Resenha crítica sobre os princípios da Intervenção Mínima e da Lesividade sob a perspectiva de Rogério
Resenhista: Victor Hugo Gomes, discente do curso de Direito da Faculdade Santa Rita de Cássia UNIFASC
Referência: GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 17 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015
A presente resenha se propõe a realizar uma análise reflexiva acerca dos Capítulos 6 e 7 do Curso de Direito Penal de autoria de Rogério GRECO, professor de Direito Penal, Secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais, Pós-Doutor pela Universitá Degli Studi di Messina (Itália), Doutor pela Universidade de Burgos (Espanha), Mestre em Ciências Penais pela Universidade Federal de Minas Gerais UFMG, dentre outras experiências que compõem a vasta lista de atuações de , consagrado nacionalmente no âmbito do Direito Penal.
Greco, na décima sétima edição do seu Curso de Direito Penal, buscou demonstrar a aplicação do Direito Penal como uma proteção dos bens mais importantes e necessários à vida em sociedade. Para o autor, o legislador deverá intervir quando os outros ramos do direito se mostrarem incapazes de proteger devidamente os bens mais importantes para a sociedade, atuando sobre as condutas que comporão o Direito Penal. Assim, conseguimos perceber que há uma limitação no poder punitivo do Estado.
Ao citar o princípio da intervenção mínima, Greco afirma que há uma distinção dos bens de maior relevância e que merecem atenção especial do Direito Penal, selecionando quais os bens ficarão sob a tutela da espera penal, e contribuindo para que ocorra a descriminalização quanto às condutas de menor relevância social. Para isso, caberá ao legislador estar atento à evolução da sociedade, pois bens que teriam importância no passado podem ser retirados do nosso ordenamento jurídico devido aos atuais costumes.
Destarte, o autor ressalta a importância de o Estado e do Direito Penal interferirem o mínimo possível na sociedade, sendo acionados apenas quando as demais esferas do Direito não se mostrarem suficientes para proteger os bens considerados mais importantes.
Nesta perspectiva, faz-se necessário observar o atual cenário social, onde discute-se a necessidade de apenar, por exemplo, o emissor de cheque sem fundos, onde o autor reflete que as medidas civis e administrativas não são suficientes par inibir as ações dos maus pagadores, mesmo quando ocorrem a execução da quantia não paga e o impedimento, por um longo período, que este indivíduo volte a ser correntista bancário. Se fossem suficientes, o autor salienta que não havia mais a necessidade de o Direito Penal intervir na aplicação da penalidade.
O Código Penal, alterado pela Lei 11.106/2005, extinguiu do ordenamento jurídico brasileiro alguns crimes cuja proteção dos bens passou a ser abarcado pelas demais esperas do direito. Neste contexto, Greco cita como exemplo a questão do adultério, antes tipificada no código penal e atualmente dá o direito de o cônjuge ingressar na esfera civil a fim de obter indenização moral.
Outrossim, o autor faz uma crítica ao princípio da intervenção mínima ao afirmar que se trata de duas faces de uma mesma moeda, pois há o lado em que Direito Penal irá orientar o legislador na escolha dos bens que deverão ser tutelados por serem imprescindíveis ao convívio em sociedade; e, por outro lado, o norteará para afastar do Direito Penal aqueles bens que antes gozavam de especial importância, mas que atualmente, já podem ser protegidos pelos demais ramos do direito.
Para Greco, enquanto a intervenção mínima estatal somente permitirá a interferência no Direito Penal mediante ameaças aos bens jurídicos considerados importantes, o princípio da lesividade busca esclarecer e limitar o poder do legislador sobre as condutas passíveis de criminalização na lei penal, ou seja, as que não poderão ser regidas pelos rigores da lei penal. O autor, em sua obra, aduz que a proibição imposta através do Direito Penal só irá justificar-se quando o ato lesivo afetar diretamente o direito de terceiros.
No que se refere ao princípio da lesividade, Greco aponta que o mesmo se iniciou no período iluminista, e, com o passar dos tempos, deixou de confundir a questão do direito e a moral, bastando para tanto ser entendido por atender as seguintes finalidades: proibir incriminação de atitudes internas ou de conduta que não exceda o âmbito do próprio autor, proibir a incriminação de simples estados ou condições de existência, e proibir a incriminação de condutas desviadas que não interfiram no bem jurídico tutelado.
Ainda, partindo deste pressuposto, o autor ressalta que não cabe ao Direito Penal punir condutas que não sejam lesivas ao bem terceiro, pois não ultrapassam os limites da vida do próprio indivíduo, como por exemplo a tentativa de suicídio ou a automutilação.
Greco aponta ainda que o art. 16 da Lei nº 6.368/76 fere diretamente ao princípio da lesividade, ao incriminar o mero uso de entorpecentes, desde que portados em quantidade compatível com o próprio consumo de modo a não lesionar o bem jurídico alheio. Assim, tem-se a terceira função do princípio da lesividade, que corresponde ao impedimento do agente ser punido por sua essência, e não por sua conduta.
O princípio da lesividade, sob a perspectiva de Greco, busca afastar ainda a aplicação da lei penal às condutas que, embora transgredidas, não afetam ao bem jurídico de terceiros, como aquelas que a sociedade despreza ou detém repulsa, mas que, apesar de ferirem à normativa moral, não interferem na proteção do bem tutelado, a exemplo dos indivíduos que sequer tomam banho regularmente ou que se entregam a práticas sexuais consideradas anormais.
Por fim, de acordo com Greco, é impossível o Direito Penal atuar em casos em que o bem jurídico de terceiro não esteja sendo efetivamente atacado, de modo que aquilo que for prejudicial somente ao agente da conduta, deverá ser respeitado pela sociedade, bem como pelo Estado, ao passo em que deve existir a tolerância no meio social para o convívio pacífico entre os indivíduos.
Para Greco, citando Mariano Silvestroni, a tolerância é uma consequência da imaterialidade e liberdade do ser humano, onde as pessoas detêm o direito de ser, pensar, se expressar e agir de forma livre sem qualquer restrição ou sanção, desde que isso não afete o direito de um terceiro.