Eu sou tímida e ousada ao mesmo tempo: Clarice Lispector e o Direito à timidez.

26/02/2022 às 19:32
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Desabrocho em coragem, embora na vida diária continue tímida. Aliás sou tímida em determinados momentos, pois fora destes tenho apenas o recato que também faz parte de mim. Sou uma ousada-emcabulada: depois da grande ousadia é que me encabulo. - Clarice Lispector

A escritora e jornalista Clarice Lispector - autora de romances, contos e ensaios - é considerada um dos maiores nomes da literatura brasileira do século XX. Em sua obra nomeada de Vergonha de Viver ela propala ter sido uma criança muito tímida, mas uma tímida ousada. Em um fragmento da obra ela traz à tona momentos de solidão e de não pertencimento à quarta dimensão. "E quando eu era pequena em Recife meu encabulamento nunca me impediu de descer do sobrado, ir para a rua, e perguntar a moleques descalços: Quer brincar comigo? Às vezes me desprezavam como menina". Esse não pertencimento em diversas searas da vida é como um sinal colocado no início de uma nova pauta, o pertencer surge como um anseio, como uma necessidade. É tamanha essa fome humana por pertencer que acaba sendo visitada pelo seu contrário. De acordo com Clarice, ela nasceu da graça, nasceu gratuitamente como se fosse gruxa.

Entre o sentimento de pertencimento e não pertencimento, entre a missão e a questão, entre as pessoas e seus mistérios, entre mundos, brota-se a solidão. Clarice não gostava de ficar dentro de casa, era sufocante, era um afogamento repentino, ela gostava de andar, de sentar em frente a sua casa e esperar que alguém passasse e aceitasse seu convite para brincar. Além disso, não dispensava, sob hipótese alguma, o encontro com outros amigos, aqueles do mundo animal. Adorava a companhia deles, caso não tivesse nenhum, satisfazia-se com as formigas que em algum lugar trabalhavam.

A timidez traz uma bagagem de contrariedades, pode-se dizer que é a análise do fenômeno através da manifestação, dentre elas a solidão. A solidão é uma velha conhecida, companheira dos momentos de vida de qualquer ser humano. Para sentir solidão você não precisa estar sozinho. Todavia, o estado de solidão dá sentido aos encontros e faz com que se acentue a necessidade do outro.

Desrespeitar a timidez é ultrajar o princípio da dignidade da pessoa humana, na Carta Magna de 1988, o princípio encontra-se elencado no art. 1°, III, materializando-se em fundamento da República Federativa do Brasil e em competência matriz dos direitos e garantias fundamentais. É a dignidade a presunção da concepção de democracia, justiça social e igualdade. Sendo inerente a condição de pessoa e não admitindo tonalidades. Diante disto, entende-se que todas as pessoas possuem idêntica dignidade, sendo irrenunciável e inalienável.

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