RESUMO.
O presente trabalho busca a análise das principais transformações ocorridas com o conceito da entidade familiar brasileira, as novas atribuições do psicólogo jurídico com atuação na área de família, demonstrando a sua importância tanto para os pais quanto para as crianças envolvidas nos conflitos. Assim, através dos dispositivos legislativos e dos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, além dos princípios basilares que norteiam o direito de família brasileiro, defende-se a possibilidade da intervenção do Psicólogo no Direito de Família, mormente, nas questões de guarda compartilhada e alienação parental, observando-se sempre, no caso concreto, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
Palavras-chave: Psicólogo Jurídico; Direito de Família; Guarda Compartilhada; Alienação Parental.
SUMÁRIO
2. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENTIDADE FAMILIAR...
3. PRÍNCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.......
4. O PAPEL DO PSICÓLOGO JURÍDICO NO DIREITO DE FAMÍLIA......
4.1. A atuação da Psicologia Jurídica na aplicação da Guarda Compartilhada........................
4.2. A importância do Psicólogo Jurídico nos casos de Alienação Parental..
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como tema a importância da atuação do psicólogo jurídico na área de família, principalmente nas questões em que as crianças estão envolvidas, sendo que muitas são vítimas dos conflitos familiares, especialmente, nos embates de guarda compartilhada e de alienação parental.
Nesse sentido, cumpre salientar que, após o advento da Constituição Federal de 1988, aliado ao entendimento da jurisprudência dominante, a entidade familiar fora ampliada, e não tem sido formada por apenas pai, mãe e filhos, tendo em vista que, na atualidade, a formação familiar independe do casamento, constituída por apenas um genitor e descendentes, bem como através de relacionamentos homoafetivos, estando alicerçadas não somente pelo vínculo sanguíneo e jurídico, mas, sobretudo, pelos laços de afetividade.
Dessa forma, o Direito de família passou a exigir uma abordagem multidisciplinar, necessitando, veementemente, da atuação de profissionais que acompanham direta ou indiretamente os embates familiares, especialmente, a do psicólogo jurídico, tanto nos atendimentos extrajudiciais quanto nos processos judiciais.
Ademais, questiona-se se haveria a possibilidade da aplicação da Psicologia Jurídica no Direito de Família?
Nesse sentido, nos conflitos de guarda dos filhos, existe uma grande probabilidade do surgimento da alienação parental, dificultando, exorbitantemente, a aplicação da guarda compartilhada. É justamente, nesses embates, que os psicólogos jurídicos buscam agir, observando a demanda de uma forma crítica e analisando as possíveis consequências da vida dos envolvidos.
Ademais, com o desenvolvimento das audiências de conciliação e mediação nas Varas de Família, torna-se fundamental a presença do psicólogo jurídico, pois possibilita a criação de alternativas para as soluções dos litígios por meio da auto composição.
Nesse diapasão, o objetivo do presente estudo de caso é identificar e analisar a possibilidade de atuação dos Psicólogos Jurídicos nas Varas de Famílias, na medida em que estes colaboram na tomada da decisão judicial, além de possibilitarem uma melhora nas relações entre as partes, através da escuta, e serem verdadeiros mediadores nos embates familiares, observando-se sempre, no caso concreto, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
A metodologia usada na pesquisa é a histórica e dedutiva, sendo que nesta ultima está incluído o estudo bibliográfico e descritivo. As considerações finais consistem nos aspectos conclusivos da pesquisa, acompanhada dos resultados alcançados.
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A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENTIDADE FAMILIAR
Importa trazer à baila que o Código Civil de 1916, veementemente patriarcal, regulamentava uma sociedade com o perfil conservador, tornando o vínculo matrimonial o meio exclusivo para o reconhecimento da paternidade no Brasil, conforme se vislumbra dos ensinamentos da ilustre doutrinadora Maria Berenice Dias (2005):
Em uma sociedade conservadora, os vínculos afetivos, para merecerem aceitação social e reconhecimento jurídico, necessitavam ser chancelados pelo que se convencionou chamar de matrimônio. A família tinha uma formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada por todos os parentes, formando uma unidade de produção, com amplo incentivo à procriação. Sendo uma entidade patrimonializada, seus membros eram força de trabalho. O crescimento da família enseja melhores condições de sobrevivência a todos. O núcleo familiar dispunha de perfil hierarquizado e patriarcal.
Ocorre que o surgimento da Carta Magna de 1988 incluiu princípios basilares de proteção à família, ampliando consideravelmente, em seu artigo 228, o conceito da entidade familiar, fazendo com que o casamento deixasse de ser o fator preponderante para o reconhecimento da paternidade brasileira.
Nesse diapasão, a CRFB/1988 vedou expressamente a distinção de direitos entre os filhos, ainda que oriundos de pais diversos, em observância ao princípio da igualdade, norteador da família atual brasileira.
Após, com a vigência do Código Civil de 2002, houve uma alteração significativa na definição do núcleo de família, a qual passou a ter um caráter pluriforme, formada por pessoas unidas tanto pelo elo biológico quanto pelo aspecto da afetividade.
Consequentemente, a entidade familiar passou a assumir um caráter de pluralidade, possibilitando, assim, a ocorrência de diversos arranjos familiares (matrimonial, união estável, monoparental, dentre outros).
Ademais, incumbe destacar que o rol de modalidades familiares previstas no dispositivo da Carta Magna/1988 é tão somente exemplificativo, podendo ser tutelada diversas formas de arranjos familiares, pautada na afetividade, ainda que não esteja prevista na Constituição Federal.
Nesse contexto, ensina o Mestre Farias e Rosenvald (2011, p.48): é preciso ressaltar que o rol da previsão constitucional não é taxativo, estando protegida toda e qualquer entidade familiar, fundada no afeto, esteja ou não, contemplada expressamente na dicção legal.
Além disso, convém salientar que a filiação não é oriunda apenas do parentesco consangüíneo, pois o artigo 1.593 do Código Civil de 2002 descreve que o parentesco é natural ou civil, conforme resultado de consangüinidade ou outra origem. Acrescente-se que o artigo 227, § 6°, da Constituição Federal de 1988, proíbe expressamente a prática discriminatória inerente à filiação.
Dessa forma, as legislações tendem a se adequar a realidade social, como ocorreu com a Carta Magna/1988, a qual dispôs que o Estado passaria a proteger não só a família tradicional, mas também outras formas de entidades familiares, surgindo assim o reconhecimento das uniões homoafetivas e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Desse modo, a entidade familiar tradicional (pai, mãe e filhos biológico), foi perdendo o monopólio, haja vista o surgimento da família moderna, formada por relacionamentos homoafetivos, bem como por filhos socioafetivos, padrastos e madrastas, trazendo diversas discussões para o Direito de Família brasileiro acerca desse novo ente familiar.
Nesse sentido, em 05 de maio de 2011, foi publicado o acórdão da ADI 4277 DF, no qual os Ministros do Supremo Tribunal Federal reconheceram juridicamente a união homoafetiva no país, concedendo os mesmo direitos e deveres da união estável, e, ampliando, categoricamente o conceito da entidade familiar:
EMENTA:1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA PARCIAL DE OBJETO. RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO INSTITUTO JURÍDICO. CONVERGÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA ABSTRATA. JULGAMENTO CONJUNTO. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ pela ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação.
2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA. CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de promover o bem de todos. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana norma geral negativa, segundo a qual o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da dignidade da pessoa humana: direito a auto-estima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea.
3. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO FAMÍLIA NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. A FAMÍLIA COMO CATEGORIA SÓCIO-CULTURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL. DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO-REDUCIONISTA. O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão família, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por intimidade e vida privada (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não-reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-político-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas.
4. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE ENTIDADE FAMILIAR E FAMÍLIA. A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no § 3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia entidade familiar, não pretendeu diferenciá-la da família. Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado entidade familiar como sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não-equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem do regime e dos princípios por ela adotados, verbis: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
5. DIVERGÊNCIAS LATERAIS QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. Anotação de que os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram no particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento da união homoafetiva nas espécies de família constitucionalmente estabelecidas. Sem embargo, reconheceram a união entre parceiros do mesmo sexo como uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à conformação legislativa, sem prejuízo do reconhecimento da imediata auto-aplicabilidade da Constituição.
6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA INTERPRETAÇÃO CONFORME). RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de interpretação conforme à Constituição. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI 4277/DF. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Relator Ministro Ayres Britto. Órgão Julgador Tribunal Pleno. Julgamento 05/05/2011).
Dessa forma, incumbe salientar que essa nova e complexa entidade familiar vem gerando, atualmente, várias consequências no Direito de Família (principalmente, quando a questão é separação de fato ou divórcio/dissolução de união estável), dentre elas, a concessão de guarda compartilhada e a prática de alienação parental.
Nesse contexto, torna-se imprescindível o acompanhamento de um Psicólogo Jurídico com atuação no Direito de Família, a fim de auxiliar o Juízo na tomada de decisão, objetivando a resolução dos conflitos dessa complexa e nova entidade familiar, buscando sempre priorizar o melhor interesse da criança e do adolescente.
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PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA EDO ADOLESCENTE
Esse princípio, o qual determina a prevalência dos interesses da criança e do adolescente na resolução de quaisquer questionamentos que envolvam os menores, possui previsão no artigo 227, da Constituição Federal de 1988:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Ademais, com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 8.069/1990, esse dispositivo constitucional foi regulamentado, detalhadamente, protegendo, de forma cabal, os interesses dos menores, por se encontrarem em situação de extrema vulnerabilidade perante toda a sociedade.
Nesse mesmo sentido, prevê o artigo 3° da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, de 1989, ratificada pelo Brasil, por meio do Decreto-Lei n. 99.710 de 1990: Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou provadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.
Nesse diapasão, a Declaração dos Direitos da Criança adotada pela Assembleia das Nações Unidas (1959) assim determina:
Princípio 6. Para o desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a criança precisa de amor e compreensão. Criar-se-á, sempre que possível, aos cuidados e sob a responsabilidade dos pais e, em qualquer hipótese, num ambiente de afeto e de segurança moral e material, salvo circunstâncias excepcionais, a criança da tenra idade não será apartada da mãe. À sociedade e às autoridades públicas caberá a obrigação de propiciar cuidados especiais às crianças sem família e àquelas que carecem de meios adequados de subsistência. É desejável a prestação de ajuda oficial e de outra natureza em prol da manutenção dos filhos de famílias numerosas.
Ademais, convém trazer à baila os ensinamentos do Ilustre Doutrinador Gama (2008), o qual enxerga tal princípio como garantidor da tutela do menor, pois modificou o eixo das relações familiares, tendo em vista que a criança e o adolescente passaram a ser tratados com plena prioridade comparativamente aos demais entes de sua família das relações intrafamiliar:
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente representa importante mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais, em que o filho deixa de ser considerado objeto para ser alçado a sujeito de direito, ou seja, a pessoa humana merecedora de tutela do ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente aos demais integrantes da família de que ele participa. Cuida-se, assim, de reparar um grave equivoco na história da civilização humana em que o menor era relegado a plano inferior, ao não titularizar ou exercer qualquer função na família e na sociedade, ao menos para o direito.
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O PAPEL DO PSICÓLOGO JURÍDICO NO DIREITO DE FAMÍLIA
A resolução nº 014/00 do CFP, regulamentada pela Resolução nº 02/01, que instituiu o título profissional de Especialista em Psicologia, além de dispor sobre normas e procedimentos para seu registro, especialmente, a especialização em Psicologia Jurídica. Convém salientar, ainda, as atribuições dos Psicólogos Jurídicos, nos termos da Resolução n° 02/01 do CFP:
Atua no âmbito da Justiça, colaborando no planejamento e execução de políticas de cidadania, direitos humanos e prevenção da violência, centrando sua atuação na orientação do dado psicológico repassado não só para os juristas como também aos indivíduos que carecem de tal intervenção, para possibilitar a avaliação das características de personalidade e fornecer subsídios ao processo judicial, além de contribuir para a formulação, revisão e interpretação das leis;
Avalia as condições intelectuais e emocionais de crianças, adolescentes e adultos em conexão com processos jurídicos, seja por deficiência mental e insanidade, testamentos contestados, aceitação em lares adotivos, posse e guarda de crianças, aplicando métodos e técnicas psicológicas e/ou de psicometria, para determinar a responsabilidade legal por atos criminosos; atua como perito judicial nas varas cíveis, criminais,Justiça do Trabalho, da família, da criança e do adolescente, elaborando laudos, pareceres e perícias,para serem anexados aos processos, a fim de realizar atendimento e orientação a crianças,adolescentes, detentos e seus familiares;
Orienta a administração e os colegiados do sistema penitenciário sob o ponto de vista psicológico, usando métodos e técnicas adequados, para estabelecer tarefas educativas e profissionais que os internos possam exercer nos estabelecimentos penais; realiza atendimento psicológico a indivíduos que buscam a Vara de Família, fazendo diagnósticos e usando terapêuticas próprias, para organizar e resolver questões levantadas; participa de audiência, prestando informações, para esclarecer aspectos técnicos em psicologia a leigos ou leitores do trabalho pericial psicológico; atua em pesquisas e programas sócio-educativos e de prevenção à violência, construindo ou adaptando instrumentos de investigação psicológica, para atender às necessidades de crianças e adolescentes em situação de risco, abandonados ou infratores;
Elabora petições sempre que solicitar alguma providência ou haja necessidade de comunicar-se com o juiz durante a execução de perícias, para serem juntadas aos processos; realiza avaliação das características das personalidades, através de triagem psicológica, avaliação de periculosidade e outros exames psicológicos no sistema penitenciário, para os casos de pedidos de benefícios, tais como transferência para estabelecimento semi-aberto, livramento condicional e/ou outros semelhantes. Assessora a administração penal na formulação de políticas penais e no treinamento de pessoal para aplicá-las. Realiza pesquisa visando à construção e ampliação do conhecimento psicológico aplicado ao campo do direito.
Realiza orientação psicológica a casais antes da entrada nupcial da petição, assim como das audiências de conciliação. Realiza atendimento a crianças envolvidas em situações que chegam às instituições de direito, visando à preservação de sua saúde mental. Auxilia juizados na avaliação e assistência psicológica de menores e seus familiares, bem como assessorá-los no encaminhamento a terapia psicológica quando necessário. Presta atendimento e orientação a detentos e seus familiares visando à preservação da saúde. Acompanha detentos em liberdade condicional, na internação em hospital penitenciário, bem como atuar no apoio psicológico à sua família.Desenvolve estudos e pesquisas na área criminal,constituindo ou adaptando os instrumentos de investigação psicológica.
Dessa forma, cumpre salientar que as atribuições dos psicólogos nas Varas da Infância e da Juventude e nas Varas de Família visa estudar as questões psicológicas das pessoas atuantes em processo, no que tange aos problemas afetivos, comportamentais, objetivando a garantia dos direitos da criança e do adolescente, auxiliando, assim, nas decisões judiciais.
Desse modo, a Psicologia Jurídica possibilita à aplicação de conhecimentos técnicos, através da Perícia, que é o estudo técnico acerca de uma determinada questão, que visa auxiliar as decisões do Poder Judiciário. Exemplificando, quando o assunto for Guarda de Filhos Menores, a Perícia Psicológica vai investigar a situação mais favorável para a criança.
Nesse diapasão, o Psicólogo realizará entrevistas com os pais e com as crianças, além de visitas domiciliares, e fará observações para, finalmente, apresentar o laudo pericial escrito, o qual será juntado nos autos de um processo e ser um meio probatório para a tomada da decisão do juiz.
No entanto, além da elaboração de pericias e pareceres, o Psicólogo Jurídico vai informar, auxiliar, ouvir, acompanhar e orientar as pessoas envolvidas no determinado caso em comento, cumprindo, assim, um verdadeiro papel de mediador para solucionar os conflitos familiares.
Nesse contexto, a intervenção do Psicólogo pode ocorrer na fase pré-processual (examinando o caso, na tentativa de priorizar o acordo entre as partes); na fase processual (através de um assessoramento ao magistrado de uma forma mais eficaz); e na fase pós-processual/execução da sentença (auxiliando na compreensão do resultado do caso e no ajuizamento de futuras ações judiciais).
Assim, vislumbra-se que o papel do psicólogo, além de contribuir para a tomada da decisão judicial, vai possibilitar uma melhora nas relações entre as partes, através da escuta. Isto porque, a escuta é um instrumento que permite compreender os problemas que acarretam o dano familiar, além demonstrar o acolhimento da pessoa envolvida, sendo que esta, muitas vezes, ao se sentir protegida, pode redefinir seus conceitos e buscar uma solução consensual para o conflito.
4.1-A atuação da Psicologia Jurídica na Aplicação da Guarda Compartilhada
Em relação à questão da guarda, é fundamental analisar o caso em comento, observando-se sempre o principio do melhor interesse da Criança e do Adolescente, o qual possui previsão na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, caput, e no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, em seus artigos 4º, caput, e 5º.
O conceito de guarda compartilhada está previsto na Lei 11.698 de 13 de junho de 2008, em seu art. 1583 §1º, como sendo a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
Ressalte-se que, em regra, os juízes vêm aplicando a guarda compartilhada, sendo que, apenas em casos excepcionais, existindo razões que o justifiquem, os magistrados concedem a guarda unilateral. Ex. Na prática de maus tratos e abandono do menor por parte de um dos pais.
Nesse diapasão, é o posicionamento do grande doutrinador Welter (2009): somente por exceção será admissível à fixação da guarda unilateral, já que a regra geral passou a ser o direito fundamental à criança e aos adolescentes da convivência integral e absoluta em família.
Importa salientar o entendimento do Ilustre Mestre Ramos (2011) acerca deste tema: o que deve ser analisado na guarda, independentemente se foi requerida por causa do divórcio ou se foi fruto de um relacionamento não jurídico, e também se for compartilhada ou unilateral, é o melhor interesse do menor.
Isto porque, com a guarda compartilhada objetiva-se diminuir os problemas oriundos da separação dos pais, já que estes se manterão unidos em relação à educação, à criação, à afetividade e ao desenvolvimento físico e psicológico dos seus filhos.
Nesse sentido, ambos os pais terão uma autoridade parental de forma mais eficaz, e passarão a tomar decisões essenciais para o bem estar de suas crianças. É através da residência única, que os pais concentram o exercício de suas obrigações parentais, permitindo-se, assim, que ambos definam de forma conjunta acerca da questão educacional de seus filhos.
Importa trazer à baila o entendimento do Ilustre Mestre Eduardo de Oliveira Leite, o qual afirma que a guarda compartilhada mantém, apesar da ruptura, o exercício em comum da autoridade parental e reserva, a cada um dos pais, o direito de participar das decisões importantes que se referem à criança.
Acrescente-se que os Psicólogos entendem o quão é importante à presença do grupo familiar para o desenvolvimento do infante, já que é fator influenciador na formação psíquica da criança, e, consequentemente, na constituição de sua personalidade.
Ademais, o distanciamento do antigo casal não deve ter o condão de obstaculizar o convívio da criança com ambos os pais, não podendo, por si só, influir na prioritária guarda compartilhada, por isso, é fundamental a atuação do psicólogo jurídico no Direito de Família, a fim de orientar os pais acerca da importância do compartilhamento da guarda na criação de seus filhos. Importa salientar o entendimento jurisprudencial dominante nesse sentido:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA. CONSENSO. NECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DO MENOR. POSSIBILIDADE. 1. A guarda compartilhada busca a plena proteção do melhor interesse dos filhos, pois reflete, com muito mais acuidade, a realidade da organização social atual que caminha para o fim das rígidas divisões de papéis sociais definidas pelo gênero dos pais. 2. A guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial. 3. Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso. 4. A inviabilidade da guarda compartilhada, por ausência de consenso, faria prevalecer o exercício de uma potestade inexistente por um dos pais. E diz-se inexistente, porque contrária ao escopo do Poder Familiar que existe para a proteção da prole. 5. A imposição judicial das atribuições de cada um dos pais, e o período de convivência da criança sob guarda compartilhada, quando não houver consenso, é medida extrema, porém necessária à implementação dessa nova visão, para que não se faça do texto legal, letra morta. 6. A guarda compartilhada deve ser tida como regra, e a custódia física conjunta - sempre que possível - como sua efetiva expressão. 7. Recurso especial provido.(STJ - Resp: 1428596 RS 2013/0376172-9, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/06/2014, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/06/2014) Grifos Nossos
(...)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. GUARDA COMPARTILHADA. A redação atual do artigo 1.584, § 2º Código Civil (introduzido pela Lei 13.058/14) dispõe que a guarda compartilhada é a regra há ser aplicada, mesmo em caso de dissenso entre o casal, somente não se aplicando na hipótese de inaptidão por um dos genitores ao exercício do poder familiar ou quando algum dos pais expressamente declarar o desinteresse em exercer a guarda. Caso em que a guarda compartilhada vai regulamentada, mas o regime de convivência entre pai e filha continua sendo o regime vigente, fixada residência habitual materna. DERAM PROVIMENTO (Agravo de Instrumento Nº 70064723307, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Julgado em 25/06/2015).(TJ-RS - AI: 70064723307 RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Data de Julgamento: 25/06/2015, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/07/2015) Grifos Nossos
Nesse contexto, o Psicólogo Jurídico deve ouvir a criança, a fim de entender seus anseios, esclarecer suas dúvidas; no entanto, não pode tomar o desejo desta como um meio probatório crucial para determinar a decisão do juiz, já que a criança não possui capacidade civil plena. Além disso, o infante, ao expor sua opinião sobre com qual dos pais pretende permanecer, após a segregação do casal; pode obter sérios danos psicológicos, já que no entendimento da criança, ela rejeitou um dos seus genitores.
Dessa forma, a função jurídica do Psicólogo consiste justamente em trabalhar com os pais a importância dos seus papeis no desenvolvimento físico e psicológico de seus filhos menores de idade, orientando-os sempre que a ruptura conjugal não tem o condão de romper os laços afetivos entre pais e filhos; e, sim, fortalecer ainda mais este elo, através de um diálogo positivo entre os genitores, quando o assunto disser respeito aos seus infantes, frutos de um relacionamento amoroso que um dia existira.
4.2- A importância do Psicólogo Jurídico nos casos de Alienação Parental
A alienação parental é uma forma de violência psicológica, podendo ser praticada de forma unilateral, e ocorre quando um dos pais gera imposições sobre o outro, gerando na criança e na outra parte uma revolta e uma pretensão de vingança e reparação.
A questão pode se tornar ainda mais grave quando os embates continuam após a separação, expandindo-se em processos judiciais, como na disputa de guarda, gerando, muitas vezes, efeitos negativos no estado emocional dos filhos.
Quando o casal recém-separado possui filhos, a situação se torna complicada, pois eles podem experimentar um clima tenso no ambiente familiar, já que presenciam constantemente conflitos, podendo apresentar alguns sintomas como medo, desamparo, insegurança, dentre outros.
Ora, deve-se ressaltar que o objetivo do alienador consiste no rompimento dos laços afetivos da criança com um dos pais, através de um elo de dependência afetiva, podendo acarretar, muitas vezes, no filho, sentimentos de desprezo, de ansiedade, tristeza, ódio e temor em relação ao genitor alienado.
Mas quais os sintomas do praticante de alienação parental? Para responder tal questionamento, importa trazer à baila o entendimento do Ilustre Mestre Gardner (1998 apud SOUSA, 2010):
Auxílio ativo à campanha de difamação; racionalizações pouco consistentes, absurdas ou frívolas para difamação; falta de coerência; pensamento independente; suporte ao genitor alienador no litígio; ausência de culpa sobre a crueldade e/ou exploração do genitor alienado; presença de argumentos emprestados; animosidade em relação aos amigos e/ou família do genitor alienado (GARDNER 1998 apud SOUSA, 2010, p. 104-105).
Incumbe salientar que o Psicólogo Jurídico vai observar que vários fatores advindos das desavenças entre casais podem influenciar negativamente no desenvolvimento psíquico da criança, sendo a infância um período particularmente vulnerável.
Dessa forma, normalmente, os casos de alienação parental estão associados à ruptura da vida conjugal, tendo em vista que tal fato acarreta em um dos cônjuges um sentimento de rejeição, traição e segregação, gerando, assim, uma sensação de vingança em face do outro.
Nesse sentido, o genitor alienador pensa, primeiramente, na sua dor e não consegue enxergar as necessidades afetivas dos filhos, e acaba afastando a criança do outro genitor, como uma forma de realização do seu desejo de vingança.
Convém trazer a baila o disposto no art. 2º da Lei nº 12.318/2010:
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência naformação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental,além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I realizar campanha de desqualificação da conduta do genitorno exercício da paternidade ou maternidade; (...)
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dificultar o contato de criança ou adolescente com genitor;
IV dificultar o exercício do direito regulamentado deconvivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; (...)
VII mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com outro genitor, com familiares deste ou com avós.
Dessa forma, geralmente, o que acontece é a tentativa de um dos genitores de fazer uma verdadeira lavagem cerebral, de modo a comprometer a imagem que a criança tem de um dos pais, além de fazer todos os esforços para impedir a convivência da menor com aquele, inclusive através das falsas acusações de abuso sexual, de agressão física e verbal, todas sem quaisquer meios probatórios.
As consequências da alienação parental são gravíssimas, conforme se encontra descritas no art. 3º da Lei nº 12.318/2010:
A prática da alienação parental fere direito fundamental dacriança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres à autoridade parental decorrentes de tutela ou guarda.
Outrossim, convém apresentar as decisões majoritárias dos tribunais nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE GUARDA. PEDIDO INCIDENTE DE ALIENAÇÃO PARENTAL CONFIGURADA. A guarda é instituto que visa à proteção dos interesses dos menores. O seu bem-estar deve se sobrepor, como um valor maior, a quaisquer interesses outros, sejam dos genitores ou de terceiros. Na hipótese, a forma como procedeu o genitor, em completo desrespeito à própria filha, impedindo o convívio da filha com a mãe, e plantando falsas memórias contra a genitora, dão conta da alienação parental praticada pelo genitor. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70076918309, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: LiselenaSchifino Robles Ribeiro, Julgado em 25/04/2018).
(...)
APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO PARENTAL. A conduta da genitora, mesmo que tenha tido uma justificativa inicial causada pela preocupação em proteger a filha, extrapolou, em muito, o que esse dever lhe impunha. A circunstância de se tratar de pessoa esclarecida, advogada que é, serve de maior agravante para suas atitudes. Ao elencar, exemplificativamente, o rol de atitudes caracterizadoras da alienação parental o art. 2º da Lei 12.318 , menciona um total de 7 (sete) condutas. Dessas, a prova dos autos demonstra que a apelada incorreu em, no mínimo, 4 (quatro) delas, a saber: (...) III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; (...) DERAM PARCIAL PROVIMENTO PARA DECLARAR A ALIENAÇÃO PARENTAL E ESTIPULAR MULTA POR EVENTUAIS INFRAÇÕES FUTURAS AO ACORDO DE VISITAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70067174540, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 28/07/2016).
Importa salientar, ainda, o entendimento da Ilustre Mestra Maria BereniceDias:
Ao conseguir impressioná-los, eles sentem-se amedrontados na presença do outro. Ao não verem mais o genitor, semcompreenderem a razão do seu afastamento, os filhos sentem-se traídos e rejeitados, não querendo mais vê-lo. Como consequência, sentem-se desamparados e podem apresentar diversos sintomas. Assim, aos poucos se convencem da versão que lhes foi implantada, gerado a nítida sensação de que essas lembranças de fato aconteceram. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo paterno-filial. Restando órgão do genitor alienado, acaba o filho se identificando com o genitor patológico, aceitando como verdadeiro tudo que lhe é informado.
O filho é utilizado como instrumento da agressividade, sendo induzido a odiar um dos genitores. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização.
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Pessoas submetidas à alienação mostram-se propensas a atitudes antissociais, violentas ou criminosas; depressão, suicídio e, na maturidade quando atingida -, revela-se o remorso de ter alienado e desprezado um genitor ou parente, assim padecendo de forma crônica de desvio comportamental ou moléstia mental, por ambivalência de afetos.
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O filho é convencido da existência de determinados fatos e levados a repetir o que lhe é afirmado como tendo realmente acontecido. Dificilmente consegue discernir que está sendo manipulado e acaba acreditando que lhe é dito de forma insistente e repetida. Com o tempo, nem o alienador distingue mais a diferença entre verdade e mentira. A sua verdade passa a ser verdade para o filho, que vive com falsas personagens de uma falsa existência, implantando-se, assim, as falsas memórias.[2](sem grifos no original)
Dessa forma, a Psicologia Jurídica vai demonstrar que as relações entre pais e filhos são cruciais no processo de desenvolvimento do infante. Isto porque, o desenvolvimento cognitivo de uma criança em formação dependerá de uma boa estruturação familiar que lhe dê apoio tanto no âmbito educacional quanto na construção de valores morais, éticos e afetivos que, posteriormente, irão alicerçar sua vida adulta.
Saliente-se, ainda, que o Psicólogo Jurídico orientará os pais a negociarem frente aos seus desentendimentos, a fim de evitar prejuízos emocionais aos seus filhos. Cabe, então, aos genitores das crianças favorecerem a manutenção dos vínculos entre eles, por meios das visitas, tendo em vista que este aspecto é de suma importância para que o infante possa contar com a presença de ambos nas fases evolutivas da sua vida.
Nesse sentido, se faz necessário buscar meios que garantam o direito da criança à convivência com ambos os pais após o rompimento conjugal e que possíveis desavenças entre estes recebam os devidos encaminhamentos psicológicos e jurídicos necessários.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, verificou-se que a Constituição Federal de 1988 ampliou a proteção legal a família e possibilitou a formação da entidade familiar pelo matrimônio, união estável, e pela modalidade monoparental, através de um rol exemplificativo.
Ocorre que a sociedade atual vem sofrendo intensas mudanças, e com isso, o Direito de Família vem se adequando a realidade social, na medida em que a relação familiar passou a ser constituída também por um único genitor e seus descendentes, por relacionamentos homoafetivos, e, especialmente, pelo vínculo socioafetivo.
Nesse diapasão, vislumbrou-se que o Direito de família passou a exigir uma abordagem multidisciplinar, necessitando, exorbitantemente, da atuação de profissionais que acompanham os problemas familiares, especialmente, a do psicólogo jurídico, tanto nos atendimentos extrajudiciais quanto nos procedimentos judiciais.
Dessa forma, ficou demonstrado que o Psicólogo Jurídico tem uma atuação fundamental no Direito de Família, pois se responsabilizará pelas entrevistas com os pais e com as crianças, além de visitas domiciliares, e fará observações para, depois, apresentar o laudo pericial escrito, que será um meio probatório para a tomada da decisão do juiz nos autos de um processo.
Ademais, salientou-se que o papel do psicólogo, além de auxiliar na tomada da decisão judicial, vai possibilitar uma melhora nas relações entre as partes, por meio da escuta, a qual permite a compreensão dos conflitos que causam o dano familiar; além de gerar o acolhimento da pessoa envolvida, sendo que esta ao se sentir protegida, poderá redefinir seus conceitos e buscar uma solução consensual para o conflito.
Observou-se também que a guarda compartilhada é um instrumento garantidor da tutela do menor, já que reduz os problemas oriundos da separação dos pais, pois estes decidirão conjuntamente acerca da educação, criação, afetividade e do desenvolvimento físico e psicológico dos seus filhos.
Ressaltou-se, ainda, que o Psicólogo com atuação nas Varas de Família vai trabalhar com os pais sobre a importância dos seus papeis no desenvolvimento físico e psicológico de seus filhos menores de idade, instruindo-os que a ruptura da vida conjugal não deve afastar os pais dos filhos, mas, sim, fortalecer ainda mais este vínculo, já que ambos devem enxergar as necessidades afetivas das criança, de forma prioritária, evitando-se, assim a prática de alienação parental.
Outrossim, ficou consignado que a alienação parental é uma das formas de violência psicológica, sendo, na verdade, uma espécie de manipulação praticada por um dos pais, que acaba comprometendo a imagem que a criança tem do outro genitor; fazendo, assim, todos os esforços para impedir a convivência do infante com o genitor alienado, especialmente, por meio das falsas memórias(acusações infundadas de abuso sexual, agressão verbal e física).
Diante dessas considerações, concluiu-se pela possibilidade da atuação do psicólogo jurídico nessas relações familiares atuais e complexas, já que, além de elaborarem pareceres e laudos periciais, serão verdadeiros mediadores nos conflitos das famílias, na medida em que orientarão os pais a negociarem frente aos seus desentendimentos, auxiliando na manutenção dos vínculos entre eles, para que o infante possa tê-los presentes durante as fases evolutivas da sua vida, em consonância com o principio do melhor interesse da criança e do adolescente.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RESP: 1428596 RS 2013/0376172-9, Terceira Turma, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/06/2014, Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21086250/recurso-especial-resp-1251000-mg-2011-0084897-5-stj. Acesso em 30/04/2018.
BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL. AGRAVO DE INSTRUMENTO: 70064723307 RS, Oitava Câmara Cível Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Data de Julgamento: 25/06/2015, Disponível em: https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/204418596/agravo-de-instrumento-ai-70064723307-rs. Acesso em 04/06/2018.
BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL. APELAÇÃO CÍVEL Nº 70076918309, Sétima Câmara Cível. Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 25/04/2018. Disponível em: https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/371229092/apelacao-civel-ac-70067174540-rs?ref=serp. Acesso em 02/06/2018.
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BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL. APELAÇÃO CÍVEL Nº 70076918309, Sétima Câmara Cível, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 25/04/2018. Disponível em:https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/574596620/apelacao-civel-ac-70076918309-rs. Acesso em: 04/06/2018.
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Acesso em: 04/06/2018.
Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília DF: Senado, 1988.