Palavras-chave: Discrminação. Homofobia. Transfobia
Introdução
Este artigo pretende esboçar algumas das reivindicações da população LGBTQIA+ relacionadas à violência e estabelecer uma análise da participação da travesti Linn da Quebrada no BBB 2022 enquanto voz de milhares de travestis e mulheres transgêneros vítimas de violência, discriminação e preconceito.
A metodologia deste trabalho é pautada sob dois aspectos, em primeiro lugar pesquisa bibliográfica. Desse modo, houve uma busca por diversos artigos e monografias, através de sites especializados nas buscas acadêmicas como o Google acadêmico e o SCIELO. Em segundo, plano a pesquisa é pautada na observação do programa de televisão denominado Big Brother Brasil 2022 analisando a participação do travesti Linn da Quebrada que tem protagonizado a voz da comunidade transgênero na luta contra a discriminação de gênero.
Este estudo tem por objetivos analisar a participação de Linn da Quebrada enquanto voz que protagoniza a luta contra a discriminação de mulheres transgêneros e travestis trazendo uma perspectiva pautada em algumas conquistas para esta população no judiciário.
As reivindicações da população LGBTQIA+: uma busca constante pelo fim da discriminação e violência
A noção de Direitos Humanos é compreendida como os direitos pelos quais todos estão resguardados desde o nascimento, cabendo ao Estado assegurar o respeito e a segurança, por meio de acordos, convenções, leis e tratados nacionais e internacionais.
Inúmeros documentos existem para assegurar a defesa e a realização das práticas de proteção a tais direitos, como por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Constituição Federal do Brasil de 1988, na qual são destacados os princípios constitucionais visando assegurar a proteção do Estado aos Direitos Humanos de todos os brasileiros (BASTOS et al., 2017, p. 3).
Já o preconceito e a discriminação nascem quando não se aceita a condição da outra pessoa. A Constituição de 1988 por sua vez diz todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza [...] (art. 5º caput) em consonância o art. 3º, IV da Constituição Federal, dispõe que, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, está: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Em que pese a proteção constitucional, o preconceito e a discriminação são latentes no Brasil. No caso da homofobia, o preconceito vem a partir do incômodo que gera a orientação sexual de outro ser humano e nesse aspecto Varella (2018, p. 5) comenta:
Que diferença faz para você se o seu vizinho dorme com outro homem, ou se sua vizinha é apaixonada pela colega de escritório, se faz diferença para você procura um psiquiatra [...] duas pessoas se amam e são do mesmo sexo, o que isso me atinge? Você vai discutir esse comportamento como se fosse aberração da natureza? Homossexualidade existe com todos os mamíferos, uma condição biológica. Você não chega a uma fase da vida onde você se pergunta o que serei? homossexual ou heterossexual? A sexualidade é, ela se impõe daquele jeito, temos mulheres e homens que gosta do mesmo sexo e entre esses dois extremos temos uma gama enorme de comportamento sexuais, o que não podemos é impor nossa condição para os outros.
É exatamente por conta desse incômodo social que muitos homossexuais estabelecem verdadeiras muralhas de proteção, para impor respeito visto que constituem um grupo historicamente excluído da sociedade. Por isso a relevância criminalização, pois se todos se tratassem igualmente não haveria preconceito (SILVA, 2019, p. 15). Nesse sentido, a problemática da crescente violência contra esta população suscita diversas reflexões importantes para a compreensão do processo de institucionalização dos direitos de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans e outros (LGBTQIA+). A leniência legislativa acaba por contribuir o já elevado número de casos violentos contra esta minoria.
Não bastasse a cruel realidade que a discriminação impõe aos indivíduos, a homofobia é uma versão mais agressiva de discriminação, aqui definida como rejeição, aversão, medo ou ódio irracional aos homossexuais e, por extensão, a todos os que manifestem orientação sexual ou identidade de gênero diferente dos padrões heterossexuais ainda aceitos como normativos na nossa sociedade.
Nesse sentido,
comportamentos homofóbicos variam desde a violência física da agressão e da violência fatal, isto é, o assassinato, até a violência simbólica e/ou psicológica nos atos de xingar, ridicularizar, apelidar, excluir do grupo ou até mesmo afirmar que não gostaria de conviver/frequentar qualquer espaço com uma pessoa homossexual. (KOEHLER, 2013, p. 10)
No que diz respeito aos direitos do grupo LGBTQIA+ no Brasil a legislação ainda é morosa, razão pela qual suas conquistas jurídicas deram-se por meio de da conjugação dos princípios fundamentais relativos aos direitos humanos e à dignidade.
Assim sendo, as tutelas desta parcela da população são capitaneadas em lutas pelos movimentos sociais, Ministério Público e em certa medida o Judiciário.
Estudo que analisou a vulnerabilidade legislativa das leis federais específicas para sete grupos minoritários (idosos, pessoas com deficiência, LGBT, índios, mulheres, crianças e adolescentes) identificou que apenas a população LGBT apresentou fraca proteção legislativa, ou seja, nenhuma lei federal na área cível, processual, penal, administrativa e trabalhista (Paula apud Nelson, 2019, p. 2)
A partir dessa fragilidade legislativa é que alguns projetos começaram a tramitar no Congresso Nacional a partir de 1995, entretanto, esbarraram em questões religiosas, o que provocou um encolhimento nos debates.
As conquistas no judiciário da comunidade LGBTQIA+
A comunidade LGBTQIA+, que assim pode ser determinada para caracterizar lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, queer, intersexuais, assexuais dentre outras, nasceu com intuito de reunir forças e lutar contra a homofobia existente há séculos e que coloca o Brasil como o país com maior número de casos de homofobia no mundo.
Portanto, é urgente e imperativo traçar estratégias que visem a proteção aos de direitos humanos e a garantia de segurança das pessoas LGBTQIA+.
Uma das principais reivindicações de militantes LGBTQIA+ no país é a criminalização de condutas contra esta minoria haja vista o crescente aumento de casos de violência. Muitas foram as ações solicitaram que o STF fixasse um prazo para que fosse criada uma lei ou que a própria Corte regulamentasse temporariamente a questão até haver uma decisão do Congresso,
Os ativistas acreditam que somente o Código Penal não é suficiente hoje para proteger a população LGBTQIA + e almejam que a homofobia e transfobia tenham tratamento igual a crimes cometidos contra mulheres posto que não encontram previsão na legislação penal brasileira, ao contrário de outros tipos de preconceito.
Este apelo social a que esta parcela da população reclama não é sem razão e as políticas públicas necessariamente passam por questões sobre gênero, sexualidade e raça nas escolas. Destarte, trata-se de construir uma nova mentalidade para que crimes contra a diferença desapareçam.
É também em razão de se estabelecer novos paradigmas sociais que enfraqueçam discursos e ações de ódio que este tema deve ser constantemente visitado e discutido socialmente, tendo em vista que neste tipo de demanda o que se reclama é o próprio sentido de dignidade e direitos humanos.
Considerando que grupos minoritários, grandes vítimas de preconceito e violência, necessitam de uma proteção especial do Estado, considerando que o texto da Constituição (1988), em seu art. 5º, XLI, prevê que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais, ainda assim o aumento da violência contra a população LGBTQIA + colocou o Brasil como o país que mais mata gays no mundo.
Em um momento que o país vive índices alarmantes de empobrecimento, desemprego, inflação e instabilidade econômica e política, a luta contra a violência e às violações de direitos humanos é difícil, em especial quando estes vem sendo impactados por fatores sociais.
Violências contra a população LGBTQIA+ estão presentes nas diversas esferas de convívio social e suas ramificações adentram no universo familiar, escolas, igreja, na rua, no posto de saúde, na mídia, nos ambientes de trabalho, nas forças armadas, na justiça, na polícia, e nos mais diferentes segmentos do poder público incluindo a falta de políticas de combate à violência, sendo, portanto, um clamor social que merece atenção para reduzir atos homofóbicos violentos.
É nesta inteligência que a lei vem como proteção, pois ela existindo, as pessoas passarão a olhar de maneira mais respeitosa resduzindo então as questões de homofobia e transfobia.
Outrossim, os crescentes casos de violência contra a população LGBTQIA+ demonstram omissão e inércia do Poder Legislativo na criação de leis para combater a prática de homofobia que afastando-se da sua função típica de legislar, deixou assim de garantir um dos objetivos da Constituição Federal, de 1988, qual seja promover o bem de todos sem qualquer preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Em contrapartida à inércia do legislativo, na esteira do chamado Ativismo Judicial pelo STF equiparou a homofobia ao crime de racismo, a ADO nº 26 o que configurou um novo paradigma social com vistas a enfraquecer discursos e ações de ódio. Políticas públicas tais quais a do STF, que protejam a população LGBTQIA+ são imperativas.
Outra conquista importante veio com uma Resolução do Conselho Federal de Medicina em 2002 que possibilitou e autorizou a cirurgia de mudança de sexo em que do ponto de vista médico-clínico deixa de ser lesão corporal grave passando a ser reconhecidamente uma cirurgia (Chaves, 2017). Esta autorização traduz-se em uma vitória à população transgênero que pode incumbir-se da direção do seu corpo, mudar o nome e assumir a identidade à qual melhor atende à sua individualidade.
Por último, apesar de haver nem precedentes tão pouco entendimento unânime na Justiça, a possibilidade de estender a Lei Maria da Penha, antiviolência doméstica, para mulheres transexuais afigura-se como vitória, mas necessita de regulamentação. O Ministério Público Federal por sua vez defende esta aplicação, de forma que mesmo não havendo regulamentação, este reconhecimento é importante dado o cenário assombroso de violência contra transgêneros no Brasil.
Isto posto, falemos adiante da participação da travesti Linn da Quebrada e sua importância enquanto voz desta parcela que anseia em ser ouvida.
A participação da travesti Linn da Quebrada na televisão Uma voz para uma multidão
Um dos programas de reality show mais assistidos nas casas dos brasileiros o Big Brother Brasil em sua versão nº 22 conta a participante travesti, Linn da Quebrada, que tem levantado a voz para que novas construções sociais que quebrem a discriminação em relação à população transgênero e travesti.
Cativando milhares ao discursar com firmeza, Linn mostra à sociedade de forma cristalina, a ponta do iceberg para que grandes mudanças ocorram na base da sociedade.
Em diversos episódios os diálogos confrontam toda a discriminação sofrida pela comunidade transgênero, cujos preconceitos, por vezes iniciam no seio familiar, mas perpetuam nos diversos segmentos da sociedade como escola, trabalho, lazer e tantos outros.
Linn da Quebrada a cada dia mostra-se como a voz silenciada de tantos outros travestis ou transgêneros que padecem em uma sociedade que discrimina em razão da opção sexual, cor da pele, pobreza e tantas outras situações que fazem uma parcela da população ser excluída.
Em uma das discussões entre os participantes do programa, a travesti demonstrou sua satisfação em ser travesti e que a sociedade precisa debater o que travestis e transgêneros mulheres aproximam-se de mulheres cisgênero e não centralizar no que as afasta.
Este é também o pensamento da ANTRA1 conforme postagem em rede social
A subalternidade alcança mulheres de diversas formas e é um grande desafio para os feminismos (e para feministas) enxergar e enfrentar a subalternidade das mulheres sem hierarquizar a dor que sentimos. Dor é dor. Dor e opressão não se discutem! A subalternidade de gênero que alcança as mulheres cis é a mesma que nos mata. Que nos silencia e nega a nossa identidade. Que nos proíbe de usar banheiros. Que permite sermos espancadas a luz do dia ou esquecidas por anos no cárcere. Nos nega o direito ao afeto. Nos nega um lugar, um nome, uma família. Que nos fetichiza, explora e abusa de nossos corpos. Travestis e mulheres Trans sempre estiveram em lugar de subalternidade. E sair dele tem sido uma tarefa bem difícil. Sempre fomos colocadas em um lugar de uma completa invisibilidade e ocupamos o lugar da hipervisibilidade negativa quando exploram a subalternidade e os processos de marginalização de nossa população em detrimento de nossas conquistas. A identidade de gênero feminina das travestis e mulheres Trans não deveria ser assunto de discussão, especialmente no feminismo. Pois ele também é o nosso lugar. Deveríamos discutir formas de enfrentar JUNTAS a violência de gênero, o cissexismo, a transfobia, a misoginia, o Racismo e os desafios de ser mulher em uma sociedade machista, racista, colonial, neoliberal e patriarcal. Não excluam as Travestis e Mulheres trans dos espaços de luta. Nossa luta não atrapalha em nada a luta de qualquer outra mulher. E a nossa força é suficientemente capaz de contribuir grandiosamente com os feminismos. Lutemos juntas! (ANTRA, 2022)
Este texto é um apelo justo e digno. A sociedade já não pode mais fechar os olhos aos direitos desta sofrida parcela da população. Não se trata de ter pena, trata-se de dignidade, um direito a todos assegurado pela Constituição, mas ainda remoto para milhares. Nossa sociedade não pode continuar a querer determinar o que o outro deve ou não escolher, caso contrário, não estamos em um Estado democrático de direito.
Conclusão
É notável que temos muito que melhorar não só em termos de legislação, mas também enquanto sociedade. O Brasil negativamente consagrado como país que mais mata gays no mundo parece adormecido a este fato. É por esta razão que movimentos sociais são importantes ao levar à sociedade de alguma forma a conscientização de forma a minar dia a dia toda sorte de discriminação, preconceito, violência e agressão. Entretanto, Linn da Quebrada tem feito este papel de forma brilhante ao mostrar ao Brasil que mulheres cisgênero, e transgênero e travesti têm muito em comum ao se unirem no propósito de minguar toda e qualquer tipo de violência, pode-se construir uma sociedade equânime.
Referências
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BASTOS, Gustavo Grandini; GARCIA, Dantielli Assumpção; SOUSA, Lucília Maria Abrahão e. A homofobia em discurso: direitos humanos em circulação. Linguagem em (Dis)curso LemD, Tubarão, SC, v. 17, n. 1, p. 11-24, jan./abr. 2017.
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KOEHLER, Sonia Maria Ferreira. Homofobia, cultura e violências: a desinformação social. INTERACÇÕES NO. 26, PP. 129-151 (2013 Número Especial).
NELSON, DULCINÉA PEIXOTO et al. Demanda judicial da população transexual na 2ª Instância do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro: uma análise das decisões até 2017. Physis: Revista de Saúde Coletiva [online]. 2019, v. 29, n. 03 [Acessado 14 Fevereiro 2022] , e290308. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0103-73312019290308>. Epub 25 Nov 2019. ISSN 1809-4481. https://doi.org/10.1590/S0103-73312019290308.
CHAVES, Débora Caroline Pereira. Afinal, quem sou eu para o Direito. Reflexões sobre a tutela do transgênero no Brasil, v. 1, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.
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VARELLA, Dráuzio. O que disse Dráuzio Varella à BBC sobre aborto e homossexualidade. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=luBVQtbXSv0>. Acesso em 12/08/2019.
Notas
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1 A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), é uma rede nacional que articula em todo o Brasil 127 instituições que desenvolvem ações para promoção da cidadania da população de Travestis e Transexuais.
A missão da ANTRA é: Identificar, Mobilizar, Organizar, Aproximar, Empoderar e Formar Travestis e Transexuais das cinco regiões do pais para construção de um quadro político nacional a fim de representar nossa população na busca da cidadania plena e isonomia de direitos. (Assembléia da ANTRA, Teresina-PI/ Maio 2009). Disponível em: https://antrabrasil.org/sobre/. Acesso: 02/03/2022