Política proibicionista e sua evolução histórica

27/11/2021 às 21:35

Resumo:


  • O proibicionismo foi uma política adotada ao longo da história para controlar o consumo de drogas e melhorar a saúde pública.

  • O proibicionismo é estruturado por quatro pilares: moral, sanitário, segurança pública e internacional.

  • A política proibicionista cedeu em alguns momentos a pressões da indústria farmacêutica, revelando interesses econômicos e políticos em detrimento da saúde pública.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O proibicionismo foi uma forma de política adotada ao decorrer da história para promover o controle contra as drogas com objetivo de melhorar a saúde pública e abaixar o consumo de substancias psicotrópicas, teve um papel muito relevante na história pois esta política trouxe o rol do que são drogas licitas e ilícitas conforme explica Fiore:

Proibicionismo é uma forma simplificada de classificar o paradigma que rege a atuação dos Estados em relação a determinado conjunto de substâncias. Seus desdobramentos, entretanto, vão muito além das convenções e legislações nacionais. O proibicionismo modulou o entendimento contemporâneo de substâncias psicoativas quando estabeleceu os limites arbitrários para usos de drogas legais/positivas e ilegais/negativas. (FIORE, 2011, p. 01).

O Proibicionismo é estruturado por quatro pilares: o moral, o sanitarista, o de segurança pública e segurança internacional (ARGUELLO, DIETER, 2015).

Com o decorrer do tempo percebe-se que a política proibicionista cedeu em alguns momentos a pressão da indústria farmacêutica, demonstrando que se tratava mais de jogadas políticas e econômicas ao invés de ser uma política realmente voltada a preocupação com a saúde pública da época (ESCOHOTADO, 1998), esse tema será explanado e explicado ao decorrer deste trabalho.

Entender como funciona o proibicionismo é muito importante para se entender todo contexto histórico que as políticas proibicionistas desenvolveram na sociedade que é um dos objetivos deste trabalho, para elucidar um pouco mais sobre está política o autor Tarso Araújo explica de forma detalhada como funciona a política proibicionista, quais seus objetivos e em qual substâncias elas se aplicam:

COMO FUNCIONA: produzir, distribuir, transportar, vender, comprar e portar drogas, em qualquer quantidade, são crimes. Em geral atividades ligadas à produção e à distribuição são punidas com prisão. As penas ligadas ao uso costumam ser mais brandas, mas em muitos países também levam à cadeia. A compra e a venda podem ser autorizadas por órgãos competentes, em casos específicos, quando é comprovado que a droga será usada com finalidades religiosas, medicinais ou científicas; OBJETIVO PRINCIPAL: diminuir a oferta das drogas proscritas para aumentar seu preço e reduzir as oportunidades de consumo; ONDE EXISTE, COM QUE DROGAS: essa é a política dominante nos 183 países participantes das três convenções sobre drogas da ONU, de 1961, 1971 e 1998. As regras desse tratado se aplicam a mais de cem substâncias naturais e sintéticas. (ARAÚJO, 2012, P.207).

Araújo cita convenções que serão posteriormente explicadas uma a uma no trabalho, tendo em vista que foram marcos históricos e que tem uma importância gigantesca dentro do tema políticas do proibicionismo que contribuíram com fatos até os dias atuais.

Análise histórica da política proibicionista e das legislações de drogas

Os primeiros resquícios de uma política proibicionista

Muito se acredita que a primeira restrição contra o uso de drogas se deu no século XVIII contra o uso do ópio pelo imperador chines, porém antes mesmo do imenso consumo desta droga derivada da papoula, o governante chines proibiu o uso de tabaco pelos chineses costume que foi trazido para asia por meio dos portugueses.

O chines que fosse pego infringindo a lei que proibia o tabaco incorria na pena de decapitação, com toda essa restrição acredita-se que foi o estopim para os chineses começarem a fumar o ópio, maneira mais nociva a saúde já que até então a droga só era consumida bebendo ou comendo (VALOIS, 2017).

Um dos motivos da China ter proibido o uso do ópio e da plantação da papoula no ano de 1729 foi a alegação que a importação do produto devido ao alto consumo estava desequilibrando a balança comercial do país.

Porém não se fez eficaz a proibição, tendo em vista que somente agravou o problema da balança comercial chinesa já que o ópio continuava sendo importado agora de forma ilegal, fazendo os comerciantes ilegais os mais beneficiados.

Neste período de 1729 Portugal ainda era o principal país a fornecer e comercializar ópio com a China, e foi aí que começou o início da corrupção entre os funcionários chineses que permitiam que o comércio ilegal do produto ainda continuasse vivo. Em 1779 a Companhia da Índias Orientais, inglesa, passa a ter o monopólio do comércio, conforme explica VALOIS:

Formou-se um esquema em que a Companhia das índias só aparentemente respeitava a proibição do governo chinês. Empresários particulares vendiam o ópio aos mercadores chineses e entregavam o ouro e a prata obtidos na transação à Companhia das índias, esta que convertia os metais em letra de câmbio para que os empresários as pudessem trocar por libras inglesas depois. Com o ouro e a prata obtidos, a Companhia comprava o chá, as sedas e as especiarias importantes para a Inglaterra (VALOIS, 2017, p. 37).

Em 1870 na China acabava a segunda guerra do ópio tendo as importações da droga legalizadas o que acarretou uma diminuição no consumo de ópio no país, já que não era mais visto como um símbolo de resistência da sociedade ao poder imperial chinês devido a graduai legalização. (LUCENA, 2020).

A legalização do ópio na China fez com que gerasse um enfraquecimento nas relações comerciais que o país mantinha com a Inglaterra desta forma ESCOHOTADO (1998, p.399) afirma bastaram alguns anos para que o parlamento inglês considerasse o tráfico de ópio em grande escala, com destino às casas de fumo, uma atividade moralmente injustificável.

Em com isto os primeiros resquícios de uma política proibicionista se mostrou ineficaz e falha podendo-se afirmar que os motivos para legislar sobre o ópio foram de cunho políticos e econômicos e não de saúde pública conforme afirma Lucena:

Infere-se, portanto, que as motivações para a guerra do ópio, bem como para as políticas proibicionistas contra o ópio eram de cunho essencialmente econômico, não havia, portanto, preocupação genuína com o consumo da droga e seus efeitos. Notar-se-á que são comuns à maioria das políticas proibicionistas de drogas o discurso revestido de cunho humanitário, de forma atingir maior legitimidade, maquiando os reais interesses na aplicação dessas políticas. (LUCENA, 2020, p. 14).

O proibicionismo no âmbito internacional

As primeiras convenções internacionais sobre drogas

A Conferência de Xangai que ocorreu em 1909 foi a primeira conferência que tratou sobre o controle de drogas e tinha como objetivo a definição de limites à produção e comercialização do ópio. Este fato ocorreu breve a queda da hegemonia britânica que já foi mencionada anteriormente.

Esta conferência contou com o apoio direto do Estados Unidos que foram favoráveis a proibição que vieram a surgir nos tratados internacionais que serão futuramente explicadas neste mesmo tópico, o que criou algumas insatisfações e limitações para os países europeus tendo em vista a queda dos lucros nas indústrias farmacêuticas como explica Lippi:

Em 1909, a Conferência de Xangai criou o primeiro documento relativo ao controle das drogas, limitando a produção de ópio e derivados. Isso ocorreu no contexto da queda da pax britanica. Os Estados Unidos se posicionaram favoráveis a essa proibição, repetindo-a nos tratados internacionais de controle penal das drogas (criados a partir de 1912). Os países europeus, porém, não desejavam esse tipo de limitação, pois esse lobby foi feito por suas indústrias farmacêuticas, que enxergavam nisso a queda de seus lucros. (LIPPI, 2010, p. 10).

Em 1912, foi aprovada a Primeira Convenção Internacional do Ópio, que limitou não somente a produção de ópio como a de morfina e cocaína drogas estas que estavam se popularizando e eram as principais drogas que estavam sendo desenvolvidas pelas indústrias farmacêuticas.

Posteriormente em 1925 ocorre a segunda Convenção Internacional do Ópio, onde foi criada o Permanent Central Opium Board, que foi a primeira lei a ter como mandato o controle penal das drogas (LIPPI, 2010).

Uma curiosidade foi que os Estados Unidos não assinaram a favor da convenção de 1925 citada no parágrafo anterior, mesmo sendo os responsáveis pela política antidrogas do país, enquanto intensificavam as medidas repressoras no âmbito doméstico de forma que fez com que o país não deixou de participar das relações no plano internacional ficando intensivamente das convenções de 1931 e 1936 as duas em Genebra (CARVALHO, 2013).

Essas foram as primeiras convenções internacionais que trataram sobre o uso de drogas, porém a política do proibicionismo tomou força realmente expressiva nos anos de 1961 quando ocorreu a Convenção Única sobre Entorpecentes que se deu na sede da ONU que viera substituir a Liga das Nações explica Avelin:

Após a Segunda Guerra Mundial, mais especificamente em 1946, a Liga das Nações fora sucedida pela Organização das Nações Unidas, sob a influência da qual foram assinados os protocolos de 1946, 1948 e 1953, que além de atualizar acordos anteriores, restringiram a produção de ópio exclusivamente para uso médico. (AVELINO, 2010, p. 03).

As convenções Internacionais pós ONU

Na convenção de 1961 citada no parágrafo anterior o uso de ópio foi extremamente condenado, além da proibição da mastigação da folha de coca e uso recreativo da Cannabis, criando-se assim um perfil mais proibicionista.

Esta convenção contou com participação de setenta e quatro países, um deles era o Brasil, que por meio do decreto n.° 54.126, de 27 de agosto de 1964, o qual trazia escrito em seu preambulo a seguinte mensagem:

As Partes, Preocupadas com a saúde física e moral da humanidade, Reconhecendo que o uso médico dos entorpecentes continua indispensável para o alívio da dor e do sofrimento e que medidas adequadas devem ser tomadas para garantir a disponibilidade de entorpecentes para tais fins, Reconhecendo que a toxicomania é um grave mal para o indivíduo e constitui um perigo social e econômico para a humanidade, Conscientes de seu dever de prevenir e combater esse mal.
Considerando que as medias contra o uso indébito de entorpecentes, para serem eficazes, exigem uma ação conjunta e universal.
Julgando que essa atuação universal exige uma cooperação internacional, orientada por princípios idênticos e objetivos comuns, Reconhecendo a competência das Nações Unidas em matéria de controle de entorpecentes e desejosas de que os órgãos internacionais a ele afetos estejam enquadrados nessa Organização, Desejando concluir uma convenção internacional que tenha aceitação geral e venha substituir os tratados existentes sobre entorpecentes, limitando-se nela o uso dessas substâncias a fins médicos e científicos e estabelecendo uma cooperação e uma fiscalização internacionais permanentes para a consecução de tais finalidades e objetivos,
Concordam, pela presente, no seguinte. (BRASIL, 1964).

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O Comportamento passivo dos países latino-americanos que também era comumente exercido pelo nosso país, fez com que gerassem prejuízos as tradições de alguns dos países como a Bolívia e o Peru, países onde era comum o uso da papoula da folha de coca e da maconha em rituais culturais (LUCENA, 2020).

O escritor Luís Carlos Valois também vislumbra da mesma percepção da autora do parágrafo anterior e afirma:

Cristalizava-se o que a advogada canadense Paula MALEA chama de desconexão geopolítica entre Norte e Sul das leis de drogas, onde substâncias orgânicas, algumas fazendo parte da culta de países do Sul, como a coca, a papoula e a maconha, foram estritamente proibidas no norte, enquanto substâncias normalmente originadas e produzidas no norte do planeta foram meramente reguladas como substâncias legais, nestas o tabaco, o álcool e muitas outras substâncias criadas pela indústria farmacêutica. (VALOIS, 2017, P. 256/257).

A Convenção de 1961, gerou o mais auto teor do proibicionismo internacional onde estabeleceu um amplo sistema de controle ao tráfico de drogas no mundo, o que proporcionou uma militarização da segurança pública e trouxe o controle criminal como obrigatoriedade para este caso (LUCENA, 2020).

Este controle na esfera criminal se deu devido o que tangia o artigo 36 parágrafo primeiro do decreto n.° 54.126 de 1964, que trazia escrito:

Com ressalva das limitações de natureza constitucional, cada uma das Partes se obriga a adotar as medidas necessárias a fim de que o cultivo, a produção, fabricação, extração, preparação, posse, ofertas em geral, ofertas de venda, distribuição, compra, venda, entrega a qualquer título, corretagem, despacho, despacho em trânsito, transporte, importação e exportação de entorpecentes, feitos em desacordo com a presente Convenção ou de quaisquer outros atos que, em sua opinião, contrários à mesma, sejam considerados como delituosos, se cometidos intencionalmente, e que as infrações graves sejam castigadas de forma adequada, especialmente com pena de prisão ou outras de privação da liberdade. (BRASIL, 1964, Art. 36).

O decreto mencionado também buscava especificar quais as substancias que estavam sujeitas a tutelas dos dispositivos, o documento da convenção Única sobre Entorpecentes trazia anexo quatro listas de acordo com autor Avelino (2010, p. 2) As listas I e II relacionavam as substâncias tidas como entorpecentes, fossem eles naturais ou sintéticos; a lista III apresentava um rol de preparados de entorpecentes e a lista IV abrangia entorpecentes perigosos e suscetíveis de uso indevido, sujeitando-se, portanto, a uma fiscalização especial.

Com o avanço na ciência caminhava à passos largos naquela época convenção já tinham em mente que logo seriam produzidas novas drogas com poder psicotrópico deixando em aberto para serem engajadas dentro do mesmo decreto que regulamentava as drogas já existentes, deixando isto claro no artigo 3° §° 3 do decreto n.° 54.126 de 1964 que trazia escrito:

Modificações da esfera de aplicação da fiscalização
3. Quando a notificação se referir a uma substância ainda não incluída nas Listas I ou II: I - as Partes examinarão, à luz das informações obtidas, a possibilidade de aplicação provisória, a substância em apreço de todas as medidas de fiscalização aplicáveis aos entorpecentes da Lista I; II - Enquanto não der sua decisão, de acordo com o subparágrafo III do presente parágrafo, a Comissão poderá determinar que as Partes apliquem provisoriamente à tal substância, todas as medidas de fiscalização aplicáveis aos entorpecentes da Lista I. As Partes aplicarão provisoriamente tais medidas à Substância em questão.    III - Se a Organização Mundial de Saúde constatar que a substância se presta a similar abusos e pode produzir efeitos nocivos semelhantes aos entorpecentes das Listas I e II ou ser transformada em entorpecente, comunicará isso à Comissão, a qual, de acordo com a recomendação da Organização Mundial de Saúde, poderá decidir que a substância seja incluída nas Listas I e II... (BRASIL, 1964, Art. 03).

A Convenção sobre Substancias psicotrópicas de Viena que ocorreu no ano de 1971, foi convocada por causa da análise que nenhuma das quatro listas da Convenção Única de Entorpecentes de 1961 tinham incluído as anfetaminas e nem os barbitúricos.

A convenção para incluir as substancias psicotrópicas só se ocorreu devido à alta pressão da indústria farmacêutica como explica Valois:

A ideia de um novo tratado para incluir as substâncias psicotrópicas, inclusive, foi resultado de uma vitória das indústrias L farmacêuticas, uma vez que a pressão aumentava para a inclusão de tais drogas entre as demais da Convenção Única. A segunda vitória, porque a primeira havia se dado em 1966 quando a CND se reuniu para discutir os psicotrópicos e concluiu poderem ser os mesmos relegados apenas aos controles nacionais, a exceção do LSD que, por sugestão norte-americana, foi incluído como droga permitida apenas para fins medicinais e científicos por uma resolução. (VALOIS, 2017, p. 279).

Os padrões opressores explicados anteriormente na convenção de 1961 não seguiram adiante por muito tempo tendo em vista que na convenção de 1971 foram adotadas medidas mais coerentes e flexíveis, a primeira mudança relevante pela convenção teve como finalidade de afastar a conotação negativa da palavra entorpecente passando a se referir a esta agora como substância psicotrópica:

O termo "entorpecente", recorrente no texto da Convenção Única de 1961, foi substituído pela expressão "substância psicotrópica", com significado mais abrangente, designando qualquer substância de origem natural ou sintética ou qualquer produto presente em uma das quatro listas da nova conferência. (AVELINO, 2010, p. 03).

Porém como já citado anteriormente essa convenção só ocorrera devido à forte preção das indústrias farmacêuticas, a flexibilização destas termologias foram apenas uma jogada tendo em vista que esta indústria produzia a maioria das drogas psicotrópicas conforme explica Lucena:

Outro ponto relevante para entender o tratamento mais flexivo da Convenção de 1971 está na influência que a indústria farmacêutica teve sob os representantes dos países signatários, de forma a que interesses daquela fossem preservados, tendo em vista que as substâncias classificadas como psicotrópicos eram produzidas por essa indústria, que tinha sua sede em diversos países do hemisfério norte. (LUCENA, 2020, p. 18).

Além do uso substancia ao invés da palavra droga Valois explica em sua obra citando o autor Escohotado que:

Além do uso da palavra substância no lugar de droga, ESCOHOTADO ensina que o termo psicotrópico era uma forma de suavizar a palavra psicotóxico. Como tropos em grego significa movimento, câmbio, o termo psicotrópico podia significar que eram drogas que alteram o juízo, o comportamento, a percepção ou o estado de ânimo, sem ganhar a conotação negativa dos entorpecentes ou narcóticos. (ESCOHOTADO, 2008 apud VALOIS, 2017, p. 282).

Nesta convenção foi a primeira onde houve a sugestão de enquadrar a maconha e cocaína dentro da classificação de drogas psicotrópicas tendo em vista que a maioria dos representantes já sabiam que não se consideravam estas drogas narcóticos, e tinham funcionalidade semelhante as anfetaminas e aos barbitúricos, proposta que em um debate não público foi afastada e até hoje não discutida (VALOIS, 2017).

Tendo em vista a pressão da indústria farmacêutica fazendo que houvesse esta convenção afasta-se a imparcialidade das decisões podendo citar que em nenhum momento a convenção teve preocupação genuína com a saúde pública, sendo assim as políticas proibicionistas que tangem a guerra contra as drogas que o presidente Richard Nixon dava largada, somente tratava de uma jogada econômica e política para angariar o apoio dos grupos mais seletos (LUCENA, 2020).

A convenção da ONU de 1988

A Convenção das Organizações das Nações Unidas de 1988 também ocorreu em Viena e teve um marco muito importante no contexto histórico do proibicionismo tendo em vista que esta convenção tinha como objetivo não mais a discriminação do que é droga, mas sim estabelecer medidas repressivas contra o tráfico de entorpecentes e criminalizando pela primeira vez o ato de portar alguma substância ilícita (LUCENA, 2020).

Esta convenção se encontra em vigor até os dias atuais, e foi promulgado no Brasil no ano de 1991. Ela tem um caráter altamente repressivo e sua finalidade era a colaboração dos países no combate as organizações criminosas encarregadas do tráfico de drogas conforme explica Luciana Boiteux de Figueiredo Rodrigues:

A Convenção da ONU de 1988 é um instrumento repressivo que pretende combater as organizações de traficantes, através da ampliação das hipóteses de extradição, cooperação internacional e do confisco de ativos financeiros dos traficantes, unificando e reforçando os instrumentos legais já existentes. Foi assim criado um sistema com enfoque particular de se opor ao poder militar, econômico e financeiro alcançado pelo tráfico ilícito nesses anos de proibição. (RODRIGUES, 2006, p. 41).

Vários mecanismos que buscavam oprimir o usuário de drogas foram acolhidos por esta convenção:

Diversos mecanismos de repressão foram adotados na Convenção, como a criminalização, o confisco e a extradição do condenado a crime de tráfico de drogas, estabelecendo, ainda, a assistência jurídica recíproca e a cooperação internacional entre os países signatários. (LUCENA, 2020, p. 18).

Dentre os muitos objetivos repressores desta convenção um dos objetivos principais era acabar com a produção e cultivo de plantas narcóticas como a folha de coca de comum produção nos países da américa latina, além de aumentar os esforços contra a produção de entorpecentes incluindo para isso um monitoramento para realizar o controle de quem adquirisse produtos químicos usados no preparo e de drogas.

O objetivo declarado desta convenção foi a repressão total do uso e produção de drogas o que fez a adoção de medidas mais restritivas buscando punir os indivíduos que se associassem de alguma forma ao tráfico de drogas, dando assistência ou cumplicidade para a consumação do crime como explica Rodrigues:

Com o objetivo declarado de uniformizar a descrição típica das ações ilícitas pelos estados signatários, a Convenção ampliou o alcance das chamadas ofensas relacionadas com drogas, pois além da incriminação do tráfico e do uso de entorpecentes, determinou a previsão legal da proibição e apreensão de equipamentos e materiais destinados a uso na produção de estupefacientes e substâncias psicotrópicas; a criminalização da incitação pública do uso e consumo de entorpecentes; a punição da participação no crime de tráfico; a associação, tentativa, cumplicidade e assistência visando a prática deste tipo de delito. Além disso, para o delito de tráfico de entorpecentes foram recomendados, além da pena de prisão, o confisco de bens. (RODRIGUES, 2006, p. 42).

O crime de lavagem de dinheiro foi tratado internacionalmente pela primeira vez nessa convenção o que de fato foi inovador, o confisco de bens supracitado pela autora Rodrigues era defendido como pena devido ao fato de o indiciado neste crime já ter convertido o montante em outros bens, conforme explica a legislação por meio do decreto n.° 154 de 26 de junho de 1991:

a) Quando o produto houver sido transformado ou convertido em outros bens, estes poderão ser objeto das medidas, mencionadas no presente Artigo, aplicáveis ao produto.
b) Quando o produto houver sido misturado com bens adquiridos de fontes lícitas, sem prejuízo de qualquer outra medida de apreensão ou confisco preventivo aplicável, esses bens poderão ser confiscados até o valor estimativo do produto misturado.
c) Tais medidas se aplicarão também à renda ou a outros benefícios derivados:
I) do produto;
II) dos bens, nos quais o produto tenha sido transformado ou convertido; ou
III) dos bens com os quais o produto tenha sido misturado, do mesmo modo e na mesma medida (em) que o produto (o foi). (BRASIL, 1991, Art. 01).

A convenção teve o consenso de todos os participantes considerando a luta contra as drogas um desafio coletivo global, o que foi muito bom para os Estados Unidos que implantavam mundialmente sua política de repressão às drogas, devido a este consenso geral a convenção visava uniformizar e conceituar as coisas, definindo o conceito do que é o tráfico de drogas, impondo as aplicações das definições nos países participantes da convenção ignorando ás diferenças estruturais e culturais de cada um A Convenção de Viena, portanto, universaliza a cruzada contra as drogas, consagrando o estado policial e o regime de monopólio do narcotráfico por parte dos setores corruptos das forças de segurança da maioria dos Estados (BOUVILLE, 2000 apud LUCENA, 2020).

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Almanaque das drogas. São Paulo: Leya 2012, P.207

ARGUELLO, Katie SC; DIETER, Vitor S. Política criminal das drogas: o proibicionismo e seu bem jurídico. Direito penal e criminologia. Curitiba: Clássica Editora, 2014. Disponível em:<http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=7a70c831f7cd4077#:~:text=%C3%89%20assim%2C%20mediante%20o%20bem,seguran%C3%A7a%20p%C3%BAblica%20e%20seguran%C3%A7a%20internacional> Acesso em 30/03/2021;

AVELINO Victor Pereira, A evolução do consumo de drogas. Aspectos históricos, axiológicos e legislativos. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/14469/a-evolucao-do-consumo-de-drogas/2> Acesso em: 29/03/2021;

BRASIL DECRETO N° 154 DE 26 DE JUNHO DE 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0154.htm>Acesso em: 30/03/2021;

BRASIL DECRETO n.° 54.216, de 24 de agostos de 1964. Promulga a Convenção Única sobre entorpecentes. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1960-1969/decreto-54216-27-agosto-1964-394342-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso: 25/03/2021.

CARVALHO, Jonatas Carlos. A emergência da política mundial de drogas: o Brasil e as primeiras Conferências Internacionais do Ópio. Oficina do Historiador, v. 7, n. 1, p. 153-176, 2013. Disponível em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/index.php/oficinadohistoriador/article/view/15927/11571. Acesso em: 29/03/2021;

ESCOHOTADO, Antonio. História general de las drogas. Espasa, 1998;

FIORE, Maurício. O lugar do Estado na questão das drogas: o paradigma proibicionista e as alternativas. Novos estudos CEBRAP, n. 92, p. 9-21, 2012. Disponível em : https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010133002012000100002#:~:text=O%20proibicionismo%20modulou%20o%20entendimento,%2Fpositivas%20e%20ilegais%2Fnegativas.&text=Entre%20as%20drogas%2C%20h%C3%A1%20as,sobre%20o%20funcionamento%20do%20c%C3%A9rebro Acesso em 30/03/2021;

LIPPI, Camila Soares. A política externa norte-americana para a criminalização do tráfico de drogas pelo TPI. Encontro Regional de História da ANPUH-Rio: Memória e Patrimônio, 2010. Disponível em:< http://www.encontro2010.rj.anpuh.org/resources/anais/8/1276737126_ARQUIVO_ApoliticaexternanorteamericanacriminalizacaodrogasTPI.pdf> Acesso em: 29/03/2021;

LUCENA, Letícia Bezerra Francelino. Política criminal de drogas no Brasil: origem e efeitos do modelo proibicionista. 2020. Disponível em: <http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/55106/1/2020_tcc_lbflucena.pdf> Acesso em 28/03/2021;

RODRIGUES, Luciana Boiteux de Figueiredo, Controle penal sobre as drogas ilícitas: o impacto do proibicionismo no sistema penal e na sociedade. / Luciana Boiteux de Figueiredo Rodrigues; orientador Prof. Dr. Sergio Salomão Shecaira -- São Paulo, 2006. Diponivel em: <https://cetadobserva.ufba.br/sites/cetadobserva.ufba.br/files/355.pdf> Acesso em: 26/03/2021;

VALOIS, Luís Carlos O direito penal da guerra às drogas -- 2. ed. -- Belo Horizonte: Editora DPlácido, 2017;

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