3. Considerações finais.
Como se vê, o presente artigo não objetiva apresentar uma proposta pronta e acabada acerca da disciplina e do alcance do instituto da desconsideração da personalidade jurídica. Colima, isto sim, vislumbrar e apresentar uma possível problemática de ordem prática com a qual o Direito Processual do Trabalho poderá se deparar, em vingando a redação conferida aos arts. 133 a 137 do PL nº 8.046, de 2010, que versam sobre o tema.
Acreditamos prudente que o Congresso Nacional, quando do exercício da nobre atividade legislativa, e ouvindo as mais abalizadas vozes, considere a efetiva possibilidade de um determinado instituto jurídico vir a ser aplicado, a partir do critério da subsidiariedade, ao processo do trabalho, refletindo, assim, a respeito da necessidade de se construir soluções legais que não desprezem a essência deste.
De qualquer forma, já antevemos que o emprego subsidiário do incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao processo do trabalho, nos exatos termos em que vem sendo construído, e sem a possibilidade de ser declarada, sempre excepcionalmente, ex officio pelo juiz, poderá comprometer, por assim dizer, a efetividade do processo do trabalho e, em última análise, ofuscar o direito fundamental consagrado no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal.
4. Referências.
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______. Congresso Nacional. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 11 nov. 2014.
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KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. A desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine) e os grupos de empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
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SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de direito do trabalho. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.
Notas
[2] Comissão instituída pelo Ato nº 379, de 2009, do Presidente do Senado Federal.
[3] Nesse sentido, leciona o Ministro Luiz Fux: "Assim como nos primórdios da civilização o anseio popular era o de uma justiça institucionalizada contra a justiça privada, hoje a aspiração social é a da 'justiça urgente' em confronto com a 'justiça ordinária e ritual'".
[4] Atual do art. 1º do PL nº 8.046, de 2010:
"Art. 1º O processo civil será ordenado e disciplinado conforme as normas deste Código".
[5] Atual art. 8º do PL nº 8.046, de 2010: "Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência".
[6] Atual art. 15 do PL nº 8.046, de 2010: "Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente".
[7] Na doutrina, Santos (2003, p. 211) defende tal aplicação subsidiária, naquilo em que não for incompatível com os princípios próprios do Direito do Trabalho.
[8] A propósito, sobre o manejo de tal teoria, leciona Fábio Ulhoa Coelho (2005, p. 31): "[...] é pacífico na doutrina e jurisprudência que a desconsideração da personalidade jurídica não depende de qualquer alteração legislativa para ser aplicada, na medida em que se trata de instrumento de repressão a atos fraudulentos. Quer dizer, deixar de aplicá-la, a pretexto de inexistência de dispositivo legal expresso, significaria o mesmo que amparar a fraude".
[9] Sobre o assunto, o anteprojeto, originalmente, previa a seguinte redação:
Art. 62. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado na forma da lei, o juiz pode, em qualquer processo ou procedimento, decidir, a requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou dos sócios da pessoa jurídica.
Art. 63. A desconsideração da personalidade jurídica obedecerá ao procedimento previsto nesta Seção.
Parágrafo único. O procedimento desta Seção é aplicável também nos casos em que a desconsideração é requerida em virtude de abuso de direito por parte do sócio.
Art. 64. Requerida a desconsideração da personalidade jurídica, o sócio ou o terceiro e a pessoa jurídica serão intimados para, no prazo comum de quinze dias, se manifestar e requerer as provas cabíveis.
Art. 65. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória impugnável por agravo de instrumento.
[10] Cumpre mencionar, todavia, a existência de posição doutrinária (KOURY, 2003, p. 170) que pugna pela incidência, para efeito de uma tal desconsideração, da regra insculpida no art. 2º, § 2º, da CLT, segundo o qual, "Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas".