Resenha crítica acerca do Direito Penal e a história da humanidade, sob a perspectiva da obra de André Estefam
Resenhista: Victor Hugo Gomes, discente do curso de Direito da Faculdade Santa Rita de Cássia UNIFASC
Referência: ESTEFAM, André. Direito penal: parte geral (arts. 1º a 120). 7 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018
A presente resenha se propõe a realizar uma análise reflexiva desta doutrina do professor André Estefam, Doutor e Mestre pela PUC-SP, e autor de diversas obras jurídicas na esfera do Direito Penal. No ano de 2018, dedicou a 7ª edição do seu livro Direito penal: parte geral aos seus filhos, enfatizando que a obra é, antes de tudo, fruto de uma experiência adquirida em sala de aula desde o ano de 1999 quando ministrava as disciplinas de Direito Penal e Direito Processual Penal em cursos preparatórios pela Damásio Cursos.
O exemplar supracitado é destinado aos mais diversos estudos acadêmicos no âmbito do Direito Penal parte geral, desde a graduação, passando pelas especializações lato sensu e percorrendo até níveis mais elevados como mestrado e doutorado, permitindo a todos os profissionais do Direito acesso ao conhecimento jurídico de forma igualmente tradicional e inovadora.
No que se refere à sua essência, este livro difere-se das edições anteriores por terem sido inclusas decisões judiciais mais recentes sobre os mais importantes crimes analisados no trabalho, bem como novas análises das imunidades constitucionais, de acordo com a matéria penal constitucional, e acerca da figura da colaboração premiada, dentre outras questões.
Insta destacar que, nesta obra, Estefam delimita conceitualmente em seu primeiro capítulo o Direito Penal e a humanidade, citando o renomado jurista do Império, Tobias Barreto, o qual afirmava que o Direito Penal é o rosto do direito, no qual se manifesta toda a individualidade de um povo, seu pensar e seu sentir, seu coração e suas paixões, sua cultura e sua rudeza. Nele se espelha a sua alma. O Direito Penal dos povos é um pedaço da história da humanidade.
Neste viés, o autor transmite o pensamento de que o Direito Penal e suas modificações carrega a cultura de um povo e o seu comportamento em sociedade, buscando resguardar através das penalidades o seu patrimônio, sua saúde, o meio ambiente e até mesmo sua própria vida.
Neste aspecto, as sociedades puniam os próprios membros de sua tribo por perturbarem a paz e a vida em grupo, culminando na morte ou na fuga do agente. Já sob os estrangeiros as punições vinham em forma da chamada vingança de sangue, onde a pena possuía caráter sacro pois os povos antigos acreditavam que a paz encontrava-se sob a proteção dos deuses, e vingar a atitude inesperada do estrangeiro baseava-se em um preceito divino.
O autor também reflete em seu livro a forma com que o Brasil vivenciou o Direito Penal, citando a obra O direito penal indígena de João Bernardino Gonzaga, onde, desde o descobrimento, o direito penal e o regramento jurídico surge através dos costumes, mitos e tabus observados pelos silvícolas, os quais julgavam serem os índios brasileiros pouco misericordiosos e extremamente vingativos, onde a retaliação era obrigatória.
Estefam enfatiza que onde há sociedade, há crime, e isto faz jus a existência do Direito Penal, o qual se faz presente desde os tempos mais remotos quando os seres humanos passaram a conviver em grupo. Relembrando historiadores antigos, traz à baila que o ser humano carrega em sua essência a ideia de castigar terceiros por atos lesivos; mesmo que, inicialmente, as punições eram vistas como formas de vingança, como a própria Lei do Talião já dizia: olho por olho, dente por dente.
Ao perceberem que os métodos brutais de repressão, como morte e mutilação, estavam enfraquecendo os grupos sociais, passou-se utilizar uma composição pecuniária como forma de reparação que devia ser direcionada à família vítima do ato lesivo. Nota-se que o poder público através do Estado buscou normatizar as regras em sociedade, visando a convivência pacífica entre seus cidadãos, retirando assim dos particulares o direito de punir ao atribuir para um representante imparcial, ou seja, alguém que não estivesse envolvido diretamente no conflito.
Contudo, os rumos que o Direito Penal foi tomando mostrou-se cada vez mais cruel com o aumento das penas de morte, mutilação, açoite, e, em certa época, ficou conhecido como Direito Penal do Terror. No Brasil, vigoraram até o início do século XIX as Ordenações do Reino de Portugal (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas), até a instituição do Código Criminal do Império em 1830; o qual ditava quatro tipos de penalidades: morte natural cruel, que ficava a cargo da crueldade do executor e do livre arbítrio dos juízes; morte natural de fogo, onde o réu ingeria garrote e posteriormente era queimado vivo; morte natural, com enforcamento e posterior sepultamento no cemitério; e, por fim, morte natural para sempre, que correspondia ao enforcamento, ficando pendente até cair em solo, e após eram soterrados em tumbas nas igrejas.
É sabido, aponta Estefam, que somente no final do século XVIII é que o Direito penal ganhou uma denotação mais humanizada, na ideia de que o temor por um castigo é mais infalível do que a crueldade das penas. Nesse sentido, o autor salienta que o Direito Penal evoluiu em paralelo à sociedade, passando por diversos estágios até alcançar a fase de punição pública onde se contra atualmente.
De uma forma conceitual, Estefam entende por Direito Penal o ramo jurídico encarregado de definir as infrações penais e empregar-lhes as respectivas sanções. Ao abordar este conceito, o autor ressalta que é preferível utilizarmos a expressão Penal do que Criminal, no sentido de ampliarmos o alcance desta matéria.
Por conseguinte, obsta dizer que, mesmo tipificando as práticas delitivas, o Direito Penal não é capaz de impedir que o ilícito seja cometido. Citando Miguel Reale Júnior, o autor ressalta que o preço da liberdade é o eterno delito. Contudo, para Esfefam, o Direito Penal é sim capaz de trazer segurança quanto às expectativas de que as normas serão respeitadas por terceiros, sob o óbice das penalidades previstas no Código Penal, permitindo assim, o pacífico convívio social.