A concorrência sucessória de cônjuge/companheiro com descendentes e ascendentes

24/06/2022 às 11:12
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RESUMO

Sabe-se que as discussões a cerca da concorrência sucessória é um tema recorrente na atualidade. Após o Novo Código Cívil de 2002, essa questão tornou-se uma problemática ainda maior, devido a alteração da ordem sucessória e de temas relevantes para o Direito de Família e de Sucessões.

Sabe-se que a sucessão pode acontecer de duas formas, a primeira é a testamentária, que ocorre quando o falido deixa um testamento, que nos limites da lei, detalha como ele deseja que aconteça a distribuição dos seus bens, e a segunda é a legítima, nesse caso, o falecido não deixa testamento, ou deixou um testamento que houve caducidade, e devido a invalidade deste ou a inexistência, a sucessão é determinada pela lei. Assim, na maioria dos casos há grande divergência entre os concorrêntes sucessórios, e necessita-se cada vez mais de intervenções claras da lei.

É nesse contexto que o Código de 2002 trouxe uma mudança na ordem sucessória, esta tratando-se da sucessão legítima, em que o artigo 1829 trouxe sua ordem legítima, tratando primeiramente dos descendentes, em concorrência com o cônjuje sobrevivente, a depender do regime em que ocorria o casamento; posteriormente há os ascendentes em concorrência também com o cônjuje; depois o cônjuje sobrevivente, apenas; e, por fim, os colaterais. E nesses parâmetros que trata-se e divide-se a concorrência sucessória.

PALAVRAS CHAVE

Concorrência; Sucessão; Cônjuje; Ascendentes; Descendentes.

INTRODUÇÃO

Sabe-se que o Direito de Sucessões é, por vezes, palco de polêmica e atrito familiar. Nesse contexto, ao lidar com situações que envolvem cônjuje/companheira e descendentes ou ascendentes que concorrem aos bens de sucessão, é notório que surgem inúmeras dúvidas e questionamentos à respeito da forma dessa divisão, e, há ainda inúmeros tabus correlacionados ao direito sucessório.

Além disso, os novos contextos familiares, que surgiram principalmente no advento do século 21, aumentaram ainda mais esses questionamentos, tendo em vista que cada vez mais surgem novas variantes familiares, tais como quando o falecido obteve mais de um casamento, com descendentes em diferentes contextos de relacionamentos, o aumento do número de casais em união estável, dentre outros.

Diante disso, objetifica-se sanar boa parte dessas dúvidas, em particular aquelas em que direcionam-se a união estável, cônjujes e companheiros(as), bem como descendentes e ascendentes, e a forma que ocorre a concorrência sucessória entre eles.

É importante ressaltar que foi através da alteração do Código Civil em 2002, alterando a sucessão legítima, que o cônjuje passou a concorrer simultaneamente com os descendentes aos bens do falecido. O Código de 1916, que vigorava anteriormente a mudança, trazia o cônjuje como sucessor legítimo facultativo, sendo após a alteração sucessor necessário.Porém, tal concorrência é condicionada ao regime de bens que o casamento vigorava, ou seja, devem estar casados no regime de separação convencional de bens; no regime de comunhão parcial de bens com bens particulares do de cojus; e, por fim, no regime de participação final nos aquestros.

É válido dizer que há divergência doutrinária a cerca da concorrência no regime de separação convencional de bens e o da separação legal de bens, com isso, foi mantida a decisão, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que é reconhecido como herdeiro necessário o cônjuje sobrevivente. Em suma, este concorre junto aos descendentes na herança. Por outro lado, não existe previsão quanto a concorrência no regime da separação legal de bens.Nesse contexto, ao mudar a sucessão no CC vigente, o legislador buscou amparar o cônjuje sobrevivente, tendo em vista que antes os descendentes herdavam tudo.

Sabe-se que a alteração do Código Cívil em 2002 trouxe consigo muitas mudanças a cerca da sucessão e seus pontos principais, tais como a ordem legítima e os beneficiados. A exemplo de tais mudanças, pode-se explanar que no Código de 1916 o cônjuje era tido como sucessor legítimo facultativo, ao contrário do novo código, que o trouxe como sucessor necessário, e assim, concorre a herança com os descendentes. É válido lembrar que o cônjuje sobrevivente participará da concorrência junto aos descendentes a depender do regime legal de bens do casamento.

Em outra vertente, aponta-se a concorrência entre ascendente e cônjuje, que é tratada no artigo 1837 do Código Cívil. Nesse caso, caso pai, mãe e cônjujesejam os únicos herdeiros, herdará cada um um terço da herança. Porém, existindo apenas um ascendente em primeiro grau, sendo pau ou mãe, ou ascendentes de maior grau, o cônjuje fica com metade da herança.

Antes de tudo, para entender como se origina a sucessão, é preciso explanar que está disciplinada no Código Cívil, e diz respeito a morte da pessoa natural, essa morte pode ser a morte real ou presumida, e dessa maneira os bens do de cujos segue as normas sucessórias trazidas pelo direito civil. Em via de regra, a forma como acontece a concorrência sucessória está intrinsecamente ligado as relações familiares, e atualmente, a partir no novo código civil de 2002, abrange também as entidades familiares fora dos padrões mais conhecidos pela sociedade, como exemplo, a união de fato.

Inicialmente, como supracitado, é necessário falar da ordem da vocação hereditária tratada na sucessão legítima, conforme aponta o art. 1829 cc, em que existe entre os herdeiros. Antes, quais são os sucessores legítimos? Há dois tipos: os herdeiros legítimos necessários, que são os descendentes, ascendentes e o cônjuje sobrevivente; e os herdeiros legítimos facultativos, que são os convivente sobrevivente e os colaterais em ate 4º grau. Dessa forma, é determinado que essa ordem deve ser respeitada da seguinte ordem: primeiramente concorrem descendentes junto ao cônjuje sobrevivente, no entanto, para que essa concorrência ocorra é necessário observar o regime de bens que vigorava o casamento, pois não ocorre se o regime for de comunhão universal de bens ou no regime da comunhão parcial, em casos que não houver bens particulares por parte do autor da herança.

É notório que os descendentes são herdeiros preferenciais desde os mais priomordiais tempos, isso porque o vínculo afetivo entre descendentes e seus respectivos ascendentes é e sempre foi muito forte, então os descendentes estão sempre no início da ordem de vocação hereditária, que inclusive foi mantido pelo novo código cívil de 2002, acrescentando-se apenas, junto a eles, o cônjuje sobrevivente do de cujus. Em seguida da ordem sucessória, há os ascendentes em concorrência com o cônjuje, e neste caso o regime de bens que vigorava o casamento não tem relevância. Após, há o cônjuje sobrevivente, apenas. E, para finalizar a ordem, têm-se os colaterais.

Pode-se observar que o atual código civil traz como prioridade para a sucessão os descendentes, isso justifica-se devido, principalmente, a presunção de vontade do autor da herança, como forma de continuidade da vida humana. Dessa maneira, exeto o direito de representação, se obedece a ordem de que os descendentes de grau mais próximo excluem os mais distantes, de forma que todos os descendentes são participantes, a partir desta ordem. A exemplo, filhos são prioridades, mas, na inexistência deles, sobrevêem os netos, faltando ainda ester, chama-se os bisnetos, mas, apenas em casos que não há representação. Ainda a respeito dos descendentes, é preciso tratar a cerca do art. 1835 cc, que diz:

Artigo 1835 da Lei nº 10.406 de 10 de Janeiro de 2002 Na linha descendente, os filhos sucedem por cabeça, e os outros descendentes, por cabeça ou por estirpe, conforme se achem ou não no mesmo grau.

Nesse sentido, pode-se exemplificar que inicialmente, os bens deixados pelo falecido serão divididos igualmente entre os filhos, no entanto, se acontecer de falecer algum dos herdeiros, e este, deixar mais de um filho, ou seja, mais de um neto do de cujus, a parte do filho será dividida entre os netos, o que chama-se de sucessão por estirpe.

Em seguida, é preciso tratar da concorrência entre descendentes e cônjujes. Nesse sentido, pode-se entender a partir do art. 1.829, I do CC, que os descendentes concorrem junto ao cônjuje do de cujus de forma legítima. Mas, pode-se citar três casos em que o cônjuje não participa da sucessão. O primeiro caso é quando o cônjuje sobrevivente e o falecido vigoravam seu casamento no regime de comunhão universal de bens, nesse caso ,não há hipóteses de concorrência. O segundo caso é quando forem casados em regime obrigatório de bens, por motivos óbvios; e , por fim, a terceira impossibilidade ao cônjuje é quando o casamento vigorava no regume de comunhão parcial de bens sem bens particulares deixados pelo falecido. Além disso, há outra exceção quanto ao cônjuje herdeiro:

Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse contexto, tal direito a sucessão só é concedido ao cônjuje sobrevi-vente em casos que não estavam separados judicialmente ou separados de fato há mais de dois anos no momento que ocorre a morte do de cujus, mas, havendo forma de provar que o sobrevivente tinha, inocentemente, uma convivência impossibilitada com o falecido, participa, nessa ocasião, juntamente a concorrência.

Analisados todos os fatos trazidos pelo código como exceções, e não enquadrando o cônjuje sobrevivente a nenhuma delas, o Código Civil de 2002 traz em seu artigo 1832 a forma correta e regida em lei para como deve acontecer a concorrência entre descendentes e cônjuje, bem como a forma exata de sua divisão. Assim, determina a lei que para o cônjuje cabe quinhão igual ao dos que sucedem por cabeça, mas, diz ainda que essa quota não poderá ser menos que a quarta parte da herança. Dessa forma, pode exemplificar se o falecido deixa como herdeiros o cônjuje sobrevivente e quatro filhos ou mais, caberá ao cônjuje um quarto, e os três quartos que restam divide-se aos filhos.

Por outro lado, é necessário tratar da chamada sucessão dos ascendentes, que são aqueles que sucesem subsidiariamente aos descendentes do de cujus, de forma a concorrer com o cônjuje. Conforme afirma o art. 1.835 CC, os ascendentes serão inclusos a sucessão em hipóteses de falta de descendentes, e, assim, concorrerão junto ao cônjuje sobrevivente. Da mesma forma que funciona com os descendentes, o grau mais próximo de ascendente exclui o mais distante. Além disso, há ainda no código que se houver igualdade em grau e diversidade de linha, o legislador aponta que divide-se metade para a linha paterna e metade para a linha materna. Em suma, é possível afirmar que com base nesse artigo, os pais estando vivos, concorrem a sucessão com o cônjuje sobrevivente, e assim, não há hipóteses de sucessão para os avós, e nesse caso, herda metade o pai e metade a mãe.

Além disso, há o direito de representação, que não se enquadra na vocação hereditária dos ascendentes, a exemplo, caso só haja um dos pais vivos, este herda tudo, ou seja, os sucessores do ascendente morto não herderão, somente aquele vivo no mesmo grau. É de suma relevância ressaltar que, diferentemente do modo que ocorre a concorrência entre cônjujes e descendentes em que o regime que vigora o casamento é de total importância para que concorram ou não, na sucessão legítima dos cônjujes com os ascendentes sempre haverá concorrência entre ambos, não importanto o regime em que acontecia o casamento com o falecido.

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Necessita-se falar ainda da sucessão do cônjuje. Nesse sentido,apresenta-se o art. 1.838 do Código Cívil de 2002, em que afirma que o cônjuje sofrevivente herda totalmente os bens do falecido em caso de não haver descendentes e ascendentes. Porém, para isto, é necessário que, além da ausência destes (ascendentes e descendentes), o sobrevivente precisa enquadrar-se nas hipóteses do art. 1.830 CC. Estando ele de acordo com esse artigo, sucede a totalidade dos bens, conforme diz. Além disso, o artigo seguinte ao supracitado, tem como exigência que o cônjuje sobrevivente comprove o local que residia como do de cujus, pois dessa forma ele terá direito de habitação ao imóvel que residiam, caso não exista inventariados.

Ademais, há a sucessão dos colaterais, que na ordem de vocação hereditária são os derradeiros a entrarem para a sucessão legítima, nesse sentido, para que os colaterais participem da sucessão, é preciso que não existam nem descendentes, nem ascendentes e nem cônjuje sobrevivente que enquadre-se nas exigências da Lei, conforme diz o art. 1.839 do CC:

Art. 1.839. Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições estabelecidas no art. 1.830, serão chamados a suceder os colaterais até o quarto grau.

Porém, sabe-se que existe a regra de que os mais próximos excluem os mais distantes, mas, nos colaterais a lei concede uma exceção no que diz respeito a sucessão legítima a representação, pois, para eles é possível a sucessão por estirpe. A respeito dos colaterais, afirma-se que são considerados herdeiros legítimos os irmãos, sobrinhos, tios, primos, sobrinhos-netos e tios-avós, no entanto, não considera-se como necessáarios, pois caso o autor tem a possibilidade de excluí-los. O código cívil abrenge em seus artigos 1.841, 1.842 e 1.843 a respeito da sucessão legítima dos colaterais, conforme abrange a seguir:

Art. 1.841. Concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar.

Art. 1.842. Não concorrendo a herança irmão bilateral, herdarão, em partes iguais, os unilaterais.

Art. 1843. Na falta de irmãos, herdarão os filhos destes, e não os havendo, os tios.

É de suma importância tratar também daqueles casos, que embora raros, acontecem: em que nenhum dos sucessores legítimos acima citados são encontrados, ou, se algum foi encontrado, renunciou a herança. Nessas duas hipóteses, a herança é recolhida pelo Estado, conforma aplica o art. 1.844 do CC. Tal artigo detalha que nas hipóteses acima, a totalidade dos bens deixados pelo falecido devem ser destinadas ao Município ou ao Distrito Federal, conforme for a localização dos bens, e ainda, se localizados em território federal, os bens devem ser enviados à União.

Lembra-se também que não há p que se falar em aceitação ou renúncia por parte do Estado, tendo em vista que este não é herdeiro e sim um sucessor obrigatório, não importando os encargos advindos da herança, pois o papel do Estado nesse caso é recolher a herança na falta de hereiro, tornando-se assim de domínio público os bens deixados pelo falecido.

Em outra vertente trata-se da sucessão do companheiro sobrevivente, o que pode-se dizer que nada mais é que a situação dos que vivem em união estável. Sabe-se que a união estável pode ser provada ainda que não haja documentos a comprová-la. É nítido que a existência de documentos comprovatórios são facilitadores, mas não obrigacionais. O Código Civil de 2002 não negligenciou tal situação, e trouxe seu parecer:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição familiar.

Antes, para ser considerado união estável necessitava-se de um prazo de no mínimo cinco anos de existência, porém, atualmente não há prazo específico trazido por Lei, o essencial é que tenha o reconhecimento como companheiro(a) do falecido, ou seja, que seja de convivência pública, de maneira contínua e duradoura, além de que essa relação tenha sido constituída com a intenção de formar uma família.

O artigo 1.790 do CC limita que o companheiro ou companheira somente concorrem àqueles bens que foram conquistados no decorrer da união estável de maneira onerosa. Assim, conclui-se que o cáuculo da quota em que o companheiro herdará, se dá apenas a respeito dos bens que foram adquiridos de forma onerosa, ou seja, não ocorre sob os bens em geral do falecido. Além disso, o artigo citado acima traz a circunstância em que o companheiro sobrevivente tem a possibilidade de concorrer com os parentes colaterais em até quarto grau.

Outro fato digno de explicação a respeito de união estável é que o Código Cívil não traz prazo específico para que se considere união estável, dessa forma é possível que uma pessoa, no período de sua morte, esteja há dois anos ou mais separado de fato, e durante esse período tenha constituído união estável com outra pessoa. Esse fato, por tornar-se confuso causa grandes transtornos aos juristas, devido a falta de explanação sobre tal no código civil. Nesse aspecto, o doutrinador Mário Luiz Delgado Régis aponta que a melhor forma de resolver seria:

No inciso IV do art. 1790, tido como norma especial em relação ao art. 1830, assegurando-se, assim, ao companheiro, a totalidade da herança no tocante a esses bens, e excluindo, em consequência, quanto aos mesmos, qualquer direito sucessório do cônjuge.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FREIRE, Reinaldo Franceschini et al. Concorrência sucessória na união estável. 2008.

MUSTAFÁ, Letícia Rodrigues. A concorrência sucessória entre o cônjuge supérstite e os descendentes. 2016.

DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO, Programa; DE MATTOS, Paulo Henrique Reis. A CONCORRÊNCIA SUCESSÓRIA DEFERIDA AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE.

GOMES, Arthur et al. A concorrência sucessória do cônjuge sobrevivente na renúncia do herdeiro descendente.

DE FREITAS, Letícia Moreira Barbosa; DE OLIVEIRA, Amanda Letícia Botelho; SILVA, Ruskaya Aparecida Panho. A DIFERENÇA DADA AO CÔNJUGE E AO COMPANHEIRO NA CONCORRÊNCIA SUCESSÓRIA E COMENTÁRIOS SOBRE A POSSÍVEL INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. CIÊNCIA AMAZÔNIDA, v. 1, n. 1, 2016.

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