejuízo significativo para a economia brasileira. De acordo com os dados em sua obra, Francisco Mendes e Vinicius de Carvalho informam:
Segundo estimativa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a corrupção no Brasil pode representar anualmente em torno de 1% a 4% do PIB, o que equivale a um valor mínimo de R$ 30 bilhões. Já segundo o relatório da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), essa cifra está próxima de 2,3 do PIB. (CARVALHO e MENDES, 2017, p.22)
No entanto, com a abertura comercial entre os países juntamente com a grande circulação no mercado financeiro global, houve um grande interesse do Brasil de implementar leis e regulamentações que viabilizassem os programas de controles internos e adequassem leis e regulamentações internacionais a fim de trazer mais credibilidade e confiança, o que seria necessário devido a corrupção que assola o país. Para isso, seria imprescindível criar um ambiente seguro e estável para atrair novos investimentos tanto nacionais quanto internacionais. Dessa forma, o Estado teve o interesse de ampliar novas leis relacionadas aos temas de combate à corrupção, fraudes, esquemas de lavagem de dinheiro, e criar uma fiscalização maior acerca das denúncias corporativas. Consequentemente, iniciar a adoção de Compliance no Brasil para trazer as ferramentas necessárias para a diminuição dos problemas voltados aos crimes financeiros. Diante dessa preocupação, o Brasil tem se desenvolvido para combater a corrupção, é possível afirmar que há uma movimentação contínua para o aprimoramento e a elaboração de leis mais rígidas. Não obstante, o Brasil tem criado mecanismos para um amadurecimento institucional e se esforçado para que os órgãos e entidades públicas que promovem tais fiscalizações se tornem mais independentes e consequentemente mais eficazes, longe de conflitos de interesses ligados à administração pública do país.
Para uma melhor visualização desse crescimento, conforme os autores Francisco Mendes e Vinicius de Carvalho (2017), o Brasil desde a década de 1990, vêm criando um modelo de economia compatível com o mercado global. Para isso, houve reformas legislativas a fim de mudar a estrutura econômica de forma positiva.
Em uma linha contínua histórica, podemos compreender como o Brasil criou seus mecanismos para regularizar o mercado e adotar leis que coíbem os crimes de fraude, lavagem de dinheiro e corrupção. Em 1998, tivemos grandes avanços no Brasil acerca de mecanismos para regularização do mercado brasileiro, sendo eles:
a) O Conselho Monetário Nacional (CMN), publicou o decreto 9.613/98: dispondo sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, a prevenção na utilização do Sistema Financeiro Nacional para atos ilícitos;
b) A partir da publicação da lei criou-se a COAF (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) órgão de inteligência financeira do Governo Federal de suma importância que atua no combate a crimes financeiros [4];
c) CMN adota os 13 princípios que concernentes à Supervisão pelos Administradores e Cultura;
d) Publicação da resolução 2.554/98 dispondo acerca da implementação e implantação de sistemas de controles internos. (BLOK, 2020, p.25):
Portanto, conforme citado acima, é possível vislumbrar alguns passos que o Brasil tomou em 1998, para o avanço ao combate dos crimes financeiros, por mínimo que seja, tais passos deram margem ao crescimento de legislações e disposições acerca das pautas voltadas a corrupção, lavagem de dinheiro, como também a criação da COAF, um órgão importante a fim de fiscalizar possíveis atos ilícitos dentro do sistema econômico brasileiro.
Na primeira década do século XXI ocorreram algumas mudanças importantes acerca do desenvolvimento ao combate da corrupção no Brasil, podemos destacar:
e) GAFISUD Organização internacional com o objetivo de atuar em Prevenção à Lavagem de dinheiro, agregando os países da América do Sul;
f) Resolução 3056 do Conselho Monetário Nacional alterando a resolução 2554, dispondo sobre a Auditoria Interna das intuições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2002);
g) Publicação do Conselho Monetário Nacional (CMN) acerca da resolução 3.198 independência da auditoria, regulamenta a instituição do Comitê de Auditoria, com funções semelhantes à Sarbanes Oxley Act;[5]
h) Carta circular 3.098 Dispondo acerca da necessidade do registro e comunicação ao BACEN das operações em espécies de depósito, provisionamentos e saques a partir de R$ 100 mil;
i)Comitê de Supervisão Bancária da Basiléia cria as práticas recomendáveis para Gestão e Supervisão de Riscos Operacionais. (BLOK, 2020. p. 26)
Podemos observar que o objetivo do Brasil de adaptar-se às regulamentações estrangeiras e trazer a ideia de criar um ambiente mais idôneo foi alcançado durante a primeira década do século XIX. Isso mostra o esforço advindo do país para ambientar-se as novas práticas e finalmente ter mais transparência em seus negócios. Os comitês, as resoluções normativas, as adequações às leis estrangeiras tiveram um papel importante para o desenvolvimento do Compliance no Brasil, pois vislumbrou uma chance de trazer ferramentas mais eficientes e estruturar um programa de Compliance mais incisivo. É importante destacar que tais mecanismo advindos do Estado clarearam muitas ideias ao Compliance, porém ainda há muitos desafios por parte das organizações, Poder público e Compliance officers, a fim de atingir 100% do seu principal objetivo, mitigar os riscos, ser transparente e adquirir uma economia estável, atraindo novos investimentos para o Brasil e beneficiando a sociedade.
Os programas de Compliance no Brasil são compostos por leis que trazem requisitos para adoção dos programas de Compliance, políticas de boa governança corporativa, que tem como objetivo diminuir os riscos das organizações. Podemos destacar aqui o decreto 8.420/15 que será mais discutido mais para frente neste trabalho. Pensando na estruturação de Compliance no Brasil, as empresas adotam o que chama de pilares de Compliance, que por sua vez, trazem ferramentas para uma boa estruturação do Compliance empresarial, abrangendo requisitos para tornar o ambiente corporativo mais transparente e confiável, sendo eles:
o Art. 42 do Decreto 8.420/2015 oferece-nos requisitos mínimos a ser considerados:
-
Tone at the top;
-
Código de ética/ políticas e procedimentos externos;
-
Treinamento e comunicação;
-
Risk assessment;
-
Registros contábeis,
-
Controles internos;
-
procedimentos para interação com o poder público;
-
Independência do departamento de Compliance;
-
Canais de denúncias,
-
Medidas disciplinares;
-
Remediação,
-
Due Diligence;
-
Due Diligence de M&A
-
Melhoria contínua
(BLOK, 2020.p 7):
Os pilares de Compliance podem ser usados em diversas áreas empresariais, mesmo que crie um padrão, a lei determina os requisitos a serem considerados, a partir da iniciativa das organizações de criarem um programa de Compliance. No entanto, tais requisitos podem servir como um caminho a ser seguido para moldar um programa de Compliance robusto e torná-lo único.
Para melhor compreensão de como o Compliance funciona no Brasil, é importante explicar brevemente tais pilares, assim vejamos.
Tone at the top: É uma expressão que envolve o comprometimento da alta administração de cumprir com o código de ética e conduta da organização, quem deve mostrar seriedade diante dos funcionários a fim de mostrar o quanto o Compliance deve ser respeitado seguido. Portanto tal requisito expressa que o Compliance deve ser respeitado quebrando a linha hierárquica quando se trata de criar uma cultura idônea dentro da organização, não medindo o cargo do funcionário, mas sim suas ações.
Código de ética e políticas e procedimentos externos: o código de ética, basicamente, cria as diretrizes a serem seguidas, para funcionários internos como: colaboradores, e para funcionários externos como: fornecedores. É importante pois a partir do código de ética é que se define os valores da organização o e quais comportamentos os funcionários necessitam ter. É no código de ética que cria a cultura da empresa. Já os procedimentos externos é quem define quais procedimentos em determinadas áreas que determinadas atividades acontecem, por conseguinte os procedimentos externos definem as atividades, os responsáveis pelas atividades, em qual periodicidade devem seguir os funcionários que exercerão tais atividades, os riscos de tal procedimento, girando em torno da rotina que essa organização deverá ter.
Treinamentos e Comunicação: O treinamento periódico dos funcionários, pode resultar em maior compreensão de como a organização funciona, e como e quando os funcionários deverão aplicar as regras das políticas, principalmente ao tema atrelado ao programa de integridade, do qual é importante ser aplicado dentro da corporação sempre com o intuito de conscientizar seus funcionários acerca de boa conduta, ética e possíveis riscos de fraudes, crimes como suborno, lavagem de dinheiro etc., e como funciona, além de abranger o tema de assédio dentro das organizações. Em paralelo, o desenvolvimento de uma boa comunicação nas organizações cria um ambiente amigável e traz certo conforto para os funcionários a fim de tornar um ambiente seguro para denúncias e melhorias.
Risk Assessment: Quando se trata de Compliance, é inevitável falar riscos, uma vez que a mitigação dos mesmos é o que torna uma das ferramentas de Compliance essenciais. Nesse ponto de vista, uma organização precisa criar métodos, avaliações de riscos dos quais a mesma está suscetível a cometer atos ilícitos, possíveis riscos e até mesmo riscos absolutos. Tais análises e avaliações podem resultar num conhecimento mais abrangente e efetivo acerca de cada atividade que a organização realiza, auxiliando a organização a compreender a vulnerabilidade da qual se encontra. A classificação desses riscos é importante pois classificando poderá evitá-los. Conforme mencionado pela autora Marcella Blok (2020), a classificação traz estratégias como: 1) Evitar: risco com nível alto que pode ser altamente danoso para a organização, por isso cria métodos para mitigá-lo. 2) Reduzir: métodos para reduzir um dano, criando uma estratégia viável e eficiente. 3) Transferir/Compartilhar: risco passível de transferência para terceiros. Exemplo: apólices de seguros. 4) Aceitar: risco que já está inserido em tal atividade empresária, sendo que criar um mecanismo pode trazer um custo que não seja benéfico para a organização, e de certa forma, é melhor aceitar o risco uma vez que é mais viável.
Registros contábeis: Tem o objetivo de registrar toda e qualquer atividade financeira dentro de uma organização, sendo ativos os passivos, despesas, receitas. Tal requisito é obrigatório para qualquer organização. Conforme mencionado pela autora Marcella Blok:
Pois, conforme entendimento da CGU em seu guia de Programa de Integridade Diretrizes para as Empresas privadas, entende-se que: O estabelecimento de procedimentos rígidos para os registros contábil é essência para identificação de impropriedades. Subornos, assim como outras práticas ilícitas, é geralmente disfarçado contabilmente em pagamento legítimos como comissões, consultorias, gastos com viagens, bolsas de estudo, entretenimento etc. (BLOK. 2020. p. 72)
Controles Internos: A área de controles internos tem como função supervisionar a organização a fim de mantê-la em conformidade, não somente com as leis, como também as políticas e os códigos de conduta da mesma. Realizar uma avaliação de performance da organização rastrear possíveis irregularidades das áreas assegurando o bom funcionamento da empresa e de seus funcionários.
Procedimentos para interação com o Poder Público: Tal requisito se trata especificamente de atos ilícitos acerca de relações com o poder público, por exemplo: contratos de licitações para empreiteiras, ainda que haja intermediação de terceiros nesta relação. Para evitar vantagens ilícitas, benefícios indevidos advindos da administração pública, a organização privada deverá criar mecanismos para coibir tais atos de corrupção. Todas as organizações que tenham uma relação com o poder público, seja de maior ou menor deverá ser incisiva quanto ao favorecimento ilícito e vantagens econômicas a fim de manter essas relações mais transparentes possíveis.
Independência do Departamento de Compliance: Para ter um departamento de compliance efetivo e transparente é preciso que a alta administração dê autonomia para a mesma. Principalmente atribuindo maiores recursos humanos e financeiros para os exercícios das atividades inseridas no Compliance. Obtendo recursos adequados, o compliance, poderá exercer sua função de forma mais eficiente, a fim de trazer resultados positivos para a organização.
Canais de denúncia: Tal mecanismo advindo dos programas de integridade destina-se para a proteção do colaborador que deseja denunciar algum ato praticado dentro da organização que não está em conformidade com as práticas de boa conduta organizacional, além disso, criar meios mais fáceis para os canais de denúncia, auxiliam facilita o uso entre os colaboradores e terceiros como também servem como um bom monitoramento para construir um programa de integridade mais eficaz.
Medidas disciplinares: As medidas disciplinares servem para dar credibilidade a todos os treinamentos, códigos de ética a práticas de boas condutas dentro da organização. Dessa forma, de nada adiantaria ter todos esses tipos de ferramentas para trazer uma boa cultura se quando houvesse algum ato ilícito praticado dentro da organização, não fosse aplicável uma punição cabível e justa para o colaborador. Não fazendo exceção de nenhum funcionário, não adentrando linhas hierárquicas, as medidas disciplinares são cabíveis a todos os colaboradores da organização.
Remediação: Este procedimento tem relação com as medidas disciplinares explicadas acima, pois quando um funcionário pratica ato ilícito dentro da organização, a organização deverá ter meios para remediar a situação e mitigar os problemas advindos desse ato. O Compliance, tem o dever de criar procedimentos que faça uma investigação interna para remediar a situação e descobrir envolvimentos, possíveis meios que levaram o colaborador a cometer o ato ilícito e principalmente ter ciência de tal vulnerabilidade.
Due Diligence: A avaliação de riscos e o Due diligence são procedimentos correlatos, isso porque o Due diligence tem a função de levantar informações acerca contabilidades, patrimônio em uma empresa, problemas jurídicos de uma organização que possa se tornar parceira em seus negócios por exemplo. Conforme Marcella Blok explica:
O processo de Due Diligence é uma arte em si para avaliar todos os aspectos jurídicos envolvendo certa empresa, a fim de determinar se cada prática do negócio está ou não suscetível a eventualidades, para ser capaz de entender as quão frágeis ou fortes certas relações corporativas podem ser, sem nunca perder de vistas os interesses e necessidades dos participantes. (BLOK, 2020, p.96)
Ademais, dentro do procedimento de Due diligence, existe um procedimento bastante vasto com relação as informações que são adquiridas, não somente para empresas, é importante que a organização tenha informações sobre clientes os chamados backgrounds checks, ou seja, o histórico de clientes, fornecedores, funcionários e assim por diante. Esse procedimento tem como função conhecer o histórico de todas as pessoas físicas e ou jurídicas que se relacionarão com a organização, é o chamado know your Customer/ Client; Supplier; Emproyee; Partner [6]. Contudo será feita uma análise de documentação para adquirir o máximo de informações possíveis e avaliar se tais relações podem criar um risco para a organização. Ao mesmo tempo, se tratando de relações governamentais, temos o chamado PEP Pessoa politicamente exposta, ou seja, relações pessoais com agentes públicos, trabalhos anteriores no Governo dependendo do nível do cargo que o funcionário ou até mesmo o cliente atingiu, organizações que tenham ligações com autoridades públicas no sentido de compor o quadro diretivo da empresa, necessitam de análise minuciosa a fim de mitigar os riscos que essa relação traz.
Due Diligence de M&A: O Due diligence de M&A (Merger and acquisition), trata-se de fusões e aquisições que a organização tem interesse em adquirir com outras organizações, os procedimentos acima citados fazem parte do escopo de atividade deste procedimento. A diferença é que o due diligence de M&A tem maior profundidade quanto a coleta de informações, não se baseando somente em análise de documentação. Terá a análise e coleta de detalhes sobre o negócio a ser adquirido, é importante tal detalhamento de informações pois aqui o risco é maior. Quando se trata de fusão com outra empresa, uma organização toma esses riscos para si, por isso deverá buscar uma análise minuciosa.
Melhoria Contínua: A despeito de todas essas funções que compõe o Compliance, a melhoria contínua é importante para manter o Compliance em alta eficiência. Pois, permite que a organização esteja a par de todos os riscos que possam surgir. Esse monitoramento constante é capaz de manter atualizado os planos de ação, ter ciência dos procedimentos que ainda necessitam de melhor performance e atuar neles. Por isso que criar um programa de Compliance de fechada, apenas para estar em conformidade com a lei não é suficiente pois todos os dias o Compliance tem novos desafios.
Portanto, esses foram alguns dos procedimentos de um vasto programa de Compliance, podemos observar que os mecanismos de Compliance, além de completos, são extremamente úteis para as organizações. Há muitos objetivos a serem alcançados, principalmente com relação a adequação de legislações brasileiras, com a corrupção sendo cometida por muitas vezes, as leis e a área de Compliance necessita de mecanismos suficientes para o combate desse ato ilícito no país. Para isso, a implementação do governo de leis como empresa limpa, pacote anticrime etc., deverão ser pautas de atualidade.
2 LEI ANTICORRUPÇÃO 12.846/2013
2.1 ORIGEM HISTÓRICA DA LEI ANTICORRUPÇÃO E SUAS NECESSIDADES
Inicialmente, podemos afirmar que o Brasil não possuía uma previsão legal voltada aos crimes de corrupção que responsabilizasse as Pessoas Jurídicas por atos ilícitos praticados contra a Administração Pública, nacional e estrangeira. Na legislação brasileira, os atos ilícitos, enriquecimento indevido etc., são tratados com base nas seguintes: Lei nº 8.429/1992 (Lei de improbidade administrativa), acerca de sanções aplicáveis a agentes públicos nos casos de enriquecimento indevido (BRASIL, 1992); Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações e Contratos da Administração pública), que regulamenta os contratos e as licitações formalizados entre o Estado e as organizações privadas, com o intuito de atender os benefícios à sociedade (BRASIL,1993), Lei nº 12.529/2011 (Lei Antitruste e ou/ Lei de Defesa da Concorrência), que dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, abuso do poder público. (BRASIL, 2011), porém todos os assuntos acima mencionados versavam apenas na responsabilização da pessoa natural, deixando uma lacuna com relação a responsabilização da pessoa jurídica.
A ausência de lei abria espaço para a Pessoa Jurídica cometer atos de corrupção, e por consequência, todos os danos que fossem causados não eram reparados, não havia restituição de bens e valores ao Estado, a lei brasileira ausentava-se de responsabilizar a Pessoa jurídica. De certa forma, podemos observar que essa falha, acarretava o incentivo inverso às organizações, de modo que, se a lei é omissa quanto a responsabilização da Pessoa Jurídica em atos ilícitos de corrupção, dá-se espaço para cometê-los, dessa forma, nenhuma era a preocupação das organizações com relação aos impactos negativos de sua reputação.
Não obstante, o Brasil tornou-se signatários de convenções internacionais importantes ligadas ao combate de corrupção como:
Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, concluída em Paris em 17 de dezembro de 1997, no âmbito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE); pela Convenção Interamericana contra a Corrupção, firmada em 29 de março de 1996 pela Organização dos Estados Americanos (OEA); e pela Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, assinada em 9 de dezembro de 2003. (BECHARA, 2020, p. 40)
Pensando nisso, adotou-se a Lei Anticorrupção, nº 12.846/2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira (BRASIL, 2013).
Para adentrarmos na Lei nº 12.846/2013, é importante ser ressaltados os modelos de leis internacionais que inspiraram a Lei brasileira Anticorrupção. Dessa forma, criada nos Estados Unidos em 1977 Foreign Corrupt Practices Act. (FCPA), visa o combate a corrupção transnacional cometidas por pessoas e instituições nacionais e internacionais, por ser a primeira lei a versar sobre as vantagens indevidas econômicas por instituições públicas e privadas e abrangendo até mesmo estrangeiros, a FCPA foi usada de modelo no século XX para a criação de leis anticorrupção no mundo:
Em linhas gerais, tal diploma legal define como crime não apenas o pagamento de propina em si, mas também todo e qualquer pagamento feito por empresas listadas na bolsa de valores norte-americana que não esteja registrado devidamente e de forma clara e precisa. (BLOK, 2020, p. 28)
A FCPA foi o primeiro diploma legal a ter aplicabilidade em territórios estrangeiros, ou seja, países listados na bolsa de valores norte americanas, organizações de com sede em outros países que mantem negócios no território dos EUA, subsidiárias, não obstante também é aplicado a FCPA pessoas naturais estrangeiras, um detalhe importante é que caso um estrangeiro ou até mesmo uma organização efetuarem um pagamento indevido direta ou indiretamente dentro do território norte americano ou esse pagamento passe por lá, estes também estão sujeitos à aplicação da FCPA (BLOK, 2020).
Por conseguinte, na Europa, a FCPA teve um grande impacto no Reino Unido, a lei norte americana foi usada como exemplo para constituição de uma lei ainda mais severa, a United Kingdom Bribery Act (UKBA), foi promulgada em 2010. A autora Marcella Blok define em sua obra: A UKBA criminaliza a oferta, promessa, ou concessão de uma vantagem (corrupção ativa) e a solicitação, aceitação ou acordo em receber vantagem (corrupção passiva). (BLOK, 2020, p. 31).
Portanto, tanto a FCPA quanto a UKBA foram modelos de leis que além de versar sobre os temas de corrupção ainda são consideradas leis transnacionais, envolvendo estrangeiros. É importante ressaltar também que tais leis internacionalizaram o conceito de Compliance, de modo que, trazem consigo medidas de se eximir de responsabilidade ou ter uma diminuição de sanção, caso comprovem que dentro da organização há ferramentas e procedimentos que coíbem tal prática. Assim como no Brasil, com a lei anticorrupção.
Em sua obra, Marcella Blok traz um quadro comparativo entre as leis FCPA, UKBA e a Lei Anticorrupção. A autora traz os aspectos acerca do tema de corrupção e como é tratado em cada uma dessas leis supramencionadas. Segue a tabela comparativa:
Tabela 1 - Comparativo das leis supramencionadas:
Fonte: BLOK (2020)
Tabela 2 - Comparativo das leis supramencionadas
Fonte: BLOK (2020)
A diversificação que as leis trazem de acordo com seus aspectos, são bem variáveis, podemos reiterar o quanto a UKBA é severa em alguns deles. Por exemplo à título de multa, na qual é ilimitada não minorando ou majorando um valor estipulado, também podemos observar que a responsabilidade penal da pessoa jurídica está presente nas duas leis internacionais supracitadas (FCPA e UKBA), no Brasil ainda tem se discutido a responsabilidade penal na lei anticorrupção e por qual motivo o legislador não adotou, na qual veremos mais para frente. No entanto em todos os diplomas legais, podemos observar que com relação a corrupção de funcionários estrangeiros, extraterritorialidade, créditos pela existência de Compliance e crédito por reporte voluntário e cooperação são temas que todas essas leis trazem e tem em comum.
Portanto, com o objetivo de elucidar as comparações e para melhor compreensão, é de reconhecimento que tais as leis internacionais serviram de modelo, não só para o Brasil, mas também para outros países que adotaram essa medida legal.
2.2 A APLICABILIDADE DA LEI E SUAS CARACTERÍSTICAS
A Lei anticorrupção conforme já explicado, dispõe acerca da responsabilização administrativa e civil da pessoa jurídica ao práticas atos ilícitos contra a Administração pública nacional e estrangeira. Como vemos acima, não há responsabilidade na esfera penal, o que trouxe diversas discussões sobre tal aplicabilidade. Internacionalmente nenhuma das convenções da qual o Brasil é signatário exigem a responsabilização penal na medida legal, elas devem somente atender à efetividade e a proporcionalidade, ficando facultativo o âmbito na qual o país deverá adotar.
Entretanto, podemos afirmar que no Brasil é admitido a responsabilidade da pessoa jurídica no âmbito penal, podemos citar o artigo 225, § 3º da Constituição Federal:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL, 1988)
O legislador poderia ter escolhido a aplicação na esfera penal. O motivo pela qual levou o mister a não responsabilizar a pessoa jurídica no âmbito penal, foi porque o Direito Penal brasileiro não oferecia ferramentas mais céleres para punir as sociedades empresárias, e que, no entanto, o direito administrativo seria efetivamente mais célere na repressão de desvios em contratos administrativos (VERÍSSIMO, 2017). É questionável a afirmação do legislador, visto que a lei anticorrupção tem caráter penal, senão vejamos:
Entretanto, o ponto que merece reflexão é o de que esta lei pretende responsabilizar pessoas jurídicas pela prática de crimes de corrupção previstos nas convenções internacionais antes referidas. Trata-se, portanto, de responsabilidade em face da prática de crimes. Não há como contestar a natureza penal da corrupção. (VERÍSSIMO, 2017, p. 178)
Outrossim, se mantem a opinião do autor Renato Silveira com relação a lógica penal que a lei anticorrupção possui:
(...) no sentido de uma responsabilidade penal da pessoa jurídica, essa parece ser uma tendência significativa, até́ mesmo porque a genérica responsabilidade não penal parece ser dotada, sim, de uma lógica penal, ou ao menos de preceitos e garantias penais.(SILVEIRA, 2015, p. 81)
Dessa forma, abre-se um leque de questões e possibilidades acerca da amplitude que a lei anticorrupção poderia ter, por exemplo, se a aplicação na esfera penal traria uma preocupação maior para as sociedades empresárias no sentido de ser uma lei mais severa e intimidadora, se as sanções aplicáveis no âmbito administrativo e civil seriam suficientes para trazer danos permanentes para quem cometesse o ato ilícito, e dessa forma qual seria a postura das organizações se fossem intimidados por sanções penais?
De fato, as sanções penais são mais severas e danosas para uma organização apesar de todas as esferas terem caráter sancionatório, dentro da esfera administrativa o objetivo de sancionar uma empresa está ligada ao ressarcimento dos cofres públicos. De outro lado, na esfera civil o objetivo se caracteriza pelo efeito de reparar um dano causado, dessa forma ambas as esferas têm natureza reparatória. Entretanto o direito penal traria detenção do comportamento criminal, o que reduziria de fato o ato ilícito a ele vinculado e por consequência a coibição do crime de corrupção.
A despeito da responsabilidade da pessoa jurídica não incluir o âmbito penal, as esferas administrativa e civil trazem consigo danos altamente ruins no ponto de vista econômico. Dentro de um certo período, foi apurado que as multas aplicadas após a Lei anticorrupção ter vigorado no Brasil, já somam R$ 18 milhões de reais, sendo 33 (trinta e três) empresas sancionadas pela lei.[7]
Portanto, podemos observar que a responsabilização da pessoa jurídica, embora não se aplique ao âmbito penal, trazem consequência econômicas danosas à uma sociedade empresária, consequentemente as organizações necessitam de programas de Compliance para mitigar os riscos que os atos lesivos acerca da corrupção podem trazer, além de causar um impacto negativo, o que veremos adianta acerca das características importantes que a Lei nº 12.846/2013 traz consigo.
Com relação aos aspectos gerais da lei da anticorrupção, conforme já dito acima, o direito brasileiro teve como objetivo garantir que as empresas fossem responsabilizadas por cometer atos ilícitos contra a Administração pública. Tais delitos estão relacionados aos contratos de licitação firmados entre a organização privada e o poder público, e a disponibilização dos recursos providos pelo Estado, a fim de inibir as vantagens e o enriquecimento indevido retirados dos cofres públicos.
A lei ainda prevê que a responsabilidade da sociedade empresária é objetiva, ou seja, responde pelo ato ilícito sem a necessidade de comprovação da intenção e da culpa, mesmo que seja causado por um terceiro, a organização ainda responde de forma objetiva, segundo Francisco Mendes e Vinicius de Carvalho (2017).
De acordo com as penalidades nela aplicadas, as organizações poderão sofrer multas fixadas no valor de 0,1% até 20% do faturamento bruto do ano anterior ao processo administrativo iniciado contra a empresa. Conforme previsto no art. 6º da Lei Anticorrupção:
Art. 6º Na esfera administrativa, serão aplicadas às pessoas jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos previstos nesta Lei as seguintes sanções:
I - Multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação (...) (BRASIL, 2013)
Em casos de não ser possível utilizar-se do critério de faturamento mensal bruto, a multa poderá ser estipulada entre R$ 6.000,00 (seis mil reais) até R$ 60.000,000,00 (sessenta milhões de reais). (BRASIL, 2013). Entretanto, segundo Francisco Mendes e Vinicius de Carvalho (2017), as sanções penais não se limitam às multas, em casos mais severos, poderá ocorrer extinção compulsória da pessoa jurídica.
É importante ressaltar que mesmo que a lei anticorrupção disponha de responsabilidade da pessoa jurídica nas esferas administrativa e civil, é possível que uma pessoa natural seja responsabilizada no âmbito penal após apuração dos fatos. Dentre as condutas puníveis, é possível observar que a lei é clara com os atos que possam ser considerados lesivos, Senão vejamos:
a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público;