Alteração nos fatos apresentados pode ocasionar nulidade do auto de infração ambiental?

04/05/2022 às 18:50
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A descrição incorreta de coordenadas geográficas podem anular o auto de infração ambiental da correta imputação dos fatos.

Artigo original em https://advambiental.com.br/nulidade-modificacao-fato-descrito-auto-de-infracao-ambiental/

 

Conforme dispõe o § 1º do artigo 100 do Decreto 6.514/08, a modificação do fato descrito no auto de infração ambiental implica na sua nulidade, por se tratar de vício insanável.

E isso pode ocorrer em casos de indicação incorreta das coordenadas geográficas em infrações ambientais de desmatamento sem autorização ou licença da autoridade competente; supressão, danificação ou destruição de vegetação. Vamos explicar!

Sabe-se que o contraditório e a ampla defesa são princípios assegurados constitucionalmente, os quais devem ser observados em procedimentos administrativos, sob pena de infringir outros princípios com igual status, a exemplo da dignidade da pessoa humana, princípio central do sistema jurídico pátrio.

Por ampla defesa, entende-se o direito que é dado ao indivíduo de trazer ao processo administrativo, os elementos de prova licitamente obtidos, possibilitando o exercício integral do direito de defesa, sendo-lhe assegurado o uso de todos os meios processuais disponíveis para tutelar seus interesses.

Nesse sentido, apesar de o desmatamento sem autorização do órgão ambiental competente constituir infração administrativa ambiental, sua responsabilização depende da correta imputação do fato.

Até porque, o auto de infração ambiental é ato administrativo que goza de presunção de veracidade e legitimidade, cabendo ao particular o ônus de demonstrar a inocorrência da infração ambiental nele descrita, desde que de forma correta.

Requisitos do auto de infração ambiental

Com efeito, a lavratura de auto de infração, enquanto espécie do gênero ato administrativo, necessita atender aos seguintes requisitos/elementos para revestir-se de validade:

  • ser produzido por sujeito competente, segundo a lei (competência);

  • ter por escopo objeto/conteúdo lícito, possível, certo/definido e moral;

  • obedecer à forma prescrita em lei (se houver);

  • buscar finalidade alinhada ao interesse público; e,

  • possuir motivo adequado à fundamentação de sua prática (pressupostos de fato e de direito do ato).

De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro [1]:

Pode-se definir o ato administrativo como a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário.

Motivo é o pressuposto de fato e de direito que serve de fundamento ao ato administrativo. Pressuposto de direito é o dispositivo legal em que se baseia o ato). Pressuposto de fato, como o próprio nome indica, corresponde ao conjunto de circunstâncias, de acontecimentos, de situações que levam a Administração a praticar o ato [2].

Urge ressaltar, que vício insanável é aquele em que a correção da autuação implica modificação do fato descrito no auto de infração, conforme art. 100, § 1º do Decreto 6.514/08.

Assim, constatado que a ausência de um elemento do tipo acarretará uma alteração na conduta, claro está que estaremos diante de um vício insanável.

Vício sanável x Vício insanável

Sobre vício sanável do auto de infração ambiental, dispõe o art. 99 do Decreto nº 6.514/2008:

Art. 99. O auto de infração que apresentar vício sanável poderá, a qualquer tempo, ser convalidado de ofício pela autoridade julgadora, mediante despacho saneador, após o pronunciamento do órgão da Procuradoria-Geral Federal que atua junto à respectiva unidade administrativa da entidade responsável pela autuação.

Parágrafo único. Constatado o vício sanável, sob alegação do autuado, o procedimento será anulado a partir da fase processual em que o vício foi produzido, reabrindo-se novo prazo para defesa, aproveitando-se os atos regularmente produzidos.

O que se entende por vício sanável, por sua vez, decorre da interpretação a contrario sensu do § 1º do art. 100 do mesmo diploma, que assim prevê o dispositivo:

Art. 100. O auto de infração que apresentar vício insanável deverá ser declarado nulo pela autoridade julgadora competente, que determinará o arquivamento do processo, após o pronunciamento do órgão da Procuradoria-Geral Federal que atua junto à respectiva unidade administrativa da entidade responsável pela autuação.

1º. Para os efeitos do caput, considera-se vício insanável aquele em que a correção da autuação implica modificação do fato descrito no auto de infração.

Modificação do fato descrito no auto de infração ambiental lavrado por desmatamento

Embora possível a lavratura de auto de infração ambiental pelo desmatamento de área sem prévia autorização ou licença ambiental, o erro quanto à descrição do fato leva a um vício insanável, que provoca a nulidade da autuação, porquanto componente do próprio tipo, que tem interpretação estrita e que deve ser objetivo e certo, para fins de consecução do contraditório e ampla defesa.

Esse erro na descrição, pode ser, por exemplo, a indicação incorreta das coordenadas que devem ser indicadas pela autoridade fiscalizadora no momento da lavratura do nos auto de infração ambiental, sendo vedado a retificação posterior.

Logo, se as coordenadas fornecidas pela autoridade ambiental no ato da lavratura do auto de infração não se referirem à exata área individualizada na descrição do fato, então sua correção posterior implicará em modificação do fato descrito no auto.

O que se deve ter em mente, é que o autuado precisa ter a ciência exata do fato infracional que lhe é imputado, como por exemplo, as coordenadas, sob pena de cerceamento de defesa.

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Vício insanável: coordenadas erradas

Em se tratando de vício sanável, o defeito do auto de infração pode ser convalidado, não resultando em nulidade do auto. De modo contrário, se insanável o vício, impossível a sua correção, estando fulminado desde a origem, devendo ser declarada sua nulidade, visto que não se admite convalidação pela autoridade competente, pois nulo desde sua concepção.

No caso de desmatamento, ainda que a imputação da infração administrativa seja a mesma desmatamento, supressão, destruição ou exploração de floresta de origem nativa sem aprovação prévia do órgão ambiental competente , se a área em que ela fora desenvolvida não corresponder às exatas coordenadas fornecidas pela autoridade ambiental, de modo que se pode concluir que sua retificação posterior implicaria em modificação do fato descrito.

Possibilidade de lavrar novo auto de infração ambiental

Como se vê, o que se tem, é que o erro na descrição das coordenadas do auto de infração é vício insanável e que, portanto, acarreta no reconhecimento de sua nulidade, apenas sendo possível a imputação do mesmo fato ao infrator se lavrado dentro do prazo prescricional.

A lavratura de novo auto de infração caso constatado vício insanável, inclusive, é prevista no § 2º do art. 100 do Decreto nº 6.514/2008:

2º. Nos casos em que o auto de infração for declarado nulo e estiver caracterizada a conduta ou atividade lesiva ao meio ambiente, deverá ser lavrado novo auto, observadas as regras relativas à prescrição.

Conclusão

Vale destacar, que sendo o auto de infração um ato administrativo, então deve ser adequadamente motivado, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando negue, limite ou afete direitos ou interesses, bem como quando imponha ou agrave deveres, encargos ou sanções.

Portanto, considerando que o erro na descrição do fato imputado ao infrator impossibilita o efetivo exercício do contraditório e da ampla defesa (a exemplo da indicação incorreta das coordenadas geográficas no auto de infração lavrado por desmatamento), e não pode o administrado ser prejudicado por culpa imputada à Administração, então haverá nulidade quando a correção da autuação implicar na modificação do fato descrito no auto de infração ambiental.

[1] Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, 22ª edição, editora Atlas, pag. 196.

[2] Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, 22ª edição, editora Atlas, pag. 210


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Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: [email protected].

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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