O trabalho noturno e as implicações na qualidade de vida pessoal e profissional

Leia nesta página:

RESUMO

O trabalho noturno é tema de relevância na atualidade, devido à sua ampla aplicação, por razões técnicas, sociais e econômicas. Essa organização temporal do trabalho pode ocasionar distúrbios na saúde e perturbações na vida familiar e social do indivíduo. Os trabalhadores apresentam presença de distúrbios na saúde e na qualidade do sono, além de algumas perturbações na vida familiar e social, e no lazer. Percebe-se a necessidade de planejamento de assistência e orientação preventiva à saúde física e mental do trabalhador, além de programas de assistência e orientação psicológica à família.

INTRODUÇÃO

O trabalho provê os recursos necessários para o sustento do trabalhador e de sua família, desenvolve habilidades e enriquece a afetividade, como resultado do relacionamento humano. No entanto, assim como traz benefícios, também pode causar sofrimento físico e mental, podendo também afetar a família do trabalhador, dependendo das condições e da forma como é organizado. Nessa situação, pode-se incluir o regime de trabalho em turnos.

Tendo em vista a crescente incidência dessa modalidade de organização do trabalho em nossa realidade e os possíveis riscos a que expõe o trabalhador, é importante que se conheçam as condições do trabalho em turnos e suas influências no cotidiano do trabalhador. Esse conhecimento é imprescindível para que se possam aperfeiçoar as diversas formas que esse tipo de jornada assume e para se planejar uma assistência preventiva contra os possíveis distúrbios na saúde física e mental desses trabalhadores.

QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO NOTURNO

A qualidade de vida pessoal inclui as condições de saúde do indivíduo e os aspectos do meio ambiente que podem ou não ser afetados pela saúde, como, por exemplo, a limitação no desempenho de papéis sociais ou a baixa performance nas atividades que desenvolve.

Segundo Vasconcelos, Alves, Santos e Francisco (2012, p. 85): A qualidade de vida é um fator que todas as pessoas que trabalham buscam, e, além de buscar-se a qualidade de vida no lado pessoal, vincula-se a qualidade de vida ao trabalho pelo fato de se passar a maior parte do tempo trabalhando em organizações, seja no próprio ambiente, seja na redução do estresse.

Já no Trabalho, a qualidade de vida pode ser definida como o conjunto das ações dentro da empresa que envolve a implantação e manutenção de melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais no ambiente de trabalho (Limongi-França, 1996).

A qualidade de vida no trabalho, refere-se à preocupação com o bem estar geral e à saúde do trabalhador, passa a contribuir para a realização de uma ligação direta, por meio da evolução e análise dos impactos que o trabalho em turnos e noturno pode afetar positiva ou negativamente a vida do trabalhador fora do ambiente organizacional.

Daí o porquê da ordem jurídica fixar um tratamento diferenciado ao labor à noite, seja proibindo-o aos menores de 18 anos (art. 404 da CLT c/c art. 7º, XXXIII da CF/88), seja assegurando algumas vantagens a fim de compensar tal caráter pernicioso.

Art. 404 - Ao menor de 18 (dezoito) anos é vedado o trabalho noturno, considerado este o que for executado no período compreendido entre as 22 (vinte e duas) e as 5 (cinco) horas.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

 Na atualidade, cada vez mais pessoas passaram a depender dos beneficios que os resultados do trabalho de turnos noturnos oferecem. Conforme artigo 73 da CLT.

Artigo 73. Salvo nos casos de revezamento semanal ou quinzenal, o trabalho noturno terá remuneração superior à do diurno e, para esse efeito, sua remuneração terá um acréscimo de 20 % (vinte por cento), pelo menos, sobre a hora diurna.

§ 1º - A hora do trabalho noturno será computada como de 52 minutos e 30 segundos.

§ 2º - Considera-se noturno, para os efeitos deste artigo, o trabalho executado entre as 22 horas de um dia e as 5 horas do dia seguinte.

§ 3º - O acréscimo, a que se refere o presente artigo, em se tratando de empresas que não mantêm, pela natureza de suas atividades, trabalho noturno habitual, será feito, tendo em vista os quantitativos pagos por trabalhos diurnos de natureza semelhante. Em relação às empresas cujo trabalho noturno decorra da natureza de suas atividades, o aumento será calculado sobre o salário mínimo geral vigente na região, não sendo devido quando exceder desse limite, já acrescido da percentagem.

§ 4º - Nos horários mistos, assim entendidos os que abrangem períodos diurnos e noturnos, aplica-se às horas de trabalho noturno o disposto neste artigo e seus parágrafos.

§ 5º - As prorrogações do trabalho noturno aplica-se o disposto neste capítulo.

O trabalho em turnos apresenta em seu histórico vantagens relacionadas aos adicionais salariais, possibilidade de se obter agenda mais favorável para cuidar da família, trabalho com menor supervisão e maior liberdade em termos de atitudes e ritmo de trabalho. Porém, quando uma pessoa é submetida a uma nova rotina de atividades e descanso, é notório o surgimento de pontos negativos, que acarretam os seguintes problemas: riscos à saúde (como doenças cardiovasculares e queixas gastrointestinais), aumento do nível de acidentes pessoais e industriais, insônia, fadigas crônicas, insatisfação com o trabalho, diminuição do desempenho de produtividade e maiores custos, devido a maior ausência e rotatividade.

A idade, número de filhos, status na família, cargo na empresa, atribuições desenvolvidas, entre outros, são fatores que podem ser preponderantes nas causas de saúde do trabalho noturno, o que influenciará na sua qualidade de vida.

Outro ponto significativo que deve ser ponderado é o segundo emprego, no qual como renda e ocupação profissional, são cruciais nas implicações do trabalho em turno. Neste sentido, destacam-se, pontos relevantes, que demonstram a importância do estudo para o entendimento das implicações do trabalho noturno na qualidade de vida profissional e social dos colaboradores das organizações na atualidade, que estão preocupadas com uma gestão de pessoas estratégica e com uma gestão competitiva no mercado globalizado.

No tocante a gênero, observando pelo aspecto das mulheres, isso se agrava, devido ao tempo de trabalho em casa e o cuidar dos filhos

As mulheres podem ter maior dificuldade em adaptação ao trabalho noturno do que os homens, visto que destacam riscos específicos do gênero feminino, como ciclo menstrual desordenado devido à mudança no ritmo circadiano ( mecanismo pelo qual nosso organismo se regula entre o dia e a noite) , problemas de fertilidade e reprodução e, até mesmo, a ocorrência de câncer de mama. Interessante ponderar que o período diurno, por ser claro, reduz a melatonina, por reduzir a glândula pineal que participa na organização temporal dos ritmos biológicos, que, por sua vez, atua como mediadora entre o ciclo claro/escuro ambiental e os processos regulatórios fisiológicos, incluindo a regulação endócrina da reprodução, a regulação dos ciclos de atividade-repouso e sono/vigília, assim como a regulação do sistema imunológico. Diante disso, o trabalho noturno poderá ter uma influência mais significativa nas mulheres do que nos homens, como estes apresentados e outros, como convívio social, atividades domésticas, forma e horário de alimentação. Entretanto, vale ressaltar que estudos também apontam que não existem diferenças significativas entre homens e mulheres em trabalho noturno, como o realizado por Tamagawa, Lobb e Booth (2007) com policiais (homens e mulheres), cujos resultados são equivalentes entre os gêneros, no tocante ao problema de fadiga, de saúde e de insônia.

Aponta que diversos aspectos da vida sócio familiar podem facilitar ou dificultar o dia-a-dia dos trabalhadores, atuando, portanto, na tolerância ao regime de trabalho. Neste contexto, verificam-se as implicações na qualidade de vida do trabalhador dos turnos noturnos, como dificuldades no relacionamento e na convivência familiar, esposa/maridos, filhos, amigos, etc., que, algumas vezes, o deixam isolado. Além disso, apresentam, também, queixas frequentes advindas do trabalho noturno, como os transtornos na alimentação, dificuldades de digestão, azia, dores musculares, etc.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Fatores como claridade, barulho ou temperatura do período diurno também influenciam na vida do trabalhador, causando transtornos, visto que contraria seu relógio biológico ou ritmo circadiano ( mecanismo pelo qual nosso organismo se regula entre o dia e a noite), ou seja, durante o dia o trabalhador pode tentar descansar, mas o ambiente no qual está inserido, sua família, algumas vezes, não tem a sensibilidade para evitar ruídos.

A sonolência no local de trabalho, é um estressor potencial, causador do estresse ocupacional, causando impactos diferentes sobre os trabalhadores, dependendo de como uma atribuição é desenvolvida. Embora algumas pessoas acreditem que o sono e a sonolência estejam primordialmente sob o controle de indivíduos, pesquisas sugerem que aspectos do trabalho e da própria vida organizacional, por exemplo, longas jornadas de trabalho ou trabalho em turno, contribuem para os problemas de sono, que influenciarão a vida social e profissional do trabalhador.

O perfil psicossocial dos trabalhadores fornece informações sobre como os fatores psicológicos, como, por exemplo, a motivação e o reconhecimento meritocrático, podem interferir no comportamento dos trabalhadores inseridos em seu ambiente de trabalho e nas relações com os demais companheiros de trabalho e, ainda, quais as implicações disso para o clima organizacional. São considerados critérios como a percepção dos funcionários sobre a sua valorização para com os demais (gestores e outros funcionários), autoestima, liberdade de expressão e valorização dos colaboradores. .

Observa-se a importância do estudo das implicações da qualidade de vida do trabalhador no turno noturno. A demanda de serviços e produções torna-se, cada vez mais, ininterrupta, aumentando a necessidade de trabalhadores no período noturno. Portanto, os gestores da área de gestão de pessoas devem ter conhecimentos das necessidades desses trabalhadores, para um bom desempenho no desenvolvimento de suas atribuições organizacionais.

CONCLUSÃO

A forma de organização temporal do trabalho causa interferências no relacionamento familiar do trabalhador, restringe suas atividades sociais e de lazer.

A questão principal que afeta o bem-estar é o sono diurno. O trabalhador não consegue dormir de dia o tempo suficiente para despertar descansado, pois, além da inversão de ritmos biolõgicos, que dificulta o sono durante o dia, há também interferências externas, como barulhos diversos, calor e crianças na família. Esses fatores contribuem para que o sono diurno seja pouco repousante e insuficiente, em relação à qualidade do sono noturno.

Esses sintomas, se prolongados, poderão deixar o organismo mais vulnerável ao aparecimento de doenças, o que faz com que o trabalho no turno seja avaliado como um fator de risco à saúde.

Em relação à dinâmica familiar, constata-se que o trabalhador é o principal responsável pelo sustento econômico da família, As demais tarefas familiares, como as relativas à organização da casa, à educação e cuidados com os filhos, à proteção da família e ao controle do orçamento, acabam sendo atribuídas à esposa.

São mencionados conflitos na família devido ao barulho e à irritação do trabalhador frente ao sono insuficiente. Também aparecem, com ênfase, queixas relativas à dificuldades de contato com a família, o que prejudica a comunicação e a afetividade. O trabalhador queixa-se da dificuldade em manter um contato afetivo mais próximo e positivo devido ao estresse, e sente-se cobrado pela esposa por isso.

No entanto, a par de sentimentos de intolerância e impaciência com os filhos e de distanciamento da família, constata-se o reconhecimento da importância do apoio e da colaboração da esposa, o que ameniza as dificuldades.

O lazer e a vida social também ficam prejudicados, devido à dificuldade de participação motivada pela falta de sincronia entre os horários do trabalhador e os da sociedade

Em geral, apesar de algumas vantagens serem apontadas, como um melhor relacionamento interpessoal no trabalho noturno, menor pressão por parte da chefia e adicional salarial, as desvantagens têm um peso maior, quando os trabalhadores comparam o trabalho diurno com o trabalho noturno. Verifica-se que o trabalho noturno afeta o bem-estar do trabalhador e de sua família. Tem-se a importância e a necessidade de que as organizações que adotam esse tipo de jornada implementem serviços de assistência psicológica ao trabalhador e à sua família.

BIBLIOGRAFIA

http://revistagt.fpl.edu.br/get/article/viewFile/445/417

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-66572006000200004

Limongi-França, A. C. (1996). Indicadores empresariais de qualidade de vida no trabalho: esforço empresarial e satisfação dos empregados no ambiente de manufaturas com certificação ISO 9000. Tese Doutorado em Administração - Universidade de São Paulo, São Paulo.

Vasconcelos, P. H.; Alves, C. E. L.; Santos, S. F. M. & Francisco, A. C. (2012). Qualidade de vida no trabalho docente: um estudo de caso em uma instituição de ensino superior. Revista de Administração e Inovação, 9(2), 79-97.

Sobre os autores
Gleibe Pretti

Pós Doutorado na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina- nota 6 na CAPES), com término em 2023, com a pesquisa focada na Arbitragem nas relações trabalhistas (Sua aplicação como uma forma de dar maior celeridade na solução de conflitos com foco, já desenvolvido, na tese de doutorado, contrato procedimento - Vertragsverfahren) Doutor no Programa de pós-graduação em Direito da Universidade de Marília (UNIMAR- CAPES-nota 5), área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social, com a tese: APLICAÇÃO DA ARBITRAGEM NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS, COMO UMA FORMA DE EFETIVIDADE DA JUSTIÇA (Concluído em 09/06/2022, aprovado com nota máxima). Mestre em Análise Geoambiental na Univeritas (UnG). Pós-graduado em Direito Constitucional e Direito e Processo do Trabalho na UNIFIA-UNISEPE (2015). Bacharel em Direito na Universidade São Francisco (2002), Licenciatura em Sociologia na Faculdade Paulista São José (2016), Licenciatura em história (2016) e Licenciatura em Pedagogia (2018) pela Uni Jales. Coordenador do programa de mestrado em direito da MUST University. Atualmente é Professor Universitário na Graduação nas seguintes faculdades: Centro Universitário Estácio São Paulo, Faculdades Campos Salles (FICS) e UniDrummond. UNITAU (Universidade de Taubaté), como professor da pós graduação em direito do trabalho, assim como arbitragem, Professor da Jus Expert, em perícia grafotécnica, documentoscopia, perícia, avaliador de bens móveis e investigador de usucapião. Professor do SEBRAE- para empreendedores. Membro e pesquisador do Grupo de pesquisa em Epistemologia da prática arbitral nacional e internacional, da Universidade de Marília (UNIMAR) com o endereço: dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/2781165061648836 em que o líder é o Prof. Dr. Elias Marques de Medeiros Neto. Avaliador de artigos da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Editor Chefe Revista educação B1 (Ung) desde 2017. Atua como Advogado, Árbitro na Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada de São Paulo S.S. Ltda. Cames/SP e na Secretaria Nacional dos Direitos Autorais e Propriedade Intelectual (SNDAPI), da Secretaria Especial de Cultura (Secult), desde 2015. Especialista nas áreas de Direito e Processo do Trabalho, assim como em Arbitragem. Focado em novidades da área como: LGPD nas empresas, Empreendedorismo em face do desemprego, Direito do Trabalho Pós Pandemia, Marketing Jurídico, Direito do Trabalho e métodos de solução de conflito (Arbitragem), Meio ambiente do Trabalho e Sustentabilidade, Mindset 4.0 nas relações trabalhistas, Compliance Trabalhista, Direito do Trabalho numa sociedade líquida, dentre outros). Autor de mais de 100 livros na área trabalhista e perícia, dentre outros com mais de 370 artigos jurídicos (período de 2021 a 2023), em revistas e sites jurídicos, realizados individualmente ou em conjunto. Autor com mais produções no Centro Universitário Estácio, anos 2021 e 2022. Tel: 11 982073053 Email: [email protected] @professorgleibepretti

Claudinha Gardeno

Graduando/Bacharelando em Direito no UniDrummond, campus Tatuapé.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos