RESUMO
O presente artigo objetiva, através da revisão bibliográfica de leis, jurisprudências, doutrinas e enunciados, a possibilidade de se conceder ou não as tutelas provisórias no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis diante da ausência de previsão legal da Lei nº 9.099/95. Para tanto, foram estudadas as leis do microssistema dos Juizados Especiais bem como as que permeiam o tema, os princípios, o instituto das tutelas provisórias e a sua aplicação nas leis dos Juizados Especiais e, finalmente, os Enunciados atinentes ao tema e a jurisprudência nacional e tocantinense. Desse modo, utilizou-se como metodologia o método dedutivo onde pode-se concluir que as tutelas provisórias podem ser utilizadas no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, ainda que incidentalmente.
Palavras-chaves: Tutelas provisórias. Juizados especiais. Lei 9.099/95. Aplicabilidade.
ABSTRACT
The present article aims, through the bibliographic review of laws, jurisprudence, doctrines and statements, the possibility of granting or not the provisional guardianship in the scope of the Special Civil Courts in the absence of legal provision of Law nº 9.099/95. Therefore, the laws of the Special Courts microsystem were studied, as well as those that permeate the theme, the principles, the institute of provisional guardianship and its application in the laws of the Special Courts and, finally, the Statements related to the theme and the national and Tocantins jurisprudence. Thus, the deductive method was used as a methodology, where it can be concluded that provisional injunctions can be used within the scope of Special Civil Courts, even if incidentally.
Key-words: Provisional guardianship. Special Courts. Law 9099/95. Applicability.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. Artigo
CNJ Conselho Nacional de Justiça
CPC Código de Processo Civil
CRFB Constituição da República Federativa do Brasil
FONAJE Fóruns Nacionais dos Juizados Especiais
FPPC Fórum Permanente de Processualistas Civis
JEC Juizado Especial Cível
JEF Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal
Nº Número
PPGCom Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Sociedade
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
TJ Tribunal de Justiça
TO Tocantins
UFT Universidade Federal do Tocantins
SUMÁRIO
2 A PREVISÃO CONSTITUCIONAL, definição e PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS
2.1 Origem dos Juizados Especiais
2.2 Definição de Juizados Especiais
2.3 Os Princípios Fundamentais dos Juizados Especiais.
2.3.2 Princípio da Simplicidade e Informalidade
2.3.3 Princípios da Economia Processual e Celeridade
2.4 Previsão Legal de Aplicação Supletiva do CPC/15 à Lei 9.099/95.
3.3 Diferença entre caráter antecedente e incidental
4 TUTELAS PROVISÓRIAS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
4.1 O que dizem os enunciados FONAJE e FPPC.
4.2 Como tem julgado a justiça tocantinense e do Brasil sobre o assunto.
- INTRODUÇÃO
O presente trabalho buscou fazer uma análise da possibilidade legal da Concessão de Tutelas Provisórias nos Juizados Especiais Cíveis.
As espécies de tutelas provisórias foram unificadas pelo Código de Processo Civil (CPC) 2015, passando a ser denominadas genericamente de Tutelas provisórias sob a regulamentação dos arts. 294 a 311.
Assim, dividem-se em tutelas de urgência e tutelas de evidência, sendo a tutela de urgência dividida em antecipada e cautelar.
O instituto estudado é tão importante que o Ministro Luiz Fux assegura que a tutela da evidência, assim como a tutela antecipada e a tutela cautelar, são baseadas na urgência, uma vez que o processo ordinário com sua lentidão gerará um atraso na satisfação da pretensão.
Os Juizados Especiais criados em 1995 com a intenção de resolução de litígios com mais rapidez, menos burocracia e de fácil acesso à Justiça pela população, transformou-se em um local onde há acúmulo de processos em tramitação assim como em outras varas da Justiça, tendo como consequência a burocracia e lentidão.
Utilizando-se da hipótese levantada com a intenção de respondê-la de maneira suficiente in fine, coadunando com os objetivos geral e específicos, além da metodologia adequada, espera-se que as respostas encontradas sejam esclarecedoras e satisfatórias.
O tema para o artigo relaciona-se com as tutelas provisórias nos Juizados Especiais Cíveis, sendo relevante, pois é onde boa parte das demandas do poder judiciário são processadas e onde não há uma pacificação quanto à concessão de tutelas provisórias.
Pretende-se demonstrar a legalidade da concessão das medidas provisórias, mesmo com a ausência de previsão na lei específica.
Assim, nesse contexto, o presente projeto tentará contribuir para um entendimento mais aprofundado sobre possível cerceamento de direitos de demandantes nas Varas dos Juizados Especiais Cíveis do Tocantins.
Finalmente, para uma boa investigação, será apresentado detalhadamente o planejamento e etapas de execução do projeto.
O ponto central da questão é: sendo a Lei nº 9.099/95 omissa quanto a possibilidade da concessão de medidas provisórias nos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, há respaldo legal para as suas concessões? Há algum ato normativo que pode guiar ou orientar, contribuindo na solução deste problema?
Nos Juizados Especiais Cíveis de Palmas-TO não há um consenso quanto a concessão ou não das tutelas, sendo que algumas varas entendem não ser uma prática permitida e outras sim, entretanto, no Tribunal de Justiça do Tocantins consolidou-se o entendimento pela inaplicabilidade.
É relevante termos um entendimento consolidado sobre o tema, pois os juizados tem sido utilizados por grande parte da população que pretende ter uma solução rápida para sua demanda, mas sem que o seu direito pereça diante do perigo da demora, mesmo com a fumaça do bom direito em mãos.
Não há solução consolidada, apesar dos Enunciados dos Fóruns Nacionais dos Juizados Especiais (FONAJE), pois estes não possuem natureza jurídica de lei e nem podem ser vinculantes.
Desse modo, o problema persiste em aberto, por isso, buscou-se apresentar neste artigo hipóteses de soluções que possam contribuir para reflexão na resolução do defeito legal.
Considerando que o Código de Processo Civil de 2015 é utilizado subsidiariamente em todas as leis que tratam de processos judiciais, ele pode ser utilizado também nos Juizados Especiais Cíveis quando houver omissão.
Ainda, pode-se considerar os enunciados do FONAJE como guias e orientações, mas nunca se pode considerá-los como lei ou considerar como norma Vinculante.
O presente projeto delimitou-se aos Juizados Especiais Cíveis, ou seja, a Lei nº 9.099/95. Não abrangeu qualquer outro Juizado Especial como os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, Lei nº 10.259/2001, nem mesmo os Juizados Especiais da Fazenda Pública (JEFP) no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, Lei nº 12.153/2009, pois nessas legislações é pacífico a aplicação das tutelas, com previsão, inclusive, na própria lei.
O presente artigo buscou diferenciar-se de outros trabalhos a medida que focou na possibilidade ou não da concessão da tutela de urgência, seja ela antecedente ou incidental. Tutela esta que, por muitas vezes, salva vidas ou assegura o direito líquido e certo do requerente.
Posto isto, aos pleiteantes que optarem pelo Juizado Especial Cível, devido à sua característica sumaríssima, a medida que perceber que o seu direito poderá se perder caso não haja uma intervenção estatal imediata, poderá requerer a tutela de urgência incidental que garantirá seu pleito, assim, resolvendo o problema.
Finalmente, o que motiva a controvérsia sobre a concessão ou não da tutela de urgência nos Juizados Especiais são: i. a não previsão na lei específica dos Juizados Especiais Cíveis; ii. a contradição entre dois enunciados do FONAJE, um dizendo ser possível e o outro entendendo ser incompatível uma das modalidades de tutela de urgência; iii. a inteligência de que o CPC deve ser utilizado subsidiariamente quando há omissão em legislação específica, prevendo o CPC a aplicação das tutelas de urgência.
O objetivo geral do trabalho é analisar a possibilidade de concessão de tutelas provisórias por Juizados Especiais Cíveis, diante da ausência de previsão legal da medida na Lei nº 9.099/95.
Enquanto os objetivos específicos são:
- Analisar a importância do instituto das tutelas provisórias;
- Entender o funcionamento dos Juizados Especiais Cíveis e conhecer os Enunciados do FONAJE que são aplicados subsidiariamente à Lei nº 9.099/95;
- Demonstrar que é legal a concessão das tutelas provisórias nos Juizados Especiais, mesmo que incidentalmente.
No que se refere à metodologia, o presente trabalho estudou a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, os enunciados e as leis que norteiam o instituto das tutelas provisórias e Juizados Especiais Cíveis (JEC). Quanto ao gênero, teve uma abordagem teórica.
Partindo-se do pressuposto que se busca pacificar um entendimento que solucionaria o problema apresentado, foi utilizada a natureza aplicada, posto que o conhecimento produzido poderá ser utilizado para solução de problemas causados pela não concessão das tutelas provisórias no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis.
Analisando a legislação pertinente aos JECs, as tutelas provisórias e as decisões denegatórias do instituto, quanto ao objeto, foi utilizada a modalidade descritiva, enquanto a abordagem a forma qualitativa, posto que se buscou orientação baseada principalmente na legislação pátria e na jurisprudência, pelo mesmo motivo, o instrumento utilizado foi o documental.
Finalmente, o método adotado no presente artigo foi o dedutivo, pois foram feitas composições de premissas para alcançar conclusão válida a partir de todo o conteúdo estudado.
- A PREVISÃO CONSTITUCIONAL, definição e PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS
2.1 Origem dos Juizados Especiais
Os Juizados Especiais tiveram sua origem garantida quando os constituintes da Carta Magna Brasileira em 1988 dispuseram em seu art. 98 a previsão da criação dos Juizados, objetivando uma celeridade nos processos judiciais. In verbis:
Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I - Juizados Especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas Cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;
Com isso, em 26 de setembro de 1995, os Juizados Especiais Cíveis foram criados por meio da Lei nº 9.099/95, promulgada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, com o objetivo de orientar-se pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.
Tal lei definiu as bases para criação, no âmbito dos Tribunais de Justiça Estaduais, dos Juizados Especiais, modelo único que dois tipos de competência: causas de pequeno valor econômico (até 40 salários mínimos art. 3º, I e IV) e causas especiais em razão da matéria (causas de menor complexidade art. 3º, II e III).
No artigo 1º da Lei nº 9.099/95, já é evidente que os Juizados Especiais Cíveis são órgãos da Justiça Ordinária e têm as premissas da conciliação, processo, julgamento e execução. Senão vejamos:
Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência.
Neste contesto, origina-se o Juizado Especial Cível que é um dos principais mecanismos de justiça no ordenamento brasileiro, pela sua celeridade, acessibilidade e eficiência, que, devido à grande demanda, tem perdido as características supra citadas.
Em que pese este trabalho vise destacar a conceção das tutelas provisórias nos Juizados Especiais Cíveis, faz-se importante evidenciar que posteriormente à criação deste, também foram instituídos os Juizados Especiais Cíveis da Justiça Federal, por meio da Lei 10.259 de 12/07/2001, bem como os Juizados Especiais da Fazenda Pública, 8 (oito) anos depois, pela Lei 12.153, em 22 de dezembro de 2009, formando assim o microssistema dos juizados especiais.
Dentro deste Microssistema, apenas a Lei nº 12.153/2009 em seu artigo 27, tem previsão expressa para a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil no âmbito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Vejamos:
Art. 27. Aplica-se subsidiariamente o disposto nas Leis nos 5.869, de 11 de janeiro de 1973 Código de Processo Civil, 9.099, de 26 de setembro de 1995, e 10.259, de 12 de julho de 2001.
Dessa feita, considerando somente a origem dos juizados especiais, não há um favorecimento para a pretensa utilização das tutelas provisórias no âmbito da Lei 9.099/95, todavia, outros fatores podem contribuir favoravelmente.
2.2 Definição de Juizados Especiais
Várias são as definições que os doutrinadores atribuíram aos Juizados Especiais. Uma delas foi proferida por Abreu (2008, p. 208), o qual definiu da seguinte maneira:
O Juizado Especial é um novo tipo de procedimento simplificado, trazendo, ao contrário, um conjunto de inovações que envolve desde aspectos filosóficos e estratégicos no tratamento de conflito de interesse, até técnicos de abreviação e simplificação procedimental.
Os Juizados Especiais Cíveis trouxeram uma modernização do sistema judiciário que, em tese, descongestionaria o tumultuado e lento Poder Judiciário. O autor destaca que os juizados trouxeram um conjunto de inovações pautadas não somente na letra da lei, mas destacando-se outros aspectos até então não tão valorizados, como os filosóficos, com destaque para as técnicas mais céleres.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (2021) também traz uma definição importante quando assevera que os Juizados Especiais são um importante meio de acesso à justiça, pois permitem que cidadãos busquem soluções para seus conflitos cotidianos de forma rápida, eficiente e gratuita.
Não pode ser desprezada a definição feita pelo legislador no Capítulo I da Lei 9.099/95, nas disposições gerais, nos artigos 1º e 2º do dispositivo legal dando ênfase às características de conciliação, processo, julgamento e execução, assim como destaca a oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade como eixos norteadores dos Juizados Especiais Cíveis. In verbis:
Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência.
Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.
Para Chimenti (2005), os Juizados Especiais são um sistema ágil e simplificado de distribuição da Justiça pelo Estado. O autor enfatiza que os Juizados cuidam das causas do cotidiano de todas as pessoas, tais como das relações de consumo, cobranças em geral, direito de vizinhança, dentre outros, não levando em consideração a classe social, mas considerando que os JECs aproximam a Justiça e o cidadão comum, combatendo o clima de impunidade e descontrole que hoje a todos preocupa.
De fato, um dos grandes empecilhos para se entrar com uma demanda judicial era a morosidade do sistema e a necessidade de se contratar um advogado, o que causava até mesmo uma sensação de impunidade, considerando que as demandas não tinham solução previsível e, quando a lide era resolvida, já se tinha perdido o objeto.
Com o advento do microssistema dos Juizados Especiais, além de diminuir as demandas no procedimento comum, ainda prometia soluções mais céleres.
2.3 Os Princípios Fundamentais dos Juizados Especiais.
Quis o legislador deixar expresso alguns princípios que norteariam os Juizados Especiais. Estes princípios inequivocamente dispostos no artigo 2º da Lei 9.099/95 devem ser observados por todos os agentes atuantes nos processos do microssistema dos juizados como a bússola para resolução dos litígios, são eles: os princípios da oralidade; simplicidade e informalidade; economia processual e celeridade, os quais foi dada uma atenção especial a cada um.
2.3.1 Princípio da Oralidade
Nos Juizados Especiais o princípio da oralidade é um diferencial devido às previsões expressas no texto.
A Lei dos Juizados Especiais Cíveis (Lei 9.099/95) possui várias passagens incentivando o princípio da oralidade, vejamos alguns:
- em seu art. 14, § 3º já autoriza que: o pedido originário da parte pode ser formulado oralmente perante o Juizado;
- no art. 9º, § 3º autoriza que o mandato ao advogado pode ser verbal;
- nos artigos 28 e 29 enfatiza que: serão decididas de plano todas as questões que possam interferir no prosseguimento da audiência e, demais, na sentença que é proferida logo após;
- artigo 35 há previsão de que a contestação pode ser oral;
- os embargos de declaração podem ser orais, conforme reza o artigo 49;
- o início da execução de sentença pode ser verbal, é o que assevera o artigo 52, IV.
Para Piske (2012) a oralidade é um princípio que promove uma maior proximidade entre o magistrado e o jurisdicionado, facilitando uma solução rápida do litígio, sendo uma inovação no cenário jurídico tradicional, tendo ainda como princípios correlatos o da imediatidade, o da irrecorribilidade das decisões interlocutórias e o da identidade física do juiz, tanto na esfera especial cível, como na especial criminal.
Uma característica marcante e enfatizada pelo texto legislativo é o incentivo à conciliação, neste sentido, mais uma vez, em conjunto com o princípio do imediatismo, o princípio da oralidade é colocado em prática e as partes diante das falas, têm oportunidades de chegarem a solução da lide para que não seja necessário o prosseguimento das exaustivos atos processuais até a sentença.
Para Cardoso (2015, p. 12), A oralidade incide nos Juizados Especiais Cíveis desde o pedido inicial até o cumprimento da decisão, ressalvada a forma escrita para os atos essenciais (§ 3º do art. 13 da Lei n, 9.099/95)
2.3.2 Princípio da Simplicidade e Informalidade
O ambiente jurídico até antes dos Juizados especiais era caracterizado por sua complexidade processual e formalidade. Com o advento do novo microssistema isso muda, e, pelo menos ali, a simplicidade e a informalidade são perfeitamente aceitas, o que garante uma maior participação também do cidadão comum, ou seja, sem muito conhecimento jurídico. Pelo menos assim deveria ser.
Tanto é assim que a Lei dispensa até mesmo a intervenção de um advogado nas causas de valor de até 20 salários mínimos, ou seja, o próprio requerente pode postular por seus direitos, sendo uma característica inegável da simplicidade e informalidade prevista no art. 9º da Lei 9.099/95. In verbis:
Art. 9º Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória.
Gonçalves apud Almeida (2017) colabora grandemente com o tema quando diz que os referidos princípios se evidenciam por uma redução substancial de termos e escritos do processo, com a adoção de mecanismos diferenciados, como gravações de vídeo, fitas magnéticas, e uso de equipamentos de informática. Há inúmeras simplificações na petição inicial na citação na resposta do réu, na colheita de provas, nos julgamentos e nos recursos. Assim, o princípio da simplicidade e informalidade é característica marcante nos atos processuais dos Juizados Especiais.
2.3.3 Princípios da Economia Processual e Celeridade
Aqui, considerar-se-á o que diz Piske (2017. online). In verbis:
Pelo princípio da economia processual entende-se que, entre duas alternativas, deve-se escolher a menos onerosa às partes e ao Estado para que se evite a repetição de atos procedimentais, assim, a concentração de atos em uma mesma oportunidade é critério de economia processual.
Ainda, a autora assevera o que segue:
Os princípios da economia processual e da celeridade oportunizam a otimização e a racionalização dos procedimentos, objetivando a efetividade dos Juizados Especiais. Tais princípios impõem ao magistrado na direção do processo que confira às partes um máximo de resultado com um mínimo de esforço processual, bem como orientam para, sempre que possível, que haja o aproveitamento de todos os atos praticados. Vale lembrar que tal aproveitamento tem como limite apenas a ausência de prejuízo a se causar aos fins da Justiça (PISKE, 2012).
Esses dois princípios deveriam ser os principais e mais bem resguardados dos processos ajuizados nos JECs, pois objetiva acelerar a resolução da lide justamente com a economia de procedimentos, requerendo que as partes, em um único momento/audiência, realizem toda a instrução e julgamento e, ainda, o aproveitamento de atos processuais.
2.4 Previsão Legal de Aplicação Supletiva do CPC/15 à Lei 9.099/95.
Subsidiariedade é a qualidade de subsidiar. A palavra deriva do latim, subsidium, e significa socorro, ajuda, apoio, alívio, reforço, auxílio extraordinário, garantia excepcional ou complemento.
O legislador da Lei 9.099/95, ao mesmo tempo que não deixou claro a aplicação subsidiaria do CPC, que na época era o de 1973, também não vedou expressamente a sua aplicação, deixando uma controvérsia que tem sido debatida por acadêmicos, advogados, doutrinadores e tribunais brasileiros, mas que, até o momento, não há uma jurisprudência/entendimento pacífico sobre a matéria.
No entanto, a Lei que instituiu os Juizados Especiais no Brasil é expressa com relação à aplicação subsidiária do Código de Processo Penal (art. 92) como também o novo CPC/15 deu nova redação ao artigo 48 da Lei 9.099/95 prevendo aplicação nos casos de embargos de declaração. Ainda na parte da execução da sentença (art. 52 da Lei 9.099/95), é expressa a previsão de processamento do mesmo no próprio Juizado com aplicação, no que couber, do CPC/15.
Diante do conflito de entendimento, a Ministra do STJ, Nancy Angridhi, quando da abertura do XI Encontro de Juízes dos Juizados Especiais e Turmas Recursais realizado logo depois da vigência no Novo CPC, se posicionou contrária à aplicação subsidiária. Para a Ministra, o fato de a Lei 9.099/95 não ter fixado a obrigação de subsidiariedade ao CPC é pelo motivo de dar aos juízes liberdade para, com base nos princípios da informalidade e simplicidade que regem essas instâncias, adotarem o procedimento mais adequado à resolução dos conflitos.
Analisando a interpretação da respeitada Ministra, nos deparamos com uma liberdade dada aos juízes sem nenhum respaldo legal, ou seja, os juízes fariam as regras de ofício a fim de solucionar o litígio? Faz-se importante trazer dispositivos da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) que não apoiariam esta tese.
Considerando que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5º, II da CRFB), a imprevisibilidade do método que será adotado pelo juiz utilizando-se de sua suposta liberdade, certamente, pelo menos em muita casos, cercearia o direito à defesa, ou seja, umas das partes envolvidas no processo terá seu direito tolhido por uma determinação do juízo sem previsão legal.
Com a inexistência de previsão legal, a aplicação livre pelo juiz do procedimento e o cerceamento da defesa, é confrontado mais um dispositivo constitucional, o art. 5º, LV da CRFB. In verbis:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Para Niemeyer (2016, online), Será sempre abusiva a ordem promanada de uma autoridade constituída para que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa sem que haja lei obrigando-a a tanto.
Por último, a competência para legislar em matéria processual é exclusiva da União (CF, artigo 22, I), não existindo no ordenamento jurídico brasileiro norma que dá poderes ao juiz de decidir/legislar quando a lei for omissa. Ou seja, inexistindo norma, o juiz deve aplicar outra existente subsidiariamente, e não adotar procedimento próprio.
Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições do CPC/15 lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente. Este é o teor do art. 15 da lei 13.105/15. Assim também, leis específicas tem previsão expressa de aplicabilidade supletiva e subsidiária do referido Código, como a Lei da Ação Popular (art. 22), Lei da Ação Civil Pública (art. 19) dentre outras, não havendo óbice para aplicação também na Lei dos Juizados Especiais Cíveis.
Para Neves (2019, p. 55):
O Código de Processo Civil é o mais importante diploma legal processual e tem sua aplicabilidade aos processos em trâmite perante a justiça comum. Apesar disso, pode ser aplicado apenas subsidiariamente quando houver normas processuais especificas em legislação extravagante, seja em leis isoladas, seja em razão da existência de microssistemas processuais (processo coletivo, procedimento sumaríssimo dos Juizados Especiais).
Como vimos, a Lei 9.099/15 não tem previsão de utilização subsidiária do CPC/15 nos casos omissos, no entanto, este último, sim. No artigo 1.046, § 2º do CPC/15, já nas disposições finais, é expresso ao dizer que em outras leis, as disposições especiais dos procedimentos regulados permanecem em vigor, mas que o Código de Processo Civil de 2015, será aplicado supletivamente. Vejamos:
Art. 1.046. Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
(...)
§ 2º Permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará supletivamente este Código. (destaque nosso)
Portanto, sendo a Lei 9.099/95 uma lei especial, a aplicabilidade supletiva é autorizada pelo CPC/15, que entrou em vigor 10 anos após aquela.
3 AS TUTELAS PROVISÓRIAS
Mas, afinal, o que são as tutelas provisórias? Para compreender o instituto, Mendes e Azevedo (2016) definem da seguinte forma:
Tutela provisória é o mecanismo processual pelo qual o magistrado antecipa a uma das partes um provimento judicial de mérito ou acautelatório antes da prolação da decisão final, seja em virtude da urgência ou da plausibilidade do direito.
Nessa senda, Silva (2014, p. 127) assevera que a tutela provisória pode ser conceituada levando em consideração a sua característica sumaríssima, mas não definitiva. Disse assim:
É uma tutela jurisdicional sumária e não definitiva. Sumária, vez que é fundada em cognição sumária, o que quer dizer que é fundada em um exame menos aprofundado da causa, pois, exige-se apenas um juízo de probabilidade e não um juízo de certeza. Ela não é definitiva, vez que pode ser revogada ou modificada a qualquer momento.
Quanto às tutelas, ainda na vigência do CPC/73, os doutrinadores já debatiam a respeito do que seria a prova inequívoca e a verossimilhança da alegação e do requisito do fumus boni iuris exigidos, no entanto, o que se tinha de certeza era que há uma diferença fundamental entre ambos, em que pese os 2 (dois) orbitam na probabilidade do direito.
Para Neves (2019) na verdadeira linha de convencimento, pode-se afirmar que a prova inequívoca da verossimilhança da alegação estaria mais próxima da certeza do que o fumus boni iuris, ainda que em ambos os casos já exista um convencimento suficiente para o juiz considerar, ao menos aparente, o direito do autor.
A redação do CPC/73 que autorizou o juiz a antecipar total ou parcialmente os efeitos da tutela pretendida não estava no texto original, mas foi dada pela Lei nº 8.952 mais de 20 anos depois, ou seja, no final do ano de 1994, sendo razoável que o texto da Lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis) não abordasse tal instituto, pois para ser promulgada no ano de 1995, certamente o seu projeto de lei já estava pronto há bem mais tempo, passando por todos os trâmites e comissões necessárias para sua aprovação. Vejamos o art. 273 do CPC/73 que aborda o tema:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
Com o advento do novo CPC/15, o legislador optou por dar peso igual à fumaça do bom direito (probabilidade do direito) e ao perigo da demora para a concessão de qualquer das tutelas requeridas.
No CPC/15, o legislador deu a importância merecida às tutelas provisórias com um livro inteiro para tratar do assunto (livro V), desde o art. 294 ao 311.
É importante ressaltar as previsões das tutelas no microssistema dos Juizados Especiais que, dos 3 (três), somente o da Lei 9.099/95 não faz nenhuma referência, mesmo nos casos em que estão evidentes o perigo da demora e a fumaça do bom direito. Ainda pior, o legislador não colocou no texto da referida lei a possibilidade do CPC ser utilizado subsidiariamente.
Ainda assim, as tutelas provisórias são concedidas e negadas por diversos tribunais Brasil afora fundamentando-se para conceder no enunciado nº 26 do FONAJE que dispõe que são cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis, em caráter excepcional, e para denegar, no enunciado do FONAJE nº 163 que diz: os procedimentos de tutela de urgência requerido em caráter antecedente, na forma prevista nos arts 303 a 310 do CPC, são incompatíveis com o sistema dos Juizados Especiais.
Enquanto a lei de 1995 dos Juizados Especiais Cíveis se omite quanto ao assunto, os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal (JEF), em seu art. 4º da Lei nº 10.259/2001, deixa expresso que o Juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação.
A lei 10.259/2001 dos JEFs, diz que aos juizados se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995 (LJEF, art. 1º), mas também não faz referência da possível subsidiariedade ao CPC. Vejamos:
Art. 1o São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.
Mais recente lei, do ano de 2009, a Lei nº 12.153 que regulamenta os Juizados Especiais da Fazenda Pública, em seu artigo 3º, prevê que o juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir quaisquer providências cautelares e antecipatórias no curso do processo, para evitar dano de difícil ou de incerta reparação.
As Tutelas provisórias são fundamentadas em: de urgência (cautelar e antecedente) ou evidência, conforme preceitua o Art. 294 do CPC. In verbis:
Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.
Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.
Pede-se uma atenção especial ao parágrafo único acima, pois o fato de as tutelas poderem ser aplicadas em caráter antecedente ou incidental fará uma grande diferença, como veremos mais adiante.
3.1 Tutelas de Urgência
Uma excelente definição de Tutela Provisória de urgência é levantada por Mendes e Azevedo (2016), senão vejamos:
A tutela provisória de urgência é o instrumento processual que possibilita à parte, pleitear a antecipação do pedido de mérito com fundamento na urgência. Essa espécie de tutela provisória se subdivide em duas subespécies: (i.1) tutela provisória de urgência antecipada; (i.2) tutela provisória de urgência cautelar, sendo que ambas podem ser requeridas de forma antecedente ou incidente.
Os mesmos autores (MENDES e AZEVEDO, 2016), na esteira das definições pertinentes, enfatizam que a Tutela Antecipada pode se tornar estável, conforme o que segue:
Estabelece o Código de Processo Civil, em seu artigo 304, que tanto a tutela antecipada antecedente quanto incidente, deixam de ser provisórias tornando-se estáveis quando não interposto o respectivo recurso pela parte contrária, extinguindo-se o processo sem resolução do mérito e sem a formação da coisa julgada material.
O doutrinador Marinoni (2010) fala que a tutela cautelar tem por fim assegurar a viabilidade da realização de um direito, não podendo realizá-lo. A tutela que satisfaz um direito, ainda que fundada em juízo de aparência, é satisfativa sumária.
Com previsão nos artigos 300 ao 310 do CPC/15, esta deve ser concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Conforme expresso no artigo 300 do CPC/15. Vejamos:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1 o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Não há um motivo razoável para que as tutelas de urgência não sejam admitidas no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis pelo seu rito sumaríssimo, quando os próprios magistrados têm ciência que, tanto os processos não estão sendo julgados com a rapidez desejada ou minimamente razoável, quanto há o perigo da demora e o consequente perigo de perda do objeto com risco evidente do resultado útil do processo.
3.2 Tutelas de Evidência
Finalmente, em se tratando de Tutelas de evidência, traz-se à baile o que definiu Rodrigues, et al. (2016) que disse:
O direito evidente é aquele que se sustenta por si só dispensando a dilação probatória ou através de prova documental irrefutável do direito alegado pela parte, independente da necessidade de tempo para se produzir a prova ou constituí-la. Evidência é um critério frente à probabilidade, nesse sentido as hipóteses descritas pelo autor permitem o deferimento de uma tutela com um grau de probabilidade tão elevado que beira à certeza.
No CPC/15 as tutelas de evidência receberam um capítulo próprio, contendo somente um artigo, 4 (quatro) incisos e 1 (um) parágrafo. Vejamos:
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
O texto do legislador que visa garantir, pela evidência, o direito do requerente, não tem sido utilizado no âmbito dos JECs por não ser compatível com o rito sumaríssimo dos Juizados Especiais Cíveis. O que poderia ser mais sumaríssimo que a aplicação de uma tutela de evidência fundada em prova documental inequívoca?
Nesse instituto, conforme previsão do inciso IV do art. 311 do CPC, se a petição inicial já vier instruída com prova documental suficiente (neste caso, o autor pode utilizar prova emprestada oral ou pericial) dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável, ao juiz caberá a concessão da tutela provisória de evidência, sendo perfeitamente razoável a utilização nos Juizados Especiais Cíveis.
3.3 Diferença entre caráter antecedente e incidental
É importante fazer esta diferenciação no âmbito deste trabalho pois, em que pese não seja discutido, o Enunciado do FONAJE 163, como foi visto, tem expresso que somente os requerimentos em caráter antecedente seriam incompatíveis com o sistema dos juizados especiais, omitindo-se quanto os de caráter incidental.
O que vai diferenciar se a tutela de urgência é antecedente ou incidental é o momento em que ela é requerida. O parágrafo único do artigo 194 do CPC define que A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.
Para Parizatto (2019), a primeira (cautelar) tem finalidade de conservar, ou seja, assegurar bens, pessoas ou determinadas provas, admitindo-se assim o aresto, o sequestro e a produção antecipada de provas. Já a segunda (antecipada), tem a mesma finalidade, mas de forma provisória quanto ao efeito final da tutela. Contudo, em ambos os casos (cautelar e antecedente) as medidas são admissíveis anteriormente à efetiva tutela final ou mesmo no curso do feito.
A tutela incidental deve ser requerida no bojo do processo principal e independe do pagamento de custas (art. 295 do CPC/2015). In verbis:
Art. 295. A tutela provisória requerida em caráter incidental independe do pagamento de custas.
Já a Tutela Antecedente é requerida antes do processo principal, que será aditado mais tarde (Art. 303 e 305 do CPC/2015), ou seja, pede-se a tutela antecipada antecedente quando há perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo desde o momento inicial. Para isso é necessário a parte demonstrar a probabilidade ser realmente titular do direito em questão, em razão da antecipação da tutela.
4 TUTELAS PROVISÓRIAS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
O cerne deste trabalho está na possibilidade ou não da utilização das tutelas provisórias no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis. A principal justificativa para denegar o instituto é a suposta incompatibilidade com o rito sumaríssimo do Juizado Especial, que se pauta por evitar incidentes processuais e pela resolução da questão posta, preferencialmente em audiência.
Mas, sendo o microssistema dos juizados especiais composto das Leis 9.099/1995 (JECs), a Lei 10.259/2001 (JEFs) e a Lei 12.153/2009 (JEFP), as duas últimas pautadas também pelo rito sumaríssimo, e ainda assim com previsão expressa de que o Juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação, artigos 4º e 3º, respectivamente, esta argumentação não cairia por terra?
4.1 O que dizem os enunciados FONAJE e FPPC.
Para ajudar a compreender e interpretar dispositivos e omissões da Lei nº 9.99/95, foram criados os Fóruns Nacionais dos Juizados Especiais (FONAJE) que emitem os enunciados do FONAJE. Apesar de não possuir natureza jurídica de lei e nem serem vinculantes, os Enunciados servem como guias, orientações para todos os operadores que atuam na área dos Juizados Especiais.
Formado por um grupo de advogados processualistas, o Fórum Permanente dos Processualistas Civis (FPPC) reúne a comunidade jurídica para travar diálogos, em especial dos processualistas civis, sobre a aplicação do CPC/2015 e promover encontros com todos que se dedicam ao processo civil.
É importante destacar que os enunciados do FPPC também não são jurisprudência, mas possuem um caráter doutrinário e são utilizados de maneira recorrente em petições, sentenças e acórdãos como se fossem jurisprudência, tendo em vista que os mesmos são formulados a partir de debates sobre a prática jurídica processual por especialistas na área.
Primeiramente, vamos ao que diz os enunciados do FONAJE sobre o tema. O Enunciado 26, de redação dada no XXIV Encontro em Florianópolis/SC, é enfático ao determinar: São cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis
Em que pese o disposto no Enunciado 26, um outro, dos mais importantes para o tema proposto neste trabalho, o Enunciado 163, dispõe que os procedimentos de tutela de urgência requerido em caráter antecedente, na forma prevista nos arts 303 a 310 do CPC, são incompatíveis com o sistema dos Juizados Especiais.
Destaca-se acima a palavra antecedente, pois, sabendo que a tutela de urgência pode ser antecedente ou incidental, estando o Enunciado sendo taxativo ao citar o antecedente, omitindo-se quanto à incidental, este, pela lógica, seria possível a sua aplicação.
Ainda mais, o Enunciado é taxativo ao prever a forma dos artigos 303 a 310 do CPC, quando a tutela de urgência de caráter incidental é prevista no artigo 295 do CPC/15, portanto, quis o enunciado apenas restringir a tutela antecedente.
Para Neves (2019), não é possível conhecer as razões que levaram a edição de referido enunciado, e o mesmo presume que tenham sido as dificuldades e polêmicas procedimentais, em especial no tocante à estabilização da tutela antecipada.
Ainda segundo o autor, basta pensar na compatibilidade de aplicação do art. 304, caput, do CPC, que exige recurso contra a decisão concessiva da tutela antecipada para que ela não se estabilize, sendo que nos Juizados Especiais há resistência histórica ao cabimento de agravo de instrumento, mesmo em situações em que isso nitidamente cerceia o direito de defesa, como na hipótese de decisão interlocutória que tenha como objeto a tutela de urgência.
Por outro lado, o Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) emitiu o Enunciado 418 em que entendem pela possibilidade da admissibilidade das tutelas provisórias de urgência e de evidência nos Juizados Especiais (todos). Vejamos o teor do enunciado:
Enunciado 418. (arts. 294 a 311; Leis 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009). As tutelas provisórias de urgência e de evidência são admissíveis no sistema dos Juizados Especiais.
Quanto a possibilidade do requerimento da tutela provisória incidental, o FPPC emitiu enunciado que entende pela possibilidade a qualquer tempo, sem preclusão temporal. In verbis:
Enunciado 496. (art. 294, parágrafo único; art. 300, caput e §2º; art. 311) Preenchidos os pressupostos de lei, o requerimento de tutela provisória incidental pode ser formulado a qualquer tempo, não se submetendo à preclusão temporal. (Grupo: Tutela de urgência e tutela de evidência)
Desse modo, sendo aplicado o direito de requerer a tutela provisória incidental no âmbito dos juizados especiais, para o FPPC, não se pode alegar preclusão temporal.
4.2 Como tem julgado a justiça tocantinense e do Brasil sobre o assunto.
Julgados do Tribunal de Justiça do Tocantins demonstram que já possui entendimento consolidado de que os procedimentos de tutela de urgência requeridos em caráter antecedente são incompatíveis com o Sistema dos Juizados Especiais. Vejamos com grifos e destaques nossos:
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO SUSCITANTE DO 5º JUIZADO ESPECIAL DE PALMAS. JUÍZO SUSCITADO DA 2ª VARA DA FAZENDA E REGISTROS PÚBLICOS DE PALMAS-TO. DEMANDA CAUTELAR ANTECEDENTE. INCOMPATIBILIDADE COM O RITO DO JUIZADO ESPECIAL. CONFLITO JULGADO PROCEDENTE. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO.
1. Os procedimentos adotados nas tutelas de urgência requeridas em caráter antecedente, independente do valor dado a causa, se inferior a 60 salários mínimos, são incompatíveis com o rito empregado no âmbito dos Juizados Especiais, consoante enunciado 162, editado pelo Conselho Nacional de Justiça.
2. Portanto, considerando que a parte autora ajuizou ação de tutela provisória antecipada em caráter antecedente para imediato fornecimento de cópia dos documentos discriminados na exordial, a competência para processar e julgar o feito é da justiça comum.
3. Conflito negativo de competência julgado procedente, para declarar a competência do Juízo da 2ª Vara Da Fazenda e Registros Públicos de Palmas-TO, ora suscitada, para processar e julgar a ação que deu origem ao presente conflito.
(Conflito de competência Cível 0000606-83.2022.8.27.2700, Rel. JOSÉ RIBAMAR MENDES JÚNIOR, GAB. DO JUIZ CONVOCADO JOSÉ RIBAMAR MENDES JÚNIOR, julgado em 23/03/2022, DJe 08/04/2022 16:53:53)
EMENTA: CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CAUTELAR ANTECEDENTE. INCOMPATIBILIDADE COM O RITO DO JUIZADO ESPECIAL. COMPETÊNCIA DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA. CONFLITO PROCEDENTE.
1. Os procedimentos de tutela de urgência requeridos em caráter antecedente, são incompatíveis com o Sistema dos Juizados Especiais.
2. Ainda que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, o caráter instrumental da cautelar antecedente, que visa assegurar a utilidade do pedido principal, é incompatível com o rito sumaríssimo do Juizado Especial, que se pauta por evitar incidentes processuais e pela resolução da questão posta, preferencialmente em audiência.
3. Conflito de competência procedente para declarar a competência do juízo da 2ª Vara da Fazenda e Registros Públicos da Comarca de Palmas para processar e julgar os autos de origem.
(Conflito de competência Cível 0015836-05.2021.8.27.2700, Rel. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, GAB. DO DES. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, julgado em 23/03/2022, DJe 05/04/2022 17:39:24)
Como vimos, o Tribunal entende como conflito de competência se o requerente, ao ajuizar ação no Juizado Especial Cível, requerer a concessão de Tutela Provisória. O Acórdão a seguir, relatado pela Desembargadora Jacqueline Adorno de La Cruz Barbosa, traz, expressamente, o Enunciado 163 do FONAJE:
EMENTA: CONFLITO DE COMPETÊNCIA - CAUTELAR ANTECEDENTE - INCOMPATIBILIDADE COM O RITO DO JUIZADO ESPECIAL - COMPETÊNCIA DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA - CONFLITO PROCEDENTE.
1 - Segundo se depreende do Enunciado Cível nº. 163 do Conselho Nacional de Justiça, os procedimentos de tutela de urgência requeridos em caráter antecedente, na forma prevista nos artigos 303 a 310 do CPC/2015, são incompatíveis com o Sistema dos Juizados Especiais.
2 - Nesse contexto, tem-se por procedentes os argumentos do juízo suscitante, pois que ainda que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, o caráter instrumental da cautelar antecedente, que visa assegurar a utilidade do pedido principal, é incompatível com o rito sumaríssimo do Juizado Especial, que se pauta por evitar incidentes processuais e pela resolução da questão posta, preferencialmente em audiência.
3 - Conflito de competência procedente para declarar a competência do juízo da 1ª Vara da Fazenda e Registros Públicos da Comarca de Palmas, ora suscitado, para analisar e julgar os autos da Ação de Exibição de Documentos nº. 0030433-23.2020.8.27.2729.
(Conflito de competência Cível 0011123-21.2020.8.27.2700, Rel. JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA, GAB. DA DESA. JACQUELINE ADORNO, julgado em 25/11/2020, DJe 04/12/2020 16:23:57)
No julgado a seguir, o juiz de primeiro grau modificou a competência da ação que havia sido protocolada na justiça comum com pedido de tutela provisória, para o Juizado Especial Cível, no entanto, o desembargador Pedro Nelson de Miranda Coutinho cassou a decisão justamente pelo entendimento pacífico do tribunal da incompatibilidade das tutelas provisórias no âmbito dos JECs. Verbis:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA ANTECIPADA. AÇÃO AJUIZADA NA JUSTIÇA COMUM. JUIZADO ESPECIAL. COMPETÊNCIA RELATIVA. OPÇÃO DO AUTOR. INDEFERIMENTO DA INICIAL. NÃO CABIMENTO. DECISÃO CASSADA.
1. Os Juizados Especiais Cíveis têm competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, cabendo à parte autora, no entanto, a opção pela adoção do procedimento previsto na Lei Federal no 9.099, de 1995, observados os limites e restrições a ele inerentes.
2. Independente da complexidade, a ação deve tramitar perante a Justiça Comum, se a parte autora optou pela referida via, impondo-se a cassação da decisão que modificou ex officio a competência para o Juizado Especial Cível.
3. Agravo conhecido e provido.
(Agravo de Instrumento 0003096-49.2020.8.27.2700, Rel. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, GAB. DO DES. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, julgado em 30/09/2020, DJe 10/12/2020 20:27:52)
Mesmo quando demonstrado o perigo da demora e a fumaça do bom direito, as decisões do TJTO são no sentido de que o caráter instrumental da cautelar antecedente que visa assegurar a utilidade do pedido principal é incompatível com o rito sumaríssimo do Juizado Especial, que se pauta por evitar incidentes processuais e pela resolução da questão posta, preferencialmente em audiência declarando o conflito de competência.
No entanto, em outros tribunais pelo país, há um entendimento pela aplicabilidade das Tutelas provisórias no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, como também no mesmo tribunal, pelo não cabimento. Vejamos duas decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (grifamos):
RECURSO INOMINADO. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DA RÉ. ALEGAÇÕES RECURSAIS NÃO ACOLHIDAS. BANCO DO BRASIL. RELAÇÃO DE CONSUMO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA EM JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. ENUNCIADO 26 DO FONAJE: “SÃO CABÍVEIS A TUTELA ACAUTELATÓRIA E A ANTECIPATÓRIA NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS” (NOVA REDAÇÃO – XXIV ENCONTRO – FLORIANÓPOLIS/SC).
(...).
SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS E JURÍDICOS FUNDAMENTOS. APLICABILIDADE DO ART. 46 DA LEI Nº 9.099/95. Recurso conhecido e desprovido.
(TJ-PR - RI: 00139551920208160021 Cascavel 0013955-19.2020.8.16.0021 (Decisão monocrática), Relator: Leo Henrique Furtado Araujo, Data de Julgamento: 14/01/2021, 4ª Turma Recursal, Data de Publicação: 14/01/2021)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LEI Nº 9.099/95. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA. RECURSO NÃO CONHECIDO.
(TJ-PR - AI: 00011872220228169000 Curitiba 0001187-22.2022.8.16.9000 (Decisão monocrática), Relator: Manuela Tallão Benke, Data de Julgamento: 19/05/2022, 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, Data de Publicação: 19/05/2022)
Para fins de comprovar que há uma controvérsia sobre o tema, listou-se mais algumas decisões de diversos estados do Brasil com acórdãos favoráveis à concessão das tutelas (grifos nossos):
AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO. RITO INCOMPATÍVEL COM O PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. PRESENÇA DE INCAPAZES. VEDAÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. O rito estabelecido na Lei nº 9.099/95 mantém incompatibilidade com o estabelecido para as medidas cautelares típicas, como a de exibição. Certo que o enunciado 26 do FONAJE entende "cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis". Não se pode confundir, contudo, a "tutela acautelatória" que poderá ser formulada pelo autor na ação juntamente com o pedido principal, com a ação cautelar típica, onde o pedido é só e tão somente o cautelar.
(TJ-SC - RI: 20144006573 Criciúma 2014.400657-3, Relator: Edir Josias Silveira Beck, Data de Julgamento: 29/09/2015, Quarta Turma de Recursos - Criciúma)
JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA E MEDIDA ACAUTELATÓRIA EM SEDE DE JUIZADOS ESPECIAIS. ANÁLISE DE CASO A CASO. SITUAÇÕES ESPECIAIS. POSSIBILIDADE. PRAZO PARA CUMPRIMENTO DE MEDIDA. RETIRADA DO NOME DE CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE. MULTA COMINATÓRIA. RAZOABILIDADE. PROPORCIONALIDADE. LIMITE DE INCIDÊNCIA. AGRAVO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Dispõe o ENUNCIADO 26 do FONAJE que São cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis.
2. O prazo de cinco dias úteis para retirada do nome do consumidor dos cadastros de proteção ao crédito não representa ilegalidade e pode ser cumprindo ainda que em tempos de pandemia.
3. A multa cominatória, com limite de incidência, contra a parte agravante, no caso concreto, não representa desproporcionalidade, de modo que é legal e deve ser mantida. 4. Recurso conhecido e não provido.
(TJ-DF 07007964620208079000 DF 0700796-46.2020.8.07.9000, Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA, Data de Julgamento: 01/09/2020, Segunda Turma Recursal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 16/09/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENUNCIADO 26, DO FONAJE. Admissibilidade de tutela antecipada nos Juizados Especiais Cíveis. Ausência de justificativa plausível para o não cumprimento da obrigação. Manutenção da decisão recorrida. Agravo improvido.
(TJ-SP - AI: 01000315720218269034 SP 0100031-57.2021.8.26.9034, Relator: Mônica Tucunduva Spera Manfio, Data de Julgamento: 03/12/2021, 1ª Turma Recursal Cível, Data de Publicação: 03/12/2021)
Diante de tudo isso, não se pode negar que há uma controvérsia sobre o tema, a qual é relevante, tendo em vista que os JECs são meios utilizados para resolução de problemas em todo o Brasil, com bastante aceitação pelos usuários desta justiça, não podendo, em nenhuma hipótese, deixar de considerar que, mesmo em alguns casos, a conceção das tutelas provisórias se fazem necessárias.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo fez a análise da possibilidade da concessão de tutelas provisórias no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, previsto no artigo 98, I da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e legislado por meio da Lei nº 9.099/95, tendo em vista a ausência de previsão das tutelas provisórias e a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil de 2015 em tal lei.
A importante Lei nº 9.099/95 estabeleceu uma série de procedimentos próprios, possibilitando a rapidez no julgamento, amparada ainda em princípios particulares como efetividade, oralidade, informalidade e simplicidade com o objetivo de agilizar os julgamentos. No entanto, o sucesso dos juizados devido sua celeridade teve como consequência o abarrotamento de processos e sua consequente morosidade.
Diante disso, é inegável que o direito pode se perder caso não haja uma intervenção imediata do Estado.
Embora os Juizados tenham competência para causas de “pequeno” valor, podendo chegar até 40 (quarenta) salários mínimos, o valor referido pode ser todo o patrimônio de uma pessoa, não podendo ser ignorado este fato, muito menos que há possibilidade de, devido a morosidade flagrante dos Juizados Especiais Cíveis, o direito do requerente perecer antes do decisium final do processo e o seu trânsito em julgado.
Ainda, considerando que Código de Processo Civil é utilizado subsidiariamente na legislação brasileira, quando há omissão em lei específica, este é perfeitamente cabível de ser aplicado nas omissões da Lei nº 9.099/95, como expresso no artigo 1.046, § 2º do CPC/15.
Inclusive é a previsão do Enunciado 26, de redação dada no XXIV Encontro em Florianópolis/SC, que entende serem cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis.
Apesar disso, e sem revogar o Enunciado 26, o Enunciado 136 enfatiza que os procedimentos de tutela de urgência requerido em caráter antecedente, na forma prevista nos arts 303 a 310 do CPC, são incompatíveis com o sistema dos Juizados Especiais.
Ademais, se duas das três leis do microssistema dos Juizados Especiais preveem expressamente que o Juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação, mesmo também sendo procedimentos sumaríssimos, não há motivo plausível para somente os Juizados Especiais Cíveis não conceder.
Posto isso, o presente trabalho concluiu que o magistrado possui fundamentação possível para aplicação das tutelas de urgência no âmbito dos Juizados Especiais, com fulcro, especialmente, no disposto no Enunciado 26 do FONAJE e art. 1.046, § 2º do CPC/15.
Mesmo considerado o teor do Enunciado 136 do FONAJE, é possível a conceção da tutela de urgência em caráter incidental, tendo em vista que o enunciado é taxativo ao restringir somente a tutela de urgência em caráter antecedente como incompatível com os Juizados Especiais.
Assim, a complexidade da solução passa pelo não requerimento de maneira antecedente do direito, mas incidentalmente, ou seja, no meio do processo.
A solução proposta pode ser facilmente aplicada, considerando que a tutela de urgência incidental já é um instituto bastante utilizado no sistema judiciário brasileiro, sendo muito viável para garantir o direito e evitar o dano de difícil reparação.
A conceção ou não das tutelas de urgência no âmbito dos Juizados Especiais não é uma unanimidade no sistema judiciário brasileiro, deste modo, o presente artigo contribuirá para que interessados obtenham informações do tema.
Por fim, a solução proposta neste artigo é relevante notadamente por garantir aos pleiteantes da tutela provisória a garantia de que seu direito não perecerá ou que ao final do processo, mesmo ganhando, perca, quando, sem a tutela pretendida, a outra parte atua para que o direito seja impossível.
1 REFERÊNCIAS
ABREU, Pedro Manoel. Acesso à justiça e Juizados Especiais: o desafio histórico da consolidação de uma justiça cidadã no Brasil, p. 208.
ALMEIDA, Kezia Torres de. Os Juizados Especiais Cíveis estaduais e a morosidade processual. 2017. disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51112/os-juizados-especiais-civeis-estaduais-e-a-morosidade-processual. acesso em 04/03/2022
AMB - ASSOCIAÇÃO MAGISTRADOS BRASILEIROS. Enunciados FONAJE. Disponível em https://www.amb.com.br/fonaje/?p=32#. Acesso em 14/03/2022.
BRASIL. Código de Processo Civil (2015). Código de Processo Civil Brasileiro. Brasília, DF: Senado, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em 26/11/2021.
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Juizados Especiais. Disponível em <https://www.cnj.jus.br/poder-judiciario/juizados-especiais/> . Acesso em 01/12/2021.
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BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. AI: 01000315720218269034 SP 0100031-57.2021.8.26.9034, Relator: Mônica Tucunduva Spera Manfio, Data de Julgamento: 03/12/2021, 1ª Turma Recursal Cível, Data de Publicação: 03/12/2021.
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Paraná - RI: 00139551920208160021 Cascavel 0013955-19.2020.8.16.0021 (Decisão monocrática), Relator: Leo Henrique Furtado Araujo, Data de Julgamento: 14/01/2021, 4ª Turma Recursal, Data de Publicação: 14/01/2021.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Paraná. AI: 00011872220228169000 Curitiba 0001187-22.2022.8.16.9000 (Decisão monocrática), Relator: Manuela Tallão Benke, Data de Julgamento: 19/05/2022, 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, Data de Publicação: 19/05/2022.
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Tocantins. Conflito de competência Cível 0015836-05.2021.8.27.2700, Rel. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, GAB. DO DES. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, julgado em 23/03/2022, DJe 05/04/2022 17:39:24.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Tocantins. Conflito de competência Cível 0011123-21.2020.8.27.2700, Rel. JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA, GAB. DA DESA. JACQUELINE ADORNO, julgado em 25/11/2020, DJe 04/12/2020 16:23:57.
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