Ementa: lei Maria da Penha - competência híbrida dos juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher - alteração legislativa nos códigos de processo civil e penal - rito dos juizados repercussão em várias áreas do direito - ações cabíveis - recursos admissíveis das decisões atuação do advogado nos juizados de violência doméstica e familiar
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LEI MARIA DA PENHA (Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006)
- Breve resumo
A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de agosto de 2006. Com 46 artigos distribuídos em sete títulos, ela cria mecanismos para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher em conformidade com a Constituição Federal (art. 226, § 8°) e os tratados internacionais ratificados pelo Estado brasileiro[2].
Tratando-se de uma legislação especial para o enfrentamento contra a violência de gênero contra as mulheres, a previsão da competência cível e criminal não deve ser compreendida apenas como aspecto da organização e/ou administração da justiça, mas é condição relacionada com a qualidade da resposta judicial e as garantias de acesso à justiça para as mulheres.
Segundo a Recomendação Geral n. 33 do Comitê CEDAW (CEDAW- Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher da Assembléia Geral das Nações), todas as referências a mulheres devem ser entendidas como incluindo mulheres e meninas, a menos que especificamente indicado de outro modo. A Recomendação Geral n. 35 do Comitê CEDAW também estipula, no seu parágrafo 14, que toda referência às mulheres em seu texto incluem as meninas, já que a violência de gênero afeta as mulheres ao longo de seu ciclo de vida.
Essa inovadora forma de elaborar uma legislação rompeu com a forma como se elaboram, em geral, as legislações (parlamento) ou seja, uma ruptura tanto no que se refere à origem quanto ao conteúdo, pois inovou ao trazer a perspectiva da complexidade, intersetorialidade, multidisciplinaridade e integralidade, presente nos estudos e pesquisas do campo (CAMPOS, 2017)[3].
Acontece que, na prática, observa-se que muitos magistrados negam a competência cível do juizado e, consequentemente, forçam as mulheres a se submeter à processos simultâneos no Juizado de Violência Doméstica e nas Varas de Família. Na intenção de evidenciar ainda mais essa competência cível, foi promulgada a lei 13.984/19 que altera o art. 14 da LMP.
- DA COMPETÊNCIA HÍBRIDA DOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
A lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 7 de agosto de 2006) não é uma lei penal, pois não cria tipos penais; não é uma lei de Processo Civil ou de Processo Penal, embora traga importantes normas processuais e de cunho cautelar civil e penal[4]. Da mesma maneira, a Lei Maria da Penha não é normatização de Direito Civil, mesmo que muitas providências tenham relação direta com o Direito das Famílias[5]. Entretanto, não se pode negar que se trata de uma lei predominantemente penal[6], aplicando um sistema legal múltiplo e próprio de proteção à mulher em razão da agressão de gênero, com inúmeros dispositivos que tratam de políticas públicas, com regras de cunho processual civil, processual penal, trabalhista e administrativo. Há quem diga tratar-se de um microssistema[7], mas é lei especial[8] que consagra norma constitucional art. 226, § 8º, CF7 e são suas disposições processuais e de organização judiciária que, no plano da competência, têm originado debates na doutrina e jurisprudência.
O que é a competência híbrida dos juizados da violência doméstica?[9] É quando uma lei pode atuar tanto na esfera cível como criminal. No caso da Lei Maria da Penha, é a capacidade de agir com direito penal e também com direito de família, ou seja, a possibilidade da mulher ter não somente a Medida Protetiva de Urgência, mas na vara ou juizado especializado de violência doméstica e familiar ter o divórcio, alimentos, regularização de guarda e visitas, entre outros temas relativos ao Direito de Família, conforme segue abaixo o artigo 14 da Lei 11340/2006:
Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Parágrafo único. Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária.
Art. 14-A. A ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. (Incluído pela Lei nº 13.894, de 2019)
§ 1º Exclui-se da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a pretensão relacionada à partilha de bens. (Incluído pela Lei nº 13.894, de 2019)
§ 2º Iniciada a situação de violência doméstica e familiar após o ajuizamento da ação de divórcio ou de dissolução de união estável, a ação terá preferência no juízo onde estiver. (Incluído pela Lei nº 13.894, de 2019).
O artigo 33, por sua vez, introduz como disposição transitória, que:
enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar.
A tentativa da legislação, é de que a mulher possa, em um só processo, resolver todos os problemas jurídicos que necessitem resolução para com o seu agressor.
- ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS
A Lei Maria da Penha alterou o Código Penal, o Código Civil, a CLT, as disposições de direito administrativo, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e de Seguridade social, para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência deferidas em favor da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes.
3.1. Lei 13.894 de 29 de outubro de 2019 Atribuição de competência dada pelo artigo 14-A caput: decretação de divórcio e de dissolução de união estável
A alteração feita pela Lei 13.894 de 29 de outubro de 2019, autoriza o ajuizamento de pedidos de decretação de divórcio e de dissolução de união estável nos Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Veja-se:
Art. 14-A. A ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. (Incluído pela Lei nº 13.894, de 2019)
Destarte, estas unidades judiciais, de elevada demanda de requerimentos cautelares de medidas protetivas de urgência e de número expressivo de feitos de natureza criminal, passaram a cumular mais uma competência jurisdicional. A alteração legislativa tem finalidade precípua de impor celeridade ao conhecimento e provimento jurisdicional tendente a estabelecer o fim do vínculo jurídico e do relacionamento permeado por comportamentos abusivos. Assim sendo, possibilita à mulher, vítima de violência doméstica praticada por marido/esposa ou companheiro(a), acesso rápido ao estado-juiz para findar a sociedade conjugal, em ambiente acolhedor, capacitado em compreender as peculiaridades de sua situação familiar. Por esse olhar, a alteração normativa merece ser compreendida, interpretada e aplicada conforme a inteligência da Lei Maria da Penha, das Convenções Internacionais de proteção aos direitos humanos das mulheres e da Constituição da República[10].
3.2. Alterado o Código de Processo Civil, em três pontos - Inserção do artigo 14-A, 2º.
A Lei 13.894 de 29 de outubro de 2019, assim determina em relação à competência territorial:
Art. 14-A. A ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
1º Exclui-se da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a pretensão relacionada à partilha de bens.
2º Iniciada a situação de violência doméstica e familiar após o ajuizamento da ação de divórcio ou de dissolução de união estável, a ação terá preferência no juízo onde estiver.
Destarte, foi alterado o diploma processual geral, em três pontos.
3.2.1. O primeiro diz respeito à competência territorial para as ações objeto da lei (divórcio, separação judicial, anulação de casamento e extinção de união estável). Surge uma quarta alínea no primeiro inciso no artigo 53, prevendo a competência do foro do domicílio da vítima de violência doméstica e familiar.
CPC. Art. 53. É competente o foro:
I - para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável:
a) de domicílio do guardião de filho incapaz;
b) do último domicílio do casal, caso não haja filho incapaz;
c) de domicílio do réu, se nenhuma das partes residir no antigo domicílio do casal;
d) de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha).
3.2.2. O segundo, criou a hipótese de atuação compulsória do Ministério Público, nas ações de família.
CPC- Art. 698. Nas ações de família, o Ministério Público somente intervirá quando houver interesse de incapaz e deverá ser ouvido previamente à homologação de acordo.
Parágrafo único. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas ações de família em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha).
Na redação originária, o parquet apenas interviria quando existisse interesse de incapaz, algo acidental nas ações de divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, mas frequente nas demandas de guarda, visitação, filiação e alimentos rol legalmente estatuído de ações de família. Doravante, o Ministério Público se fará presente como fiscal, quando a vítima de violência doméstica for parte processual.
3.2.3. O terceiro ponto, modifica o Código Fux, passando a prever prioridade na tramitação de processos em que for parte vítima de violência doméstica e familiar.
CPC Art. 1.048. Terão prioridade de tramitação, em qualquer juízo ou tribunal, os procedimentos judiciais:
III - em que figure como parte a vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha).
3.3. Alterações do Código de processo Penal
3.3.1. Lei nº 13.827, de 2019 e Lei nº 13.827, de 2019 - As leis permitem que delegados e policiais decidam, em caráter emergencial, sobre medidas protetivas para atender mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Assim determina a o artigo 12-A da LMP:
Art. 12-C. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física ou psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida: (Redação dada pela Lei nº 14.188, de 2021)
I - pela autoridade judicial; (Incluído pela Lei nº 13.827, de 2019)
II - pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou (Incluído pela Lei nº 13.827, de 2019)
III - pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia. (Incluído pela Lei nº 13.827, de 2019).
3.3.3. Lei nº 14.132/21 - inseriu no Código Penal o art. 147-A, denominado crime de perseguição. Sua finalidade é a tutela da liberdade individual, abalada por condutas que constrangem alguém a ponto de invadir severamente sua privacidade e de impedir sua livre determinação e o exercício de liberdades básicas.
Sabendo que há prevalência do stalking em vítimas do sexo feminino, importante usar como vetor interpretativo a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará):
Artigo 7. Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a empenhar-se em: (...)
d) adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha de perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que danifique ou ponha em perigo sua vida ou integridade ou danifique sua propriedade;
3.3.4. Lei nº 14.149/21, que institui o Formulário Nacional de Avaliação de Risco, com o intuito de prevenir feminicídios.
Art. 38-A. O juiz competente providenciará o registro da medida protetiva de urgência. (Incluído pela Lei nº 13.827, de 2019)
Parágrafo único. As medidas protetivas de urgência serão registradas em banco de dados mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça, garantido o acesso do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos órgãos de segurança pública e de assistência social, com vistas à fiscalização e à efetividade das medidas protetivas. (Incluído pela Lei nº 13.827, de 2019)
3.3.5. Altera o Código de Processo Penal para possibilitar ao juiz a decretação da prisão preventiva quando houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher.
3.4. Alteração na lei de execuções penais para permitir ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.
3.5. A Lei n° 14.164/21 altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para incluir a prevenção da violência contra a mulher como tema transversal nos currículos da educação básica.
Art. 8º A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes:
...
VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia;
IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à equidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.
3.6. Alterou o Regime Jurídico único dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, para a remoção e transferência para outro local de trabalho, seja em outra região, Município ou Estado, da servidora pública vítima de violência doméstica. Veja-se:
Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.
...
§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:
I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta.
3.7.Altera disposição da CLT- CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO.
A medida de afastamento do local de trabalho, prevista no art. 9º, § 2º, da Lei é de competência do Juiz da Vara de Violência Doméstica, sendo caso de interrupção do contrato de trabalho, devendo a empresa arcar com os 15 primeiros dias e o INSS com o restante.
A formalização do pedido de manutenção do vínculo trabalhista tanto poderá ser requerida na fase investigatória policial, mediante o expediente apartado dirigido ao Juiz, com o pedido da ofendida para sua concessão, ou mesmo após o oferecimento da denúncia, através de pedido verbal da ofendida que será tomado a termo, ou através de requerimento do Ministério Público ou da Defensoria Pública (arts. 12, Parágrafo 1o, Inciso III, 19, caput e 28 da Lei 11.340/2006).
Dispõe o Art. 9o, Parágrafo 2o, Inciso II, desse Estatuto Protetivo da Mulher o seguinte:
Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.
...
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.
3.8. Alteração da Lei de Seguridade Social
3.8.1. Auxilio-reclusão - Acaso condenado o acusado pela prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, com trânsito em julgado, uma vez lançado ao cárcere, imediatamente o mesmo fará jus ao gozo do Auxílio-Reclusão, que será devido aos seus dependentes, ex vi do Art. 80 da Lei 8.213/91. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário.
Acrescenta os §§4º e 5º ao art. 9º da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, para dispor sobre a responsabilidade do agressor em ressarcir os custos relacionados aos serviços de saúde prestados pelo Sistema Único de Saúde - SUS e aos dispositivos de segurança em caso de pânico, utilizados pelas vítimas de violência doméstica e familiar.
3.8.2. Ressarcimento ao SUS- Os juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher, tem competência para o envio de diversos ofícios à Autarquia Previdenciária para consecução da prestação à mulher violentada, ameaçada em sua integridade física e psicológica.
Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.
§ 4º Aquele que, por ação ou omissão, causar lesão, violência física, sexual ou psicológica e dano moral ou patrimonial a mulher fica obrigado a ressarcir todos os danos causados, inclusive ressarcir ao Sistema Único de Saúde (SUS), de acordo com a tabela SUS, os custos relativos aos serviços de saúde prestados para o total tratamento das vítimas em situação de violência doméstica e familiar, recolhidos os recursos assim arrecadados ao Fundo de Saúde do ente federado responsável pelas unidades de saúde que prestarem os serviços. (Vide Lei nº 13.871, de 2019) (Vigência)
§ 5º Os dispositivos de segurança destinados ao uso em caso de perigo iminente e disponibilizados para o monitoramento das vítimas de violência doméstica ou familiar amparadas por medidas protetivas terão seus custos ressarcidos pelo agressor. (Vide Lei nº 13.871, de 2019) (Vigência)
- DO RITO DOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
Embora tenham recebido a nomenclatura de juizados, o rito previsto na Lei Maria da Penha para os feitos em trâmite nos juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher não se confunde com o procedimento previsto na Lei Nº 9.099/1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, porque a violência doméstica praticada contra a mulher deixa de ser considerada como de menor potencial ofensivo.
O artigo 41, da Lei nº 11.340/2006, que afasta a incidência da Lei nº 9.099/95 aos delitos perpetrados com violência doméstica e familiar contra a mulher:
Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.
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AÇÕES CABÍVEIS NOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER
- Ações de natureza cível
- Ação de alimentos
- Ação de separação judicial
- Ação de divórcio
- Ação de anulação de casamento
- Ação de dissolução de união estável.
- Investigação de paternidade;
- Pedidos de regulamentação de visitas;
- Reconhecimento de paternidade.
- Quaisquer outras ações em que for parte vítima de violência doméstica e familiar.
- Ações no âmbito das relações de trabalho
- Manutenção do vínculo trabalhista, por até seis meses.
- Ações de repercussão no direito administrativo
- Pedido de remoção para servidora nos casos de violência.
- Ações que podem ser manejadas na esfera criminal
- Habeas- corpus
- Incidente de insanidade mental;
- Pedidos de liberdade;
- Quaisquer outras ações em que for parte vítima de violência doméstica e familiar.
- Ações com efeitos na seguridade social.
- Requerimento do auxílio-reclusão nos juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher.
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MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
- As medidas protetivas de urgência são de caráter cível e penal sem distinção.
O ofensor que desrespeita medida a ele imposta, comete o crime tipificado no artigo 24-A da Lei Maria da Penha e está sujeito a pena de 3 meses a 2 anos de detenção.
As medidas protetivas de urgência estão previstas nos artigos 22 a 24 da Lei Maria da Penha. Assim, conforme o art. 22 da Lei Maria da Penha, o juiz ou juíza poderá determinar:
- A proibição ou restrição do uso de arma por parte do agressor.
- O afastamento do agressor da casa.
- A proibição do agressor de se aproximar da mulher agredida.
- A restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores.
- A obrigatoriedade da prestação de alimentos provisórios.
- A restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor.
- A proibição de venda ou aluguel de imóvel da família sem autorização judicial.
- O depósito de valores correspondentes aos danos causados pelo agressor etc.
- DOS RECURSOS ADMISSÍVEIS DAS DECISÕES DOS JUÍZADOS DE COMPETÊNCIA HÍBRIDA DE VIOLÊNCIA DOMÊSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
O cabimento do recurso contra as decisões que versam sobre as medidas protetivas de urgência está intrinsecamente ligado à esfera de aproximação penal ou civil das próprias medidas.
É necessário frisar, contudo, que, a despeito da falta de previsão legal acerca do recurso cabível, o que certamente tem causado enorme dificuldade para as partes, bem como à míngua de deliberação do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, divergem as cortes acerca do recurso cabível e da turma competente para apreciá-lo[11].
Por tal razão, entende-se como extremamente salutar a aplicação do princípio da fungibilidade dos recursos em face das controvérsias pertinentes ao tema.
Aplicação do procedimento recursal do Código de processo Civil
Conforme elenca o CPC são cabíveis os seguintes Recursos:
- Apelação;
- agravo de instrumento;
- agravo interno;
- embargos de declaração;
- recurso ordinário;
- recurso especial;
- recurso extraordinário;
- agravo em recurso especial ou extraordinário;
- embargos de divergência. (art. 994 do CPC).
- Aplicabilidade do procedimento recursal do Código de Processo penal
Todos os recursos previstos no direito processual penal brasileiro tais como:
- Recurso em sentido estrito;
- Apelação;
- Embargos de declaração;
- Carta testemunhável;
- Agravos;
- Embargos infringentes;
- Protesto por novo júri;
- Correição parcial;
- Recurso ordinário-constitucional;
- Recurso extraordinário;
- Recurso especial.
- Recursos Trabalhistas
A omissão do legislador deu brecha a várias interpretações, uma vez que parte da doutrina entende ser atribuição dos Juizados Especializados em Violência Doméstica e Familiar e, até que estes sejam instalados, a atuação caberá à Justiça Comum. Por outro lado, outros discordam, acreditando tratar-se de competência da Justiça do Trabalho, já que a situação envolve relação trabalhista[12].
O art. 14 da Lei n. 11.340/2006 alude que poderão ser criados Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, atribuindo-lhes competência cível e criminal para julgamento e execução das causas decorrentes de agressões e maus tratos contra a mulher no seu ambiente doméstico e familiar. No entanto, o art. 33 da mesma lei dispõe que enquanto não forem estruturados tais juizados, caberá à vara criminal conhecer e julgar causas dessa natureza.
Alguns doutrinadores consideram que o legislador pecou ao remeter à justiça comum a concessão da medida protetiva laboral assegurada no art. 9, § 2º, II, da Lei Maria da Penha, pois entendem que isso contraria os sistemas de distribuição de competência, adotados pelo ordenamento jurídico brasileiro. Ainda, por tratar-se de uma relação trabalhista, a qual exige a comprovação do vínculo empregatício através da justiça do trabalho, parte da doutrina entende que são absolutamente incompetentes as varas dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
Conforme o artigo 893 da CLT, das decisões proferidas pelos órgãos da Justiça do Trabalho são admissíveis os seguintes recursos;
- recurso ordinário,
- embargo de declaração,
- recurso de revista,
- agravo de instrumento,
- agravo de petição,
- embargos ao TST,
- agravo regimental,
- recurso adesivo e
- recurso extraordinário.
- AS MEDIDAS DE PROTEÇÃO À MULHER NOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
A Lei prevê medidas de proteção à mulher e em repressão ao agressor, conforme:
- probabilidade de assegurar à vítima servidora pública acesso prioritário à remoção nos casos de violência sofrida no local de trabalho,
Possibilidade da prisão em flagrante do agressor com decretação de Prisão Preventiva (art. 20 LMP);
- Impossibilidade de aplicação de Penas alternativas e benefícios da Lei nº 9.099 de 1995 (artigo 41);
- Possibilidade a aplicação das Medidas Protetivas de Urgência previstas no artigo 22 da Lei nº 11.340 de 2006;
- Impossibilidade, haja vista apresentar ausência de idoneidade moral, de inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) havendo críticas atinentes à sua constitucionalidade.
Nesse diapasão, a Lei Maria da Penha somente veda a possibilidade de aplicar penas alternativas e benefícios atinentes à Lei nº 9.099 de 1995. Não menciona a impossibilidade de estabelecimento de liberdade provisória, com ou sem imposição de medidas cautelares, nos termos do artigo 319 do Código de Processo Penal.
- AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
As Medidas Protetivas de Urgência poderão ser concedidas pelo juiz, desde que requeridas:
a) pelo Ministério Público;
b) pela ofendida (vítima).
As medidas protetivas não são acessórias de um processo principal, e nem a ele se vinculam, razão pela qual podemos classificar as medidas protetivas de urgência em medidas cautelares inominadas, uma vez que resguardam direitos fundamentais à mulher, à criança e ao adolescente no âmbito das relações familiares e funcionais. Destaque-se que as Medidas Protetivas de Urgência poderão ser aplicadas cumulativamente.[13] E, em caso de necessidade, poderão ser substituídas a qualquer tempo.
Embora as medidas protetivas não sejam acessórias ou instrumentos para assegurar um processo principal, analisando o rol contido da Lei Maria da Penha, é de se perceber uma aproximação de determinadas medidas com a esfera criminal, enquanto de outras com a seara civil. Note-se:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
O descumprimento de Medida Protetiva de Urgência passa a ser uma conduta típica do ordenamento jurídico criminal brasileiro. O agressor que, após ter medida protetiva determinada pelo juiz, e insiste na conduta de descumprir essa Medida Protetiva, estará praticando a conduta criminosa prevista no artigo 24-A da Lei nº 11.340 de 2006, in verbis:
Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei:
Pena detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. § 1º A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas.
§ 2º Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança. § 3º O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis.
- DO (NÃO) CABIMENTO DE FIANÇA PELA AUTORIDADE POLICIAL
É um tema ainda enfrentado com divergências e críticas doutrinárias e jurisprudenciais, pois a Lei nº 12.403 de 2011 criou várias medidas cautelares para coibir a utilização do instituto da prisão preventiva de forma desregrada.
Dentre tais medidas, alterou o artigo 322 do Código de Processo Penal para estabelecer a possibilidade de concessão de fiança pela autoridade policial, estipulando um critério quantitativo de pena.
Consoante previsto no artigo em comento, cabe a autoridade policial conceder fiança nos casos em que a pena máxima do delito cometido não ultrapasse 04 (quatro) anos. Ainda acrescentando que, nos demais casos, a fiança pode ser requerida ao juiz (que deverá decidir em prazo não superior a 48 horas).
Nesse contexto, ainda sobre os demais casos, destaque-se que o delito cometido deverá estar em conformidade com as vedações expressas previstas nos artigos 323 e 324 do Código de Processo Penal.
- DOS BENEFÍCIOS (IN) APLICÁVEL AO AGRESSOR
Ainda nesse ínterim, cumpre salientar que, consoante dispõe a Súmula nº 536 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os institutos da suspensão condicional do processo Sursis Processual e a transação penal são inaplicáveis nas hipóteses de delitos que envolvam violência doméstica e familiar contra a mulher. O artigo 41 da Lei nº 11.340 de 2006 ainda reforça esse entendimento ao afirmar que não cabe a aplicação dos benefícios da Lei dos Juizados Especiais Criminais previstos da Lei nº 9.099 de 1995.
Logo, em benefício do agressor, também caberá a aplicação do instituto da suspensão condicional da pena.
Outrossim, cabe trazer à baila o entendimento firmado na Súmula nº 589 do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas.
E para a configuração da relação doméstica, consoante entendimento estabilizado da melhor doutrina e jurisprudência pátria, não há a necessidade coabitação entre autor e vítima, consigna a Súmula nº 600 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
DETALHES IMPORTANTES: A Lei Maria da Penha está consolidada nos dias atuais como a lei de maior eficácia em nosso país que e garante a defesa dos direitos da mulher, como a preservação de sua integridade física, moral, sexual, psicológica, e a igualdade de gênero.
- A mulher não pode entregar a intimação ao/a autor/a de violência doméstica, quem deve fazer isso é o Oficial de Justiça.
- A Lei Maria da Penha proíbe as penas somente pecuniárias (penas de cunho financeiro, como pagamento de multas e cestas básicas).
- A violência contra a mulher independe de sua orientação sexual.
- A mulher deve avisar se o/a autor/a de violência doméstica descumprir as medidas protetivas, pois constitui crime e enseja prisão.
- A Lei Maria da Penha contempla as violências contra as mulheres, que acontecem no convívio doméstico, no âmbito familiar ou em relações íntimas de afeto. Portanto, a Lei Maria da Penha se aplica: aos maridos, namorados, companheiros, que morem ou não na mesma casa que a mulher; aos ex que agridem, ameaçam ou perseguem a mulher; a outros membros da família, como por exemplo, mãe, filho/a, neto/a, cunhado/a, desde que a vítima seja mulher.
- Quando a violência doméstica ocorre entre pessoas que moram juntas ou frequentam a casa, mesmo sem ser parentes. Exemplo: patrão/oa da empregada doméstica.
Com a edição de uma lei de tamanha magnitude, o Estado cumpriu com um de seus objetivos, que é o de garantir que todos vivam de forma livre, digna e igualitária, sem sobreposição de um gênero em relação a outro.
Nas belas e singelas palavras de Simone de Beauvoir: Que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância, já que viver é ser livre. (filósofa e escritora francesa -1908-1986)