Resenha de curso de Filosofia do Direito

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Resenha de curso de Filosofia do Direito

Rogério Duarte Fernandes dos Passos

Resenha. CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: José Bushatsky, 1967, 137 p.

Sobre o autor.

Nascido em Sorocaba, no ano de 1920, José Cretella Júnior foi advogado e professor da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo, na qual foi titular da cadeira de Direito Administrativo. Foi igualmente professor titular de Filosofia do Direito na Faculdade de Direito do Vale do Paraíba e vice-diretor da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.

Falecendo em 2015, deixou ampla e significativa obra jurídica, e aqui, brindando seus alunos e leitores com esse Curso de Filosofia do Direito, dedicado aos mestres Miguel Reale (1910-2006), José Pinto Antunes (1906-1975) e Goffredo da Silva Telles Júnior (1915-2009), com publicação pela tradicional Livraria José Bushatsky.

Sobre a obra.

O Curso de Filosofia do Direito de José Cretella Neto, resultou de suas lições na Faculdade de Direito do Vale do Paraíba, destacando nas linhas introdutórias a importância da Filosofia do Direito para alicerçar em maior profundidade a instrumentalização das demais áreas do direito material e adjetivo (p. 11).

Considerando a Filosofia do Direito no bojo de uma Filosofia obviamente voltada ao interior da ciência jurídica, nela temos como o ponto de partida o filósofo Pitágoras (ca. 570-495 a.C.) provavelmente o jônico que usou o termo Filosofia pela primeira vez (p. 21) , com o acréscimo etimológico da acepção e significado de amor ao conhecimento, perpassando o exercício do raciocínio e caminhando em direção a uma cosmovisão weltanschaung , deduzindo a realidade e, tomando o Direito enquanto parte desta, se definindo em amor e amizade ao Direito (p. 21-22).

Se as ciências jurídicas buscam o alcance dele em seu aspecto particular, à Filosofia do Direito interessa a universalidade do Direito, com reflexão, sistematização, valoração e crítica por meio das causas remotas (p. 25). Não à toa, José Cretella Júnior cita frase clássica de Ortolan o jurista francês Joseph Louis Elzéar Ortolan (1802-1873)? , a qual prenuncia com muito acêrto (sic) que todo historiador deveria ser jurisconsulto e todo jurisconsulto historiador (p. 74).

Passo importante neste entendimento da Filosofia do Direito se afirma no relacionamento da disciplina com a Gnoseologia notadamente no processo de conhecer e inteirar-se acerca do mundo e dos fatos , com ganhos imensos para maior substância no Direito a partir do período do Renascimento Século XIV até Século XVII e, também, em seguida às obras de Immanuel Kant (1724-1804) (p. 35), no que Cretella adverte que o sujeito cognoscente aquele que conhece ao entrar em contato com o objeto cognoscível objeto ou fenômeno a ser conhecido , outorga verdadeira existência a este, afinal, sem o sujeito, resta difícil crer no conhecimento como o consideramos sem a presença do ser humano neste ínterim processual (p. 36).

Observe-se que no raciocínio filosófico a abstração, enquanto processo de recortar, eliminar, abandonar o individual em favor do geral, impulsiona o sujeito ao empirismo para apreensão do conhecimento, a partir da experiência (p. 38). Por outro lado, não se negue a existência do racionalismo que na luta de visões, abordagens e métodos dentro da Filosofia do Direito se opõe ao primeiro, depositando em sua base epistemológica a confiança no intelecto humano para conhecer o mundo, em contribuições que bebem na Grécia antiga por meio de Parmênides, da Escola Eleática (ca. 510-470 a.C.) não raro tido como o principal filósofo pré-socrático apto a inaugurar os estudos de ontologia e metafísica , ao lado do estabelecimento da razão em Sócrates (ca. 470-399 a.C.), com contribuições de Platão (ca. 428/427-348-347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.), em relevo nesta tríade maior dos gregos, no que finalmente, em exercício da síntese tão frequente no Direito, alcançamos uma posição conciliatória representada no intelectualismo referendado até mesmo no pensamento aristotélico , que na jornada do conhecimento, une experiência e razão (p. 39-40).

Essa incursão filosófica caminha no tempo, chegando nos teólogos e escolásticos, onde o intelectualismo é desenvolvido por Santo Tomás de Aquino (1225-1274), rejeitando o antagonismo entre fé e razão e supondo a fé cristã como reveladora desta última (p. 40).

A história do conhecer não ignora, curiosamente, os céticos na sua tarefa de crer que nada pode ser conhecido , no que Cretella Júnior acrescenta a curiosa observação: afirmar que é impossível conhecer já é expressar uma certa forma de conhecimento a respeito do problema que estamos examinando (p. 41).

Não resta dúvida que o conhecer é uma relação entre sujeito e objeto do conhecimento, em tarefa imbricada, como lembra-nos Herbert Spencer (1820-1903) no saber como parcialmente unificado e a filosofia como tendo-o totalmente unificado (p. 45).

José Cretella Júnior, ao lado de todo o desenvolvimento histórico conseguintemente reconhecido em favor da Filosofia do Direito, alcança a disciplina no Brasil, em um ínterim de desenvolvimento que perpassa Tobias Barreto (1839-1889), Padre Leonel Franca (1893-1948), Sílvio Romero (1851-1914), José Mendes (1861-1918) (também internacionalista), Pedro Lessa (1859-1921), Jônathas Serrano (1885-1944), João Arruda (1914-1973), até o reconhecimento do austríaco-estadunidense Josef Laurenz Kunz (1890-1970) (igualmente internacionalista, autor do célebre The Changing Law of Nations, de 1968) à grande contribuição de Miguel Reale (p. 110), sobretudo, na sua Teoria Tridimensional do Direito, que trabalha em um viés dialético fato, valor (no aspecto axiológico) e norma.

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Acrescenta o autor que Reale trouxe em seu trabalho a admiração ao legado do filósofo alemão Max Ferdinand Scheler (1874-1928), criando reconhecimento internacional por meio de contribuição original, agrupando pensadores do quilate de Renato Cirell Czerna (1922-2005), Irineu Strenger (1923-2007) (da mesma forma internacionalista) e Teófilo Cavalcanti Filho (1921-1978) (p. 113), no que jurista paulista ainda se notabilizaria no futuro por capitanear os trabalhos de edificação do projeto de Código Civil brasileiro que viria à baila em 2002.

Por fim, sem prescindir dos estudos do filósofo italiano Giorgio Del Vecchio (1878-1970) o qual em sua tarefa lógica, fenomenológico e ontológica buscava um conceito de Direito, supondo-o com a coordenação de ações possíveis entre diferentes sujeitos e sem impedimentos de ordem ética (p. 126) , José Cretella Júnior retoma a tarefa da definição da disciplina com significações polissêmicas , concluindo, a par do caráter fastidioso da missão:

Na realidade, o Direito, verdadeira constante na história da humanidade, ainda continua a desafiar a argúcia dos pensadores que procuram enquadrá-lo numa definição breve e perfeita, razão por que êste (sic) problema não pode deixar de ser considerado como um dos temas capitais da Filosofia do Direito (p. 127).

Uma leitura produtiva e informativa se materializa no estudo do Curso de Filosofia do Direito, do professor José Cretella Júnior.

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