Difícil para o consumidor

25/08/2022 às 17:50

Resumo:


  • A Lei n. 14.181/2021 introduziu a figura do superendividado no Código de Defesa do Consumidor, permitindo a renegociação de dívidas para consumidores de boa-fé.

  • O Decreto n. 11.150/2022 estabeleceu o mínimo existencial em R$ 303,00 para acordos de superendividados, gerando críticas por violar o princípio da dignidade da pessoa humana.

  • A dificuldade de renegociar dívidas e garantir direitos sociais básicos, como previsto na Constituição Federal, torna o tratamento do superendividamento um desafio para muitos consumidores.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O presente artigo trata sobre o mínimo existencial na situação de superendividamento no Código de Defesa do Consumidor.

O direito do consumidor passou por grandes alterações recentemente com a Lei n. 14.181/2021 que alterou o Código de Defesa do Consumidor, que trouxe a figura do superendividado, garantindo uma forma de recolocação do consumidor no mercado de consumo, com a possibilidade de uma renegociação de suas dívidas.

Antes de entrar no mérito do texto, importante definir quem estará em situação de superendividamento de acordo com o Código de Defesa do Consumidor em seu art. 54-A, § 1°:

Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.[1] (grifo nosso).

A Lei 14.181/2021 foi criada para estabelecer formas diferenciadas de pagamento do débito do consumidor de boa-fé que possui um passivo acima do seu ativo e que não consegue sair da chamada bola de neve das dívidas, em especial nos casos mais comuns que envolve cartão de crédito e cheque especial os maiores vilões dos brasileiros.

O tratamento do superendividado foi uma válvula de escape para aquele consumidor que quer solucionar a sua vida financeira e se reestruturar para voltar a ter o crédito na praça. Sabe-se que muitas dessas situações, são causadas por fatores que fogem da normalidade, principalmente no período pós-pandemia do Covid-19 em que houve um elevado número de demissões, divórcios e falecimentos.

São situações, em muitos casos, geradoras de altos gastos e cortes de receitas que pega o consumidor de surpresa e em muitos casos despreparado e desorganizado financeiramente.

Parecia que a legislação caminhava para uma solução legal, mas essa solução foi alterada recentemente, dificultando a vida do consumidor que no dia 26/07/2022, sofreu um duro golpe, com a publicação do Decreto n. 11.150/2022 que determinou o mínimo existencial para fins de acordos/conciliações dos superendividados.

O Decreto n. 11.150/2022 no seu art. 3 ° assim dispõe:

No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto.[2] (grifo nosso).

Ficou determinado de acordo com o Decreto n. 11.150/2022 que será considerado mínimo existencial o valor de R$ 303,00 (trezentos e três reais). Uma total violação do que é a visão de mínimo existencial, que deveria se pautado no princípio da dignidade da pessoa humana previsto no art. 1°, Inciso III da Constituição Federal de 1988.[3]

Como será possível renegociar as dívidas e garantir o que prevê o art. 6° da Constituição Federal? Veja-se:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.[4] (grifo nosso).

Que de acordo com a moderna doutrina é o considerado o mínimo para uma vida digna, sendo garantias vitais para o ser humano.

Difícil para o consumidor, o que parecia ser a solução para o restabelecimento de seu crédito, respirar, diminuir os problemas de saúde que o superendividamento gera na vida do consumidor, virou algo quase impossível de ser sustentado para um consumidor que recebe salário mínimo e que busca renegociar suas dívidas e garantir o sustento de sua família.

É preciso lutar para que esse valor seja alterado, e que a sua aplicação seja revista com base no que realmente é o mínimo existencial para o cidadão brasileiro. Somente assim, será possível que o tratamento do superendividamento não fique apenas no papel, mas passe a ser um direito que garanta uma forma de restruturação das famílias e do cidadão de boa-fé que por fatores inesperados encontra-se hoje superendividado e que sonha com a sua reinserção no mercado de consumo, mas sem tirar o sustento de sua família.


Referências:

[1] BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm >. Acesso em: 20 ago. 2022.

[2] BRASIL. Decreto nº 11.150, de 26 de julho de 2022. Dispõe sobre a preservação e o não comprometimento do mínimo existencial para fins de prevenção, tratamento e conciliação de situações de superendividamento em dívidas de consumo, nos termos do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: < 2022/2022/decreto/D11150.htm#:~:text=DECRETO%20N%C2%BA%2011.150%2C%20DE%2026%20DE%20JULHO%20DE%202022&text=Regulamenta%20a%20preserva%C3%A7%C3%A3o%20e%20o,C%C3%B3digo%20de%20Defesa%20do%20Consumidor. >. Acesso em: 20 ago. 2022.

[3] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

[4]  BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 20 ago. 2022.

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Sobre o autor
Allan César de Arruda

Mestre em direito pela UNIMAR - Universidade de Marília (SP) em Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social (2017). Especialista em Direito Previdenciário pela Faculdade Professor Damásio de Jesus (2014). Possui graduação em Direito pela Universidade Norte do Paraná (2012). Professor pela Universidade Pitágoras UNOPAR de Bandeirantes/PR. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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