RESUMO: O presente artigo dedica-se ao estudo da discursão sobre a evolução dos jogos, bem como a caracterização do jogador como um cliente, visto que a evolução tecnológica gerou uma gigantesca mudança no mundo gamer, onde hoje gira em torno de sí, não somente um grupo de pessoas com o intuito de se divertir ou usufruir de um mero jogo como passatempo, mas também um mercado financeiro onde há compras e vendas de produto de jogos, além de altos investimento e até fonte de renda. O intuito é propor uma nova ideia de como disciplinar, organizar e aplicar a legislação atual de modo mais eficaz a este novo mundo dos jogos com base principal no direito do consumidor e seus princípios.
PALAVRAS CHAVE: Direito do Consumidor, Princípios, Evolução dos jogos.
ABSTRACT: This article is dedicated to the study of the discussion about the evolution of games, as well as the characterization of the player as a client, since technological evolution has generated a gigantic change in the gaming world, where today it revolves around you, not just a group of people with the intention of having fun or enjoying a mere game as a hobby, but also a financial market where there are purchases and sales of game products, in addition to high investments and even a source of income. The aim is to propose a new idea of how to discipline, organize and apply current legislation more effectively to this new world of games based mainly on consumer law and its principles.
KEY WORDS: Consumer Law, Principles, Evolution of Games.
INTRODUÇÃO
O presente artigo científico tem como objetivo demonstrar a evolução do mundo gamer, compreendendo a evolução dos jogos, de acordo com o crescimento do mercado consumerista ao seu redor, visto que o universo gamer disponibilizado ao jogador e player brasileiro deve se adequar as normas brasileiras.
Desta forma, é necessário expor um pouco do crescimento tecnológico e entender como funciona o mercado de consumo no ambiente virtual dos jogos, pois não é igual ao consumo físico realizado no dia a dia, além disto há situações as quais ferem não somente a lei consumerista, mas também outros conjuntos de normas legais e princípios constitucionais.
O Código de Defesa do Consumidor atualmente já utilizada e devidamente aplicado para relações consumeristas virtuais, como por exemplo a compra e venda na internet, porém o desconhecimento do universo gamer, acrescido da inercia, não podem deixar o consumidor jogador refém de práticas consideradas ilegais.
É importante apontar os casos concretos, visto que a lei deve ter sua abrangência e força diante de todos os fatos ocorridos que envolvam a matéria de consumo, o comercio na internet já foi disciplinado, porém quando se trata do comercio no mundo gamer a aplicação do CDC, não é tão visível, tratada como uma compra e venda comum.
O tema procura visibilizar o consumo do mundo gamer, com a intenção deste artigo científico, buscar a melhor aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, não deixando jogadores refém de uma plataforma ou empresa decidirem unilateralmente sobre uma relação de consumo.
Para adentrar a questão da problemática a ser tratada, é necessário antepor algumas elucidações sobre temas importantes que antecedem a questão principal, como a evolução histórica do universo gamer, para assim, ter uma melhor compreensão da aplicação do direito do consumidor nos casos concretos no universo dos jogos online.
- A Evolução Histórica e Tecnológica do Ambiente Gamer
Desde o começo das civilizações o ser humano carrega consigo um fascínio pela competição, superação e consequente valorização das conquistas obtidas, como por exemplo na Roma antiga já existiam jogos como atletismo, caça e dentro outros.
Os jogos olímpicos foi uma forma de evitar as guerras e disputas por poder fazendo com que o ser humano pudesse usar o anseio de crescer em competir em esportes os quais não gerassem conflitos.
A revolução industrial foi o grande desenvolvimento mundial, que a partir deste momento foi possível o surgimento de jogos eletrônicos, estando dentro os mais famosos jogos o Atari, bem como o surgimento dos chamados videogames.
Os jogos se popularizaram e a evolução tecnológica não parou, os jogos foram incluídos até mesmo em celulares como o popular jogo da cobrinha, e uma grande comunidade pessoas foi se formando em torno de cada jogo.
A internet foi a grande conexão em as pessoas da comunidade dos jogos, antes o que apenas poderia ser jogado isolado ou cada um em sua máquina, unificou todo o ambiente gamer, fazendo com que os players, vulgo, jogadores, pudessem estar todos em um mesmo ambiente virtual os quais poderiam jogar, conversar, competir e demais atividades do mundo gamer.
Atualmente os jogos, possuem gráficos de realidade inimaginárias as quais nos inserem em um ambiente que apesar de virtual transforma o ambiente real, como os jogos de realidade virtual, onde o usuário tem a experiencia física de estar em um local totalmente diferente a partir da realidade virtual.
Os gamers atualmente, não apenas simples jogos ou coisa de criança, não somente hobby, ao redor do mundo dos jogos se formou um mercado, o qual movimenta muito dinheiro, não somente na compra e venda de jogos mas como produtos virtuais dos jogos, campeonatos profissionais de jogos, que para alguns se tornou meio de sustento e trabalho.
Diante de toda esta evolução, o direito do consumidor deve estar atualizado de forma a prestar a devida a proteção aos jogadores que hoje são também consumidores constantes, porém dentro do ambiente dos jogos algumas práticas são ofensivas a legislação brasileira e consumerista, as quais não podem ser toleradas devendo ser combatidas e eliminadas.
- Possibilidade da Aplicação do Código de Defesa do Consumidor para a Resolução de Conflitos no Mundo Gamer
Atualmente a lei 8.078/90 (CDC), que rege as relações de consumo no Brasil, também é aplicada para as relações de consumo virtuais, com base no artigo 2º do CDC, o consumidor é aquele que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, assim o player de jogos online é consumidor, quando adquire uma mídia física de um jogo, bem como, quando se utiliza de serviços de jogos online.
Quanto as empresas de jogos sejam online ou offline, estas se enquadram no artigo 3º, caput, do CDC, no qual se lê:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Imperioso é destacar que as empresas fabricantes de jogos se responsabilizam objetivamente, independentemente de culpa, contudo não limitam a uma hipótese, pois podem se enquadrar apenas como fabricante do jogo, de respondendo de acordo com o art. 12 do CDC, bem como prestadora de serviço, conforme o art. 14 do CDC, descritos abaixo:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Neste sentido, destacamos a jurisprudência, abaixo que demonstra o entendimento dos tribunais, impondo esta responsabilidade até ao terceiro na relação de consumo:
Apelação ação de indenização compra e venda pela Internet empresa mantenedora de sítio eletrônico de intermediação fraude responsabilidade danos morais mero descumprimento contratual recurso parcialmente provido. A empresa, que mantém sítio eletrônico para intermediar venda pela internet e fornece informações no sentido de que os vendedores ali certificados são confiáveis, responde pelos danos materiais suportados pelos usuários que confiaram nas informações prestadas e foram vítimas de ações de falsários. O transtorno decorrente de descumprimento contratual, por si só, não enseja indenização por danos morais (MINAS GERAIS, Tribunal de Justiça, Apelação Cível nº 10071080385462001, 2010)
O Código de Defesa do consumidor tem como obvio o principio basilar a proteção do consumidor por ser considerado hipossuficiente e vulnerável diante da relação de consumo, bem como no principio da dignidade da pessoa humana, conforme explica Tartuce:
[] o CDC brotou como uma resposta legal protetiva, objetivando ainda, situar a transparência e a concordância entre consumidores e fornecedores. Mais do que uma legislação alfandegária e punitiva, o Código criou uma cultura de respeito aos direitos de quem consome produtos e serviços, iniciamos o processo de desenraizar as relações onde o consumidor era tratado como um sujeito figurativo da relação de consumo sem voz, e plantamos a semente do Direito do Consumidor que defende conceitos que confrontam com os desejos do fornecedor, porém não ministra vontades e sim garantias (TARTUCE; NEVES, 2013, p. 25).
Além das vulnerabilidades técnica, jurídica, e econômica, o contrato de adesão é um outro fator que aumenta a vulnerabilidade do consumidor, visto que o mesmo depende desta aceitação e por um simples click no mouse, consegue aceitar e concordar com os termos que lhe são impostos, conforme bem leciona Renata Cattini Maluf Aguierre:
O contrato eletrônico do entretenimento apresenta-se usualmente sob a forma de contrato de adesão, denominado contrato-tipo, em que as cláusulas são impostas por uma parte à outra sem que seja possível discutir cláusulas isoladamente, cabendo à outra parte apenas aderir incondicionalmente a ele, em geral em forma de disclaimers, que são declarações em formato digital inseridas nas páginas de Internet que estipulam regras dirigidas ao usuário com a finalidade de limitar ou excluir a responsabilidade, em que se dá um click no botão de OK para aceitar e só com isso se consegue continuar com a navegação ou ter acesso ao conteúdo que este se refere. É o que ocorre com contrato de compra e venda on-line, realizado via e-mail, via site ou instant messaging, dentre outros contratos.
Ressalta-se que vários modos de transações econômicas podem acontecer no mundo gamer entre consumidor/usuário e as empresas, de modos amplos, como a venda de mídia física do jogo, de cosméticos reais e virtuais, moedas virtuais, de serviços de benefícios temporários, venda e a depender do jogo e seu estilo pode haver compra de skins (roupas virtuais), itens, habilidades e serviços para o personagem virtual.
No caso das mídias físicas o CDC, disciplina muito bem, conforme o seu artigo 26 que trata sobre a decadência e prescrição para reclamar de vícios, no qual se observa:
Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:
II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.
Demonstrado que os conceitos são perfeitamente aplicáveis, e que diante da aquisição de qualquer de uma modalidades citadas no parágrafo acima, haverá uma relação de consumo, na qual existe, a parte consumidora, geralmente vulnerável e hipossuficiente que aceita as condições de um termo de adesão para poder usufruir do jogo, diante de uma grande empresa a qual detém todo o poder dentro do jogo, bem como possui poder diante dos personagens fictícios utilizados pelos jogadores.
No mundo e no Brasil, ainda não há uma legislação específica que trate de comercio em jogos online, contudo tenha havido uma arrecadação mundial de 19,8 bilhões de dólares no ano de 2016, e que com a pandemia elevou ainda mais, visto que as pessoas sem encontravam mais tempo em sua residência, obtendo mais disponibilidade para jogar, o que aumentou o número de players em vários jogos.
Pelo motivo da relação de consumo virtual, ser enquadrado pelo art. 49 do CDC, visto a possibilidade do direito ao arrependimento, como bem explica Leonardo de Medeiros Garcia (GARCIA, 2008, p. 260):
Exercido o direito de arrependimento, o consumidor deverá receber de forma imediata a quantia paga, monetariamente atualizada, voltando ao status quo ante. Assim, todo e qualquer custo despendido pelo consumidor deverá ser ressarcido, como o valor das parcelas pagas, além de outros custos, como os de transporte, por exemplo. Além disso, a norma autoriza que a restituição seja feita de forma imediata, ou seja, o fornecedor não poderá impor prazo ao consumidor para que restitua os valores
Observação do disposto no art. 49º do CDC:
Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.
O disposto no artigo acima, pode ser até compatível em alguns casos concretos, porém quando entramos no ambiente de compra virtual, algumas plataformas vendem cópia da mídia digital, que diante de tal disposição, o consumidor poderia se utilizar do jogo por 7 (sete) dias e ate mesmo a depender do estilo do jogo zerar e após isto exercer o direito de arrependimento, pedindo o dinheiro do jogo de volta, tendo gozado de todo prazer do jogo.
- Problemas e Conflitos das Relações de Consumo no Mundo Gamer.
Como citado no final do tópico acima, a venda de copias digitais de mídias físicas, onde há a possibilidade de empresas serem lesadas pelos consumidores, com a aplicação do art. 49 do CDC, visto que 7 dias a depender do jogo, bem como da liberdade de usufruir, pode fazer com que o jogador não apenas tenha uma experiência, mas sim a experiência completa do game.
Um dos problemas também é a questão de banimento de usuários, por questões de infringir regras do jogo, geralmente a maioria de casos, que levam ao banimento de contas, são por condutas dos próprios jogadores, em utilizar programas que teoricamente pelas regras do jogo, são proibidos, pois este teriam a intenção mínima de ajudar ao jogador a obter pequenas vantagens, até mesmo ao ponto do programa jogar pelo consumidor, dando a este um vantagem muito maior.
Outra conduta que acarreta o banimento, é através de interação entre os jogadores, que nem sempre são pacíficas, visto que alguns jogos podem envolver interesses econômicos reais, onde o jogador aufere dinheiro real, por produzir uma riqueza virtual. Os motivos podem ser desde de atitudes proibidas pelo jogo, como por exemplo, o power abuse, onde um jogador utiliza de sua força para impedir que outro consiga jogar por meios do próprio jogo, bem como por comentários racistas, xenófobos, discriminatórios e ofensivos, ou até atitudes reais com objetivo de causar prejuízos financeiros, intimidar, ou ameaçar o outro jogador e consumidor.
O banimento também pode ocorrer por motivo de bug, que é um erro não-intencional do jogo que proporciona aos jogadores, que agem de má-fé, na intenção de alcançar benefícios não permitidos normalmente, se aproveitando de vantagens indevidas, em vez de reportar a parte responsável da empresa, sobre o defeito.
O agir de má-fé não pode ser elemento na relação de consumo, visto que o CDC, tem como um dos princípios mais importante o princípio da boa-fé, descrito no art. 4º, inciso III:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;
Segundo Leonardo de Medeiros Garcia (2008, p. 41), podemos definir a boa-fé como:
[...] um conjunto de padrões éticos de comportamento, aferíveis objetivamente, que devem ser seguidos pelas partes contratantes em todas as fases da existência da relação contratual, desde a sua criação, durante o período de cumprimento e, até mesmo, após a sua extinção
Os banimentos são realizados de forma unilateral e sumaria pela empresa detentora do jogo, na maioria das vezes sem qualquer possibilidade de defesa, ou de contraditório, ou até de recorrer decisão da empresa.
Outro problema, que é um questionamento por parte dos consumidores jogadores, são os tratamentos desiguais que certas empresas de jogos dão a aqueles jogadores menos importantes, iniciantes ou pouco ativos, ou por motivo de o jogador uma relevância de por adquirir um item (qualquer objeto do jogo que dê ao usuário atributos ou vantagens) raro ou único.
Além desses citados, é muito comum que em jogos, haja a venda de produtos sortidos, o jogador compra algo aleatório sem saber o que irá receber e a depender de sua sorte pode receber um item muito raro ou um algo comum, ou até meios de apostas, onde usam dinheiro real ou virtual para poder ganhar mais dinheiro, ressalta-se que hoje em dia devido a grande demandada, o dinheiro virtual do jogo ganhou poder equivalendo a uma quantidade no dinheiro real.
A modalidade de venda de produtos sortidos a depender da forma pode se configurar uma ofensa ao principio da informação pois induz ao consumidor a comprar algo e receber outro, devendo assim haver uma especificação mínima do que poder vir a ser o objeto da compra, quanto aos jogos de apostas, podem ser considerados jogos de azar, que teoricamente são proibidos pela legislação brasileira, contudo não há um controle efetivo sobre esta modalidade.
No meio virtual sites se aproveitam dos lucros obtidos por moedas virtuais que podem ser trocadas por dinheiro real, para instigar ao jogador a realizar apostas, que podem até viciar o jogador na busca de ganhos fáceis, havendo ainda a hipótese maliciosa, que o jogador não depender somente de sua sorte como também de um algoritmo que busque prejudica-lo e presenteá-lo em algum momento para que não desista de apostar.
A interação entre os jogadores, pode ser outro problema, pois, nem sempre são pacificas e diplomáticas e todas as relações são capazes de gerar conflitos, assim ainda mais no mundo dos gamers onde há uma disputada para ganhar ou dominar o adversário, desta forma comportamento, atos, falas e escritos, são mais um ponto a ser bem observados, pois podem ser somente um costume e intimidade entre pessoas, bem como causar ofensa graves e até criminais a outras pessoas, devendo assim exigir um agir da empresa neste ultimo caso, para banimento do jogador.
Importante destacar que, o Código de Defesa do Consumidor preza muito pelo direito a informação, contidas no art. 4, inciso IV, bem como no art. 6º, inciso III, no qual se observa um princípio indispensável a relação de consumo:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
No âmbito das relações de consumo, o direito à informação, com base nos artigos citados acima, estabelece o direito do consumidor de ser informado, bem como o dever do fornecedor em prestar as informações, conforme ensina Tartuce (2007, p.141):
[...] a informação, nesse âmbito da ciência jurídica, tem dupla face: o dever de informar e o direito de ser informado, sendo o primeiro relacionado com quem oferece o seu produto ou serviço ao mercado; e o segundo, com o consumidor vulnerável
Desta maneira informação é indispensável a relação de consumo não somente no âmbito físico mas também no meio virtual, não podendo as empresas de jogos arbitrar penas ao jogadores, sem motivos justificados que se enquadrem nas regras jogo e também nas regras das leis brasileiras, pois a empresa presta um serviço ao seus clientes que deve se submeter as ordens do CDC.
- Da Atualização do Código de Defesa do Consumidor para Atender o Mundo Virtual.
Pelo fato de o Código de Defesa do consumidor ser elaborado na década de 90, este não imaginou que as relações virtuais comerciais fossem atingir um nível tão alto quanto as relações comerciais físicas, já que na época computadores, internet e celulares eram incomuns a maioria da sociedade.
Atualmente, podemos perceber de muitos fatos e relações comerciais virtuais em ambiente gamers ou não, apesar de poderem ser enquadradas como relação de consumo pelo CDC, não são contempladas na legislação.
Desta forma, é comum ver os fornecedores abusarem se seus poderes, diante do consumidor hipossuficiente, tais abusos afrontam não só o CDC, mas até a legislação constitucional, visto que empresas de jogos ou de redes sociais aplicam penas aos seus usuários, as quais podem determinar a exclusão indevida de uma conta na qual fora feito um grande investimento financeiro, causando assim um enriquecimento sem causa, o que é vedado pela legislação:
Código Civil Lei nº 10.406 de 2002
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
A empresa desenvolvedora do jogo, tem o direito de impor as regras do jogo e banir um jogador que venha a violar, contudo para que haja um respeito ao ser humano quanto a sua personalidade, a relação de consumo baseada na informação, para que haja um banimento a empresa deve:
Em primeiro lugar, prever as punições anteriormente a serem a aplicadas, bem como trazer quais condutas geram as punições, assim como o Código Penal Brasileiro, obviamente necessário obedecer também a uma espécie de principio da anterioridade e legalidade existente no CP, analogicamente aplicado a penas na relação de consumo do mundo virtual.
Em segundo lugar um procedimento de exclusão o qual permita ao consumidor e jogador se defender das acusações antes de sofrer a punição de exclusão, já que esta para alguns jogos pode ser irreversível.
Uma atualização no Código de Defesa do Consumidor para o mundo virtual gamer e não gamer, seria bastante útil uma forma de disciplinar um processo pelo qual as empresas e consumidores, tivessem um espaço mínimo administrativo no qual houvesse uma acusação concreta, certa e específica da infração, bem como a oportunidade de defesa completa ao consumidor.
Quanto aos jogos, um exemplo, seria no caso de a empresa identificar a infração de uma regra do jogo. Neste caso, a empresa dona do jogo em sua primeira atitude, enviaria ao jogador/consumidor uma notificação de que identificou uma possível infração a regra do jogo, especificando-a e demonstrando que tal conduta faz parte do contrato aceitado quando da criação da conta no jogo, bem como até se possível com imagens ou vídeo da infração.
A partir do momento do envio da notificação e da sua gravidade, a empresa e fornecedora achar cabível uma suspensão temporária, assim poderia ser aplicada contanto que não prejudicasse nenhum investimento feito pelo consumidor.
A segunda atitude seria do consumidor que ao receber a notificação via e-mail ou pela própria plataforma do jogo, tivesse a oportunidade de realizar sua defesa, explicando os motivos pelos quais não deve receber a punição, demonstrando ser uma punição injusta.
A terceira atitude seria da própria empresa que com a explicações feitas pelo consumidor e cliente, julgaria ser devida ou não a punição. Ressalta-se que a oportunidade de defesa do consumidor é importante, tanto por se tratar de um direito de defesa, bem como para melhorar os sistemas e softwares que buscam a proteção do jogo contra outros sistemas e softwares que violem regras do jogo.
Outro modo, pode ser aplicado a comportamentos, falas e escritos. Neste caso, as denuncias sãos de players contra outros players por comportamento indevido que também violam as regras do jogo, assim, o player que se sentir ofendido por um comportamento, fala ou escrita, pode reportar tal conduta ao jogo, que seria o primeiro passo.
O segundo passo seria a empresa diante do reporte feito pelo consumidor ofendido, notificar e demonstrar ao consumidor ofensor que seu comportamento é incompatível com as regras do jogo, após isto o terceiro passo, seria do consumidor ofensor, que faria a defesa do seu comportamento visto que como jogos são mundiais, cada comportamento fala ou escrita podem ter significados e sentidos diferentes.
Após a defesa do possível ofensor, esta voltaria a empresa que assim decidiria a pena a ser imposta ou a absolvição notificando os motivos desta última ao consumidor ofendido.
Importante ressaltar que as empresas não poderiam justificar a imposição de pena por quantidade de acusações, pois muitas delas podem ser indevidas apenas para criar volume para exclusão de um consumidor, bem como não deve tolerar denuncias vazias aplicando penas para estas. Desta forma a pena deve se basear somente no disposto nas regras do jogo segundo a gravidade da infração.
- Casos Concretos de Lides Judiciais e entre Consumidores e Jogadores contra Empresa de Jogos e Fornecedores.
O site ebrabi.com.br em outubro de 2019, noticiou o caso de um autor que ingressou com uma ação na 2ª Vara Cível de Jacarepaguá, pedindo a restituição da sua conta, bem como indenização pelo seu banimento, contudo em 1º grau obteve apenas a restituição da conta, contudo após apelar a 24ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, concedeu danos morais ao jogador, o desembargador atribuiu a imagem virtual o mesmo valor a imagem humana real. (Ebradi, 2019)
A decisão do desembargador é acertada, pois a imagem virtual e a imagem real, se refere a imagem equivalente a honra da pessoa que contempla o direito da dignidade humana, conforme o art. 5º da Constituição Federal de 88, no qual se lê:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Outro caso, foi divulgado pelo site Migalhas.com.br, neste os jogadores tiveram suas contas excluídas e solicitaram indenização por danos morais e materiais e alegaram falta de contraditório e direito de defesa, na 32ª Vara Cível do Rio de Janeiro, processo 0416420-22.2014.8.19.0001, que fora negado, por dois motivos, o primeiro pela falta de comprovação que as contas excluídas eram de sua titularidade, bem como pelo entendimento da magistrada de que não se poderia dar dimensão existencial aos jogos virtuais. (Migalhas, 2021)
A decisão da magistrada apenas é acerta pela falta de comprovação da titularidade da conta, contudo, a indenização moral e material, se comprovada a titularidade da conta, deveria ser estabelecida, visto que a imagem virtual e a imagem real são uma só imagem, bem como o dano material em relações de consumo físicas são o mesmo dano que as relações de consumo virtuais.
O canaltech.com.br também noticiou três casos de lides judiciais, o primeiro, processo de nº 0033863-56.2016.8.19.0203, onde um jogador foi banido do jogo por permanecer online no jogo por mais de 10 horas seguidas, contudo a empresa não conseguiu provar ilegalidade na conduta do jogar, sendo condenada a pagar indenização. No segundo, o player teve sua conta banida por suposta duplicação ilícita de itens do jogo, contudo neste caso a empresa não conseguiu provar qualquer a atitude desleal, sendo atribuída a imagem virtual o mesmo valor da imagem real. (CanalTech, 2019)
Quanto aos primeiros dois casos, apesar da indenização por danos morais referentes a imagem virtual, serem acertadas, podem ser suficientes quando ao dano moral, contudo não suprem o tempo despendido pelo jogador para conseguir o progresso no jogo, bem como todo investimento feito por compras virtuais para facilitar o progresso no jogo, nem ao apego sentimental ao personagem virtual caso não seja restituído.
No terceiro caso, processo 0004675-13.2011.8.26.0554, um jogador ajuizou ação por ter sido banido, contudo não obteve sucesso, neste caso a empresa do jogo conseguiu provar que o player conseguiu dinheiro virtual pertencente ao jogo, por meio de fraude de terceiros, violando os termos do contrato, ou seja, regras do jogo. (CanalTech, 2019)
Todos os três casos se houvesse um processo administrativo eficiente pela empresa, seriam evitadas as demandas judiciais, pois a comunicação player e empresa, poderiam facilitar todo o processo e esclarecer os fatos, sem a necessidade de estimular o poder judiciário.
Outro caso foi decidido pelo 7 Juizado Especial Cível de Brasília, onde um consumidor e jogador do jogo Gods Of Rome, foi banido da plataforma por supostamente terr utilizado de meios e ações ilegais, a empresa Gameloft, alegou que o jogador concordou com os termos de uso do jogo, bem como um aumento de poder anormal por parte do avatar do player.
O magistrado em sentença no processo de nº 0707184-48.2020.8.07.0016, considerou que as regras não são especificas quanto as ações que levaram ao banimento do jogador, bem como não verificou um direito de defesa ao jogador para sua exclusão, desta forma determinou a reativação da conta do mesmo modo a que existia antes de ser banida com itens, recursos, nome e personagens.
Diante deste fato, é importante que as empresas de jogos modifiquem os termos de conduta, não seja apenas uma barra de rolagem, que nela ou no aplicativo jogo haja um código, como exemplo o código penal brasileiro, onde expõe as condutas e as punições, permitindo assim a informação ao consumidor e uma justa punição.
Além disto, novamente se faz importante um processo administrativo pela própria empresa do jogo para que casos como este não sobrecarreguem o sistema judiciário.
CONCLUSÃO
O desenvolvimento do presente tema possibilitou uma análise acerca do direito do consumidor com um olhar específico para as relações de consumo no mundo virtual gamer, entre as empresas de jogos e seus jogadores e clientes.
O objetivo do presente artigo é demonstrar que o Código de Defesa do Consumidor, pode e deve ser aplicado as relações de consumo virtuais, contudo o CDC, foi elaborado em momento anterior a existência dessas relações virtuais, o que mostrar ser necessário uma atualização e uma melhor aplicação deste código.
A existência de um procedimento para suspensão e banimento de contas mostra-se hoje indispensável visto que não se pode deixar ao poder do fornecedor aplicar sansões ou punições aos consumidores, sem um procedimento que possibilite uma mínima defesa do consumidor, pois isto lhe geraria danos.
Proteger o consumidor nas relações de consumo virtuais também é tarefa do direito do consumidor, de modo que todos os princípios aplicados as relações de consumo físicas, devem estar presentes nas relações de consumo virtuais, devendo a relação entre jogador e empresa basear-se na boa-fé e na informação certa, precisa e verídica.
A atualização do Código de Defesa do Consumidor, deve vir para proteger o consumidor de atos unilaterais sancionatórios e punitivos sem qualquer possibilidade de defesa, bem com proteger o fornecedor de consumidores que tenham a intenção de agir de má-fé como se aproveitar de um direito de arrependimento do art. 49, para se beneficiar do jogo sem prestar qualquer contraprestação.
Ainda assim, no mundo gamer impedir que um consumidor tenha benefícios que o outro possua, é estabelecer um principio de igualdade, e também é dever do CDC, proteger o consumidor, de outro consumidor mal-intencionado, que usufrua de bugs, ou utilize de práticas de abuso de poder.
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