Assédio Sexual em ambiente laboral.

11/08/2022 às 07:42
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Autores:

Gisele Leite Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores POA -RS.

Ramiro Luiz Pereira da Cruz. Advogado, Pós-Graduado em Direito Processual Civil. Articulista de várias revistas e sites jurídicas renomados. Vice-Presidente da Seccional Rio de Janeiro da ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional.

Resumo:

O assédio sexual, inicialmente, foi tratado nos EUA[1] como conduta discriminatória contra a mulher. O assédio sexual no Brasil tem origem fincada no colonialismo, coronelismo, onde as mulheres em situação de escravas eram tratadas como se fossem meros objetos ou mercadorias. A doutrina trata da matéria amiúde, notadamente, quando ocorre em ambiente de trabalho[2] e que viola o direito de intimidade da trabalhadora, bem como a dignidade da pessoa humana e, ainda, as garantias constitucionais asseguradas. A jurisprudência pátria contemporânea, a seu turno, vem condenando os assediadores bem como exigindo-lhes compensação por danos morais produzidos.

Palavras-chave: Assédio sexual. Direito do Trabalho. Constituição Federal do Brasil de 1988. CLT. Dano moral.

Em pleno século XXI, servidoras da CEF (Caixa Econômica Federal) realizaram, em 29.06.2022, na frente da sede da instituição bancária, em Brasília, sendo um ato em protesto contra assédios sexual e moral na instituição bancária.

A manifestação era contra o então Presidente Pedro Guimarães, ora investigado no Ministério Público Federal, depois das denúncias das funcionárias[3]. Mais tarde, Pedro Guimarães pede demissão e, o atual Presidente decidiu nomear Daniella Marques[4] que era auxiliar direta do Ministro Paulo Guedes, para comandar o banco.

Interessante que até de manhã, Guimarães participou de evento corporativo da CEF vedado aos jornalistas, mas não terminou o dia como comandante da instituição bancária.

Infelizmente, trata-se de mais um escândalo no tormentoso governo federal presente, que nos açoda cada dia mais, por suas características e práticas. Não obstante existir o princípio da inocência do réu.

Convém esclarecer que o assédio moral não se confunde com o assédio sexual. Pois, o primeiro visa a eliminação da vítima do mundo do trabalho pelo terror psicológico. Já o segundo é caracterizado pela conduta que objetiva o prazer sexual de várias formas causando constrangimento e afetando a dignidade da vítima no ambiente laboral.

O assédio moral é fator de degradação do ambiente profissional, nem sendo fenômeno recente. Contemporaneamente, o grande estimulador à competitividade e ao individualismo vem enfatizando, progressivamente, essa prática. Sendo maior a preocupação dos legisladores, dos organismos internacionais de direitos humanos, dos profissionais do direito e da saúde, entre outros, exigindo a devida identificação e prevenção, além da repressão. O assédio moral que afeta ambos os sexos, todas as etnias e raças.

Não se trata de problema meramente individual. E, se reproduz no ambiente laboral devida as práticas presentes e enraizadas no contexto social, econômico, organizacional e cultural e, calcadas nas desigualdades sociais.

Atualmente, o assédio moral incide mais sobre o gênero e a raça. Produzindo efeitos nefastos que ultrapassam a esfera individual do trabalhador ou trabalhadora para atingir o ente público, a empresa e até a comunidade.

De acordo com a cartilha da OIT de 2017[5] com orientações sobre o assédio sexual no ambiente de trabalho foi lançada em 21.07.2017 pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT[6]), produzida no formato de perguntas e resposta, trazendo detalhadas informações sobre como identificar e denunciar o assédio sexual no trabalho, além de explicar as responsabilidades e consequências para os (as) trabalhadores(ras). Vide o link: https://mpt.mp.br/pgt/publicacoes/cartilhas/assedio-moral-no-trabalho-perguntas-e-respostas/@@display-file/arquivo_pdf .

Segundo a pesquisa realizada pela médica do trabalho Margarida Barreto, da PUC SP, entre 2001 e 2005, no Brasil, o assédio moral atinge cerca de 36% da população economicamente ativa.

Em países europeus, pesquisas comprovam a prática de assédio moral nas relações de trabalho. Exemplificativamente, o Reino Unido 16,3%, Suécia 10,2%, França 9,9% e Alemanha 7,3%. Fonte: (http://assediomoral.org.br/ ).

O assédio moral manifesta-se de três modos distintos, a saber:

1º. Vertical: relações de trabalho marcadas pela diferença de posição hierárquica. Pode ser descendente (assédio praticado por superior hierárquico) e ascendente (assédio praticado por subordinado);

2º. Horizontal: relações de trabalho sem distinção hierárquica, ou seja, entre colegas de trabalho sem relação de subordinação;

3º. Misto: consiste na cumulação do assédio moral vertical e do horizontal. A pessoa é assediada por superiores hierárquicos e, também por colegas de trabalho com os quais não mantém relação de subordinação.

Importante diferenciar o assédio moral do assédio sexual no ambiente laboral. Afinal, o assédio moral não se confunde com o assédio sexual. O assédio de conotação sexual pode se manifestar como uma espécie agravada do moral, que é mais amplo. Sendo ofensivo, agressivo e dotado de efeitos devastadores.

O assédio sexual caracteriza-se por constranger alguém, mediante palavras, gestos ou atos, com o fim de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o(a) assediador(a)[7] da sua condição de superior hierárquico ou da ascendência inerente ao exercício de cargo, emprego ou função.

Há, portanto, uma finalidade de natureza sexual para os atos de perseguição e importunação. O assédio sexual consuma-se mesmo que ocorra uma única vez e os favores sexuais não sejam entregues pelo(a) assediado(a).

Os Tribunais do Trabalho frequentemente se deparam com diversas ações nas quais os autores alegam ter sofrido algum tipo de perseguição ou humilhação no ambiente de trabalho. Porém, é comum que haja confusão sobre se ter sofrido um dano moral, assédio moral ou assédio sexual.

Quando cogitamos em assédio no local de trabalho, nos referimos à conduta abusiva do empregador ao exercer o seu poder, diretivo ou disciplinar, atentando contra a dignidade ou integridade física ou psíquica de um empregado.

O assédio constitui uma espécie de dano moral que traz algumas características peculiares. O assédio moral é caracterizado por comportamentos abusivos e humilhantes frequentes, expressos por gestos, palavras e atitudes que prejudiquem a integridade física e mental do empregado. Cobrança de metas abusivas por parte de superiores hierárquicos, apelidos e conotações pejorativas são exemplos comuns de assédio moral.

Repise-se que o assédio sexual não se confunde com o assédio moral. No assédio sexual refere-se ao constrangimento que é dirigido exclusivamente à obtenção de vantagem ou favorecimento sexual.

De acordo com o artigo 216 A, caput, do Código Penal, o crime de assédio sexual consiste no fato de o agente constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. A Lei 10.224, de 15 de maio de 2001 foi introduzido o artigo 216-A no Código Penal brasileiro.

Para caracterizar o crime de assédio sexual, o constrangimento pode ser realizado verbalmente, por escrito ou gestos, mesmo que afastado o emprego de violência ou grave ameaça, pois, caso contrário, o delito seria o de estupro (CP, art. 213).

Frise-se que no assédio sexual o constrangimento é dirigido exclusivamente à obtenção de vantagem ou favorecimento sexual.

O assédio sexual pode ser conceituado como toda conduta de natureza sexual não solicitada, que tem efeito desfavorável no ambiente de trabalho ou consequências prejudiciais no plano do emprego para as vítimas. (Maurício Drapeau, Cartilha CNMP).

O assédio sexual pode ocorrer de forma explícita ou insinuada, com contato físico ou verbal, por meio de gestos, imagens enviadas, por meio de e-mails, comentários em redes sociais, vídeos, áudios, entre outros.

Geralmente, é realizado por homens em posição hierárquica superior contra as mulheres, podendo também ocorrer tendo os homens como vítimas, não se limitando às situações hierárquicas, podendo ser entre colegas de mesmo nível.

Para caracterizar o crime de assédio sexual, o constrangimento pode ser realizado verbalmente, por escrito ou gestos, ainda que afastado o emprego de violência ou grave ameaça, pois, caso contrário, o delito seria o de estupro (CP, art. 213).

São peculiares as características do assédio sexual, a saber: superioridade hierárquica do assediador, promessa de tratamento diferenciado no caso de aceitação ou submissão, atitudes concretas de represália em caso de recusa e conotação sexual.

Casos típicos de assédio sexual: Convite para ir a locais sem relação com o trabalho; Comentários ousados sobre beleza e/ou dotes físicos; Toques indesejados (abraços prolongados); Exibição ou envio de fotos pornográficas; Solicitação de caráter sexual; Perguntas embaraçosas sobre a vida pessoal do subordinado; Pedidos para que a trabalhadora se vista de forma provocante ou sensual.

O assédio sexual no ambiente laboral pode ser caracterizado em diferentes tipos e práticas, mas, obviamente, todos possuem a mesma intenção. Existe o assédio sexual por chantagem, praticado por superior hierárquico da vítima, sendo este um chefe, gerente ou supervisor. E, a intenção é a de obter um favor sexual, em substituição do oferecimento de melhores condições de trabalho, tais como promoções e aumento salarial.

Existe, igualmente, o assédio por intimidação que independe da relação hierárquica, entre a vítima e o agressor.

E, sua prática pode se dar entre pessoas em diferentes cargos, seja um colega de trabalho, ou qualquer outo funcionário que se utilize da aproximação para praticar a intimidação física, sexual, ou verbal, desenvolvendo um clima hostil e humilhante no ambiente laboral. E, assim, quase sempre por conta da nocividade, a vítima tende a pedir a própria demissão, ou se afastar, devido aos danos psicológicos ou na saúde.

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Por outro lado, a conduta está descrita no art. 483 da CLT[8] que prevê que algumas maneiras de assédio moral são causas justificantes que autorizam o trabalhador a sair do emprego por meio de rescisão indireta do contrato.

Segundo a jurisprudência nacional sobre o assédio sexual no trabalho, pode haver variantes consequências, desde a rescisão do contrato de trabalho por justa causa, sobre os atos praticados pelo empregado, a rescisão indireta, em casos cometidos pelo empregador. E, ainda, a possibilidade de o assediador ser responsabilizado penalmente.

Por ser crime de ação privada, somente a vítima poderá dar início à ação penal com a ajuda de advogado. O que não exclui a possibilidade de ação trabalhista buscando a indenização por danos extrapatrimoniais, além da aplicação da justa causa ao empregador.

É extremamente relevante se apresentar provas cabais do assédio sofrido pela vítima. E, caso esta não possua, ainda poderá solicitar, na Delegacia de Polícia, a abertura de inquérito policial para posterior investigação do crime.

Importante fator é o fato que a vítima tenha cedido ao assediador pelo temor de perder o emprego, e, isso não descaracteriza o assédio sexual e, persiste sua criminalização.

As consequências do assédio sexual para o agressor podem englobar desde a rescisão do contrato por justa causa, em relação aos atos praticados por esse empregado, e até mesmo a rescisão indireta em casos promovidos pelo próprio empregador. Assim sendo, o assediador poderá ser responsabilizado na esfera penal, dentro dos termos do artigo 216 a do Código Penal.

In litteris:

Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

Parágrafo único. (VETADO) (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

§ 2º A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)

Fora essas penalidades, o agressor ainda terá que arcar com ressarcimento à vítima, por conta dos danos morais causados.

Há a possibilidade de imposição de medidas protetivas que são mecanismos legais que asseguram ao indivíduo, caso este se encontre em situação de risco, a proteção de seus direitos fundamentais. Essas medidas independem de classe social, raça, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, religião e idade.

Em casos de violência contra a mulher, a medida protetiva é garantida pela Lei 11.340, conhecida também como a Lei Maria da Penha, datada de 2006 e, responsável por obrigar o Estado a oferecer proteção para as mulheres vítimas de violência e assédio.

A medida protetiva poderá ser solicitada pela vítima e expedida pela justiça em caráter emergencial. Após ser expedida, o agressor é obrigado a seguir determinadas condutas, como proibição de contato com a vítima e suspensão ou restrição de porte de arma, se for esse o caso.

Dessa maneira, apenas o relato da vítima pode ser utilizado para que a autoridade conceda a medida, sem que seja preciso escutar a parte do agressor. Essas medidas podem ser autorizadas tanto por autoridade judicial, quanto pela policial. Neste caso, é necessário que o município não seja de comarca, tampouco não deve haver delegado presente no local. A autoridade policial deverá notificar o juiz em até 24 (vinte e quatro) horas para manter a decisão, revê-la ou revogá-la.

Também existem duas medidas protetivas de urgência, previstas por lei, a saber: aquela que prevê a obrigatoriedade do agressor a não cometer determinados atos, e aquela direcionada à vítima, com o objetivo de protegê-la.

Destaque-se a jurisprudência a favor da vítima

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSÉDIO SEXUAL. Destaca-se que a prova do assédio sexual se faz, via de regra, por indícios. Na maioria das vezes, somente é possível reconstruir uma situação de assédio sexual mediante a junção de elementos espalhados que sustentam a alegação. Assim, para se considerar suficientemente demonstrada a ocorrência do assédio sexual, os elementos de informação colhidos devem autorizar, por indução, a conclusão sobre a existência, ou não, do ato ilícito. Da análise dos elementos e indícios dos autos, conclui-se que a autora foi vítima de assédio sexual perpetrado por empregado da reclamada, sendo devida a indenização. Inteligência do art. 932, III, do Código Civil. Recurso ordinário da reclamante parcialmente provido. (TRT-4 ROT: 00201439420165040007, Data de Julgamento: 26/11/2020, 8ª Turma)

Entenda: nesse caso, a vítima possuía provas cabais do assédio sexual contra o seu agressor, o que serviu para que a indenização por danos morais fosse autorizada.

A SDI-2 rejeitou recurso em ação rescisória ajuizada pelo professor.

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho confirmou a responsabilidade solidária de um ex-diretor do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (Ceeteps), em São Paulo (SP), pelo pagamento de indenização a uma secretária assediada sexualmente por ele. A decisão foi proferida no julgamento de recurso ordinário na ação rescisória por meio da qual ele pretendia reverter a condenação.

Vejamos, outro caso: Viúva

A vítima do assédio havia sido contratada em 2003 como recepcionista por meio de uma prestadora de serviços e depois exerceu o cargo em comissão de secretária. Conforme a sentença em que a prática havia sido reconhecida, o diretor tentou quatro vezes dispensá-la. Segundo o juízo de primeiro grau, tratava-se de uma jovem que se encontrava sensibilizada em virtude do falecimento trágico e precoce do marido e, se não tivesse ocorrido o assédio, poderia ter continuado a trabalhar na instituição.

Noutra ocasião: As provas nos autos convenceram o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Mauá da veracidade das alegações da vítima, pois testemunhas confirmaram o assédio e o interesse do professor por ela. Uma depoente relatou que ele tinha dito que estava apaixonado e que não sabia mais o que fazer, pois ela não queria saber dele.

Três outras testemunhas confirmaram que o diretor revirava habitualmente o lixo da secretária, controlava seu relacionamento social com os colegas de trabalho e alunos e trancava sua sala para permanecer isolado com ela, impedindo o acesso de terceiros. Os bilhetes enviados a ela estão encartados nos autos, e seu conteúdo, com absoluta certeza, excede a relação profissional entre as partes, ressaltou o juiz.

Ao deferir a indenização, o magistrado condenou o professor e o Ceeteps ao pagamento de R$ 240 mil a título de danos morais. O valor foi reduzido para R$ 100 mil pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-SP).

Há casos de absolvição. Após o trânsito em julgado da condenação, o professor ajuizou ação rescisória. Sustentou que o inquérito policial relativo ao caso havia sido arquivado e que ele fora absolvido nas esferas criminal e administrativa, o que justificaria a desconstituição da decisão. O TRT, no entanto, julgou improcedente o pedido.

Existem exemplos que apontam os riscos da atividade. No recurso ordinário, o ex-diretor argumentou que a lei não prevê a responsabilização do empregado que causar dano a outro empregado, mas apenas a do empregador, que assume os riscos da atividade econômica. Sustentou ser injusta sua condenação solidária ao pagamento de indenização a uma colega de trabalho e reiterou os argumentos do arquivamento do inquérito policial e da absolvição.

Interessante é observar o pronunciamento explícito. O relator do recurso, Ministro Dezena da Silva, explicou que o TRT fundamentou a condenação apenas no artigo 942, parágrafo único, do Código Civil, segundo o qual, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação. Não houve, assim, nenhuma manifestação sob o enfoque da responsabilidade do empregador pelos riscos do empreendimento.

Essa circunstância, segundo o relator, impede o acolhimento da ação rescisória. Ele explicou que, de acordo com a Súmula 298 do TST, é necessário que haja pronunciamento explícito a respeito da matéria sob o enfoque específico da tese debatida na ação.

Por unanimidade, a SDI-2 negou provimento ao recurso ordinário.

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho aumentou de R$ 2.040 para R$ 20 mil o valor da condenação de uma empresa do Rio de Janeiro pelo assédio sexual praticado por um encarregado contra uma empregada durante quase dois anos.

O processo tramita em segredo de justiça, a fim de preservar a dignidade da trabalhadora, mas foi destacado em sessão como alerta para a gravidade do problema do assédio sexual e da função corretiva da Justiça do Trabalho. A mulher, no Século XXI, ainda é tratada como objeto, destacou o relator, Ministro Walmir Oliveira da Costa.

No caso julgado, testemunhas confirmaram o tratamento vexatório, humilhante e obsceno do superior em relação à trabalhadora, inclusive com contato físico. O juízo de primeiro grau fixou a indenização em R$ 20 (vinte) mil, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) reduziu-a para R$ 2.040, equivalente a três salários da ex-empregada, que, no recurso ao TST, alegou que o valor era irrisório, diante da gravidade e das circunstâncias em que ocorreram os fatos.

Ao acolher o recurso, o Ministro Walmir Oliveira da Costa explicou que o TST vem consolidando a orientação de que a revisão do valor da indenização é examinada caso a caso, e somente é possível quando a importância arbitrada for exorbitante ou insignificante.

E, diante das circunstâncias do caso, julgou que o valor arbitrado pelo Regional deveria ser revisto. Em se tratando de questão jurídica que envolve a aferição do grau de violação da intimidade e da privacidade da empregada, em circunstâncias de extrema delicadeza, revela-se prudente homenagear a avaliação realizada no primeiro grau de jurisdição, mais próximo das partes e das peculiaridades fáticas da controvérsia, frisou, propondo o restabelecimento da indenização definida na sentença.

Expondo a gravidade do caso concreto. Em seu voto, o Ministro Walmir Oliveira da Costa observou que o assédio sexual ocorreu durante um ano e nove meses, o que, a seu ver, demonstra inadmissível tolerância da empregadora com o comportamento reiteradamente inadequado de seu preposto. Por isso, chamou atenção ao processo durante a sessão.

Para o Ministro Lelio Bentes, trata-se de uma situação lamentável e vexatória. Não é admissível que, em pleno Século XXI, as pessoas ainda se sintam à vontade para vilipendiar a dignidade de uma mulher trabalhadora. Na sua avaliação, procedimentos como este de desrespeito, de total desconsideração pela mulher acabam nutrindo fenômenos maiores, de proporções preocupantes, como o alto índice de feminicídio e o recrudescimento dos crimes de ódio. Por isso a Justiça do Trabalho é tão importante, destacou. A função corretiva de sua atuação jurisdicional contribui para a evolução do patamar civilizatório.

Outra jurisprudência:

O supermercado Álvaro da Silva Cristina & Filhos Ltda., da cidade gaúcha de Viamão, terá de pagar R$ 10 mil a uma balconista assediada por um dos donos da empresa durante o trabalho. No último exame do caso, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao recurso da empresa, que pretendia ser absolvida da condenação.

A empregada contou que em junho de 2011, quando estava sozinha no interior do estabelecimento, o patrão a teria assediado passando a mão em seus seios e fazendo comentários libidinosos sobre eles. Repreendido, ele teria pedido desculpas. De acordo com o depoimento de outros funcionários, o fato não era novo: em outra ocasião, o patrão teria tentado levantar a blusa de outra funcionária, sob o pretexto de ver uma tatuagem.

Em julho de 2011, a trabalhadora ajuizou ação trabalhista contra a empresa. Sustentando que foi vítima de assédio sexual no ambiente de trabalho, pediu a rescisão indireta do contrato de trabalho, com o pagamento das verbas rescisórias, e indenização por danos morais em 50 (cinquenta) salários-mínimos. O valor da indenização, inicialmente fixado em R$ 20 (vinte) mil pela Vara do Trabalho de Viamão, foi reduzido para R$ 10 (dez) mil pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS).

No recurso para o TST, a Álvaro da Silva Cristina & Filhos Ltda. citou violação dos artigos 818 da CLT e 333, inciso I, do CPC, já que a trabalhadora não teria provado o assédio. A empresa ainda reclamou do valor fixado para a indenização por danos morais, considerado excessivo e além dos limites da razoabilidade.

Para o relator, Ministro Alexandre Agra Belmonte, ficou clara a caracterização, em tese, do tipo previsto no artigo 216-A do Código Penal, que considera crime quem constrange alguém buscando obter vantagem ou favorecimento sexual, aproveitando-se de condição de superior hierárquico.

O relator ainda lembrou que, após o episódio, a balconista foi afastada do trabalho, denunciada na polícia por calúnia e depois dispensada sem justa causa. "O valor fixado pelo TRT, longe de afrontar o princípio da razoabilidade, se coaduna com a aplicação dos artigos 5º, V, da Constituição Federal e 944, parágrafo único, do Código Civil", concluiu.

Prevenir o assédio moral e sexual e garantir relações de trabalho em que predominem a dignidade, o respeito e os direitos do cidadão são algumas das diretrizes de práticas internas da Justiça do Trabalho, previstas na Política Nacional de Responsabilidade Socioambiental da Justiça do Trabalho (Ato Conjunto CSJT.TST.GP 24/2014).

Em termos mais abrangentes, o Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho (Programa Trabalho Seguro) da Justiça do Trabalho, em parceria com diversas instituições públicas e privadas, visa à formulação e à execução de projetos e ações nacionais voltados para a prevenção de acidentes de trabalho e ao fortalecimento da Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho.

No biênio 2018-2019, o tema de trabalho escolhido pelo programa foi Violências no trabalho: enfrentamento e superação. A quinta edição do Seminário Internacional Trabalho Seguro, realizado entre 16 e 18/10/2019, discutiu situações que podem levar ao adoecimento, como assédio moral, sexual e discriminação.

No biênio 2016-2017, o tema Transtornos mentais relacionados ao trabalho abrangeu aspectos como a exposição ao assédio moral e sexual, as jornadas exaustivas, as atividades estressantes, os eventos traumáticos, a discriminação, a perseguição da chefia e as metas abusivas, principais causas do início das patologias psicológicas e psiquiátricas.

O assédio sexual poderá acarretar indenização por danos morais ou extrapatrimoniais na esfera civil, em face da ofensa moral causada à vítima. Eis que a responsabilidade civil não afasta a responsabilidade penal, uma vez que são incidentes em âmbitos autônomos e independentes entre si.

Na responsabilização civil, poderá ocorrer a sanção in natura e pecuniária. Sendo que a primeira consiste em retratação ou desagravo público, o que de certa forma, restaura, ainda que parcialmente, o trauma produzido pelo assediador. A segunda versa em pagamento em dinheiro.

Assim, ao causar o dano à vítima, o agente terá que repará-lo por força do artigo 927 do Código Civil brasileiro e artigo 5º, inciso V da Constituição Federal brasileira vigente.

Indubitavelmente, a dificuldade da vítima em obter provas quanto à prática do assédio, vez que o delito ocorre entre portas fechadas, quando não há terceiros por testemunhas, não se expondo ao público, ocorrendo na clandestinidade, sem a comprovação de olhos e ouvidos atentos. De toda sorte, para o ajuizamento da referida ação, seja na esfera criminal, cível e trabalhista a vítima terá que ter, minimamente, lastro probatório hábil a comprovar o assédio sofrido no ambiente do trabalho.

Deve-se sopesar as provas que estejam ao alcance da vítima, e analisar a ilação entre o ato ilícito pelos antecedentes da vítima e do acusado, bem como prover análise das circunstâncias em que ocorreram os fatos.

É cediço que o ônus probante incumbe a quem alega, por força do artigo 818 da CLT e ainda o artigo 333, I do CPC. Portanto, se não o fizer, acarretará a perda da demanda. É um direito que a parte possui de comprovar o alegado, de caráter impositivo, porém, não é dever sequer obrigação. Trata-se de fato constitutivo de direito.

Salienta acerca do ônus probatório do assédio do sexual, enfatizando que o ônus incumbe à parte que alega, porém a prova pode ser flexível, eis que os atos do assediador ocorrem clandestinamente, longe de testemunhas, sendo difícil a comprovação em juízo.

Por isso, a jurisprudência é pacífica em dispensar a prova robusta. Assim, a palavra da vítima possui especial relevo juntamente com indícios e presunções, não havendo a necessidade de prova direta do ato ilícito para comprovar o assédio.

A vítima poderá ser servidor, funcionário, empregado, estagiário ou terceirizado. E, os danos causados podem evoluir gerando até incapacidade laborativo e mesmo morte, constituindo risco invisível, porém, contundente e real. Todo assédio, seja o sexual ou moral, faz adoecer o ambiente de trabalho, desencadeia o afastamento do trabalhador ou trabalhadora, seja por meio de licenças, pedidos antecipados de aposentadorias, onerando toda a sociedade, que acaba sendo afetada pela prestação de um serviço de má qualidade.

Enfim, para realmente se combater o assédio sexual, não apenas no ambiente laboral, não bastará haver instrumento legislativo avançado que, sem dúvida, pode conferir o cunho punitivo e pedagógico. Será necessário, principalmente, profunda modificação nas relações humanas[9], que priorize a preservação da dignidade humana, a despeito das diferenças de gênero, de patentes, hierarquias, etnias, raças ou estamento social.

Referências

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Sobre a autora
Gisele Leite

Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores POA -RS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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