16 Mitos e Verdades sobre a Cessão de Direitos Hereditários

20/03/2022 às 17:07

Resumo:


  • A cessão de direitos hereditários deve ser feita por instrumento público, conforme o artigo 1.793 do Código Civil, e é permitida, podendo ser realizada sem autorização judicial, mas sua eficácia fica condicionada a evento futuro e incerto.

  • É possível realizar a cessão de direitos hereditários de forma gratuita ou onerosa, e qualquer cartório de notas pode lavrar a escritura correspondente; contudo, a cessão não garante o recebimento da herança e a transferência de imóveis só é efetivada após a realização do inventário.

  • Impostos podem incidir sobre a cessão, sendo ITBI para cessões onerosas e ITCMD para as gratuitas. A cessão pode ser parcial ou total e permite até a usucapião, não se restringindo apenas a bens imóveis, e deve ser feita após a abertura da sucessão e antes da homologação da partilha.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A Cessão de Direitos Hereditários é um importante instrumento posto à disposição de quem precisa resolver questões relacionadas a INVENTÁRIO, PARTILHA e HERANÇA e, por exemplo, não pretende esperar o desfecho de um procedimento que pode demorar anos. Através dela o "direito hereditário" pode ser vendido ou doado, mas importantes questões devem ser consideradas em torno desse instrumento jurídico, componente do Direito Sucessório, delineado nos artigos 1.793 e seguintes do Código Civil. A seguir, sem pretender de maneira alguma esgotar o assunto interessantíssimo, falaremos sobre alguns mitos e verdades, convidando desde já os colegas ao estudo da matéria:

1. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS PODE SER FEITA POR INSTRUMENTO PARTICULAR OU ESCRITURA PÚBLICA - MITO: a regra do art. 1.793 do CCB é clara - somente por INSTRUMENTO PÚBLICO pode ser realizada a Cessão de Direitos Hereditários. Em que pese muitos colegas ainda realizarem documentos como "Contrato Particular de Cessão de Direitos Hereditários" a lei condena com NULIDADE tal instrumento por infringir a regra que exige tal formalidade;

2. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS É PROIBIDA - MITO: mito que sempre ouço, desde os tempos do Cartório, inclusive - e lamentavelmente - da boca de colegas advogados desinformados: a Cessão de Direitos Hereditários nunca foi PROIBIDA. O que existe - e vamos falar abaixo - são diversas regras que delimitam sua realização. Como é um instrumento complexo não duvido que muitos CARTORÁRIOS torçam o nariz para sua realização e com isso, em verdadeiro DESSERVIÇO disseminam a desinformação de que não é possível realizar Cessão de Direitos Hereditários. Não caia nessa: leia o art. 1.793 do Código Civil;

3. A CESSÃO DE DIREITOS PODE SER FEITA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - VERDADE: em que pese a regra do art. 1.793 falar em "autorização judicial" não se pode taxar de NULO ato onde a lei cuidou de INEFICÁCIA. São aspectos distintos, como muito bem ensina o saudoso mestre ZENO VELOSO e explicamos no post https://juliocarvalho.jusbrasil.com.br/artigos/1149943889/e-validaacessao-de-direitos-hereditarios... inclusive com base em decisão muito clara do STJ (REsp 1809548/SP, j. em 19/05/2020) que assentou: "NÃO É NEGÓCIO JURÍDICO NULO, tampouco inválido, ficando apenas a sua eficácia condicionada a evento futuro e incerto";

4. QUALQUER CARTÓRIO DE NOTAS PODE FAZER A ESCRITURA DE CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - VERDADE: a lei não exige um Cartório de Notas específico (seja o do domicílio dos herdeiros, último domicílio do morto ou ainda, o local da situação dos bens) para que seja realizada a Cessão de Direitos Hereditários;

5. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS PODE SER FEITA DE FORMA GRATUITA OU ONEROSA - VERDADE: de fato, a Cessão de Direitos Hereditários entabula e concretiza um negócio jurídico onde os herdeiros alienam os seus direitos à herança de certo "de cujus". Essa transferência pode ser feita de modo oneroso (POR VENDA) ou gracioso (POR DOAÇÃO) - sendo importantíssimo atentar para o fato de que a cessão onerosa atrairá as regras do contrato de COMPRA E VENDA (art. 481 e seguintes) e a cessão graciosa atrairá as regras do contrato de DOAÇÃO (art. 538 e seguintes). Isso é muito importante especialmente quando se tratam de PARENTES realizando esse instrumento. FIQUE ATENTO (A)!

6. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS ME GARANTE O RECEBIMENTO DE HERANÇA - MITO: muito CUIDADO! A Cessão de Direitos Hereditários exemplifica um nítido negócio jurídico ALEATÓRIO: não se garante o recebimento de heranças. EVIDENTE que o cessionário/comprador/donatário deverá adotar as CAUTELAS para não realizar um mau negócio, mas até aqui não há nada de diferente dos ALTOS RISCOS que envolvem qualquer transação imobiliária. Como já falamos outras vezes, a ÁLEA faz parte desse tipo específico de negócio de modo que todo cuidado deve ser redobrado e uma importante dica pode ser a inserção de ressalvas;

7. A LEI EXIGE PAGAMENTO DE IMPOSTO NA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - VERDADE: efetivamente por ser tratar de uma operação/transação patrimonial (ainda que meramente "herança", "direitos hereditários") haverá incidência tributária podendo ser ITBI (se onerosa) ou ITCMD (se graciosa). Observe-se, ainda, que para ceder o cedente precisa antes receber a herança - assim, haverá ITCMD pelo recebimento da herança;

8. COM A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS FEITA JÁ ESTÁ RESOLVIDA A TRANSFERÊNCIA DOS IMÓVEIS - MITO: de forma alguma a cessão de direitos conclui a transferência de bens deixados pelo morto. Ela apenas habilita os interessados a ingressarem no Inventário para receberem herança caso essa seja existente, no lugar dos cedentes - sendo importante que o INVENTÁRIO - judicial ou extrajudicial - seja levado a efeito. Não custa repetir: é NEGÓCIO ALEATÓRIO; muito cuidado;

9. É NECESSÁRIA A PRESENÇA DE ADVOGADO PARA A REALIZAÇÃO DA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - MITO: como se percebe na leitura do art. 1.793 do CCB em nenhum momento a Lei exige a presença de Advogado para a realização da Cessão de Direitos Hereditários - porém, como cautela geral - é muito recomendável que antes da realização de um negócio jurídico de tal importância um ADVOGADO ESPECIALISTA seja consultado e assista a operação;

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10. É POSSÍVEL O INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL FUNDADO NA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - VERDADE: com toda certeza será possível realizar o INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL baseado na Cessão de Direitos Hereditários. O Inventário Extrajudicial como sabemos é aquele que tem regras na Lei 11.441/2007 e, especificamente no artigo 16 temos uma regra expressa de admissão: "Art. 16. É possível a promoção de inventário extrajudicial por cessionário de direitos hereditários, mesmo na hipótese de cessão de parte do acervo, desde que todos os herdeiros estejam presentes e concordes";

11. NÃO É POSSÍVEL REALIZAR PROMESSA DE CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - MITO: a "Promessa de Cessão de Direitos Hereditários" é um tipo de contrato preliminar e, nessa toada, observa as regras do art. 462 do Código Civil, sendo importante recordar que por tais razões - aqui sim - em sede de contrato preliminar, será admitida a pactuação por INSTRUMENTO PARTICULAR: "Art. 462. O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado";

12. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS PODE SER PARCIAL OU TOTAL - VERDADE: o acervo hereditário pode ser cedido de forma total ou parcial. Isso é importante já que, havendo CESSÃO TOTAL o comparecimento dos herdeiros no Inventário será DESNECESSÁRIO; já na hipótese de CESSÃO PARCIAL dos direitos hereditários o comparecimento é necessário. Decisão da VRP-SP já tratou do assunto ( 0057201-87.2013.8.26.0100) com muito acerto;

13. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS PERMITE A USUCAPIÃO INCLUSIVE - VERDADE: a finalidade mesmo da Cessão de Direitos Hereditários é permitir com que o acervo recebido pela saisine seja alienado pelos herdeiros e a realização do direito adquirido seja resolvida no bojo de um INVENTÁRIO JUDICIAL ou EXTRAJUDICIAL, todavia diversos precedentes reconhecem, excepcionalmente, a possibilidade de USUCAPIÃO arvorada em Cessão de Direitos Hereditários. Essa tese encontra-se prestigiada no art. 13 do PROVIMENTO CNJ 65/2017 que, em sede de USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL, admite o pedido fundado em "Escritura de cessão de direitos hereditários, especificando o imóvel";

14. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS SE PRESTA SOMENTE PARA BENS IMÓVEIS DEIXADOS PELO DEFUNTO - MITO: o que se transaciona na Cessão de Direitos Hereditários são os direitos dos herdeiros relacionados a herança deixada pelo morto que, na exata expressão do art. 80, inc. II do CCB considera-se IMÓVEL. Por tal razão a Lei exige a ESCRITURA PÚBLICA, porém, não significa dizer que terá lugar a Cessão de Direitos Hereditários apenas quando o acervo for composto de BENS IMÓVEIS. A herança (direito à sucessão aberta) por si só é considerada IMÓVEL para fins legais, mesmo sendo composta por BENS MÓVEIS;

15. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS E DIREITOS DE MEAÇÃO SÃO COISAS DISTINTAS PORÉM ENTRELAÇADAS EM MUITOS CASOS DE INVENTÁRIO - VERDADE: outro cuidado que deve ser observado na análise do caso concreto diz respeito à existência de DIREITOS DE MEAÇÃO além dos DIREITOS HEREDITÁRIOS. Como já falamos em diversas passagens, enquanto o direito hereditário é oriundo do Direito das Sucessões, o direito de meação tem raízes no Direito das Famílias: aberta a sucessão pode ser que no caso se descortinem HERANÇA e MEAÇÃO e o interessado na aquisição do bolo somente alcance o resultado pretendido se adquirir esses dois feixes de direitos;

16. A QUALQUER MOMENTO POSSO FAZER A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - MITO: a cessão de direitos hereditários só pode ser feita depois de aberta a sucessão (ou seja, depois de ocorrido o evento MORTE) e até a homologação da PARTILHA. É que antes de ocorrido o óbito temos expressa proibição legal no art. 426 do CCB (pacta corvina) e a partilha, na forma do art. 2.023 do CCB, porá fim ao estado de indivisão do acervo (ou seja, com a partilha já se resolvem direitos hereditários e cada herdeiro recebe o seu, depois de saldadas eventuais dívidas do morto, cf. regra do art. 1.997).

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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