Resumo
O artigo apresenta e discute o valor fundamental da dignidade da pessoa humana sob a ótica jurídico-filosófica e sua relevância para o reconhecimento de direitos fundamentais.
Palavras-chave: Estado; dignidade; valoração; ética.
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Abstract
The article presents and discusses the fundamental value of human dignity in the legal and philosophical perspective and its relevance to the recognition of fundamental rights.
Keywords: State; dignity, valuation, and ethics.
A procura do fundamento é longínqua quando buscamos falar sobre o Estado. Jacques Maritan assinala que:
No plano das interpretações e das justificações racionais, no plano especulativo ou teórico, a questão dos direitos do homem movimenta todo o sistema de certezas morais e metafísicas (ou antimetafísicas), às quais se subordina cada homem[1]
Desde a Antigüidade, o homem evolui para a formação de um Estado, onde buscou delimitar o seu território estabelecendo certa jurisdição.
As alterações sociais, no curso da história, reivindicaram a patente da organização, uma organização social que buscasse, de certa forma, estabelecer as diretrizes normativas necessárias à convivência do homem com o homem, sendo que esta convivência deveria ser gerenciada por uma instituição: o Estado.
Lévy-Bruhl lembra que, neste debate, a etimologia pouco nos auxiliará. A palavra direito, em inglês, right; em alemão, recht; em italiano, diritto, droit em francês, liga-se a uma metáfora na qual uma figura geométrica assumiu, primeiro um sentido moral, e depois, jurídico.
O direito é linha reta, que se opõe à curva, ou à oblíqua, e aparenta-se às noções de retidão, de franqueza, de lealdade nas relações humanas. Mas essa acepção é muito frágil para definir as complexas redes de significados e significantes que o direito nos oferece na organização da sociedade moderna[2].
O Estado Medieval caracterizado pelo cristianismo, as invasões dos bárbaros e o feudalismo e, por fim, o Estado Moderno originado da deficiência do Estado Medieval com unidade territorial (território) e poder soberano (soberania), povo e finalidade, não obstante ao vínculo jurídico.
Para Marcus Cláudio Acquaviva[3], o Estado do latim Statu, do verbo stare, de estar em pé, manter-se, este compreende o vocábulo que apresenta o radical ST, de origem indo-européia, que significa permanência e duração.
E, no direito Romano, status personarum (civitatis, libertatis e familiae), eram segundo Acquaviva, os Estados no qual as pessoas podiam encarnar na sociedade Romana, principalmente do ponto de vista dos direitos políticos, da liberdade ou de sua condição conjugal e sucessória.
Estes status remetem-nos aos ideais preconizados na Revolução Francesa de 1789, onde a afirmação dos direitos configura a forma política do Estado Democrático, notadamente os direitos de primeira (liberté) segunda (igualité) e terceira (fraternité) gerações. Consubstanciando um direito político, onde a sociedade é dotada de um poder soberano e o Estado voltado para o bem comum.
Na linha do tempo Thomas Hobbes - em O Leviathan - já apontava os indícios destes traços políticos, O Príncipe de Maquiavel, destacando a imagem tradicional de Estado, Montesquieu - em Les esprit des lois - em suas generalidades metafísicas, entre outros.
Para muitos autores, o Estado tem início desde a existência do homem sobre a terra (Eduard Meyer, Wilhelm Koopers LOrigine de LÉtat), para outros em apenas certo período da história e assim sucessivamente.
Tendo como referência o Sociólogo Polonês Zygmunt Baumam, afirma:
A imaginação dos racionalizadores é tentada pela perspectiva de um Estado de perfeição última e estável, um Estado do qual terá sido eliminada a própria
possibilidade de desafio à ordem estabelecida.[4]
Chegamos, então, ao Estado de Direito que,significa, a priori, que nenhum indivíduo, seja ele presidente da república ou qualquer cidadão comum, está acima da lei instituída.
Max Weber assinala que:
(...) uma associação política, é particularmente um Estado(...)[5].
Desta forma, o pensamento de que o Estado é uma associação política, pressupõe que Estado não existe sem o mínimo de organização jurídica.
Assim, por volta do século XVIII, temos a Idade Moderna influenciada sobremaneira pelo povo Grego, implicando, inclusive, na consolidação de valores fundamentais, relacionados à dignidade da pessoa humana.
Por conseguinte, remetendo o Estado a um certo padrão de organização, que visasse, a priori, manter estes padrões mínimos de direitos fundamentais: de negras e negros, inclusive.
A dignidade da pessoa humana foi estabelecida como princípio constitucional no artigo 1º, inciso III da Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988, não é exclusividade da modernidade.
Seus elementos já participavam do pensamento[6] judaico-cristão, na filosofia dos gregos e de importância maior no pensamento cristão medieval: São Tomás de Aquino e Santo Agostinho.
Emmanuel Kant um dos maiores filósofos alemães pregava a importância de princípios universais, com base em seu Imperativo Categórico[7], em síntese:
Imperativo, porque está relacionado a um dever moral. Categórico, porque ele atinge a todos, sem exceção.
Ao estabelecer sua doutrina transcendental dos julgamentos apontava que:
la question qui rend necessare la doctrine transcendentale du jugement est celle qui peut expliquer comment des concepts purs de lentendement peuvent être appliqués à des phénomènes em géneral (critique de raison pure, logique trancendentale, Analytique transcendentale, livre II, ch 1, p.151). [8]
Importante destacar que Kant em seu legado deixou fundamentos importantes relacionados dignidade do homem, estabelecendo as dimensões da pessoa cuja fenomenologia tem fins existenciais, notadamente no prius (ordem jurídica) e antropológica, a origem histórica do homem.
Destarte, destaca o homem em sua valoração ética:
pessoa como categoria ética, onde a vida humana pressupõe a realização de valores.
Assim, essa realização de valores está diretamente ligada à dignidade da pessoa, axiologicamente ao jurídico para efetivação dos direitos na esfera de valores e, por conseguinte os Direitos Fundamentais como expressão da dignidade da pessoa humana.
Em 1788, ao escrever a Crítica da Razão Prática do alemão Kritik der Praktischen Vernunft, ou Critique de La Raison Pratique do Francês, reivindica a ambigüidade entre liberdade e a dignidade humana:
(...) revendiqué sans ambiguité la liberté humaine et, repectant la dignité humaine, renvoyé l´aperceptian de cette liberté au domaine de la subjectivité (...)[9].
Por fim, a consubstanciar sua argumentação em defesa da importância da dignidade humana, Kant aponta:
(...) le fondement historique dans le Théorème Kantien de L´impératif categorique, et notamment dans ses incidences sur les activitiés qui tendent à faire de la dignité humaine uma realité sans réserves(...).[10]
Nesta linha Jean Rivera ensina que Les Droits de L´Homme Selon La Declaration de 1789 tem suas fontes distantes[11], notadamente na mitologia política, onde a essência tem guarida na manutenção da liberdade e limitação da atuação do poder.
O autor assinala ainda, que não se trata de uma simples sistematização das relações do homem com a sociedade[12]:
La Déclaration propose donc une systématision des rapports entre L´homme et la société.
Vale lembrar que os direitos do homem estão ligados à liberdade e à dignidade da pessoa humana, notadamente enquanto valores históricos e filosóficos numa dimensão de universalidade.
Portanto, podemos concluir que a dignidade humana, é sem duvida, uma realidade sem reservas, devido à sua essência supra-política e em face do seu valor fundamental universal.
Referências bibliográficas
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário Acadêmico de Direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999.
BITTAR, Carlos Eduardo Bianca. O Direito na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005.
Canto-Sperber, Monique. Dicionário de ética e filosofia moral. Rio grande do Sul. UNISINOS Vol I. 2003
KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos; tradução de Leopoldo Holzbach. São Paulo: Martin Claret, 2004.
MARITAIN, Jacques. Elementos de Filosofia II. A Ordem dos Conceitos. Lógica Menor. 11a ed., Rio de Janeiro: Agir Editora, 1986.
RIVERA, Jean. Les Libertes Publiques. Paris: PVF, Vol. I, 1973.
WEBER, Max. Economia e Sociedade. Brasília: Universidade de Brasília, 1999.
Sites consultados
http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/discrim/lexracista.html em 11/04/2006
http://www.geocities.com/~esabio/transgênicos/ imperativo_categorico.htm em 25-11-2005.
http://agora.qc.ca/mot.nsf/Dossiers/Emmanuel_Kant em 09-10-2010
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Jacques Maritain. O homem e o Estado, p. 81.
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http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/discrim/lexracista.html em 11/ 04/2006.
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Marcus Cláudio Acquaviva. Dicionário Acadêmico de Direito, p. 336.
* Doutorando em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade católica de São Paulo.
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Carlos Eduardo Bianca Bittar. O Direito na Pós-Modernidade, p. 56
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Max Weber. Economia e Sociedade, p. 525.
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Dicionário de Ética e Filosofia moral, Volume 1, p. 440.
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http://www.geocities.com/~esabio/transgênicos/imperativo _categorico.htm em 25/11/2005.
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Immanuel Kant. Fundamentação da Metafísica dos Costumes e outros Escritos. Tradução de Leopoldo Holzbach São Paulo: Martin Claret, 2004.
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http://agora.qc.ca/mot.nsf/dossiers/emmannuel_kant em 09/02/2010.
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http://agora.qc.ca/mot.nsf/dossiers/emmannuel_kant em 09/02/2010.
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Jean Rivera. Les Libertes Publiques, p. 2.
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Jean Rivera. Les Libertes Publiques, p. 47.