Por Christiano Sobral*
Cada dia mais se fala mais em contratos inteligentes, com claro desvio do real sentido da proposta. Quase como se estivesse se transformando em uma palavra da moda, que perde o sentido com o tempo e o mau uso.
Antes de tudo, trata-se de um contrato; o que exige que as partes sejam capazes para firmá-lo e o objeto do contrato seja lícito. Não tendo validade, por exemplo, um contrato que possibilite a menores adquirirem bebidas alcoólicas, como uma máquina de vendas automática para bebidas que não trave quando o comprador for um menor.
Isso impede, por exemplo, que um contrato de longo prazo, como o Contrato Social de uma empresa, seja regido por um formato automático. Isso por as partes capazes hoje não necessariamente serem amanhã, e a estrutura de cláusulas lícitas hoje poderem deixar de ser por meio de uma alteração contratual.
Um contrato inteligente é, a rigor, um que é auto executável. Ou seja, se realiza sozinho, atingindo automaticamente seus objetivos, o que envolve, no fim, a redução de intermediários.
Imagine a evolução de um serviço já bem conhecido como o de aplicativo de transporte com uso de carros particulares. No modelo atual existe o cliente, o intermediário que gerencia as corridas e o intermediário que gerencia o pagamento. Num modelo de contrato inteligente, só existiria o cliente e o aplicativo.
A solicitação do carro dispararia o contrato de prestação de serviço, a confirmação de ingresso será como o aceite do prestador e, na finalização da viagem, automaticamente valores seriam transferidos de uma carteira digital (a do cliente) para a outra (a do motorista). Observe que não teríamos mais o gerenciador das viagens e nem a figura da operadora de cartões de crédito validando a forma de pagamento.
Hoje, por exemplo, já é possível comprar um Tesla pelo aplicativo, que dispara um contrato de montagem, que aciona contratos de fornecimento de peças, que gera um outro de fornecimento logístico e que, por fim, indica onde o carro será deixado (local próximo a sua casa), operacionaliza o pagamento e, pelo mesmo aplicativo, você abre o seu carro e começa a experiência de dirigir um computador sobre rodas. Nada de papeis, vendedores, concessionárias e também estoques excedentes.
Em ambos os exemplos a grande vantagem é, com a redução do número de intermediário, redução do custo total da transação. Ou seja, o que você gastaria com uma simples viagem de aplicativo, por não ter que remunerar nem o aplicativo nem a operadora de cartão de crédito, já poderia ser 25% mais barata; sendo ainda maior o ganho na escala exemplificada da compra do veículo.
Ainda que hoje não seja popular o uso de moedas digitais e carteiras digitais, a opção do PIX pode ser incluída, o que já reduz um pouco a interação e validação bancária. Em especial quando surgir a versão do PIX com pagamento a prazo (como cartão de crédito).
O principal ponto com a mudança que essa modalidade de contrato é a relação de confiança. Afinal, hoje, confiamos na empresa de serviços de transporte por aplicativo para garantir que a viagem ocorra e essa confia na instituição financeira para que o valor a que tem direito lhe seja transferido. Com o contrato inteligente isso muda, passando a ser na tecnologia que se direcionará a confiança.
*Christiano Sobral é Diretor Executivo do Urbano Vitalino Advogados, Law Master em Direito Digital, mestre em Estratégia e especialista em marketing, finanças, economia e negócios. Advogado, administrador e programador.