Inexistência de área de preservação permanente de vereda

28/06/2022 às 20:37

Resumo:


  • O Código Florestal define as Áreas de Preservação Permanente (APPs) em zonas rurais ou urbanas, como faixas marginais de cursos d'água e áreas no entorno de lagos e lagoas naturais.

  • O conceito de nascentes, olhos d'água e veredas está disposto no artigo 3º do Código Florestal, sendo consideradas APPs as áreas no entorno de olhos d'água e nascentes, bem como as faixas de veredas.

  • Em relação às APPs de olhos d'água, o Código Florestal inclui somente as nascentes e olhos d'água perenes no rol das áreas de preservação permanente, excluindo os olhos d'água intermitentes.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Nulidade de auto de infração ambiental aplicado por área de preservação permanente de nascentes, veredas ou áreas úmidas.

Artigo original em https://advambiental.com.br/inexistencia-de-area-de-preservacao-permanente-de-vereda/

 

Muitas vezes, o órgão ambiental lavra auto de infração ambiental, ou até mesmo o Ministério Público ajuíza uma ação civil pública alegando que o imóvel do autuado ou da parte seria caracterizado como área de preservação permanente em razão da suposta existência de olhos d'água, nascentes e veredas.

Porém, na maioria das vezes, o imóvel não possui área que se caracterize como de preservação permanente, nem que inviabilize a exploração rural, a instalação de edificações, e tampouco moradias.

O QUE DIZ O CÓDIGO FLORESTAL SOBRE APP DE VEREDA

Importante recordar que de acordo com o artigo 4º do atual Código Florestal (Lei Federal 12.651/2012), são Áreas de Preservação Permanentes:

Art. 4º Considera-se Area de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

I - as faixas marginais de qualquer curso d'água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:

a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d'água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;

b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;

III - as áreas no entorno dos reservatórios d'água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d'água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;

a) - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d'água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros;

b) - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive;

IV - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

VII - os manguezais, em toda a sua extensão;

a) as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;

b) no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação a base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d'água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação;

c) as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação;

d) em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.

CONCEITOS DE VEREDA NO CÓDIGO FLORESTAL

Vale observar que os conceitos de nascentes, olhos d'água e veredas estão dispostos no artigo 3º do Código Florestal, in verbis:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: [....]

a) vereda: fitofisionomia de savana, encontrada em solos hidromórficos, usualmente com a palmeira arbórea Mauritia flexuosa - buriti emergente, sem formar dossel, em meio a agrupamentos de espécies arbustivo-herbáceas; [...]

b) nascente: afloramento natural do lençol freático que apresenta perenidade e dá início a um curso d'água;

c) olho d'água: afloramento natural do lençol freático, mesmo que intermitente;

Em síntese, são consideradas Áreas de Preservação Permanentes:

  • o raio de 50 metros no entorno de olhos d'água e nascentes, que são afloramentos naturais d'água; e, ainda.
  • a faixa de 50 metros estabelecidos nas duas margens da vereda, uma espécie de savana brasileira, com presença da espécie buriti, iniciada a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.

APP DE OLHO DÁGUA

Sobre as Áreas de Preservação Permanentes de olho d'água, é relevante notar que embora o art. 3º, XVIII o defina como afloramento natural do lençol freático, mesmo que intermitente, nota-se que o novo Código incluiu somente as nascentes e olhos d'água perenes no rol das áreas de preservação permanente (art. 4º, IV)[1].

O autor Lucas Azevedo de Carvalho[2], ao tratar do tema, assim o esclarece:

Válido observar que, de acordo com o Novo Código, para ser nascente é preciso perenidade e formação de um curso d'água. Assim, em caso de intermitência ou de formação de outra cumulação de água que não seja um curso, não haverá, do ponto de vista legal, "nascente".

No caso de o afloramento não resultar em um curso d'água ter-se-á "olho d'água" e, caso este seja perene, receberá do Código o mesmo tratamento de uma nascente. [...]

Em não resultando o afloramento em um curso d'água e não sendo o mesmo perene, ter-se-á um olho d'água intermitente não sendo considerado como de preservação permanente a área ao entorno do mesmo [...].

Também para Maria Gravina Ogata, Maria Lucia Cardoso de Souza e Fernando Antônio Esteves de Araújo Silva[3], é imprescindível o pressuposto da "perenidade" no conceito de nascente e olhos d'água:

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Outro aspecto digno de nota refere-se a questão da perenidade associada ao conceito de nascente, bem como a condição de que esta dê início a formação de um curso d'água, dando, portanto, a ideia de fluxo. [...].

Observa-se que este conceito legal diverge de conceitos técnicos mais abrangentes apresentados por especialistas, a exemplo de Calheiros et al (2004) [...]".

Vê-se que o Código Florestal tratou de separar os conceitos de nascente e de olhos d'água [...], o que na prática não contribui para a aplicabilidade da norma, uma vez que ambos os conceitos são igualmente designados como Area de Preservação Permanente (APP), desde que perenes, [...].

Ao teor do referido inc. IV do art. 4º, as nascentes e os olhos d'água, quando intermitentes, não terão protegidas o seu entorno como Áreas de Preservação Permanente (APP).

Em relação a Área de Preservação Permanente de vereda, conforme mencionado anteriormente, a lei a descreve como área com "fitofisionomia de savana, encontrada em solos hidromórficos, usualmente com a palmeira arbórea Mauritia flexuosa - buriti emergente, sem formar dossel, em meio a agrupamentos de espécies arbustivo-herbáceas", de modo que se faz "necessário o cuidado para não se estabelecer confusão entre esse significado do termo vereda e outro significado que lhe é atribuído, especialmente entre hidrólogos e agrônomos, qual seja de nascente difusa, isto é, um afloramento difuso de lençol freático, feição hidrogeológica passível de ocorrer em todos os biomas brasileiros.[4]

CONCLUSÃO: ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE DE VEREDAS

As veredas são uma espécie de área úmida, sendo este último conceito mais amplo. Ocorre que a propriedade em questão está localizada em área úmida, mas não em vereda.

As áreas úmidas, conforme o artigo 3º, XXV, do Código Florestal, são assim definidas: "pantanais e superfícies terrestres cobertas de forma periódica por águas, cobertas originalmente por florestas ou outras formas de vegetação adaptadas a inundação".

Por sua vez, o artigo 6º, inciso IX, do mesmo diploma legal especifica que:

Art. 6º. Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades: [...] IX - proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional.

O que se extrai desse dispositivo é que para que a propriedade ser considerada área úmida, seja também considerada vereda e, Área de Preservação Permanente, seria necessária a sua declaração expressa, por ato do Chefe do Poder Executivo, como de interesse social.

Com efeito, a área úmida se enquadra na condição técnico/jurídica de área úmida, em consonância com a definição contida no Inciso XXV do Artigo 3º da Lei nº 12.651/2012, não considerada como de preservação permanente.

E, tendo em vista que as veredas são uma espécie de áreas úmidas, acaba por ser lógico concluir que as formações vegetativas de muitas regiões do Brasil seriam, de alguma maneira, semelhantes.

No entanto, nem toda área úmida deve ser considerada vereda, de modo que a análise da vegetação existente em cada região não é, por si só, critério suficiente para que se chegue a uma conclusão sobre sua definição.

Portanto, a vereda é uma espécie de área úmida, e, sendo assim, é errôneo defender que, por ser uma área úmida, consequentemente haveria uma vereda diante dessa mera condição de área úmida, conforme o novo Código Florestal.

 

[1] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 103 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 1320.

[2] CARVALHO, Lucas Azevedo D. O novo código florestal comentado: artigo por artigo, com as alterafÕes trazidas pela lei n. 12.727, de 17.10.2012 e referências ao Decreto 7.830, de 17.10.2012. Curitiba: Juruá, 2013, pág. 154-155.

[3] In MILARÉ, Édis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. Coord. Novo Código Florestal - Comentários à Lei 16.651, de 25 de maio de 2012, e à Medida Provisória 571, de 25 de maio de 2012. São Paulo: RT, 2012, p. 116-119.

[4] MILARÉ, Édis; MACHADO, Paulo Affonso Leme. Coord. Novo Código Florestal - Comentários à Lei 16.651, de 25 de maio de 2012, e à Medida Provisória 571, de 25 de maio de 2012. São Paulo: RT, 2012, p. 101.


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Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: [email protected].

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