O Pluralismo das Entidades Familiares no Direito Brasileiro

26/07/2022 às 01:41
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Família é termo, conceito e ente plural. Diante disso, percebem-se as constantes mudanças doutrinárias e jurisprudenciais, que acabam por afetar a legislação concernente ao tema. Entretanto, ainda que existam tantas mudanças no meio social quanto às formas de se constituir família, a legislação não vem as acompanhando como deveria. 

O Código Civil de 2002, ao se debruçar sobre o Direito de Família, trata quase que exclusivamente da família matrimonial, não dispondo quanto as outras entidades e sua constituição. A CRFB/88 dispõe, além do casamento, sobre o instituto da união estável e conceitua a família uniparental.

A jurisprudência e a doutrina buscam alargar o conceito e as espécies de entidades familiares. Percebe-se por entidade familiar toda e qualquer espécie de união entre indivíduos com a capacidade de servir de acolhedouro das emoções e afeições dos seres humanos. A expressão entidade familiar reveste-se do significado constante no artigo 226, §3º e§4º da Constituição Federal.

Para os doutrinadores e aplicadores do direito sempre foi um grande desafio descobrir qual o toque diferenciador entre as estruturas interpessoais das entidades familiares no país e como inseri-las no conceito mais amplo de família.

Sabe-se que autora Maria Berenice Dias, notável jurista do Direito das famílias, traz em seu Manual atualizades quanto as entidades familiares e a edição dessa obra, em especial, proporcionou a muitos estudantes, mestres e aplicadores do Direito o aprofundamento teórico sobre o tema, com a enumeração de algumas entidades ainda não abrigadas na legislação, mas que são recorrentes na sociedade.

Há entidades familiares reconhecidas na Constituição e no ordenamento, como algumas das que já mencionamos: matrimonial, união estável, uniparental e monoparental. Todavia, trata-se de um rol amplo,  numerus apertus e não taxativo, dado que as conjunturas sociais sempre estão em evolução, surgindo novas conjunturas que também configuram família. 

São conceitos de Maria Berenice Dias, em sua obra Manual de Direito das Famílias, as seguintes entidades familiares, em especial, a família anaparental, que é a família sem pais ou genitores. A família homoafetiva, aquela advinda da união de pessoas do mesmo sexo. Mosaico ou pluriparental é a decorrente de vários casamentos, uniões estáveis ou mesmo simples relacionamentos afetivos de seus membros.

Tem-se, ainda, a família informal, que refere-se as uniões de fato que ganharam relevo passando o Estado a reconhecer mais e mais direitos decorrentes desta união.A família paralelas, simultâneas, plúrimas,múltiplas ou por poliamorismo, consistem em circunstâncias em que algum se coloca concomitantementecomo componente de duas ou mais entidades familiares diversas entre si. E, a família eudemonista, a entidade baseada no afeto. 

O Estatuto da Criança e Adolescente dispõe diretamente quanto a três entidades famíliares: natural, extensiva e substituta. A família natural, para a lei, seria a comunidade entre pelo menos um dos genitores e seus decendentes. 

A família extensiva no ECA foi inserida com a alteração do referido diploma legal pela Lei 12.010/09, como sendo aquela composta pelos membros que estão dentro do convívio doméstico, não importando o grau de parentesco, mas a convivência na unidade familiar. 

Presente nos arts. 28 a 32 e 165 a 170 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a família substituta configura-se como o tipo de família, a qual passa a substituir a família biológica de uma criança ou adolescente, quando a família não consegue ou não pode cuidar dessa criança. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção,ser constituída por qualquer indivíduo maior de 18 anos, em qualquer estado civil, e não precisa obrigatoriamente ter parentesco.

Com efeito, ainda que podemos ressaltar aqui o reconhecimento de parte das entidades pela legislação como elucidado acima, urge a regulação e amparo de normas e leis para tornar seguro o elo afetivo entre as diversas entidades familiares brasileiras, que, apesar de existirem de fato, ainda não gozam de proteção constitucional e não estão disciplinadas em legislação ordinária, prejudicando, assim, os direitos individuais e patrimoniais daqueles que estão inseridos em tais relações.

Segundo Wald (2004, p.57), o Direito de Família se preocupa com o status ocupado pela pessoa dentro do quadro familiar, defendendo os interesses não apenas do indivíduo, mas também do grupo. Como dependemdo status da pessoa, pode tal estado na família ser modificado, ou adquirido, seja por um fato jurídico (nascimento), seja por ato jurídico (adoção, casamento).

A existência de outras entidades familiares e o pluralismo das mesmas operam como umas das mais importantes inovações da nossa Constituição Federal, no tocante ao Direito de família. Contudo, ainda cercados de perplexidades e dúvidas quanto à aplicação de conceitos e julgados. Assim, na busca de um conceito de entidade familiar, é necessário ter uma visão pluralista, que albergue os mais diversos arranjos vivenciais. É preciso encontrar o elemento fundamento que possa autorizar o reconhecimento da origem do relacionamento entre as pessoas.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. Salvador: Editora Juspodivm, 2022.

WALD, Arnoldo. O novo direito de família. São Paulo: Saraiva, 2004.

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Sobre a autora
Milanny Ferrari

Advogada. Especialista em Direito Administrativo pela UFRN. Atuação na área de Direitos dos Servidores Públicos e RPPS.

Informações sobre o texto

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