Artigo original em https://advambiental.com.br/auto-de-infracao-lavrado-contra-firma-ou-empresario-individual/
Sem delongas, a empresa individual não se reveste de personalidade jurídica, porque o seu titular atua em nome próprio e por sua conta e risco. Seus bens particulares respondem pelas obrigações contraídas, inexistindo separação de patrimônio.
Isso significa que não há distinção entre a pessoa física e a jurídica, pelo simples motivo de estarem acompanhadas de CPF e CNPJ, respectivamente. O patrimônio é comum a ambas as figuras, pois se confunde.
A empresa individual não tem personalidade jurídica própria e independente da de seu titular, tratando-se de uma única pessoa, de modo que a empresa individual é mera ficção jurídica, respondendo seu representante legal, com seus bens, por todos os atos praticados.
Tratando-se, pois, de firma individual, figura jurídica que não possui personalidade jurídica distinta da de seu titular, não é possível responsabilizá-la por infração ambiental de forma autônoma.
Com efeito, o empresário individual atua em nome próprio, respondendo com seu patrimônio pessoal pelas obrigações assumidas no exercício de suas atividades profissionais, sem as limitações de responsabilidade aplicáveis às sociedades empresárias e demais pessoas jurídicas.
Dizendo de outro modo, o empresário individual confunde-se com a própria pessoa física que representa, de sorte que o processamento e a penalização autônomos de ambos, ofertando-lhes tratamento penal como se figuras distintas fossem, resulta em inarredável bis in iden, conduta vedada pelo ordenamento jurídico pátrio.
O QUE DIZ A DOUTRINA SOBRE FIRMA INDIVIDUAL
Sobre os empresários individuais, denominados de comerciantes individuais até a entrada em vigor do Código Civil de 2002, calham-se as lúcidas lições de Fábio Ulhoa Coelho[1], redigida nas seguintes letras:
O empresário pode ser pessoa física ou jurídica. No primeiro caso, denomina-se empresário individual; no segundo, sociedade empresária. (...) O empresário individual só está autorizado a adotar firma, baseado, naturalmente, em seu nome civil. Poderá ou não abreviá-lo na composição do nome empresarial e poderá, se desejar, agregar o ramo de atividade a que se dedica.
Acerca do tema, Marcelo Bertoldi e Marcia Carla Pereira Ribeiro[2] tecem as seguintes considerações:
A empresa - atividade exercida pelo empresário - não pressupõe a existência de uma sociedade, na medida em que esta atividade pode ser exercida por uma única pessoa física e não por um conjunto de pessoas reunidas em sociedade. Enquanto a sociedade é o sujeito de direito, a empresa é o objeto de direito, ou seja, a empresa, ao contrário da sociedade, não tem personalidade jurídica, não é pessoa jurídica.
Nessa senda, não se olvida que as empresas individuais possuem um número de CNPJ junto à Receita Federal, todavia tal circunstância não possui o condão de outorgar-lhe personalidade jurídica, uma vez que advém da imposição daquele órgão unicamente para fins tributários em relação aos quais elas são equiparadas às pessoas jurídicas.
JURISPRUDÊNCIA SOBRE INFRAÇÃO AMBIENTAL COMETIDA POR EMPRESÁRIO INDIVIDUAL
A firma individual é equiparada à pessoa jurídica tão-somente para fins tributários. A Jurisprudência é firme neste sentido:
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. LAVRA DE AREIA EM DESACORDO COM LEGISLAÇÃO MINERÁRIA. ART. 55 DA LEI Nº 9.605/98 E ART. 2º DA LEI Nº 8.176/91. IMPUTAÇÃO À PESSOA JURÍDICA. FIRMA INDIVIDUAL. BIS IN IDEN. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. MULTA. REDUÇÃO. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO.
1. Trata-se de caso em que foi constatado que a pessoa jurídica e pessoa física como administrador exploraram lavra de areia em desacordo com a legislação minerária;
2. Tratando-se de firma individual, figura jurídica que não possui personalidade jurídica distinta da de seu titular, não é possível responsabilizá-la de forma autônoma. O empresário individual confunde-se com a própria pessoa física que representa, de sorte que o processamento e a penalização penal autônomos de ambos, como se figuras distintas fossem, resulta em inarredável bis in iden. Processo extinto sem julgamento do mérito em relação à imputação realizada à pessoa jurídica.
CONCLUSÃO
O registro no CNPJ não altera a natureza jurídica do empresário individual, que é de pessoa natural, mas apenas concede o regular exercício da atividade empresarial, em observância à legislação tributária.
Ressalte-se que o empresário individual é uma pessoa natural que exerce uma atividade empresarial, não se enquadrando no rol de pessoas jurídicas disciplinado pelo artigo 44 do Código Civil[3].
Desse modo, a firma individual não tem personalidade diversa e separada da de seu titular. Trata-se de uma única pessoa, com um único patrimônio, e uma única responsabilidade patrimonial perante a administração fazendária.
O empresário individual exerce a atividade empresarial em nome próprio, de modo que a pessoa natural responde com seus bens pelas obrigações assumidas.
Vale destacar, que a questão do empresário individual, quando houver acusação de infração ou crime ambiental conjuntamente com a firma individual, é matéria de ordem pública, podendo ser reconhecida pelo Juízo, de ofício, a qualquer tempo.
Portanto, por não possuir personalidade jurídica distinta da de seu titular, eventual auto de infração ambiental ou até denúncia por crime ambiental contra o empresário individual, conjuntamente com o seu titular, pela prática do mesmo delito, incorre em indesejável bis in idem, não sendo possível.
[1] Manual de Direito Comercial, 20. ed, 2008, p. 19 e 76/77.
[2] Curso Avançado de Direito Comercial, 3. ed. 2006, p. 51.
[3] Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: I - as associações; II - as sociedades; III - as fundações; IV - as organizações religiosas; V - os partidos políticos; VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada; § 1º São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento. § 2º As disposições concernentes às associações aplicam-se subsidiariamente às sociedades que são objeto do Livro II da Parte Especial deste Código; § 3º Os partidos políticos serão organizados e funcionarão conforme o disposto em lei específica.
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