Sobre a prescrição penal

10/12/2021 às 02:13
Leia nesta página:

Sobre a prescrição da execução penal:

 

Existem duas formas de prescrição penal: a de punir e a de executar a punição. Atualmente, o réu pode recorrer das sentenças e acórdãos até que se tornem definitivas para ele. Esteja  preso, esteja solto,  pode recorrer para que a condenação deixe de possuir a pecha  "condenação provisória".

O recurso defensivo  das condenações penais nem sempre ocorre com o réu solto: pode ocorrer, mas não é a regra. Diria mesmo que é a exceção. A primeira conclusão evidencia-se :  i) "quando o condenado cumpre pena não se fala em prescrição da execução".

O Código Penal aponta "se o sentenciado foge, a prescrição da execução começa a correr desta data" e alude algumas hipóteses em que a prescrição fica suspensa "antes de passar em julgado a sentença final" ( artigo 116).

Interessa-nos o item III desse artigo 116, o qual possui a seguinte redação: "a prescrição antes da sentença/acórdão passar em julgado não corre- na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos tribunais superiores, quando inadmissíveis". Tenho que essa passagem vale tanto para o promotor, como para a defesa, tanto para a prescrição da execução, como para a prescrição da condenação.

Em outra passagem, refere o Código Penal : "A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa" ( CP artigo 110, §1o). No que é complementado pelo artigo  112, inciso I,  "No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr:  I - do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional".

Todos sabem, recentemente,  o STF passou a entender que a pessoa só é culpada quando há o trânsito em julgado da pena,esgotando-se os recursos admitidos.

Por essa razão, no julgamento do RE 696.533/SC, a 1ª Turma do STF passou a entender que a prescrição  executória pelo decurso do prazo prescricional pressupõe a inércia do Estado, de forma que  tanto a prescrição da execução como a do direito de punir decorrem  do trânsito em julgado dos recursos para ambas as partes (defesa e Ministério Público). 

Em outras palavras, se apenas a defesa recorre, o recurso da defesa interrompe a prescrição da execução e a prescrição do direito de punir, se , recurso admissível.Se for recurso inadmissível, interrompe apenas a prescrição da execução. 

O tema ainda aguarda manifestação do plenário no ARE 848.107/DF, rel. Min. Dias Toffoli.

No STJ  , pelas duas turmas criminais, é pacificada a jurisprudência de que a prescrição da execução penal conta do trânsito em julgado para o Promotor de Justiça.

Passemos ao exame do sentenciado preso que recorre. O Promotor não recorre. Nesse caso, não se pode falar em prescrição da execução porque a execução está sendo executada, perdoe-se a redundância.

Mesmo sendo execução provisória, conta-se como tempo de pena cumprido.

Na hipótese, entretanto, pode-se falar, em tese, da prescrição da punição em um recurso especial ou extraordinário, da defesa, conhecidos e providos, ou conhecidos e não providos. Pode-se dizer que o Estado foi inerte (promotor não recorreu) e mesmo assim a prescrição da execução da pena não chegou sequer a ter início devido à prisão,  embora a punição possa ter prescrito, posto que possui momentos de contagem diferentes estipulados no Código Penal.

Em sendo assim, cai por terra o argumento de que a prescrição da execução penal pressupõe inércia estatal. 

Mesmo porque  inércia estatal inexiste quando o Promotor apela  e tem o apelo  denegado , ou os extraordinários inadmitidos, momento em que surge , outra vez, o início do  prazo da prescrição da execução penal, algumas vezes, contados da decisão de não admissibilidade do apelo raro, ou nobre, ou ambos. 

Vejamos a inércia da defesa. O réu foi condenado ,está solto, e só o promotor recorre.Podemos dizer que a inércia da defesa fez surgiu o termo inicial da prescrição da execução da pena? Não,porque nessa situação a pena pode ser aumentada.Por outro lado, a inércia da defesa em nada altera a prescrição do direito de punir, se o promotor recorre.A prescrição da punição pode se dar tanto em recurso da defesa como do Ministério Público. A prescrição da execução só depende de a pena não mais poder ser aumentada.Só Promotor recorre para aumentar a pena.

A bem da verdade, o Min. Barroso, no voto no RE 696533/SC  "data maxima venia"  aparentemente apanhou um trecho do Código Penal dos Delmantos sobre a prescrição ampla, e o utilizou como se fosse apenas da "prescrição da execução".

Analisemos  quando o réu é condenado e está solto.O réu recorre. Pressupõe-se que o ato de julgar, como atividade humana, não possui o dom da infalibilidade divina.

 O promotor não recorre, não apela. Sem recurso do Promotor a  pena não aumenta nunca com recurso exclusivo da defesa. Jamais. Pode ficar a mesma, ou diminuir, pode até ser anulada.

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Nesse exemplo, a pena a ser executada ou é aquela fixada pelo juiz de primeira instância  ou será menor. Se a contagem do prazo prescricional dessa pena tiver por termo inicial o mesmo  da prescrição do direito de punir,por conta do recurso exclusivo da defesa, pode-se concluir que a prescrição penal  passa a ser única. 

Por essas razões, os recursos defensivos inadmissíveis apenas não interrompem o prazo da prescrição do direito de punir. Executar a pena não tem nada a ver com a defesa. Com inércia estatal, ou sem, a prescrição da execução se formaliza quando a pena não pode mais aumentar. Tanto o promotor, como a defesa, quando  se valem de recursos inadmissíveis, não alargam o início do prazo prescricional.Aquele, prazo da execução; esta, prazo da punição.  Em situações raras o recurso exclusivo do promotor poderá beneficiar o réu, tanto na esfera da prescrição da execução, como na da prescrição da punição: quando só o promotor recorre para diminuir a pena, v.g. 

Passemos ao exame do réu que estava preso e recorreu. O promotor não recorre. A condenação transita em julgado para a acusação. Depois, dois anos depois de quando o promotor não recorreu,  há uma fuga, o réu foge.Pela defesa há um agravo em recurso especial pendente, e um agravo em recurso extraordinário, aguardando rever a condenação. Qual o início do prazo prescricional da execução:  o momento em que o promotor não recorreu, ou o momento da fuga?

Logicamente é o momento da fuga. Vimos acima que "se o sentenciado foge, a prescrição da execução começa a correr desta data".

Logo, a inércia do promotor em nada beneficiou o réu que teve o prazo prescricional da execução com início  dois anos após o promotor não recorrer.Também aqui a pena não pode aumentar porque já foi cumprida uma parte.

Os agravos da defesa, pendentes, em nada alteram o termo inicial da prescrição da execução, no exemplo acima.

De forma que  a prescrição da execução penal não tem a ver com inércia estatal e sim com a efetivação da pena. O que é relevante  para a prescrição da execução penal é que a pena não possa ser mais aumentada, e, não o efetivo ingresso da pessoa no cárcere, ou que o promotor seja obrigado a sempre recorrer.   

Penas altas raramente prescrevem. Para crimes graves os prazos são muito elevados , vinte anos em alguns casos, e até quarenta anos em hipótese de réu foragido, sem advogado constituído nos autos. 

Por essas razões, a decisão do STF no RE 696533/SC - que chegou ao STF como se fosse um Recurso Especial,- merece ser revista, por quem é titular da análise do direito infra constitucional: o STJ.

Ocorre que o STJ já possui jurisprudência pacificada sobre o tema, conforme discorrido no início desse texto.

Eu também não sabia que o STF julgava recurso especial. Descobri hoje que isso ocorre quando no curso do processo o réu que havia recorrido ao STJ  é diplomado Deputado Federal.

Do que foi exposto, não se tem como interpretar o inciso I do artigo 112 do Código Penal, da maneira como foi feita, pela 1a Turma do STF sem, com isso revogar boa parte do Código Penal no campo da prescrição  porque a decisão do STF ao julgar um recurso especial,equipara institutos diferentes, recaindo na famosa frase de Pontes de Miranda, que tanto se utiliza: misturou  substâncias diferentes, por sob um mesmo rótulo. 

 

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