Sumário: Introdução; 1 A Conciliação e Mediação no Novo CPC; 2 A proximidade entre a mediação e a conciliação; 3 A relevância do conciliador e mediador no acesso à justiça; Considerações finais; Referencias
RESUMO
Neste trabalho serão abordados aspectos gerais sobre os métodos de resolução de conflito e suas distinções, dando ênfase para a mediação e conciliação, pela amplitude se sua aplicação e por suas técnicas e que podem e devem fazer uso de seus métodos, abordando suas vantagens, avanços e seu desenvolvimento histórico, respectivamente. Apontando-as como possibilidades alternativas para reparar problemas do sistema jurídico no Brasil, sabendo que existem outras alternativas de resolução de conflito, entretanto, pouco conhecidas. Nesse estudo, buscou-se não só compreender a evolução histórica de cada método, desde as primeiras civilizações até os dias de hoje, mas lembrar também de que na medida em que a sociedade evolui, novas formas para resolver um conflito são criadas e as antigas melhoradas. Sabendo que o Poder Judiciário brasileiro está repleto de mazelas como a morosidade, a ausência de pacificação social e o alto custo, tornam-se grandes obstáculos ao acesso à justiça por meio do judiciário. Terá como objetivo destacar as mudanças do Novo CPC nos centros judiciários de solução consensual de conflitos, realizando audiências de conciliação e mediação prévias.
Palavras-chave: Mediação. Conciliação. Resolução de Conflitos. Desenvolvimento Histórico. Novo Código de Processo Civil. Acesso à justiça.
Introdução
O Novo Código de Processo civil foi publicado em 16 de março de 2015, passando de projeto de lei nº 6.025/05 para lei nº 13.105, contendo 1.072 artigos, o qual tem como objetivo simplificar e dar mais celeridade à tramitação das ações.
Esse trabalho tem como finalidade elencar uma das principais inovações da norma de acordo com o que foi aprovado pelo Sanado. Uma das principais inovações diz respeitos às audiências preliminares de conciliação, onde os tribunais terão que criar centros judiciários de conciliação e mediação, na presença de profissionais especializados para tentarem um acordo entre as partes.
1 O que é Conciliação
A Conciliação é uma forma de resolução de conflitos, onde um terceiro imparcial chamado de conciliador, por meio de seus conhecimentos, facilitará a comunicação entre as pessoas. Auxilia pessoas a construírem consenso sobre uma determinada lide. Ela privilegia a desconstrução do conflito e conseqüentemente a restauração da convivência harmoniosa das pessoas
A ideia de ativismo judicial existe a muito mais tempo do que o próprio termo. Na primeira metade do século XX, uma enxurrada de estudos discutiram os méritos da legislação judicial e acadêmicos de destaque tomaram posições em cada lado do debate. Pode-se pensar que o termo surgiu primeiramente em um julgado ou em algum artigo científico, mas na verdade, Arthur Schlesinger Jr., introduziu o termo ativismo judicial para o público em um artigo da revista Fortune de janeiro de 1947, onde fez o perfil de todos os nove magistrados da Suprema Corte americana atuantes àquela época, explicando as alianças e divisões entre eles. A Corte estava dividida entre uma interpretação da legislação e "o bom funcionamento do judiciário em uma democracia". (CHAVES, 2012)
Segundo Luís Roberto Barroso (2008), a ideia de ativismo judicial está associada a uma maior participação do Poder Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, chegando a interferir no espaço de atuação dos outros dois Poderes. Isso se tornou possível graças à superação da filosofia jurídica positivista. Neste sentido, Barroso (2008) aponta que:
O pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas. A interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma teoria de justiça, mas não podem comportar voluntarismos ou personalismos, sobretudo os judiciais. No conjunto de idéias (sic) ricas e heterogêneas que procuram abrigo neste paradigma em construção incluem-se a atribuição de normatividade aos princípios e a definição de suas relações com valores e regras; a reabilitação da razão prática e da argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica constitucional; e o desenvolvimento de uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre o fundamento da dignidade humana. (BARROSO, 2008, p. 04-05).
Destaque aqui para o desenvolvimento de uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre o fundamento da dignidade humana, pois este entendimento de que é preciso humanizar as relações jurídicas também se faz presente no movimento do Constitucionalismo, e como consequência, presente no comportamento proativo do Judiciário. Não por acaso, esta atitude ativista se manifestou primeiramente nos países que passavam por uma revalorização filosófica, e consequentemente, uma revalorização jurídica. É o caso da Espanha, Itália, Alemanha, Estados Unidos, entre outros.
Luís Roberto Barroso denota ainda que o ativismo judicial pode se manifestar por meio de diferentes condutas, não somente no que diz respeito a direitos civis:
A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas. (BARROSO, 2008. p. 6).
Contudo, atualmente não existe na doutrinauma definição clara para ativismo judicial. Valle (apud LOPES, 2010), em obra dedicada ao tema, afirma que o termo ativismo possui um caráter ambíguo, pois apresenta um caráter finalístico e comportamental. O primeiro refere-se ao compromisso com a expansão dos direitos individuais, ao passo que no segundo prevalece à visão pessoal de cada magistrado na interpretação da norma constitucional.
- Desenvolvimento histórico da conciliação
Num primeiro momento após o julgamento, o debate centrou-se na ideia de que o ativismo judicial do STF estaria a afrontar o princípio da separação de poderes. O ativismo judicial na situação em tela se justifica, entre outras razões, pela inércia do legislativo. Trata-se, portanto, de uma maneira proativa de interpretar a Carta Magna,estendendo o seu alcance e sentido. Como referido, usualmente emerge na ocorrência de "retração do Poder Legislativo, de certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que determinadas demandas sejam atendidas de maneira efetiva". (BARROSO, 2012). E no caso específico do julgamento da ADPF 132 e daADI 4277, o eventual ativismo judicial se justifica pela absoluta omissão e indolênciado Legislativo em relação às questões concernentes à homoafetividade. Basta relembrar que existem, em tramitação, Projetos de Lei que versam sobre as uniões homoafetivas de meados da década de 90. Deve-se fazer uso do ativismo judicial apenas em último caso, mas, na situação em tela, nada mais parecia poder ser feito. Existem nas casas legislativas brasileiras, diversos projetos de lei, proposta de emenda à constituição e nunca sequer ventilou-se a possibilidade de que fossem a votação. Os projetos que não foram arquivados encontram-se perdidos em algum fundo de gaveta, e quando desarquivados, esbarram nas Comissões, cuja maioria esmagadora é formada por parlamentares cujo fundamentalismo moral (especialmente com viés religioso) chancela a sonegação de direitos civis a uma grande parcela da sociedade. (CHAVES, 2012).
Deve-se fazer uso do ativismo judicial apenas em último caso, mas, na situação em tela, nada mais parecia poder ser feito. Como bem afirmou o Min. Celso de Mello:
Práticas de ativismo judicial, embora moderadamente desempenhadas pela Corte Suprema em momentos excepcionais, tornam-se uma necessidade institucional, quando os órgãos do Poder Público se omitem ou retardam, excessivamente, o cumprimento de obrigações a que estão sujeitos, ainda mais se tiver presente que o Poder Judiciário, tratando-se de comportamentos estatais ofensivos à Constituição, não pode se reduzir a uma posição de pura passividade. (2011, p. 46).
Estavam a serem desrespeitados e sonegados os direitos fundamentais de muitos cidadãos brasileiros e, o grande papel do tribunal constitucional brasileiro, do STF, é o de promover e proteger os direitos fundamentais de todos. Como assinala Luís Roberto Barroso, uma "eventual atuação contra majoritária do Judiciário em defesa dos elementos essenciais da Constituição dar-se-á a favor e não contra a democracia". (2012, p. 371). Como bem questiona Ronald Dworkin, será que uma´maioria moral´ pode limitar a liberdade de cidadãos individuais sem uma justificativa melhor do que a de desaprovar suas escolhas pessoais?. (2005, p. 645). É certo que não.Reafirmou o Min. Celso de Mello, durante o julgamento, a função contramajoritária da Suprema Corte brasileira, afirmando ser o STF o órgão investido da responsabilidade institucional e do poder de proteção das minorias contra excessos dos grupos majoritários ou, ainda, contra omissões que, atribuídas à maioria sejam lesivas, em face da inércia do Estado, aos direitos daqueles que sofrem os efeitos perversos do preconceito, da discriminação e da exclusão jurídica. De acordo com o eminente Ministro, a essência democrática de qualquer regime de governo apoia-se na existência de uma imprescindível harmonia entre a Majorityrule e os Minorityrights.Seguindo essa ideia, afirmou que ninguém se sobrepõe, nem mesmo os grupos majoritários, aos princípios superiores consagrados pela Constituição da República. (MELLO, 2011) O sexto Ministro, a votar favoravelmente a reduzir àconstitucionalidade das uniões homoafetivas também afirmou se tratar de um caso de proteção de direitos fundamentais. Diante do que classificou como limbo jurídico, fruto da omissão do Poder Legislativo em relação à matéria, o Min. Gilmar Mendes considerou que era dever do STF, Corte Constitucional brasileira, assegurar a proteção às uniões homoafetivas, em atendimento aos direitos das minorias e aos direitos fundamentais. O Min. Gilmar Mendes também foi enfático ao afirmar que o Supremo Tribunal Federal não poderia deixar de atuar no caso em tela, asseverando que uma omissão do STF se traduziria em um agravamento no quadro de desproteção de minorias ou pessoas que tenham seus direitos lesionados. Assim, não há como se contestar a legitimidade jurídica-constitucional da decisão proferida pela Corte constitucional brasileira,que se traduziu em um prestígio pela Lei Fundamental e pelos princípios nela insculpidos, e na materialização do verdadeiro Estado Democrático de Direito. (CHAVES, 2012).
- Sua obrigatoriedade de acordo com o novo CPC
Observa-se uma absoluta omissão e indolência do Legislativo em relação às questões concernentes à homoafetividade. Basta relembrar que existem, em tramitação, Projetos de Lei que versam sobre as uniões homoafetivas de meados da década de 90. Os projetos que não foram arquivados encontram-se perdidos em algum fundo de gaveta, e quando desarquivados, esbarram nas Comissões, cuja maioria esmagadora é formada por parlamentares cujo fundamentalismo moral (especialmente com viés religioso) chancela a sonegação de direitos civis a uma grande parcela da sociedade. É fato inegável que conflitos sociais e jurídicos crescem de forma assustadora no vácuo da inércia legislativa e também de leis e regulamentos inconstitucionais, sendo o Judiciário chamado não só para arbitrá-los segundo as leis existentes, mas, muitas vezes, tendo que formular a própria regra/solução de direito aplicável ao caso. O Poder Judiciário tem assumido certo nível de ativismo em face da inércia e omissão legislativas potencializadas pela repercussão das mazelas e crimes que a atividade da imprensa livre tem permitido levar ao conhecimento do povo, assim como a grande rede virtual de informações, a internet.
[...]a sociedade soberana não deve ficar refém do constituinte derivado, muita das vezes às voltas com a defesa de interesses próprios ou partidários. Portanto, fixe-se como asserção que o legítimo intérprete da Constituição detém o poder-dever de concretizá-la, sempre e quando algum preceito necessite de interpretação para ser concretizado, a despeito da inércia do Poder Legislativo. E pode porque a tarefa desenvolvida aí se coaduna com o contratado pela Constituição. Então, torná-la efetiva é tarefa mais do que necessária, é fundamental para a concretização da norma que dá legitimidade a toda a estrutura orgânica da sociedade. (SANTANA, 2010).
4Em defesa do emprego do Ativismo Judicial
O ativismo judicial na situação em tela se justifica, entre outras razões, pela inércia do legislativo, como dito anteriormente. Deve-se fazer uso do ativismo judicial apenas em último caso, mas, na situação em tela, nada mais parecia poder ser feito, assim, minimizando as desigualdades sociais, efetivando os princípios gerais do direito, mantendo assim a essência do Estado Democrático de Direito.
O magistrado ativista ao decidir o caso concreto não possui uma interpretação completamente sem vínculo ou faz uso de fontes desconhecidas e bem como procura manter sua convicção pessoal sem fundamento algum, mas utiliza os princípios e fundamentos constitucionais e desta forma possui uma maior participação no campo destinado aos outros poderes.A qualidade desta decisão refere-se aos critérios que lhe revestem e a importância que possui na efetivação dos direitos fundamentais, e por isto, que acaba atuando em outras searas, mas sem usurpar a competência originária dos demais Poderes.Assim sendo, o Ativismo Judicial é uma solução que reafirma a própria existência do Estado Democrático e Social de Direito, ao determinar o cumprimento de metas inseridas no texto constitucional, o que não significa que está executando ou criando as leis, na realidade está agindo em conjunto com os demais Poderes, sendo está à lição de UadiLammêgoBulos:
A interferência de um poder sobre o outro é apenas admissível para garantir direitos fundamentais, impedindo abusos e atentados contra a própria Constituição, caso contrário de nada adiantará a constitucionalização do princípio, porque ele existirá, apenas, nominalmente, sem qualquer relevância prática. (2012, p. 67).
Não existe contrariedade ao princípio da separação dos poderes previsto na Constituição de 88, pois na realidade a decisão ativista não está usurpando função em face de apenas exigir dos demais Poderes que sejam ativos no combate das desigualdades sociais determinando apenas que cumpram aquilo que está previsto na Constituição Federal. (SALMEIRÃO, 2013).
A interpretação do princípio da separação dos poderes inseridos no texto constitucional deixa evidente que a rigidez deverá ser ultrapassada em matéria constitucional pois todos os poderes devem ser independentes e harmônicos entre si, devendo por esta ótica existir entre ambos uma relação de cumplicidade e de colaboração com os fundamentos da República Federativa do Brasil, não podendo ser considerada a decisão ativista como uma ameaça à ordem e forma de interferência entre os Poderes mas uma solução possível de existir.A proposta de Montesquieu, em sua obra Do Espírito das Leis, onde discute a Teoria da Tripartição de Poderes ora recepcionado por nosso texto constitucional, na realidade existiu naquela época a preocupação com o continuísmo do autoritarismo em virtude da concentração do poder por uma única pessoa e desta forma propõe a divisão com objetivo da diminuição, fiscalização e controle deste poder, ou seja, não se discutiu a efetividade dos direitos fundamentais como atualmente ocorre, conforme segue:
Um órgão pouco numeroso como o encarregado das funções executivas não conseguiria ser imparcial e tenderia a ser tornar tirânico, de maneira que seria necessário manter todos os poderes separados e, ao mesmo tempo, controlando-se mutuamente, em especial o poder executivo ao poder legislativo. (1960, p. 184).
Conforme já dito, não somente a inércia dos Poderes, mas a possibilidade de antecipar algumas condutas em face da evolução incansável das relações sociais, econômicas, culturais e tecnológicas faz do ativismo uma ferramenta capaz de colaborar com os trabalhos a serem produzidos no combate a desigualdade onde a decisão irá propiciar uma diretriz a ser seguida e não apenas como um poder tirano que açoita os demais poderes.Na obra Ativismo Judicial, de EdinilsonDonisete Machado, faz uma abordagem acerca da colaboração dos Poderes, conforme segue:
A fase do atual desenvolvimento do Estado não comporta mais a discussão em torno da divisão dos poderes, como instrumentos estanque das funções, mas sim o princípio de que todas as funções não devem ser entregues em mãos de um só. Essa preocupação em se dividir as funções por compartimento estanque tinha sua razão de ser antes dos Estados de Direito, posto que a ausência da consagração de um princípio (como a tricotomia das funções hoje arraigada na maioria dos Estados) tinha como aliada sempre a usurpação das funções de um só indivíduo. Portanto, as funções devem estar uma em relação às outras como colaboradoras, até porque em cada uma delas existe a execução de funções análogas às outras. Aliás, como já salientado, é princípio constitucional, no qual se tem a harmonia e independência como fundamentos. Harmonia, como sinônimo de colaboração, de cordialidade necessária entre as funções. Independência, no sentido de não ser necessária a cada função a permissão da outra, para o exercício de suas competências. (2011, p. 104).
Assim, a decisão ativista dever ser considerada um exercício discricionário da função do magistrado em julgar a lide estando dentro de sua competência e quando determina que os demais Poderes sejam cumpridores dos direitos fundamentais e demais elementos inseridos no texto constitucional, ele (juiz) não executa e tão pouco propõe projeto de leis mas apenas cobra a efetividade da medida que é realizada diretamente pelos Poderes responsáveis.
Portanto, não existe invasão de competência, desrespeito ao princípio da separação dos poderes pois a decisão ativista somente impõe aos demais Poderes que cumpram aquilo que já está previsto no texto constitucional sendo que o alcance dos benefícios sociais será realizado diretamente pelos órgãos responsáveis que se distanciam do Poder Judiciário preservando a identidade e função de cada poder. (SALMEIRÃO, 2013)
5 Objeções ao ativismo no território pátrio
A imagem que pode se ter desta crescente interferência do Judiciário nos assuntos de competência dos demais poderes pode ser positiva em um primeiro momento, como muitos assim entendem devido o julgamento da ADPF 132 e daADI 4277. Ocorre que esta postura ativista do Judiciário tem preocupado alguns constitucionalistas. Para discutir sobre as principais preocupações quanto ao ativismo judicial, será citado uma vez mais Luís Roberto Barroso (2008), que sintetiza em três objeções as principais críticas apontadas pela doutrina. Segundo o autor, as críticas se concentram nos riscos para a legitimidade democrática, na politização indevida da justiça e nos limites da capacidade institucional do Judiciário.
Quanto aos riscos para a legitimidade democrática, o autor lembra que os membros do Poder Judiciário juízes, desembargadores e ministros não são eleitos pelo povo, mas é indiscutível que exercem poder político, inclusive o de invalidar atos dos outros dois Poderes. Então desde logo aponta a possibilidade de um órgão que não foi eleito pelo povo, como o Supremo Tribunal Federal, anular a decisão do Presidente da República, eleito por milhões de brasileiros. E para explicar a legitimidade deste poder que o Judiciário detêm, Barroso (2008) apresenta duas justificativas: uma de natureza normativa, e outra filosófica.
Sobre a justificativa de natureza normativa, escreve o autor:
[...] A Constituição brasileira atribui expressamente esse poder ao Judiciário e, especialmente, ao Supremo Tribunal Federal. A maior parte dos Estados democráticos reserva uma parcela de poder político para ser exercida por agentes públicos que não são recrutados pela via eleitoral, e cuja atuação é de natureza predominantemente técnica e imparcial. De acordo com o conhecimento tradicional, magistrados não têm vontade política própria. Ao aplicarem a Constituição e as leis, estão concretizando decisões que foram tomadas pelo constituinte ou pelo legislador, isto é, pelos representantes do povo. (BARROSO, 2008. p. 11).
E quanto ao aplicar técnico das leis pelos membros do judiciário, o autor ainda denota que esta postura reverencia a lógica da separação de Poderes, mas deve ser aceita com temperamentos, tendo em vista que juízes e tribunais não desempenham uma atividade puramente mecânica. Para ele, na medida em que cabe aos juízes a atribuição de sentido às expressões vagas, como princípio da dignidade da pessoa humana ou boa-fé objetiva, estes juízes tornam-se, em muitas situações, co-participantes do processo de criação do Direito.
Já sobre a justificativa filosófica, o autor a adjetiva como mais sofisticada, mas ainda assim compreensível. Para a explicação, partiremos de dois conceitos: constitucionalismo e democracia.
O Estado constitucional democrático, como o nome sugere, é produto de duas idéias que se acoplaram, mas não se confundem. Constitucionalismo significa poder limitado e respeito aos direitos fundamentais. OEstado de direito como expressão da razão. Já democracia significa soberania popular, governo do povo. O poder fundado na vontade da maioria. Entre democracia e constitucionalismo, entre vontade e razão, entre direitos fundamentais e governo da maioria, podem surgir situações de tensão e de conflitos aparentes. (BARROSO, 2008. p. 11).
Exatamente por estes conflitos aparentes é que cabe à Constituição desempenhar dois grandes papéis. Na visão do autor, o primeiro seria o de estabelecer as regras do jogo democrático, assegurando a ampla participação política, o governo da maioria e a alternância no poder. Contudo, democracia não se limita ao princípio majoritário. Ou seja, não é porque o país é predominantemente católico que deve haver uma negação de direito aos espíritas, por exemplo. Portanto, é necessário o segundo papel constitucional, que seria proteger valores e direitos fundamentais.
Se tratando da politização indevida da justiça, Barroso (2008) destaca:
Direito não é política. [...] Em uma cultura pós-positivista, o Direito se aproxima da Ética, tornando-se instrumento da legitimidade, da justiça e darealização da dignidade da pessoa humana. [...]Não é possível ignorar, porém, que a linha divisória entre Direito e Política, que existeinegavelmente, nem sempre é nítida e certamente não é fixa. (BARROSO, 2008. p. 12)
A preocupação central do autor neste ponto é quanto àideia de um juízo político. Deve ser esclarecido desde logo que político não está se referindo às concepções filosóficas de política, como proposto por Platão e até mesmo Aristóteles. Um juízo político se refere tão somente a um juízo movido por interesse próprio ou de terceiro. Segundo o autor, poucas críticas são mais desqualificantes para um juiz do que a acusação de que suas decisões são políticas e não jurídicas. O porquê disto se torna simples de se compreender quando é citado Carl Schmitt (apud BARROSO, 2008) que afirmou que a pretensão de judicialização da política iria se perverter em politização da justiça. Desta feita, agora sim é o momento perfeito para rememorarmos os ensinamentos de Aristóteles cuja citação é quase obrigatória ao se falar em justiça. Em Ética a Nicômaco, em seu capítulo V, Aristóteles descreve o que viria a ser a Justa Justiça. Para o estagirita, a justiça deve ser livre de todo e qualquer vício, em todos os tempos. Vício viria a ser a desproporção da medida. Seria o pesar mais para um lado da balança, e é exatamente esta a preocupação apontada por Barroso: que a politização da justiça lhe arrebate o seu caráter justo, tendo em vista que seria exercida em função de interesses. Como dito, o risco da politização dos tribunais não deve ser subestimado. Sabemos que o Direito tem sempre uma intenção política, mas o Direito não é político no sentido de que a liberdade de expressão de que quem pensa com a maioria deve ser mais protegida do que a de quem pensa com a minoria. Sendo assim, o juiz, dentro do contexto da judicialização, nunca age que não seja em nome de uma vontade política pré-existente, que não é a dele; é a que está na Constituição ou na lei. O Judiciário pode decidir em muitas questões, mas talvez não deva. O juiz deve avaliar se ele é, naquelas circunstâncias, a pessoa capaz de produzir a melhor avaliação e decisão naquela matéria. No contexto de jucialização, em que o Judiciário pode muito, às vezes é preciso uma gota de humildade para saber se, embora podendo, deve. Porque pode ser que aquela decisão tenha como autoridade competente mais qualificada outra que não o juiz. (BARROSO apud ITO, 2009).
E finalmente, temos a preocupação no que se refere aos limites da capacidade institucional do Judiciário. Basicamente, esta preocupação se fundamenta na tripartição dos Poderes. No caso trabalhado, o Poder Judiciário está a incorporar uma responsabilidade que seria do Legislativo, e a rigor, isto iria contra o Princípio da Separação dos Poderes, o princípio identidade de um Estado Constitucional Democrático de Direito. Contudo, Barroso vai além deste princípio e apresenta duas ideias presentes na doutrina contemporânea que merecem registro: a de capacidades institucionais e a de efeitos sistêmicos.
Estas ideias apresentadas são tipos de riscos que advém do ativismo judicial. Segundo o autor, o risco de capacidades institucionais:
[...] envolve a determinação de qual Poder está mais habilitado aproduzir a melhor decisão em determinada matéria. Temas envolvendo aspectostécnicos ou científicos de grande complexidade podem não ter no juiz de direito oárbitro mais qualificado, por falta de informação ou conhecimento específico.Formalmente, os membros do Poder Judiciário sempre conservarão a sua competênciapara o pronunciamento definitivo. Mas em situações como as descritas, normalmente deverão eles prestigiar as manifestações do Legislativo ou do Executivo, cedendo o passo para juízos discricionários dotados de razoabilidade. Em questões como demarcação de terras indígenas ou transposição de rios, em que tenha havido estudos técnicos e científicos adequados, a questão da capacidade institucional deve ser sopesada de maneira criteriosa. (BARROSO, 2008. p. 16).
Já o risco de efeitos sistêmicos se refere às consequências das decisões judiciais em uma macro visão. Nas palavras do autor:
[...] O risco de efeitos sistêmicos imprevisíveis e indesejados pode recomendar, em certos casos, uma posição de cautela e deferência por parte do Judiciário. O juiz, por vocação e treinamento, normalmente estará preparado para realizar a justiça do caso concreto, a microjustiça19. Ele nem sempre dispõe das informações, do tempo e mesmo do conhecimento para avaliar o impacto de determinadas decisões, proferidas em processos individuais, sobre a realidade de um segmento econômico ou sobre a prestação de um serviço público. Tampouco é passível de responsabilização política por escolhas desastradas. (BARROSO, 2008. p. 16).
A intenção do autor é justamente promover o entendimento que o Judiciário não deve ser resposta para todas as demandas da sociedade. Em muitos assuntos o juízo exige um prévio conhecimento técnico, que por vezes falta aos juristas. É neste sentido que o apontamento do autor torna-se ainda mais relevante. Em casos assim, um juízo deliberado sem o conhecimento necessário pode torna-se mais prejudicial do que antes da ação ter sido ajuizada.
Deste modo, conclui Luís Roberto Barroso (2008), em suma: o Judiciário quase sempre pode, mas nem sempre deve interferir. Ter uma avaliação criteriosa da própria capacidade institucional e optar por não exercer o poder, em auto-limitação (sic)espontânea, antes leva do que diminui.
Considerações finais
O presente trabalho abordou a presença do ativismo judicial no direito brasileiro, bem como suas condutas, característicase também críticas da doutrina sobre o tema.
Apesar de concordar com o posicionamento de Chaves (2012), queo ativismo judicial certamente não pode ser exacerbado devendo ser utilizado com prudência e moderação - e que deve ter lugar tão somente em ultima ratio, como é o caso da situação em tela,deve-selembrar de que existem riscos tão somente por sua existência, como os apontados por Barroso. Contudo, partilhamos da ideia do ativismo judicial no caso concreto do julgamento da ADPF 132 e da ADI 4277 se justifica, entre outras razões, pela inércia do legislativo.E em homenagem pela imensa contribuição de suas obras para a elaboração deste trabalho, e reafirmando a legitimidade do ativismo judicial neste caso, finalizamos aqui citando uma vez mais Luís Roberto Barroso (2008), A conservação e a promoção dos direitos fundamentais, mesmo contra a vontade das maiorias políticas, é uma condição de funcionamento do constitucionalismo democrático. Logo, a intervenção do Judiciário, nesses casos, sanando uma omissão legislativa ou invalidando uma lei inconstitucional, dá-se a favor e não contra a democracia.
REFERÊNCIAS
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