TRABALHO E TRANSFORMAÇÃO DIGITAL

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30/11/2021 às 09:09
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Em 1936, Charles Chaplin gravou Tempos Modernos, uma produção que se tornou um clássico do cinema, onde o personagem principal, Carlitos, interpretado também por Chaplin, que sempre foi uma figura inusitada, esse homem do povo. Um gênio que sempre conseguiu misturar humor com ingenuidade de forma brilhante, narra a vida de um trabalhador comum, um homem que está em busca de se estabelecer tanto profissionalmente quanto como indivíduo em uma sociedade cheia de inovações tecnológicas. Logo tento imaginar como Chaplin narraria hoje no cinema a transformação digital, acelerada pela pandemia?

Mas vejamos as similaridades e desafios para irmos dos tempos modernos para os tempos atuais. Lá na narrativa de Chaplin o trabalho é cansativo e desinteressante, pois sua única função é rosquear parafusos. Uma atividade em que o personagem tem dificuldade em se adaptar e onde se mantém às exigências do chefe, sempre cobrando por produtividade e desempenho.

E assim nos tempos atuais, as máquinas e programas modernos vão substituindo o homem, mudando a forma de trabalho, o lugar do trabalho e para tristeza de muitos a necessidade do homem e do seu trabalho.

Porém nesse momento de transformação surgem fatos curiosos, na passagem de posições de trabalho.

Nesse momento, nos EUA, a pandemia levou 4 milhões de pessoas a encontrar razões para se despedirem de seus chefes, pedindo demissão.

Afinal por que tirar algumas semanas de folga quando você pode sair do trabalho?

Esses números impressionam, mais de quatro milhões de trabalhadores deixaram seus empregos em abril passado, o número mais alto desde que o Bureau of Labor Statistics começou a rastreá-lo há duas décadas. A taxa de abandono foi particularmente elevada no setor de serviços. Para cada 100 funcionários em hotéis, restaurantes, bares e lojas, cinco deles saíram pela porta pedindo as contas.

A principal economia do mundo enfrenta uma crise trabalhista que os economistas interpretam como um sinal de otimismo. Não é comum as pessoas desistirem se não tiverem certeza se podem encontrar algo melhor. Mas poucos se atrevem a fazer previsões porque a incerteza atual dificulta a compreensão das causas do fenômeno. Trabalhadores de baixa remuneração não são os únicos a sair. Mais de 700.000 funcionários do setor empresarial e funcionários do colarinho branco também renunciaram, outro recorde desde que que esses números passaram a serem registrados.

Segundo o mesmo levantamento, em todos os setores e ocupações, 4 em cada 10 funcionários reconhecem que estão considerando deixar seus empregos atuais nos próximos meses.

O que se acredita é que o poder dos trabalhadores está aumentando, após décadas de salários estagnados e o desaparecimento das proteções trabalhistas, em meio a uma revolução que digitaliza negócios e relações.

Já ficou famosa a solução dada entre sussurros do presidente Joe Biden a empresários que reclamavam por não conseguirem encontrar pessoas para ocupar as posições: Pague-lhes mais.

É claro que sempre tem espaço para entender que o fenômeno também pode ser um breve acaso estatístico em meio a uma situação econômica turbulenta. O que fez com que o Conselho de Conselheiros Econômicos da Casa Branca, alertasse que os dados podem mostrar muitas variáveis neste verão, enquanto os EUA retornam a uma normalidade ainda imprevisível. De qualquer forma, 4 milhões podem sim indicar uma tendência.

Os números de criação de empregos superaram as expectativas em junho, com 850.000 novos empregos contra os 680.000 esperados pelos analistas, informou o Departamento do Trabalho nesta sexta-feira. No entanto, a taxa de desemprego subiu para 5,95% (+0,1 ponto), com 9,5 milhões de desempregados

A pandemia fez com que os trabalhadores no topo e abaixo da escala de renda encontrassem razões para desistir. Para esse tipo de epifania maciça sobre o que fazer com suas vidas, há também o acúmulo de pessoas que mantiveram seus empregos no ano passado devido à incerteza da crise covid-19, mas que com a reabertura decidiram sair. As empresas estão agora procurando preencher essas vagas.

De acordo com a Federação Nacional das Empresas Independentes, 40% dos empregadores dizem que não conseguem encontrar trabalhadores para cargos vagos. O sangramento é particularmente grave no setor de serviços, pois os trabalhadores que saíram às ruas por causa do fechamento durante o confinamento se beneficiaram do seguro-desemprego e agora perceberam que não estão sendo pagos o suficiente, segundo reportagem da revista Expression.

Seja qual for a razão exata para as auto-demissões em massa, os americanos parecem ver a reabertura como um momento de libertação profissional, ainda que seja uma parada para melhor se qualificar e buscar novos rumos em um novo desenho da economia.

Uma pesquisa recente da Bloomberg e Morning Consult revela que quase metade dos trabalhadores com menos de 40 anos não estão dispostos a continuar em seus empregos se a empresa não deixá-los continuar a praticar em casa pelo menos parte do tempo. Os funcionários de maior renda sucumbiram à síndrome de burnout cada vez mais comum com os bolsos cheios, após um ano entre paredes em meio a uma crise existencial em plena transformação digital.

É obvio que as mudanças são velozes e não esperam muito tempo para você se adaptar, seja empregado ou empregador.

Afinal, a rapidez com que muitas empresas, em acordo com seus empregados, conseguiram instituir regimes de trabalho diferenciados para reduzir os contatos pessoais e, assim, reduzir também os riscos de contágio pela covid-19, sem perda perceptível no resultado final, mostrou que o trabalho remoto pode ser uma boa solução para muitas atividades.

O crescimento do home office durante a pandemia, abriu os horizontes para muitos desses colaboradores para novas formas de trabalho, remuneração e até mesmo para novas áreas.

Uma reportagem publicada pelo jornal Estadão em (21/3) é bastante esclarecedora, com o título Trabalho remoto não passa nem perto da maioria.

Isso mesmo, a maioria dos trabalhos continuará sendo presencial, mesmo que com jornadas presenciais reduzidas.

Esse grupo que não pode trabalhar em regime de home office somava 79,7 milhões de pessoas, ou 86% do total de empregados no País. Na ocasião, considerava-se que 12,9 milhões de trabalhadores (os 14% restantes) podiam desempenhar suas tarefas a distância, de acordo com estudo da Idados ao qual a reportagem teve acesso.

Uma pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no ano passado,  acompanhou a evolução do trabalho remoto, com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Covid-19 que o IBGE realizou até dezembro. No dado mais recente, de novembro, o Ipea constatou que o contingente de trabalhadores atuando de forma remota somava 7,3% milhões de pessoas, o que correspondia a 9,1% das pessoas ocupadas e não afastadas. No mês anterior, correspondia a 9,6% do total.

A diferença se deve a conceitos e metodologias utilizadas em um e em outro estudo, mas ambos mostram que, mesmo quando o home office alcançou seu porcentual mais alto durante a pandemia, mal alcançou 10% do total de pessoas ocupadas. De fato, não chega perto da maioria dos trabalhadores, como assinalou a reportagem do periódico.

O mesmo estudo do Ipea destaca que além do limite de abrangência, o caráter diferenciado do trabalho remoto sob várias perspectivas. Quanto à renda, por exemplo, é notório que quem trabalha em regime de home office ganha em média mais do que os demais trabalhadores. Embora não constituíssem 10% do total de pessoas ocupadas em novembro do ano passado, os que trabalhavam em home office haviam recebido 17,4% da massa total de rendimentos efetivamente gerados naquele mês.

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Outra característica do trabalho remoto é seu alto índice de formalização. Dos que trabalhavam em home office em novembro, 84,8% tinham registro em carteira, enquanto em todo o mercado de trabalho a informalidade alcança cerca de metade do trabalhadores.

O perfil traçado pelo Ipea da pessoa em teletrabalho é predominantemente de pessoa ocupada no setor formal, com escolaridade de nível superior completo, do sexo feminino, de cor branca e idade entre 30 e 39 anos, o que representa um perfil muito diferente da média do trabalhador brasileiro que forma quase 90% do mercado. Este ganha menos, tem menor escolaridade, tende a estar no mercado informal, seu porcentual é maior em regiões menos desenvolvidas e está mais sujeito aos riscos de contágio por causa dos deslocamentos para o trabalho presencial, e é justamente essa massa que corre mais risco durante a transformação digital.

Nota-se que não basta estar capacitado, e ai entra o papel do governo em forma novos cluster econômicos com capacidade aglutinadora para essa massa de trabalhadores.

É preciso qualificar esses trabalhadores para os novos mercados, e fomentar os novos mercados para concorrência que é mundial.

Não existe diferença entre um programador no Brasil ou na Europa, pois a linguagem de programação é universal.

Segundo um mesmo estudo do IPEA, dezenas de milhões de brasileiros permanecem, desocupados, subocupados, desalentados e seus dependentes.

A economia brasileira crescerá 5,05% neste ano, segundo a projeção do mercado divulgada pelo Banco Central (BC), ou 4,8% segundo o pessoal do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O número de desempregados ainda é assustador, são 14,8 milhões de desocupados, 14,7% da força de trabalho, nível recorde na série estatística iniciada em 2012. Nada parece indicar uma onda de contratações a partir de maio.

O total de subutilizados ficou praticamente igual, tendo passado de 33,2 milhões para 33,3 milhões de indivíduos. O grupo dos informais também pouco se alterou, tendo aumentado de 34 milhões para 34,2 milhões de trabalhadores.

Na maior parte das demais economias emergentes e em quase todas as desenvolvidas houve dois movimentos bem diferenciados a partir do início da pandemia. No primeiro, como em todo o mundo, a desocupação cresceu de forma considerável. No segundo houve um claro aumento das oportunidades de trabalho.

Sem a verticalização de alguns setores devemos assistir uma escalada ainda maior do desemprego, um cenário bem distinto do que ocorre mundo afora nos países onde os governos acompanham o movimento da economia do mundo e de suas tendências.

Os tempos atuais estão além dos tempos modernos de Chaplin, mas a necessidade de ter trabalho digno e bem remunerado continua sendo a mesma.

Analógico ou digital, as pessoas precisam ter oportunidades que lhes permitam ter uma vida digna, onde a transformação digital seja uma oportunidade e não uma sentença de morte.

Governos precisam atender emergências sim, mas sem deixar de buscar um horizonte de oportunidades para que a iniciativa privada seja ela de onde for, veja um ambiente propício para investir e prosperar.

Sobre o autor
Charles M. Machado

Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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