Ressaca causa prejuízos e TRF-4 aumenta multa diária a Município

06/05/2022 às 18:01
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TRF4 aumentou o valor da multa imposta ao Município por não acatar a decisão judicial para adotar providências que impeçam o desabamento de casas atingidas pela ressaca

Artigo original em https://advambiental.com.br/ressaca-morro-das-pedras/

 

O Desembargador Federal Rogério Favreto do TRF4 acatou o pedido realizado pelos Advogados Cláudio Farenzena e Adivan Zanchet do escritório Farenzena Advocacia Ambiental que representa o morador, e majorou a multa diária de R$ 1 mil para R$ 5 mil imposta ao Município de Florianópolis, por não cumprir a decisão anterior que determinou a adoção de providências para evitar o desabamento de casas atingidas por ressacas do mar no Morro das Pedras.

Ressaca no Morro das Pedras em Florianópolis

No dia 08.05.2021, fortes marés de tempestade, popularmente chamadas de "ressacas", atingiram a costa leste de Florianópolis, provocando danos gravíssimos na infraestrutura pública da localidade Morro das Pedras e nas residências próximas ao mar.

Diante da omissão da Prefeitura de Florianópolis em relação à proteção dos moradores atingidos pelas ressacas, um dos moradores ajuizou medida cautelar para obrigar o município a adotar as providências necessárias para evitar que seu imóvel fosse engolido pelo mar, mas o juiz de primeira instância negou o pedido liminar.

Inconformados, os Advogados Cláudio Farenzena e Adivan Zanchet que representa o morador, interpuseram recurso de agravo de instrumento com pedido de tutela antecipada recursal ao TRF4, distribuído ao Desembargador Federal Rogério Favreto, que no dia 05.06.2021 deferiu o pedido nos seguintes termos:

Do exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal para determinar ao Município de Florianópolis o prazo de 10 dias para que adote providências para garantir a segurança dos habitantes e frequentadores do Morro das Pedras e para que proceda à instalação de estruturas capazes de impedir o desabamento do imóvel de propriedade da parte agravante, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de atraso.

O Município de Florianópolis foi intimado, mas não cumpriu a decisão, e diante disso, os advogados que representam o morador autor da ação, requereram à Justiça de Florianópolis a majoração da multa diária, mas o pedido foi negado em primeira instância.

Por isso, recorrem novamente ao TRF4, cujo recurso, por prevenção, foi distribuído ao Desembargador Federal Rogério Favreto, que analisou o pedido e deferiu a liminar no dia 15.09.2021, majorando a multa diária para R$ 5 mil.

Leia a íntegra do voto do Desembargador Federal Rogério Favreto

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ALBERTO BINO contra decisão que indeferiu pedido de majoração de multa fixada para hipótese de descumprimento de tutela de urgência nos autos da "Tutela Cautelar Antecedente" nº 50137529820214047200.

Noticia a agravante que no Agravo de Instrumento nº. 5022400- 36.2021.4.04.0000 foi deferido por este relator a liminar em decisão que possui o seguinte dispositivo:

Do exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal para determinar ao Município de Florianópolis o prazo de 10 dias para que adote providências para garantir a segurança dos habitantes e frequentadores do Morro das Pedras e para que proceda à instalação de estruturas capazes de impedir o desabamento do imóvel de propriedade da parte agravante, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) por dia de atraso. 

A parte agravante assevera o seguinte:

Ocorre que o Agravado Município de Florianópolis, mesmo intimado do decisum, nada fez, descumprindo, portanto, a ordem exarada por Vossa Excelência, motivando na origem, um novo pedido liminar, desta vez para majoração da multa (Evento 81), pois, o risco de desabamento do imóvel do Agravante persiste.

Por conseguinte, os Agravados foram intimados para, em 72 horas se manifestarem sobre o pedido de majoração da multa, tendo o Município de Florianópolis se limitado a alegar que autorizou a aplicação de big bags aos proprietários dos imóveis requerentes e que o referido material foi efetivo na contenção da erosão (Evento 98). 

Disse ainda, que foi definido em deliberação técnica a forma de intervenção no local (paliçadas), porém a maré não permitiu a entrada de maquinários para aplicação das paliçadas, e afirma que o mar recuou recentemente, aportando sedimentos no local aumentando o nível de estabilidade dos taludes frontais e consequentemente as edificações envolvidas, e que não haveria risco de colapso das edificações envolvidas, estando tal situação condicionada a alteração do quadro de estabilidade a ação de novas ressacas e o avanço da erosão.

Já em matéria veiculada em um dos maiores sites de notícias local, o próprio Procurador do Município Agravado declara que somente serão adotadas providências caso a situação local se agrave. 

O modus operandi dos Agravados se traduz em verdadeira omissão e descaso com o Agravante, visto que a própria municipalidade alega que não conseguiu fazer as obras de contenção porque a maré não permitiu a entrada de maquinários para aplicação das paliçadas, mas quando o mar recuou, aduz que somente adotará as providências caso a situação local se agrave. 

Ora. Quando a situação local se agravar, por óbvio, não será possível fazer a contenção, ou seja, os Agravados, conquanto executores das políticas públicas para promoção de efetivação de direitos fundamentais, tais quais os direitos à incolumidade física, à moradia e ao meio ambiente, não podem e não devem agir somente quando a tragédia anunciada se efetivar. É preciso agir previamente. 

Requer a antecipação da pretensão recursal para majorar a multa já imposta aos Agravados, inclusive com direcionamento ao gestor público, arbitrando-se o valor não inferior a R$ 10.000,00 por dia de atraso até o efetivo cumprimento da decisão proferida nos autos do agravo de instrumento n. 5022400- 36.2021.4.04.0000. 

É o sucinto relatório.

A respeito da tutela de urgência, dispõe o art. 300 do Código de Processo Civil:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 

1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. 

2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. 

3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. 

O Juízo da 6ª Vara Federal de Florianópolis, MM. MARCELO KRÁS BORGES, assim se pronunciou (evento 100, DOC1):

O Município de Florianópolis prestou informações no sentido de que a medida liminar estaria sendo cumprida com a colocação sacos de areia (evento 98, ofici2), o que constitui uma medida de caráter emergencial.

De outra parte, o Ministério Público Federal juntou filmagens com obras de escavadeiras no local controvertido (video3, video4 e video5), o que indica que a Prefeitura estaria realizando obras preventivas de grande porte ou impacto. 

Neste sentido, entendo que o Município está a cumprir a decisão liminar que determinou a adoção de medidas emergenciais para evitar o colapso das residências. 

Todavia, entendo como pertinente esclarecer qual o fundamento legal para obras de grande envergadura, com restroescavadeiras, que já haviam sido proibidas anteriormente pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região para aquele espaço sensível, a menos que houvesse o devido licenciamento ambiental. 

Isto posto, indefiro o pedido liminar. 

Intimem-se o Município de Florianópolis para esclareça o fundamento legal para as obras de grande porte filmadas no evento 96. 

Aguarde-se a audiência de conciliação já designada.

Analisando o conjunto probatório até então presente nos autos, tenho que, ao menos por ora, deve ser deferido o pedido liminar.

Percebe-se, a partir de todos os elementos presentes neste momento, que a liminar anteriormente deferida em nada alterou o comportamento do ente municipal, o qual limitou-se a afirmar que:

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Teria agido corretamente, com colocação de "big bags", as quais seriam, neste momento, a solução em tese mais adequada para evitar riscos às moradias, pois se trataria da alternativa provisória que implicaria menos danos imediatos ao meio ambiente;

Que o objetivo da liminar teria sido plenamente alcançado, pois o que teria sido determinado na decisão não seria propriamente a tomada de medidas pelo Município, mas sim a proteção em curtíssimo prazo das moradias face a riscos imediatos;

Que a própria natureza teria se encarregado de estabilizar a situação, com a sedimentação do local;

Que, em caso de novas ressacas, a parte haveria de demandar novas medidas, pois a liminar não teria contemplado a colocação de estruturas

Sem razão, porém

Ainda em momento anterior ao deferimento da liminar no Agravo de Instrumento nº. 5022400- 36.2021.4.04.0000, os próprios moradores efetuaram a colocação das "big bags", e, segundo consta destes autos, foram os moradores que instalaram e continuam instalando tais sacos de areia (processo 5033376- 05.2021.4.04.0000/TRF4, evento 9, FOTO3).

Ressalto o uso da expressão "instalaram e continuam instalando", pois, diferentemente do que argumenta o Município, a colocação de big bags / sacos de areia não é de forma alguma uma solução para o local, ainda que provisória, e precisa ser constantemente renovada.

Conforme se percebe pelos documentos constantes deste processo e de seus relacionados, ocorre depredação natural e humana nos sacos de areia com muita facilidade, de forma que não são aptos a oferecer o mínimo de proteção à residência, na forma como foi determinada pela decisão que concedeu o pedido liminar.

Isto é, além de o Poder Municipal ter cometido grave negligência em um primeiro momento, deixando de garantir a segurança dos cidadãos, procedeu, ainda, ao descumprimento da decisão liminar, ao deixar de agir mesmo após expressa determinação judicial.

Não obstante os argumentos variados apresentados pelo agravado, ressai que se houve ação de sua parte, ela foi insuficiente e subsidiária à ação já efetuada pelos próprios moradores, sem que tenha em momento algum cumprido minimamente a determinação deste Juízo.

Ora, surpreende a alegação de que a precária estrutura hoje presente no local haveria de ser mantida enquanto única proteção do cidadão frente à maré, às ressacas e à erosão, havendo-se, conforme o Município, de se aguardar uma nova tempestade para voltar a refletir sobre medidas a serem tomadas.

Beira o absurdo a afirmação de que apenas sob risco concreto o Município estudaria a possibilidade de renovar ou de intensificar a estrutura de proteção. Inviável imaginar-se que, sob intensas intempéries, sabendo que recentemente as residências quase desmoronaram sobre a praia, o Município haveria, aí sim, de estudar medidas a serem tomadas para proteger o local.

Mais ainda, quando já decorreu longo tempo desde a decisão originária, além de ter sido oportunizada escolhas de soluções técnicas pelos órgãos competentes da municipalidade. Contudo, a opção tem sido de contumaz negativa ou alegações de pendência de intimação, interposição de recurso e outras "escusas" genéricas, inclusive sempre noticiado na imprensa local e regional.

Enfim, o comportamento que se espera do Poder Público Municipal seria de imediata atuação coordenada com outros órgãos e os próprios moradores, não só em defesa da comunidade local, mas da coletividade que frequenta e usa dos espaços públicos. Tais iniciativas, nem precisariam de ordem judicial pelo dever de prevenção e correção da municipalidade. Muito mais com a determinação judicial, inclusive já ressalvado que os custos poderão, futuramente, ser distribuídos com os demais entes que possuem dever de atuação ambiental, em especial a União.

Conclusão

Não há, neste momento, nenhum indício de qualquer medida tomada pelo Município, inobstante a expressa determinação por decisão proferida nos autos do agravo de instrumento n. 5022400-36.2021.4.04.0000.

O próprio Município admite que de fato não há nenhuma estrutura no local visando à proteção da residência contra erosão e ressacas, exceto pelas big bags / sacos de areia.

Tais sacos de areia são notoriamente insuficientes para oferecer o mínimo necessário de proteção à residência do agravante face ao avanço do mar e, inclusive, sequer foram colocados pelo Município, mas pelos próprios moradores.

Diante de todo esse quadro, restou demonstrada, em sede de cognição sumária, a probabilidade e a urgência do direito invocado, devendo ser deferida a concessão do pedido para que a multa já imposta seja majorada para o valor de  R$ 5.000,00 por dia de atraso até o efetivo cumprimento da decisão proferida nos autos do agravo de instrumento n. 5022400-36.2021.4.04.0000.

Do exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal. Intimem-se, sendo a parte agravada para os fins do disposto no art. 1.019, II, do Código de Processo Civil.


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Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: [email protected].

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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