A legitimidade da prisão preventiva no favorecimento da ordem pública

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RESUMO

O estudo destaca a prisão preventiva no favorecimento da ordem pública, apresentando os seguintes questionamentos: A prisão preventiva, constante no artigo 312 do Código de Processo Penal Brasileiro, da forma como vem sendo aplicada fere os institutos constitucionais? A prisão preventiva pode ser decretada como forma de resgatar a credibilidade do direito? Para tanto, apresenta como objetivo principal: examinar a prisão preventiva, constante no artigo 312 do Código de Processo Penal Brasileiro e sua abrangência no ordenamento jurídico brasileiro fazendo um contraponto com a abstratividade e incerteza jurídica da ordem pública. A metodologia utilizada no estudo abrange uma pesquisa bibliográfica através de livros, leis, decretos e publicações relacionadas ao assunto. A partir do estudo foi possível concluir que tratar a prisão preventiva como garantia da ordem pública revela-se como uma alternativa ingênua, haja vista, tal preceito ir muito além do direito, tratando-se de também de uma questão social que versa por uma atuação incisiva do Estado na segurança pública.

Palavras-chave: Garantia da ordem pública. Prisão preventiva. Medidas cautelares. Direito Processual Penal.

ABSTRACT

The study highlights preventive detention in favor of public order, presenting the following questions: Does preventive detention, contained in article 312 of the Brazilian Criminal Procedure Code, in the way it has been applied, hurt the constitutional institutes? Can preventive detention be decreed as a way of rescuing the credibility of the law? Therefore, it presents as main objective: to examine preventive detention, contained in article 312 of the Brazilian Criminal Procedure Code and its scope in the Brazilian legal system, making a counterpoint with the abstraction and legal uncertainty of public order. The methodology used in the study includes a bibliographical research through books, laws, decrees and publications related to the subject. From the study, it was possible to conclude that treating preventive detention, as a guarantee of public order is a naive alternative, as this precept goes far beyond the law, as is also a social issue that involves in incisive performance, of the State in public safety.

Keywords: Public order guarantee. Preventive detention. Precautionary measures. Criminal Procedural Law

INTRODUÇÃO

A polissemia do conceito de garantia da ordem pública inerente à prisão preventiva resulta em um tema de vasta polêmica no sistema jurídico brasileiro, tendo em vista estar repleto de incertezas jurídicas. A multiplicidade de significados à garantia da ordem pública enseja que a mesma se torne conteúdo indefinido, conferindo assim a aplicação da prisão preventiva a partir de qualquer evento que perturbe da paz social.

Os pressupostos contidos na prisão preventiva, devem ser muito bem delineados, haja vista a mesmo ser inerente à medida cautelas, conforme constante no artigo 312 do Código de Processo Penal, que assim dispõe, a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública. Contudo, a lei processual penal brasileira não apresenta maiores esclarecimentos acerca de em quais casos uma pessoa, quando considerada acusada, constituiria uma ameaça para a ordem pública, ensejando sua prisão preventiva. Assim foram levantados os seguintes questionamentos: A prisão preventiva, constante no artigo 312 do Código de Processo Penal Brasileiro, da forma como vem sendo aplicada fere os institutos constitucionais? A prisão preventiva pode ser decretada como forma de resgatar a credibilidade do direito?

Para tanto, o estudo tem como objetivo geral, examinar a prisão preventiva, constante no artigo 312 do Código de Processo Penal Brasileiro e sua abrangência no ordenamento jurídico brasileiro fazendo um contraponto com a abstratividade e incerteza jurídica da ordem pública. Apresentado ainda como objetivos específicos, identificar as especificidades da prisão preventiva; apontar os requisitos necessários para a decretação da prisão preventiva; e demonstrar como a prisão preventiva em detrimento à garantia da ordem pública vem sido materializada nos julgados.

Ao se considerar um Estado de Direito Democrático, o direito à liberdade é considerado uma regra, e a restrição a esse direito, uma exceção, assim sendo, para se garantir esse direito à liberdade, foram criadas as normas jurídicas que ensejam uma regulamentação da vida em sociedade, bem como, da harmonização entre os povos.

Todas as normas jurídicas existentes são conduzidas a partir de um contexto que as relacionam com suas particularidades, denominado ordenamento jurídico, o qual segundo Bobbio (2011, p. 192), pressupõe necessariamente a existência de normas e, dentre estas, a de norma fundamental que serve de garantia de unidade a todas as demais, em função de ocupar a posição mais elevada numa hierarquia de normas.

A prisão preventiva consta expressa no Código de Processo Penal, artigos 311 a 316, e resumidamente pode ser definida como uma espécie de prisão cautelar de natureza processual. A mesma é um instrumento altamente presente na vida de qualquer profissional que atue no Direito Penal, sendo essa rodeada de críticas e incertezas.

O Código de Processo Penal no artigo 312 cita a prisão preventiva como uma forma de prisão cautelar, considerando-a como uma medida cautelar que pode ser decretara, a fim de garantir a ordem pública, bem como, a ordem econômica, em detrimento à conveniência da instrução criminal, ou ainda, para instigar a aplicação da lei penal, quando houver provas do crime, ou ainda, indícios suficientes de autoria. No parágrafo único do referido artigo, é reforçado o entendimento de que a prisão preventiva também poderá ser impetrada quando do descumprimento de obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º CPP)

O artigo acima citado, afirma que pode ser decretada a prisão preventiva desde que haja fatos aceitáveis de sua autoria e provas suficientes para provar que existiu o crime. Neste entendimento, Lopes Júnior (2013, p. 85) dá sua contribuição, dizendo que, a prisão preventiva somente pode ser decretada por juiz ou tribunal competente, em decisão fundamentada, a partir de prévio pedido expresso do Ministério Público, ou mediante representação da autoridade policial.

A Constituição Federal de 1988 tornou expresso constitucionalmente que tanto o indivíduo quanto a sociedade possuem direitos e garantias fundamentais, que devem ser respeitados através de princípios como o da dignidade da pessoa humana, da saúde, da segurança pública e da liberdade. Esses princípios em algum momento poderão ser confrontados, cabendo neste tocante, uma solução racional e justa no que tange ao caso concreto.

Assim, a discussão do tema proposto nesse estudo contribuirá para o enriquecimento de ideias quanto aos vários debates que estão ocorrendo no ordenamento jurídico a respeito da indefinição semântica em face da ordem pública, não havendo assim, uma unificação jurisprudencial, fato que gera diversas interpretações, podendo acarretar em infringência de direitos fundamentais e princípios constitucionais pelos operadores da justiça brasileira, a qual ainda traz em sua estrutura, traços inquisitórios de aplicabilidade de sentença.

A metodologia empregada na realização do estudo refere-se à pesquisa qualitativa, com a intenção de interpretar as vertentes subjetivas do problema, em relação ao objeto de estudo. Para melhor compreensão e abordagem do tema proposto utiliza se a pesquisa descritiva, com vistas a descrever as principais características do tema proposto, a partir da utilização padronizada de coleta de dados. As fontes adotadas para a execução do estudo proposto serão bibliográficas, sendo utilizados, artigos científicos, livros, leis, dentre outros documentos relacionados ao tema. As informações transcritas no estudo buscam estabelecer articulações entre os dados coletados e as demais informações apresentadas, com vistas a atingir o principal objetivo da pesquisa.

1 O DIREITO PROCESSUAL PENAL E A PRISÃO PREVENTIVA

A Constituição Federal de 1988 no artigo 5º, LXI, contempla que ninguém será preso, senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei, sendo assim, a prisão é excepcional e somente ocorrerá de duas maneiras, em caso de flagrância ou por consoante ordem escrita e fundamentada do juiz competente. Neste sentindo, a liberdade é considerada uma regra, porém está poderá ser reduzida quando houver o cumprimento dos ordenamentos constitucionais e legais.

Dentro do ordenamento jurídico brasileiro, podem ser verificados alguns tipos de prisões que tangem às regras para encarceramento, como por exemplo, a prisão em flagrante, constante no capítulo II, do Código de Processo Penal modificado pela Lei nº. 13.964 de 2019; a prisão preventiva, consagrada no artigo 312 do Código de Processo Penal modificado pela Lei nº. 13.964 de 2019; a Prisão administrativa, delimitada no artigo 5º, LXI da Constituição Federal de 1988 e nos artigos 319 e 320 do Código de Processo Penal revogados pelas Lei nº. 12.403 de 2011; a Prisão por pronúncia, constante no artigo 41, §3º do Código de Processo Penal, incluído pela Lei nº. 11.689 de 2008; a Prisão resultante de sentença condenatória recorrível, abordada no artigo 387, §1º do Código de Processo Penal, incluído pela Lei nº. 12.736 de 2012; e, por fim, a Prisão temporária, enfatizada no artigo 283, caput (Redação dada pela Lei nº. 13.964 de 2019 e Lei nº. 7.960 de 1989.

No que pese à prisão preventiva, destaque do estudo em tela, salienta-se que a mesma, por mais que seja resguardada pela Constituição Federal, por restringir o direito à liberdade, deverá ser fundamentada como forma de garantir o controle efetivo das ações Estatais nos direitos individuais. A prisão preventiva dentro do Código de Processo Penal é vista como forma de acautelar a ordem pública, o regular andamento das investigações criminais e a aplicação da lei penal, sendo considerada medida excepcional conforme requisitos legais, devidamente fundamentada ao caso específico. Neste pensar, Mirabete (1999) explica que:

A prisão preventiva, em sentido estrito, é medida cautelar, constituída da privação de liberdade do acusado e decretada pelo juiz durante o inquérito ou instrução criminal, diante da existência dos pressupostos legais, para assegurar os interesses sociais de segurança. E considerada um mal necessário, pois suprime a liberdade do acusado antes de uma sentença condenatória transitada em julgado. Só se justifica em situações específicas, em casos especiais em que a custódia provisória seja indispensável. Por essa razão, a lei deixou de prever como obrigatória a prisão em determinadas situações, para ser uma medida facultativa, devendo ser aplicada apenas quando necessária segundo os requisitos estabelecidos nas normas processuais (MIRABETE, 1999. p. 409).

As possibilidades de decretação da prisão preventiva estão elencadas nos art. 311 e 312, do Código de Processo Penal, que foram modificados através da Lei nº. 13.964/2019.

Antes das modificações trazidas pelo Pacote Anticrime, esse tipo de prisão não havia previsão legal de tempo predeterminado, e, geralmente, era levado em consideração a razoabilidade do tempo da medida. Com a proposta do art. 316, parágrafo único do Código de Processo Penal, definiu um tempo para a prisão preventiva e para a (re)análise, constando disposto que, o juiz poderá revogar a prisão preventiva, se no correr do processo, verificar falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que justifiquem.

Diversamente, prevê o enunciado 35 do CNPG - Conselho Nacional de Procuradores-Gerais sobre a ilegalidade da prisão, definindo que não gera direito ao preso de ser posto imediatamente em liberdade, mas sim o direito de ter os requisitos de sua preventiva reavaliados.

Enunciado nº 35, CNPG: o esgotamento do prazo previsto no parágrafo único do art. 316 não gera direito ao preso de ser posto imediatamente em liberdade, mas direito ao reexame dos pressupostos fáticos da prisão preventiva. A eventual ilegalidade da prisão por transcurso do prazo não é automática, devendo ser avaliada judicialmente (CNPG, 2015).

O STF possui entendimento no mesmo sentido, como pode ser observado no julgado de 2020, pelo Relator Ministro Luiz Fuz, no julgado SL 1395 MC em 14 e 15/10/2020, como segue, a inobservância do prazo nonagesimal do art. 316 do Código de Processo Penal não implica automática revogação da prisão preventiva, devendo o juízo competente ser instado a reavaliar a legalidade e a atualidade de seus fundamentos.

Destaca-se que há referência à prisão preventiva em outros diplomas normativos, a exemplo da Lei Maria da Penha, da Lei de Falências. Contudo, sua decretação sempre estará condicionada à observância dos requisitos do CPP.

No que se refere aos requisitos para decretação da prisão preventiva, estes estão elencados no artigo 312, caput, que trata os requisitos como fáticos, tendo como base o fumus commissi delicti e periculum libertatis; bem como, no artigo 313, caput, que descreve os requisitos normativos.

Vale ressaltar o que estabelece o art. 312, caput, do CPP, com nova redação dada pela Lei nº. 13.964/2019:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado (BRASIL, 2019).

Dentre os requisitos fáticos, o fumus commisi delicti (prova da existência do crime + indícios de autoria) é considerado aquele fato presumivelmente criminoso, indicando a possível ocorrência do crime. Por outro lado, o periculum libertatis (garantia da ordem pública ou econômica, garantia da aplicação da lei penal ou conveniência da instrução criminal), é o momento onde existe a necessidade de mostrar de alguma maneira que manter o sujeito em liberdade poderá acarretar algum risco eminente. Cumpre salientar que para alguns doutrinadores esse risco faz referência ao processo, por outro lado, outros doutrinadores, e o STF entendem que esse risco é referente não somente ao processo, mais à sociedade em si (NUCCI, 2020).

Sempre se exigiu, para a decretação da prisão preventiva, o periculum libertatis. O Pacote Anticrime positivou tal entendimento no art. 312 ao utilizar a expressão e do perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.

Os Tribunais Superiores já adotavam o Princípio da Atualidade e Contemporaneidade para a decretação da prisão preventiva, ou seja, a situação de perigo gerada pela liberdade do imputado deve ser atual/contemporânea, não baseada em fatos do passado. A parte final do §2º do art. 312 do CPP reforça tal entendimento.

Quanto à existência do delito (fumus commisi delicti), o legislador exige a presença de prova (juízo de certeza), é necessária a convicção do juiz. Em relação à autoria, o legislador usa a palavra indício, com o significado de prova semiplena (prova de menor valor persuasivo).

Os requisitos normativos, previstos no artigo 313, caput, do CPP, determinam como pressupostos alternativos para a admissão da decretação da prisão preventiva que sejam crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; ou que seja reincidente em outro crime doloso; ou nos casos que violem as medidas protetivas de urgência nos crimes que envolvam violência doméstica e familiar contra mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência; e, por fim, quando houver dúvidas sobre a identificação civil da pessoa ou não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la (BRASIL, 2019, online).

No que diz respeito à possibilidade de prisão preventiva no caso de descumprimento de medidas protetivas, os Tribunais superiores entendem que o mero descumprimento não autoriza, por si só, a prisão. Para além do descumprimento, é necessário demonstrar a presença de uma das hipóteses do artigo 312 do CPP, que traz a ideia de periculum libertatis.

(...) Muito embora o art. 313, IV [III], do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.340/2006, admita a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos que envolvam violência doméstica e familiar contra a mulher, para garantir a execução de medidas protetivas de urgência a adoção dessa providência é condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos no art. 312 daquele diploma. É imprescindível que se demonstre, com explícita e concreta fundamentação, a necessidade da imposição da custódia para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, sem o que não se mostra razoável a privação da liberdade, ainda que haja descumprimento de medida protetiva de urgência, notadamente em se tratando de delitos punidos com pena de detenção. Ordem concedida. (STJ, 6ª Turma, HC 100.512/MT, Rel. Min. Paulo Gallotti, Dje 23/06/2008).

Diante disso, e conforme preceitua o art. 315, do CPP, as decisões que decretam as prisões preventivas sempre serão motivadas e fundamentadas. Visando acabar com a decretação da preventiva sem fundamentação (com base na garantia da ordem pública, por exemplo), o Pacote Anticrime alterou a redação do art. 315, §2º, e previu o que não será considerada uma decisão motivada.

No tocante ao momento da prisão preventiva, esta pode ser decretada na fase investigatória e na fase processual. Destaca-se que na fase processual poderá ser decretada até o trânsito em julgado. Além disso, parte da doutrina entende que a prisão preventiva seria cabível na fase investigatória apenas em relação aos crimes que não admitem prisão temporária.

A conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva de ofício pelo juiz, para a doutrina, não é possível, eis que a convalidação pelo juiz ocorre na fase investigatória, na qual ele não pode decretar medidas cautelares de ofício, sob pena de violação do sistema acusatório e da garantia da imparcialidade. O art. 310, II, do CPP, frisa ainda que a prisão em flagrante apenas será convertida em prisão preventiva se outras medidas cautelares diversas da prisão se mostrarem inadequadas ou insuficientes, sendo assim, a prisão preventiva será instrumento de ultima ratio, isto é, o último recurso utilizado pelo Estado de Direito.

Outra indagação a ser observada é se o art. 313 também precisa ser observado para fins de conversão do flagrante em preventiva, visto que o inciso II do art. 310 menciona apenas o art. 312 do CPP, não fazendo nenhuma referência ao art. 313.

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Existem duas correntes doutrinária sobre o assunto. A primeira corrente e minoritária, afirma que não há necessidade de observância, em razão de tratar-se apenas de interpretação gramatical do art. 310, II do CPP Já a segunda corrente e majoritária, afirma que deve ser observado o art. 313, visto que não há diferença entre quem foi preso em flagrante e teve a prisão foi convertida em preventiva, para alguém que estava solto e teve sua prisão preventiva decretada.

A partir de todo o apanhado realizado sobre a prisão preventiva, compreende-se que existem três situações que poderão ser averiguadas na prisão em comento: a primeira será a qualquer instante na fase da investigação, conforme artigos 311, 312 e 313 do CPP; a segunda situação se dará no momento em que converter a prisão em flagrante para preventiva, conforme observância ao artigo 310, II CPP, bem como, aos arts. 311, 312 e 313 do CPP; já a terceira, e não menos importante, será quando houver o descumprimento de cautelar diverso em relação à prisão, no qual não serão condicionadas as presunções do artigo 313 do CPP. (LIMA, 2020).

Todavia, diante dos aspectos mais relevantes acerca da prisão preventiva, salienta-se que a mesma impetra uma prisão cautelar de cunho instrumental, com vistas a trazer garantias à eficácia do processo penal. Porém, diante de sua onerosidade em relação à liberdade do acusado, deverá ser decidida quando existir todos os requisitos legais.

1.1 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À PRISÃO PREVENTIVA

Os princípios constitucionais podem ser percebidos como sendo normas jurídicas que têm por finalidade completar lacunas deixadas pelo legislador e que necessitam de complementação para o estabelecimento de valores sociais.

Segundo Nicolliti (2011, p. 98), Os princípios regem a vida humana, a partir do momento que o homem, ao evoluir, elenca alguns para justificar suas condutas atuais, como elegeu este ou aquele como regra de conduta particular.

Abrangendo o estudo sobre os princípios constitucionais, cabe neste esteio apontar as definições trazidas pelo professor Celso Antônio Bandeira de Mello (1988):

Princípio é por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se radia sobre diferentes normas compondo-lhes o espirito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que residem a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que tem por nome sistema jurídico (MELLO, 1988, p. 451).

A partir dos dizeres trazidos pelo referido autor, tem-se que os princípios constitucionais nada mais são que a fonte de todo um sistema, apresentando a função fundamental de servir como compreensão racional e inteligente do referido sistema, trazendo os direcionamentos balizadores para o pleno funcionamento do sistema jurídico.

Diferentemente das normas jurídicas que adquirem o cunho de delimitar condutas, ou seja, de coagir os indivíduos a se comportarem da forma por ela almejada, os princípios se situam no âmbito dos direitos fundamentais, ou seja, em uma interpretação valorativa para que haja sua eficácia plena. No entanto, salienta-se que buscando uma visão ampla do sistema jurídico brasileiro, as normas jurídicas se entrelaçam aos princípios, dando ênfase à valorização dos direitos fundamentais, sendo consideradas normas diferenciadas que possuem força igual ou superior às normas impositivas.

Em face dos princípios constitucionais que resultam em instrumentos legais de controle, e também de limitação da atuação do Estado em face de prisões abusivas, além de norteadores do processo penal brasileiro e da prisão preventiva, temos, o princípio da adequação, o princípio da proporcionalidade, o princípio da subsidiariedade, o princípio da jurisdição, o princípio da legalidade, o princípio da necessidade e o princípio da precariedade.

1.1.1 Princípio da adequação

O princípio da adequação tem por finalidade submeter o acusado a uma medida cautelar menos grave, visando ainda, a aplicabilidade de uma medida de coação devida, conforme as determinações cautelares que o fato em si propõe. Assim, os autores Fernando Gonçalves e Manuel João Alves (2011) expõe, que:

A adequação da medida [de coação] há de ser quer qualitativa quer quantitativamente. As medidas de coação são qualitativamente adequadas para alcançar os fins previstos no caso concreto se forem idóneas ou apta pela sua própria natureza, para realizar o fim pretendido no caso concreto. As medidas de coação hão de ser, também, quantitativamente adequadas, isto é, a sua duração ou intensidade hão de ser exigidas pela própria finalidade que se pretende alcançar no processo penal em curso (GONÇALVES; ALVES, 2011, p. 64-65).

O princípio da adequação pode ainda, ser tratado como uma tentativa de regulamentação de normas, procedimentos e regras processuais, as quais deverão ser justapostos a cada caso visando equiparar a eficácia da tutela jurisdicional. Sobre essa questão, Didier JR (2015, p. 114) dispõe que, o princípio da adequação não se refere apenas à estruturação do procedimento. A tutela jurisdicional há de ser adequada; o procedimento é apenas uma forma de encarar esse fenômeno.

Desta maneira, a partir do contexto apontando, o princípio da adequação é designado dentre as medidas cautelares como um critério de escolha, ou seja, aquele que aplicar as medidas deverá agir de forma proficiente para colocar em evidencia a seriedade da medida, de forma a cumprir todas as exigências cautelares para desempenhar de forma satisfatória o caso concreto.

1.1.2 Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade pode ser percebido como um apoio às prisões cautelares, auxiliando o juiz diante do caso concreto. Trata-se da proporcionalidade de quão grave é o crime, bem como, quais as sanções que serão aplicadas. Este princípio foi incluído também pelo artigo 193°, n° 1 do Decreto-Lei 78/87 e atualmente pode-se encontrá-lo no art. 315, §1º do CPP, conforme aponta Valente (2010):

Não obstante o próprio legislador já ter dado cumprimento a esta exigência, ao fazer depender a sujeição de medidas de coação da gravidade da pena aplicável e da existência de fortes indícios de prática de crime doloso, se em causa estiverem as medidas mais gravosas para a liberdade do arguido (artigo 27.º, n.º 3, alínea b), da CRP e artigos 200.º, 201.º e 202.º do CPP), é exigível ao aplicador da lei que afira, em concreto, da proporcionalidade da privação da liberdade, devendo este juízo constar do despacho judicial, uma vez que o princípio serve a função de limitação do poder persecutório estadual e, de forma mediata, o princípio jurídico-constitucional da proibição de excesso em matéria de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos (VALENTE, 2010, p. 445).

O princípio da proporcionalidade deverá ponderar os elementos que justificam a gravidade dos atos, bem como, a qualificação jurídica e social que o acusado irá sofrer. Assim, compreende-se que a proporcionalidade refere a uma forma de ponderação de bens diante da compreensão do domínio de restrição no âmbito dos direitos fundamentais.

Moura (2001, p. 45) afirma que ao analisar a eficácia do processo, e por outro lado, as limitações aos direitos individuais, têm que ocorrer com uma especial atenção ao princípio da proporcionalidade. Haverá, então, que impor sacrifícios de bens jurídico-constitucionais, mas só se com tais sacrifícios se obtiveram benefícios proporcionais.

1.1.3 Princípio da subsidiariedade

O princípio da subsidiariedade está baseado no fato da medida de imposição será aplicada apenas quando forem consideradas inadequadas ou até mesmo insuficientes outras medidas. Foi incluída pelos artigos 193°, n° 2 e artigo 202, n° 1 do Decreto-Lei 78/87, atualmente, previstos nos arts. 282, §§ 4º e 6º; e 310, II ambos do CPP, que dispõe da seguinte forma:

Medida de coação só pode ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coação, o que vem a ser expressão do princípio político-criminal da utilização da privação da liberdade como última ratio da política criminal, princípio da subsidiariedade a que a própria Constituição dá acolhimento expresso e inequívoco quando estabelece, no artigo 28.º, n.º 2, que a prisão preventiva tem natureza excecional, não sendo decretada ou mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei. Exigência de inadequação ou de insuficiência das medidas menos gravosas, que vincula o juiz a uma fundamentação acrescida da decisão que impõe a medida de coação prisão preventiva (ANTUNES, 2018, p. 1255).

Neste esteio, o princípio em questão encontra-se diretamente relacionado ao fato de que a prisão preventiva somente será decretada quando todas as outras se mostrarem inadequadas aos fatos concretos que o acusado praticou. Fundamentando esse entendimento Lopes Júnior (2013, p. 439) depreende que, a prisão preventiva só pode ser aplicada quando mais nenhuma se mostrar adequada aos perigos concretos do agente em causa.

1.1.4 Princípio da Jurisdição

O princípio da jurisdição pode ser compreendido como sendo aquele em que qualquer prisão cautelar somente deverá ser promulgada através de uma determinação judicial estabelecida. O seu posicionamento legal está previsto no artigo 5º, em seu inciso LXI da Constituição Federal de 1988, no qual discorre que, ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

O artigo 283 do Código de Processo Penal também dispõe sobre o princípio da jurisdição apontando que, ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão cautelar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado (BRASIL, 1941).

O princípio da jurisdição é apontado por Lopes Júnior (2013) como sendo um direito fundamental, como segue:

[] a jurisdição é um direito fundamental, tanto que, ao tratarmos dos princípios/garantias do processo penal, o primeiro a ser analisado é exatamente esse: a garantia da jurisdição. Ou seja, o direito fundamental de ser julgado por um juiz natural (cuja competência está prefixada em lei), imparcial e no prazo razoável. É nessa dimensão que a jurisdição deve ser tratada, como direito fundamental, e não apenas um poder-dever do Estado (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 440).

O referido autor abarca ainda que o princípio da jurisdição tem por finalidade a obtenção de prova quanto ao cometimento ou não de um crime, dizendo que, se a jurisdição é a atividade para obter a prova de que um sujeito cometeu um crime, desde que tal prova não tenha sido encontrada mediante um juízo, nenhum delito pode ser considerado cometido e nenhum sujeito pode ser reputado culpado nem submetido a pena (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 440).

Destarte, o princípio da jurisdição enseja o entendimento de que não há culpa sem juízo, bem como, que não há juízo sem que a acusação permeie prova e refutação, sendo para tanto, postulada a presunção de inocência até que sejam averiguadas provas contrárias, as quais deverão ser decretadas por sentença definitiva de condenação (GONÇALVES; ALVES, 2011, p. 65).

1.1.5 Princípio da legalidade

O princípio da legalidade é averiguado como sendo uma garantia individual, tendo por objetivo maior a tentativa em evitar abusos estatais, quando este estiver no exercício do poder punitivo. O referido princípio encontra respaldo no artigo 316 do Código de Processo Penal, constando como um elemento de garantia individual com vistas a evitar abusos estatais, quando do exercício do poder punitivo. Desse modo, ainda que o juiz não possa decretar, como por exemplo, a prisão preventiva de ofício, o mesmo poderá, perfeitamente, revoga-la sem a obrigatoriedade de requerimento algum.

Assim como, o Princípio da Jurisdição, o Princípio da Legalidade também se encaixa no art. 5º, inciso LXI, da Constituição Federal de 1.988, que prevê que, "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei."

Podendo ainda, ser observando no art. 283 do Código de Processo Penal, o qual dispõe que, "ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado. Para tanto, pode ser compreender que o princípio da legalidade serve como um meio de segurança perante ao poder estatal, tenho o cunho de proteger os cidadãos em seus direitos fundamentais.

1.1.6 Princípio da necessidade

O princípio da necessidade é também conhecido como, princípio de intervenção mínima, onde as medidas que forem tomadas deverão ser aplicadas de forma cordial aos direitos fundamentais do acusado. Assim, após escolhida a medida que for utilizada, a mesma deverá atender o objetivo necessário de manter os direitos do sujeito ilesos.

Consoante a base legal do Princípio da necessidade, importa salientar que o mesmo está alancado ao artigo 5º da CF, inciso LXVI, o qual discorre que ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança.

O Código de Processo Penal em seu artigo 282, I, dispõe que As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a necessidade para a aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais.

Destarte, depreende-se sobre o princípio da necessidade que deve ser utilizado como meio de intervenção mínima ao direito fundamental, isto é, deve ao mesmo tempo, cumprir com o objetivo jurídico e manter todos os direitos individuais do acusado intactos, sendo tratado como uma última opção para evitar o delito.

1.1.7 Princípio da precariedade

O princípio da precariedade compreende um prazo programado as medidas cautelares, principalmente por se tratando de uma prisão cautelar, vez que atinge diretamente o direito à liberdade.

Pode se dizer que o princípio da precariedade de certa forma engloba os princípios da adequação e o da necessidade, conforme aborda Antunes (2018):

A medida de coação é imediatamente revogada sempre que tiverem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação, porque deixou de ser necessária; e é substituída por outra menos grave ou determinada uma forma menos gravosa da sua execução quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua aplicação, porque a medida anteriormente imposta deixou de ser necessária e adequada (art.º 28.º, n.º 2, da CRP e 212.º, do CPP). Revogação ou substituição que têm lugar a todo o tempo, seja oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido (ANTUNES, 2018, p. 75).

Ademais, convém instar que o princípio da precariedade, assim como todos os outros princípios citados acima nada mais são do que uma emanação do princípio da presunção de inocência do indivíduo, ensejando que toda limitação de liberdade, quando anterior à condenação em trânsito em julgado, deve ser, não somente necessária, mais também ser suportável (ANTUNES, 2018).

2 REQUISITOS E NOÇÕES ELEMENTARES DA PRISÃO PREVENTIVA

No artigo 312 do Código de Processo Penal é possível identificar quais são as hipóteses em que a prisão preventiva pode ser decretada. Vale ressaltar que tais hipóteses não são cumulativas, ou seja, existindo somente uma delas já é possível a decretação de prisão, No entanto, para que tal medida cautelar seja consumada é necessário de antemão analisar alguns fundamentos, considerados de suma importância no que tange a tornar tal prisão, legal no ordenamento jurídico brasileiro. Dentre esses fundamentos, cita-se o periculum libertatis, o qual é estudado por Lopes Júnior (2013):

Pode-se considerar que o periculum libertatis é o perigo que decorre do estado de liberdade do sujeito passivo, previsto no CPP como o risco para a ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (LOPES JUNIOR, 2013, p. 836).

Pode se entender do trecho acima citado que se não existir o perigo a liberdade, não tem como haver risco algum em relação à comprobação legal ao art. 312, fazendo com que dessa forma, não possa existir a prisão preventiva. Para o autor Nucci (2005) existem alguns argumentos necessários para que haja a prisão que são esses:

São sempre, no mínimo três: a prova da existência do crime (materialidade) + indício suficiente de autoria + uma das situações descritas no art. 312 do CPP, a saber: a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem econômica; c) conveniência da instrução criminal; d) garantia de aplicação da lei pena (NUCCI, 2005, p. 546).

Partindo dessa mesma linha de raciocínio, Rangel (2008) pontua cada requisito estabelecido no artigo 312 do CPP, o primeiro é a respeito à ordem pública no que tange esse assunto o legislador ressalva que:

Por ordem pública, deve-se entender a paz e a tranquilidade social, que deve existir no seio da comunidade, com todas as pessoas vivendo em perfeita harmonia, sem que haja qualquer comportamento divorciado do modus vivendi em sociedade. Assim, se o indiciado ou acusado em liberdade continuar a praticar ilícitos penais, haverá perturbação da ordem pública, e a medida extrema é necessária se estiverem presentes os demais requisitos legais (RANGEL, 2008, p. 693).

O primeiro requisito estabelecido, busca de certa forma, um meio para que o réu e a sociedade possam conviver de forma harmônica, porém se o acusado cometer algum ato ilícito o mesmo estará perturbando a ordem pública, fazendo assim que seja utilizada uma medida mais extrema a respeito. O segundo requisito fundamentado está estabelecido ao inciso VII da Constituição Federal, e a respeito do assunto Rangel (2008) explica que:

A Lei nº 8.884, de 11/6/1994, em seu art. 86, incluiu no art. 312 do CPP a expressão ordem econômica, ou seja, quis permitir a prisão do autor do fato-crime que perturbasse o livre exercício de qualquer atividade econômica com abuso de poder econômico, visando a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros. A prisão para garantir a ordem econômica somente poderá ser decretada se tratar de crimes previstos nas Leis nºs 8.137/90, 8.176/91, 8.078/90 e 7.492/86 e demais normas que se referem à ordem econômica, como quer o art. 170 da Constituição Federal e seguintes c/c art. 20 da Lei nº 8.884/94 (RANGEL, 2008, p. 693).

Esse tipo de requisito é utilizado em casos de crimes que são cometidos por pessoas de maior status sociais, aqueles crimes nomeados de colarinho branco. A instrução criminal entra como o terceiro requisito, e sobre esse requisito Paulo Rangel (2008) leciona que:

Por conveniência da instrução criminal: devemos inicialmente dizer que a instrução criminal não é conveniente, mas, sim, necessária, pois, diante dos princípios da verdade processual, do contraditório e do devido processo legal, a instrução criminal é imprescindível para que se possam assegurar ao acusado todos os meios constitucionais de defesa, demonstrando existir um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Assim, decreta-se a prisão do autor dos fatos e, em liberdade, ameaçar as testemunhas, tentar subornar o perito que irá subscrever o laudo, ameaçar o juiz ou o promotor de justiça que funciona no processo, subtrair documentos imprescindíveis, à comprovação do injusto penal etc. Neste caso, a custódia cautelar justifica-se com o escopo de se garantir um processo justo, livre de contaminação probatória e seguro para que o juiz forme, honesta e lealmente, sua convicção (cf. item VII da Exposição de Motivos do CPP) (RANGEL, 2008, p. 694).

Esse terceiro requisito serve para facilitar a continuidade dos processos, sendo o referido, de natureza instrumental. Rangel (2008) cita ainda um quarto e último requisito, denominado garantia para assegurar a aplicação da lei penal, informando que esse visa:

Assegurar a aplicação da lei penal: a prisão preventiva deverá ser decretada quando houver provas seguras de que o acusado, em liberdade, irá se desfazer (ou está se desfazendo) de seus bens de raiz, tentando livrar-se de seu patrimônio com escopo de evitar o ressarcimento dos prejuízos causados pela prática do crime. Ou ainda, se há comprovação de se encontra em lugar incerto e não sabido com a intenção de se subtrair à aplicação da lei, pois, uma vez em fuga, não se submeterá ao império da Justiça. (RANGEL, 2008, p. 694).

Essa garantia é considerada instrumental e tem o cunho de facilitar a obtenção de êxito em relação à sentença penal. A respeito desse assunto Tourinho Filho (2008) escreve:

A chance de fuga do imputado é a hipótese que ensejaria o risco de ineficácia da lei penal, sendo necessário, portanto, o Estado evitar tal provável atitude do réu. Mas a mera presunção de fuga não é o suficiente para o enclausuramento preventivo, pois necessária a colheita de dados fáticos veementes a ponto de motivar a potencialidade de o indivíduo evadir-se durante a persecutio criminis. Até porque se a Lei Maior presume a inocência daquele ainda não condenado, é defeso ao juiz apenas presumir que o imputado venha a escapar da ação da Justiça (TOURINHO, 2008, p. 526).

O autor em questão teve a intenção de trazer o entendimento de que se faz necessário uma medida cautelar, pois se o acusado tiver o interesse de fugir, não é indicio suficiente para que haja a prisão do mesmo. Uma solução plausível a aplicação eficaz da lei para que o acusado não possa fugir de suas responsabilidades é pedir a prisão cautelar do mesmo.

Ressalta-se que é possível que ocorra a prisão preventiva de um acusado quando esse descumpra qualquer outra medida cautelar anteriormente decretada pelo juiz, contudo, é preciso que antes da decretação da referida prisão, o juiz analise os termos legais da medida cautelar anterior descumprida pelo acusado, para só a partir do fato constatado, fazer cumprir a prisão preventiva como última ratio.

2.1 RECURSOS DA PRISÃO PREVENTIVA

Consoante o estudo da prisão preventiva é importante destacar os momentos nos quais a mesma poderá ser decretada, bem como, revogada e redecretada.

O artigo 311 do Código de Processo Penal, dispõe que a prisão preventiva pode ser decretada a qualquer fase do inquérito policial, e ainda, da instrução criminal. É comum verificar a não observância da decretação da medida preventiva, quando da não existência do inquérito policial, no entanto, é denotado o não impedimento da prisão preventiva quando a mesma constar fundamentada em peças informativas demonstrativas da existência do crime, bem como, indícios da autoria delimitados no requerimento do Ministério Público de decretação da medida preventiva.

É de ponderar que, não sendo o inquérito necessariamente indispensável à propositura da ação penal, poderá ocorrer esteja o órgão do Ministério Público com informações mais que suficientes para ingressar em juízo com a denúncia. Os documentos e outros elementos de prova demonstram não só a materialidade delitiva, como também a autoria. Nesse caso, nada obsta que ofereça a denúncia e requeira a decretação da medida extrema. Assim, mesmo sem inquérito, possível será o encarceramento provisório (TOURINHO FILHO, 2012, p. 503).

Em face do momento da decretação da prisão preventiva, Greco Filho (2012) destaca que, pode ser decretada desde a data do fato até a sentença. Prolatada esta, se for absolutória, a preventiva seria incompatível com ela, e, se for condenatória, decorrerá, ou não, dela própria e não de preventiva. Assim, assimila-se que a prisão preventiva pode de fato ser decretada a qualquer momento do inquérito policial, ou da instrução criminal, podendo ser concedida até o oferecimento das alegações finais.

Ainda que decretada, a prisão preventiva pode ser revogada, ou mesmo cassada, conforme depreende o artigo 316 do Código de Processo Penal, que diz, o juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como, de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justificarem.

O artigo 316 do CPP confere ao juiz, tanto decretar a prisão preventiva, quanto revogar, sendo entendido que uma vez ausentes os motivos que determinam a medida preventiva, a mesma poderá ser revogada. De acordo com Sznick (1995, p. 459), em casos que envolvem o status libertatis a margem de discricionariedade desaparece.

A revogação se dá a partir da manifestação do juiz, o qual deverá proceder análise dos fatos que ensejaram a custódia cautelar, devendo a mesma ser calcada no desaparecimentos dos motivos, que, a princípio, incorreram na custódia provisória, bem como, caminhar nos parâmetros elencados pelo artigo 316 do código de Processo Penal (CAPEZ, 2011).

O referido autor salienta ainda que a revogação pode ser requerida pelo próprio réu, por seu curador, pelo Ministério Público, ou mesmo, pelo juiz, constando, a autoridade policial excluída dessa solicitação, na fase da instrução preparatória para a proposta da ação penal. Consoante ao momento da revogação, destaca-se que o mesmo ocorre no decorrer do processo, ou seja, desde o instante da decretação até a decisão da sentença definitiva de primeira instância (CAPEZ, 2011).

Ainda versando pela revogação da prisão preventiva, abrange-se os prazos, os quais são estabelecidos pelos artigos 10, 46 e 401 do Código de Processo Penal, devendo ser respeitado, não sendo permitida a procrastinação do procedimento, constando estritamente condicionado às circunstâncias da medida preventiva. Findando, destaca-se que o juiz pode, quando cabível, através de ofício, de requerimento do Ministério Público, ou ainda, reivindicador, redecretar a prisão preventiva, quando ocorrerem novas razões que justifiquem a referida (CAPEZ, 2011).

2.2 PRAZOS DA PRISÃO PREVENTIVA

Cada fase da medida de coação denominada prisão preventiva possui um prazo definido, constando os mesmos elencados no artigo 215, nº. 1, do Código de Processo Penal. Em conformidade com a redação da Lei nº. 13.964 de 2019, Assumpção (2020, p. 144), destaca que, com a nova lei, a prisão preventiva segue sem prazo determinado, contudo passa a existir o dever de a autoridade judiciária, de ofício, apreciar novamente a matéria no prazo de 90 dias. Não o fazendo, a prisão passa ser ilegal, devendo ser relaxada.

Neste contexto, o novo parágrafo da referida lei enseja a manutenção da prisão preventiva a cada 90 dias para que, ao ser averiguada situação de mudança, a autoridade judicial tenha a possibilidade de revogá-la consoante sua competência, bem como, a pedido das partes interessadas. Nucci (2020) diz que:

Cuida-se de correta providência legislativa, evitando-se a perpetuação da prisão preventiva, que não possui prazo legal para terminar. Então, cabe ao magistrado justificar a cada 90 dias as razões que o levam a manter a custódia cautelar, sob pena de gerar constrangimento ilegal. Esse constrangimento pode originar-se da omissão do juiz em justificar a manutenção da preventiva ou da fundamentação insuficiente ou inidônea (NUCCI, 2020, p. 1007).

Versando pelo mesmo posicionamento, Avena (2020) enfatiza que o legislador, consoante ao prazo da prisão preventiva busca alcançar o caráter provisório da mesma, bem como, viabilizar com que o juiz trate os delitos com cautela, a fim de compreender a continuidade dos motivos de manutenção da medida de coação em questão, quando da não observância da mesma, a tutela será considerada ilegal, bem como, suas penalidades relaxadas.

Seguindo essa mesma linha de raciocino abordada em decorrência dos prazos da prisão preventiva, Lopes Jr. (2020) denota que:

Grande evolução que evita que o juiz simplesmente esqueça do preso cautelar, bem como impõe o dever de verificar se persistem os motivos que autorizam a prisão preventiva ou já desapareceram. Tal agir deverá ser de ofício, independente de pedido, até porque se trata de controle da legalidade do ato, um dever de ofício do juiz. Por fim, chamamos a atenção de que finalmente temos o dever de revisar periodicamente a medida e, também, de que esse é um prazo com sanção (não cumprido o prazo e o reexame, a prisão será considerada ilegal) (LOPES JR. 2020, p. 925).

A partir da interpretação dos apontamentos citados, e ainda, das várias alterações constantes do Código de Processo Penal Lei nº. 13.964 de 2019, no que pese à abrangência dos prazos da medida de coação de prisão preventiva, Pacelli (2021, p. 667) observa que, essa fundamentação não precisa ser exaustiva e detalhada com base em novos fatos, mas é essencial serem declinados, pelo menos, os fundamentos que justifiquem a continuidade da medida cautelar imposta.

O Código de Processo Penal, indo em direção contrária a outras leis, não dispõe, enfaticamente, sobre o período de prisão preventiva, ele, somente, determina que o tribunal deve rever a cada 90 dias para manter, ou ainda, revogar a decisão. Tratando desse estabelecimento legal, de duração máxima para a prisão cautelar, constante da nova redação do artigo 316 do CPP, Pacelli (2021) depreende que:

Entendendo que a ausência no CPP, de fixação de prazo certo para a duração da prisão preventiva deixava o acusado inteiramente à mercê do Estado, nossa jurisprudência elaborou entendimento segundo o qual, cuidando-se de réu preso provisoriamente no curso da ação penal, deveria estar concluída nos prazos previstos em lei, sob pena de caraterização de constrangimento ilegal. A hipótese, então, estaria a ensejar o habeas corpus, com fundamento no art. 648, II, do CPP, cujo comando considera ilegal a coação quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei (PACELLI, 2021, p. 717).

A falta de determinação do prazo máximo para o cumprimento da prisão preventiva é um dos maiores problemas do sistema cautelar brasileiro, conforme o autor Lopes Jr. (2020), considerando que somente será viável a limitação aos excessos, quando for possível a determinação de um prazo com sanção, como segue:

(...) concretamente, não existe nada em termos de limite temporal das prisões cautelares, impondo-se uma urgente discussão em torno da matéria, para que normativamente sejam estabelecidos prazos máximos de duração para as prisões cautelares, a partir dos quais a segregação seja absolutamente ilegal (LOPES JR. 2020, p. 922).

Neste caso, e em considerando a impossibilidade de definição do número exato de dias de prisão preventiva, compreende-se que deve-se manter um padrão de razoabilidade, devendo o magistrado avaliar caso a caso, utilizando do bom senso, ou seja, a medida de coação denominada prisão preventiva deve ser analisa e pautada sob o prisma da razoabilidade e da proporcionalidade

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A prisão preventiva pode ser tratada como uma exceção no ordenamento jurídico brasileiro, inferindo em uma espécie de prisão cautelar que propicia maior dano à liberdade do ser humano, para tanto, compreende-se que antes de cercear a liberdade do indivíduo, o magistrado deverá explicitar a causa, ou motivo de não a substituir por uma medida cautelar alternativa, garantindo assim, a ordem pública e até mesmo o asseguramento da aplicação da lei penal, em outros ditames.

Em conformidade com o constante no artigo 312 do Código de Processo Penal para que ocorra a prisão preventiva faz-se necessária a obtenção da certeza de existência do crime, bem como, de indícios suficientes para comprovação da autoria do mesmo. No entanto, reza o artigo 5º, inciso LXXV da Constituição Federal de 1988, pela cautela quando da determinação da prisão preventiva, sob pena de indenização, quando houver erro da autoridade judiciária, e ainda do tempo fixado na condenação, considerando se imensuráveis os danos causados ao indivíduo quando esse tem sua liberdade cerceado indevidamente.

Versando pela garantia e proteção dos direitos humanos, abarca-se o princípio da presunção de inocência, delimitado no texto constitucional. O referido princípio tem por intuito antecipar uma condenação baseada tão somente em suspeita. A partir do mesmo é possível interpretar que nenhum indivíduo deveria sofrer uma condenação, sem ter sido julgado, em processo criminal, que disponha ao mesmo, sentença sem possibilidade de recurso para instância superior.

As medidas cautelares para prisão de indivíduo que tenha cometido crime foram criadas a partir da Lei nº. 12.403 de 2011 a qual é regida pelo princípio da presunção de inocência, e ainda pela possibilidade de alternatividade da prisão. Sendo essas ainda mais enfatizadas no artigo 319 do Código de Processo Penal, onde são estabelecidas 09 (nove) possibilidades de medidas cautelares consoante a prisão constante no ordenamento jurídico brasileiro, neste contexto, cita-se o comparecimento periódico em juízo; a proibição de acesso a determinados lugares; a proibição de manter contato com determinadas pessoas; a proibição de ausentar-se da Comarca; o recolhimento domiciliar; a suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira; a internação provisória quando da prática de crimes com violência; e, por fim, a fiança.

Neste ensejo, e ainda, visando enfatizar questionamentos apontados no estudo, conclui-se que é de suma importância que a aplicação de pena, seja pautada nos princípios constitucionais garantidos a todo indivíduo. Cabendo ao Estado aplicar a referida baseada estritamente nos preceitos fundamentais e basilares do direito, com vistas a cumprir sua tarefa jurisdicional, sem ferir a constituição e sem prejudicar a sociedade em decorrência de sua arbitrariedade. Ademais, compreende-se que tratar a prisão preventiva como garantia da ordem pública revela-se como uma alternativa ingênua de pensar na resolução da criminalidade, tendo em vista, tal preceito ir muito além do direito, tratando-se de também de uma questão social, havendo a necessidade de atuação incisiva do Estado na segurança pública.

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Sobre os autores
Maicon Batista Nunes

Graduando em Direito, pela Faculdade Alfredo Nasser.

Nivaldo dos Santos

Professor do Centro Universitário Alfredo Nasser. Curso de Direito. Doutor em direito e Pós-Doutor em Direito.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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