Sandra Mara Dobjenski[1]
Suzane Assassina e manipuladora foi uma obra escrita por Ulisses Campbell, publicada em 2020 com o intuito de divulgar sua pesquisa de três anos a cerca do caso Richthofen.
A obra vetada pela juíza Sueli Zeraik Armani, do Tribunal de Justiça de São Paulo em novembro de 2019, com os argumentos pautados na censura, erradicando que a obra não interessaria ao público e traria enorme e irreparável prejuízo a imagem de Suzane. Essa censura durou exatamente 37 dias, sendo que no dia 18 de dezembro do mesmo ano, o ministro Alexandre de Morais fez valer a liberdade de expressão e permitiu a publicação do livro.
Em outubro de 2019, Suzane entrou com uma liminar, ou seja, uma Medida Provisória que quando, concedida por uma autoridade judicial, pode confirmar ou invalidar algo, uma inicial com o intuito de barrar a publicação mediante pena de multa diária de R$ 5 mil reais, em caso de descumprimento, foi o pedido da autora. Na argumentação, ela alegou que teria direito ao esquecimento, que nada mais é que um desdobramento do princípio da dignidade da pessoa humana que trata da possibilidade de desconsideração e abstração de fatos vexatórios ocorridos no passado, entendidos como danosos à índole e à privacidade do indivíduo e que na referida obra causaria um dano irreparável à sua imagem de condenada.
Segundo SANTOS (2019, p. 26) se utilizando dos preceitos de CHASSOT; FIGUEIREDO (2018, p.1642)[2] o direito ao esquecimento emana da solicitação do indivíduo em deixar de ser lembrado por um ato do passado, o qual faça renascer desprazeres não necessários ou que não detenham comum interesse social.
Portanto, o direito ao esquecimento consiste no fato de uma pessoa não permitir que um fato, ainda que verídico, que ocorreu em determinado momento da sua vida, continue sendo exposto e que seja permitido acesso por parte do público a essa informação. Trata-se de uma invasão à privacidade do sujeito.
É possível encontrar amparo legal ao direito ao esquecimento ao considerar que é uma consequência do direito à vida privada, intimidade e honra, no Art. 5º, inciso X da Constituição da República que preceitua que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. BRASIL (2015, p.13)[3] e pelo Art. 21 do Código Civil (CC) que estabelece que a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma. BRASIL (2018, p.29)[4] .
O IBCCrim Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, não favorece o direito ao esquecimento em sua totalidade, pois a pena para homicídios é longa, porém, as pessoas privadas de liberdade por essa causa têm o direito ao regime semiaberto antes de a cumprirem na totalidade e têm de conviver com uma sociedade que, muitas vezes, acompanha avidamente os seus atos.
Diante disso, no caso de crimes que recebem ampla cobertura, é necessária uma discussão sobre o direito ao esquecimento, não somente depois que a pena for cumprida, mas também durante o período em que o preso cumpre sua pena. Isso ocorre devido à facilidade de acesso à informação na era digital em que, uma vez publicado, é quase impossível retirar do ar a matéria. Sendo assim, o prazo deveria ser contabilizado a partir do momento em que a sentença é proferida e o julgamento é encerrado.
Ser contra o direito ao esquecimento significa ser contra o princípio de non bis in idem, que prega que ninguém pode ser processado mais de uma vez pelo mesmo fato e que veda também a possibilidade de valoração de qualquer circunstância que já tenha sido analisada pelo julgador na aplicação da pena. Isso significa que a pessoa não pode carregar o rótulo de ser uma criminosa quando já pagou pelo seu crime.
É fato que o sensacionalismo pode ser observado na cobertura de mortes em que os suspeitos já são tratados como criminosos antes mesmo de as investigações serem concluídas e do julgamento acontecer, isso fere a presunção de inocência do cidadão, quando a Constituição afirma que todos são inocentes até que se prove o contrário.
Isso é resultado da ânsia de alcançar um furo (jargão jornalístico para informação inédita noticiada por um veículo) e ser o primeiro a divulgar as informações sobre o caso, porém, isso não necessariamente é benéfico para a elucidação do caso, pois, já ficou provado, pela história recente do país, que a mídia pode se equivocar ao se antecipar ao Poder Judiciário na condenação de suspeitos.
Alexandre de Morais considerou que caso ocorresse a censura a obra, isso viria a ferir decisão do próprio STF, que já estabeleceu que não ser necessário nenhum tipo de autorização para publicação de biografias. O ministro ainda ressaltou que a censura prévia fere a liberdade de expressão.
Cabe fundamentar que as biografias podem vir a relatar fatos que digam respeito à vida privada do biografado e, nesse ponto, surge o conflito de interesses onde, de um lado, têm-se os direitos da personalidade, especialmente o direito à privacidade e, de outro, o direito à liberdade de expressão e à informação.
Por outro lado, a imposição de autorização prévia pode significar um retorno à censura, implicando em extremo sacrifício do direito à liberdade de expressão, na medida em que irá impor aos biógrafos e/ou editoras buscar a autorização do biografado ou de seus herdeiros para divulgar sua obra. Além disso, deve-se levar em conta o direito de todos à informação, garantindo-lhes o acesso aos fatos que sejam de interesse público, mas que não satisfaçam meramente a curiosidade e, sim, tenham relevo para construção da História, seja na seara política, cultural ou artística.
O próprio Campbell cita o clássico Crime e Castigo, de Dotoiévski a fim de defender sua obra, quando relata que o autor publicava em jornais e revistas casos reais de crimes brutais cometidos no seio da sociedade, assim tais histórias segundo o autor instigam a curiosidade da alma humana.
Dessa forma cabe a ressalva de que, compete aos operadores do jornalismo investigativo cumprir uma função de informar, possuindo uma responsabilidade não somente com o público, mas também com aqueles que protagonizam as matérias veiculadas.
Assim investigar se o condenado está cumprindo as regras de uma saída temporária, como não frequentar bares, não é dever de programas de televisão e não contribui em nada para uma sociedade justa, mas é, sobretudo, uma forma de preconceito e perseguição, com roupagem sensacionalista.
É importante frisar que o caso de Suzane não pode ser comparado ao de outras pessoas que tiveram livros publicados sem sua autorização, pois ela não escolheu ser uma pessoa pública ela se tornou uma, em decorrência da barbárie do crime que cometeu. Porém, a condição de condenada não anula seus direitos à personalidade.
O livro de Campbell é uma forma de livro - reportagem inspirado no modelo do repórter Gya Talese em Frank Sinatra está resfriado. E ao longo de 279 páginas o autor descreve Suzane, condenada a 39 anos de prisão por mandar matar os pais Manfred e Marísia Von Richthofen, com a ajuda do então namorado Daniel Cravinhos e do irmão dele Cristian Cravinhos, como uma pessoa passional, sedutora e acima de tudo manipuladora.
Inspirado no livro Prisioneiras, de Drauzio Varella, o jornalista decidiu ao longo da obra contar também, de forma paralela, as histórias das detentas que tiveram contato ou amizade com Suzane. As histórias são tão ou até mais chocantes do que a da biografada. Campbell conta que "dos 26 depoimentos colhidos, 06 são descritos na obra, como a 'Tia do Fogo' que matou o marido queimado após ser humilhada e traída por ele".
Assim o sensacionalismo midiático aparece na obra sobre várias formas, essencialmente na questão da transmissão de fatos e eventos descritos de maneira tendenciosa, a fim de causar fortes emoções no receptor da mensagem. Essa forma de jornalismo é feita com o propósito de aumentar a audiência dos jornais, dos programas televisivos, das leituras, de forma a aguçar a curiosidade do homem médio que se choca ao se deparar com crimes contra a vida que é exaltada pelos meios de comunicação.
Dessa forma a assídua coleta de informações tanto de Suzane quanto dos irmãos Cravinhos, que teve uma duração de 03 anos de pesquisa, reproduzida em 10 capítulos enaltece o sensacionalismo no título/chamada da matéria, no vocabulário utilizado pelo repórter, na tipografia, em fotos/ilustrações e nos recortes dos acontecimentos. Sem falar no apelo a emoções que exploram sentimentos, instigando a indignação das pessoas através de notícias que fogem ao que é socialmente aceito, fruto de uma idealização de comunidade perfeita.
Campbell, também teve acesso aos laudos e documentos anexados ao processo, fato este que fez com que o livro ficasse rico em detalhes técnicos e reais prendendo a atenção do leitor, certamente tudo em busca da ânsia de ser o primeiro a divulgar as informações reais sobre o caso, porém, isso não necessariamente é benéfico para a o condenado. Dessa forma a publicação assume um cunho polêmico, tal como enaltece Nascimento e Carvalho:
Notável se faz registrar que notícias sensacionalistas publicadas e divulgadas exercem poder sobre a opinião pública, de maneira influente e manipuladora, instigando o clamor público, em que prevalece o desejo pela vingança e não pela justiça. E acaba muitas vezes por pressionar os autores do processo, induzindo-os, às vezes, a cometer injustiças. NASCIMENTO e CARVALHO (2015, p. 2)[5]
A investigação particular a qual o acusado ou condenado é submetido pela mídia deve ser questionada, pois mostra uma perseguição à pessoa, ao seu direito de personalidade. A imprensa, ao buscar fazer uma linha do tempo, entrevistando todos que estiveram em contato com o réu ou no referido caso com o condenado em todas as fases da vida, pode revelar traços de personalidade e acontecimentos que não são pertinentes para o julgamento ou para a vida do presidiário de forma a colocarem em xeque a reputação do sujeito e a sua possível reinserção a sociedade.
O poder de investigação de crimes contra a vida, no Brasil, é dado ao Ministério Público e às Polícias Civil e Federal, porém, não é errado a imprensa tentar investigar também, mas deve haver um filtro para somente divulgar o que for pertinente e referente ao processo, evitando, assim, um julgamento moral por parte da sociedade.
Ao longo da narrativa, o autor traz os planos de Suzane assim que conseguir migrar para o regime aberto: casar com o marceneiro Rogério Olberg, ter filhos e tentar deixar para trás o sobrenome Richthofen, passando a usar Olberg das Dores.
É notório que o caso Richthofen já foi tema de estudos dentro da comunicação, do direito, da psicologia e outras áreas afins, tanto em artigos, quanto em monografias; porém, em nenhum dos trabalhos foi tratado sobre o direito ao esquecimento e foi narrado com riqueza de fatos o ocorrido na noite do assassinato de Manfred e Marísia de forma a aguçar o interesse do leitor.
Ullisses Campbell, para ganhar a confiança das detentas, ia até a porta das penitenciárias de van durante as saidinhas e oferecia carona a algumas delas, que moravam longe e perdiam muito tempo na viagem para casa com o intuito de montar seu roteiro literário conforme revelou ao R7.
O assassinato do casal Richthofen jamais foi esquecido. Hoje, na penitenciária de Tremembé, no interior de São Paulo, Suzane é descrita como uma espécie de celebridade. A história do crime, narrada na obra, chamou atenção até mesmo dos demais encarcerados. Um mesmo preso do complexo masculino comprou 28 livros.
Suzane quebrou todos os paradigmas sociais, culturais e econômicos, e é necessário avaliá-los para entender a representatividade feminina na mídia. Para Moll:
Para aumentar a audiência e alcançar ainda mais leitores, os veículos muitas vezes criam uma realidade que incentiva a violência e incita o preconceito de gênero. Ao selecionar, enquadrar e agendar os acontecimentos do caso, os meios de comunicação apresentam-se como um lugar de tensão. MOLL (2015, p. 31)[6]
A cobertura incessante a cerca do caso Richtofen promove a criação de adjetivações e estereótipos, tal como ocorreu na obra de Campbell, reforçam os padrões impostos pela sociedade que busca uma justiça a qualquer custo e o enquadramento do sujeito pelos ditames da lei sem a devida análise técnica, processual e penal a cerca do delito cometido.
Suzane, assassina e manipuladora reconstitui, com todos os detalhes mórbidos, o crime que chocou o país em 30 de outubro de 2002, sob a ótica de Cristian Cravinhos, que concordou dar ao jornalista a sua versão do assassinato do casal Richthofen, de peritos e da empregada da mansão na zona sul de São Paulo, Rinalva, que foi obrigada a limpar a cena do crime. Assim para Moll:
Considerando o valor-notícia do caso, é totalmente compreensível o modo com que o assassinato do casal Richthofen tenha sido noticiado e gerado interesse da opinião 36 pública. Afinal, a mandante do crime, a filha mais velha do casal, foge ao padrão de assassinatos que vemos na mídia. Há ineditismo no caso. MOLL (2015, p. 52)[7]
Dessa forma é possível ressaltar que o sensacionalismo presente na cobertura dos crimes contra a vida enaltece o preconceito que há na sociedade com pessoas acusadas.
O livro de Campbell mostra a falta de senso ético da publicação, pois Suzane poderia ter sido inocentada pelo poder judiciário, e ainda lhe cabe ser reinserida na sociedade, mas, para sempre ficaria estigmatizada como uma assassina fria, calculista, manipuladora que matou seus pais.
A obra traz a entrevista de Christian Cravinhos que revela detalhes do sofrimento das vítimas, Manfred e Marísia, mortos enquanto dormiam com golpes de porretes em L confeccionados por Daniel. No livro, a cena é descrita assim: Para desenganchar a arma, Cristian afundou rapidamente o bastão no crânio da vítima e puxou fazendo um movimento brusco, espalhando massa encefálica pelo colchão da cama. CAMPBELL (2020, p.112)[8].
Mediante o efeito de drogas, os irmãos alegam que só cometeram o crime porque Suzane afirmava ter sido violentada pelo pai desde a infância, uma das mentiras inventadas para convencimento do namorado. Após o crime, os irmãos Cravinhos se desesperaram e mostraram arrependimento, tanto que, anos depois, os dois conseguiram cumprir parte da pena no regime aberto. O mesmo não ocorreu com Suzane:
Campbell afirma que Suzane até os dias atuais não se arrepende do crime, não provou que não vai voltar a matar e poderá ser reinserida na sociedade, não passando nos testes psicológicos aos quais foi submetida.
No imaginário do homem tido como médio; Suzane era uma menina de família rica, que teve acesso a bons colégios adentre em uma boa faculdade e, depois de formada, ganharia um salário parecido com o dos pais, porém, existe uma quebra de expectativa quando uma pessoa como ela comete um crime. Após a descoberta de que fora a ela a idealizadora do crime que vitimou seus próprios pais, a imagem de loira fatal que povoava o imaginário das pessoas se torna um gatilho para uma cobertura incessante em cima dela.
DOBJENSKI (2019, p.83)[9] sustenta que a imprensa relatou o crime como sendo proveniente da realidade dos grandes centros urbanos e da violência que aflora a sociedade globalizada, sendo que tal fato mudou quando da descoberta que a filha mais velha do casal Richitoffen estava envolvida no homicídio. Para a autora a mídia se aproveitou da sociedade conservadora para dar maior ênfase ao caso.
O motivo do crime até hoje alegado pela autora, para a morte dos pais foi à resistência do casal Richthofen em aceitar a continuidade de seu namoro com Daniel, que era pobre e desempregado, e a ameaça de que a ela seria deserdada se mantivesse o relacionamento.
A ideia para o assassinato teria surgido em conjunto: Nós só seremos felizes no dia em que seus pais não existirem mais CAMPBELL (2020, p.15)[10], teria dito Daniel para Suzane, que afirmou estar espantada com a transmissão de pensamento, segundo o livro.
Mesmo procurada por Campbell, Suzane nunca quis dar entrevista. Daniel também não, diante de tais negativas não ocorreu prejuízo à obra.
É fato que crimes contra a vida como o cometido por Suzane e pelos irmãos Cravinhos são de ampla e duradoura relevância, pois refletem na formação de uma sociedade durante várias gerações, enquanto crimes comuns e corriqueiros não são de interesse público. Esse interesse é emanado na sociedade pelos meios de comunicação que abordam o fato 24 horas por dia, 07 dias por semana como se fosse um verdadeiro reality show.
É importante frisar que, quando uma pessoa é condenada, ela não deixa de ter direitos. O que acontece é que alguns direitos são suspendidos por um tempo proporcional ao ato cometido. Como foi dito por Michel Foucault em Vigiar e Punir, o simples fato de um condenado estar preso já deve ser suficiente para a certeza de que ele está cumprindo sua pena.
A disciplina rígida em casa e a falta de afeto também são aspectos abordados na narrativa. Em um diálogo com a amiga Amanda, Suzane teria dito: Os meus pais nunca me abraçaram e me beijaram dessa forma. Aí fico sem saber como reagir quando alguém me abraça. CAMPEBELL (2020, p.64)[11]
O escritor destaca também a suspeita de que Manfred, que era engenheiro da Dersa, órgão do estado de São Paulo responsável pela obra do Rodoanel, poderia ter se envolvimento com corrupção. O esquema foi descoberto após a morte dele, mas o jornalista lembra que contas no exterior não foram bem explicadas.
É importante saber que todo crime possui uma narrativa que o fez acontecer devido ao fato de toda pessoa possuir uma história, isso faz com que outras pessoas também se liguem ao acontecimento e que essas pessoas talvez também não queiram reviver o passado doloroso. No caso Richthofen, existe o irmão de Suzane, Andreas, que é quem mais sofre com a fama adquirida contra sua vontade. Portanto, esquecê-la é um serviço também a seus parentes.
DOBJENSKI (2019, p.88)[12] enaltece que a mídia, influencia de maneira direta, toda a sociedade principalmente quando o fato apresentado pode lhes proporcionar lucros exorbitantes e muitas vezes ocorrem o conluio dos operadores do Direito para que isso se fundamente, tornando o fato um instrumento midiático, mostrando que através da mera reprodução de imagens um povo pode ser coagido.
Na obra em comento Ullisses Campbell utiliza a técnica do jornalismo literário e, a todo o momento, reproduz diálogos, nem sempre muito convincentes, mesmo sem ter tido contato com alguns dos envolvidos. Ele explica que reconstruir os diálogos foi a segunda tarefa mais árdua ao escrever o livro: Me inspirei em Truman Capote em 'A Sangue Frio'. Foi difícil, mas me baseei em muitas horas de depoimentos e laudos que são escritos em 1ª pessoa.
O livro explora também a temática da sexualidade dos assassinos confessos. O escritor conta até um episódio em que Cristian fratura o pênis em um dos encontros íntimos com a namorada na cela e romances homossexuais de Suzane e até mesmo de Cristian na cadeia.
As constantes ameaças sofridas por Suzane, até mesmo de integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital) nas penitenciárias por onde ela passou, são descritas na obra. Mesmo tendo cometido um crime que não é perdoado pelas detentas ela assassinou os pais , Suzane se safa das emboscadas. Para sobreviver, ela usa como arma a sedução e não morreu também porque soube fazer os conchavos com as pessoas certas em todas as penitenciárias onde cumpriu parte da pena, revelou o jornalista.
Para demonstrar o quanto Suzane é manipuladora, ao longo do livro, vários episódios são citados, como a amizade com Amanda, colega de faculdade usada por ela para acobertar dos pais o romance com Daniel. Campbell afirma que ela manipula as pessoas emocionalmente, ataca no ponto fraco. Em um momento, ela até fez Daniel achar que estava no controle da situação.
O jornalista revelou que até mesmo ele quase foi vítima da astúcia de Suzane: Quando eu ainda estava na Revista Veja, tentei fazer uma sessão de fotos com ela, que pleiteava a mudança para o regime aberto, mas ela disse que só toparia se a reportagem fosse positiva.
O introvertido irmão de Suzane, Andreas Von Richthofen, que num só dia perdeu a mãe, o pai, o convívio da irmã e o melhor amigo Daniel, também é citado no livro, mas não tem grande destaque porque não foi ouvido pelo autor. As passagens referentes a ele foram construídas com base em depoimentos. Hoje ele é um bioquímico muito respeitado, com convites para trabalhar no exterior, informou Campbell.
Suzane namora Rogério Olberg desde 2015 e, nas saidinhas, vai com ele para Angatuba, a 200 km da capital paulista. A mente de Suzane é um mistério. Acredito que ela usa esse namorado porque não tinha para onde ir. Inicialmente, ela desdenha de Rogério. A família dele está dividida: metade acredita no amor de Suzane, a outra não.
Daniel Cravinhos hoje está casado e cumpre pena em liberdade. O irmão Cristian está novamente preso por suborno policial, que nada mais que um crime é de conduta, para o magistrado, há o entendimento de que o crime de corrupção ativa é consumado com o conhecimento, pelo funcionário, do oferecimento ou promessa de vantagem indevida e por desrespeitar as regras do semiaberto. Suzane luta ainda pela tão aclamada liberdade.
O jornalismo pode ser um agente de mudanças dentro da sociedade, e ele deve estar a favor do cidadão. É importante frisar que deixar de veicular uma reportagem como a do gênero não é estar contra o cidadão, pois a sociedade não precisa ser protegida de pessoas que já foram condenadas e estão cumprindo suas penas, já que essas pessoas estão em processo de ressocialização e, em certo tempo, irão estar prontas para retornar ao convívio social. Portanto, é um direito do sujeito de não ser lembrado coletivamente e não ter sua dignidade maculada bem como sua vida exposta em troca de dinheiro por seus algozes.
Sendo assim, a imprensa se comporta como culpada pelo direito ao esquecimento não ser aplicado. Pois a perseguição que os veículos ditos jornalísticos fazem enquanto a pessoa cumpre sua pena reforça estereótipos; como o de que uma vez que cometeu um delito, sempre irá fazê-lo, quando essa máxima é mentirosa, afinal, após o cumprimento da pena, a pessoa pode ser ressocializada e suas chances de cometer um delito novamente são as mesmas de qualquer outra pessoa.
Assim é notório que os meios de comunicação têm imensa responsabilidade ao enaltecer em suas telas, páginas a análise e a disseminação das sensações de temor social podendo dessa forma gerar consequências danosas ao condenado e a sociedade em geral, visto que hoje se vê uma população alienada, que acompanha os noticiários, os relatos, as séries, enfim trarão para o seu cotidiano os mocinhos e vilões dos crimes da vida real.
Para tanto, se faz necessário chamar a atenção para uma parcela da sociedade constantemente marginalizada e que é vista por muitos como não detentora de direitos, como os condenados em crimes de homicídio, de maneira que cabe a sociedade pautar o que vai estar na mídia e, para isso, deve ser estimulada a valorizar o direito ao esquecimento como forma de proteção aos direitos humanos, os direitos que devem ser de todos nós.
- Pós graduanda em Direito Penal Econômico. Centro Universitário Uninter. Especialista em Direito Penal e Criminologia Centro universitário Uninter. Pesquisadora do Grupo Máximo Pavarine. Guerreira do Júri. Idealizadora e proprietária da @Sd JurisAdv.
- SANTOS, Gabriel Souza dos. A mídia e o direito ao esquecimento em crimes de grande repercussão: uma análise do caso Richthofen. Universidade de Brasília. Brasília. 2019. Disponível em: https://bdm.unb.br/bitstream/10483/28009/1/2019_GabrielSouzaDosSantos_tcc.pdf. Acesso em: 27/01/2022.
- BRASIL. Constituição da República federativa do Brasil. Texto Constitucional promulgado em 05 de outubro de 1988, com alterações determinadas pelas Emendas constitucionais de Revisão nº 1 a 6/94, pelas Emendas Constitucionais n° 1/92 a 90/2015 e pelo Decreto Legislativo nº 186/2008. Brasília. Senado Federal. 2015.
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