O transtorno do espectro do autismo (TEA) e a utópica inclusão de crianças e adolescentes na rede pública de ensino: Descompasso entre garantia e prática

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PALAVRAS CHAVE: Lei Berenice Piana. Educação Inclusiva. Transtorno do Espectro do Autismo. Inclusão.

A partir de um estudo exploratório, descritivo, analítico, envolvendo a leitura de artigos obtidos a partir das palavras chaves deste estudo, objetivou-se problematizar a necessidade de fomento, pelo poder público de políticas públicas voltadas à legitimação e efetivação dos direitos estabelecidos pela Lei Berenice Piana (LBP) na rede regular de ensino.

O TEA é um transtorno do desenvolvimento neurológico caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social e pela presença de comportamentos e/ou interesses repetitivos ou restritos que, embora incurável, se detectado precocemente, e com devido apoio familiar e social, permite uma maior suavização dos sintomas e, consequentemente, uma melhor funcionabilidade do indivíduo no ambiente em que ele esteja inserido.

O TEA, em razão de suas várias apresentações, no tocante à alfabetização, exige vários recursos adaptados, incluindo um plano de desenvolvimento personalizado.

A Constituição Federal (CF), em seu artigo 205, assegura a educação a todos, e, em seu artigo 227, confere-lhe um caráter de direito prioritário a ser assegurado à criança e ao adolescente. Especificamente, em seu artigo 208, inciso III, a CF considera um dever do Estado que a educação seja efetivada mediante a garantia de atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.

Nesse contexto, diante de um histórica movimentação de associações e grupos de estudo defensores da inclusão dos autistas na educação e nos outros serviços básicos, em 27/12/2012, foi aprovada no Congresso Nacional a lei 12.764, conhecida como Lei Berenice Piana (LBP), que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista, representando, em termos sociais, um significativo avanço ao equiparar seus direitos aos das pessoas com deficiência além de lhes ampliar o sistema de proteção social como uma tentativa de superação das barreiras que lhes obstavam a autonomia e participação social.

Dados de um levantamento realizado pelo Ministério Público de SP apontaram que em 2017 havia 2.503 crianças com TEA estudando nas escolas credenciadas, sendo que, em 2011, ano anterior à aprovação da lei, havia apenas 61 e que o número de crianças com autismo na rede pública diminuiu de 4.350 em 2011 para 3.410 em 2017.

Dados do Censo Escolar apontaram que, das crianças com diferentes deficiências, 87% estavam no ensino fundamental, 13% fora das escolas e só 5% dos alunos de inclusão prosseguiram no ensino médio, sugerindo uma ineficácia da LBP pois o número de crianças com TEA, nas escolas credenciadas, deveria diminuir uma vez que a lei estabelece a inclusão delas em escolas regulares da rede pública.

Observa-se, então, que, para o governo, foi mais factível custear a manutenção das crianças com autismo nas escolas especializadas da rede particular e filantrópica do que, efetivamente, preparar as da rede pública para recebê-las de uma forma mais inclusiva.

Tal postura governamental demonstrou, na prática, não a inclusão idealizada pela LBP, mas, um capacitismo disfarçado de parido-inclusão que favoreceu ainda mais a segregação dos autistas do espaço de convívio da escola pública comum ao invés de inclui-los.

Assim, o presente trabalho procura demonstrar o descompasso da ótica jurídica vigente e o significativo desafio que ainda há que ser travado tanto por pais quanto por educadores para que se alcancem os objetivos da LBP em, de fato, promover a inclusão de crianças com TEA nos ambientes da rede regular de ensino.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

1- ARAUJO, Liubiana Arantes de et al (org.). Manual de Orientação - Transtorno o Espectro do Autismo. 2019. Sociedade Brasileira de Pediatria. Disponível em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/21775d-MO_-_Transtorno_do_Espectro_do_Autismo__2_.pdf. Acesso em: 11 out. 2021.

 2- FERRO, Ana. Acessibilidade e inclusão escolar do aluno com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no ensino regular. 2016.

3- MARQUES, Neila Hyvelise Gonçalves. O direito à educação para crianças com transtorno do espectro autista (TEA) segundo os tribunais pátrios. 2020. Tese de Doutorado.

4- CABRAL, Cristiane Soares; MARIN, Angela Helena. Inclusão escolar de crianças com transtorno do espectro autista: uma revisão sistemática da literatura. Educação em revista, v. 33, 2017.

5- WUO, Andrea Soares. Educação de pessoas com transtorno do espectro do autismo: estado do conhecimento em teses e dissertações nas regiões Sul e Sudeste do Brasil (2008-2016). Saúde e Sociedade, v. 28, p. 210-223, 2019.

6- COSTABILE, Camila; BRUNELLO, Maria Inês Britto. Repercussões da inclusão escolar sobre o cotidiano de crianças com deficiência: um estudo a partir do relato das famílias. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, v. 16, n. 3, p. 124-130, 2005.

7- BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Secretarias Estaduais e Municipais de Educação (org.). O Censo Escolar: notas estatísticas do censo escolar de 2018. Brasília, 2018. 9 f. Disponível em: https://download.inep.gov.br/educacao_basica/censo_escolar/notas_estatisticas/2018/notas_estatisticas_censo_escolar_2018.pdf. Acesso em: 11 out. 2021.

8- ANGELUCCI, Carla Biancha. Uma inclusão nada especial: apropriações da política de inclusão de pessoas com necessidades especiais na rede pública de educação fundamental do Estado de São Paulo. 2002. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.

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Sobre os autores
Thiago Roberto Castellane Arena

Natural de Ribeirão Preto. Como primeira graduação estudou Medicina pela Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP) graduando-se em 2006. Em dezembro de 2008 concluiu MBA Executivo em Gerência de Saúde pelo Convênio Firmado entre a Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ) e as Faculdades COC de Ribeirão Preto (UNICOC). Em janeiro de 2010 concluiu o programa de Residência Médica de Medicina de Família e Comunidade pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HC-FMRP/USP). Em junho de 2010 concluiu Especialização em Auditoria Médica pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Em junho de 2015 concluiu Doutorado junto ao Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-FMRP-USP com pesquisa voltada à gestão clínica de pacientes crônicos no âmbito dos serviços de saúde pública (https://bdpi.usp.br/item/002722956 ). Com o intuito de completar sua graduação e complementar seu entendimento de questões relacionadas ao exercício da atividade médica no setor público de saúde debruçou-se sobre o estudo do Direito e, em 2021, concluiu o Curso de Direito do Centro Universitário Barão de Mauá (http://lattes.cnpq.br/2431627417113071).

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