Criança menor de doze anos comete crime?
O ECA silencia sobre o ato infracional cometido por criança menor de 12 anos, dizendo que deve o responsável responder por ela. Mas uma criança de 11 anos e 11 meses não teria o mesmo discernimento que que uma criança de 12 anos para sofrer as medidas sócio-educativas?
Rio, 12/09/02
Prezada Walkiria,
Incialmente gostaria de dizer que coloco-me a disposição através do meu e-mail para trocarmos idéias mais detalhadas sobre a questão proposta. Rapidamente respondo sua indagação da seguinte forma: "O ECA prevê no art. 105 a prática de ato infracional por criança, sendo que as medidas serão protetivas (art. 101) inclusive com a possibilidade de aplicação de medidas aos pais ou responsáveis (art. 129), e que o órgão competente para aplicar as medidas é o Conselho Tutelar (art. 136) e que na hipótese de não existir um na Comarca a competência será do juiz da infância. Não se trata de uma questão de discernimento (todos tem discernimento em proporções diferenciadas, com exceção do débil mental)o critério utilizado pelo legislador é o "biológico", inclusive por uma questão de política criminal. Se quiser entre em contato que terei o maior prazer em te enviar alguns textos a respeito.
Um abraço,
Pedro
Inicialmente, vale salientar que, nem criança e nem adolescente cometem crimes. Praticam atos infracionais quando entram em conflito com a lei.
Seja criança ou seja adolescente, se praticou um ato que é considerado infracional, porquanto equiparado a um tipo penal, está em conflito com a lei e sujeito as medidas previstas no ECA. O que a idade diferencia é a medida a ser aplicada. Afinal para uma criança, antes de se fala em medida sócio-educativa, é preciso falar em medida de proteção, pois se como criança ela já está praticando este ato, é porque está absolutamente perdida no mundo e necessitando de um apoio afetivo e depois uma discussão sobre sua educação e valores.
Por primeiro que o legislador não contempla o cometimento de crimes por menores de 18 anos, sào inimputáveis, mas sim atos infracionais (art. 102 e 103, do ECA). Ocorre que houve um tratamento distinto (criança 0 a 12 incompletos) e adolescentes (12 anos completos até 18 anos) e excepcionalmente aos 21 anos) que atualmente em razão da redução da capacidade civil (18 anos no novo Código Civil) a excepcionalidade do ECA não se aplicará. Doutra banda, não há que se falar em capacidade de discernimento (compreensão e autodeterminação) conforme se faz no Código Penal, porque tanto criança e adolescente são pessoas em situação de peculiar desenvolvimento. Assim, a criança pode praticar ato infracional, cujas medidas são as do artigo 101 do ECA, enquanto que os adolescentes aplicável as medidas previstas nos artigos 112, é o que se extrai do art. 105. Aqui não é o discernimento mais a proteção integral que se aplica por força do risco social dada a conduta (art. 98, III, do ECA). Dúvidas ao dispor. Denis.
Infelizmente vivemos em um país com gravíssimos problemas sociais; o grupo vulnerável que mais padece é o das crianças e adolescentes. Todavia, há uma contribuição imensa para a perenização destes problemas, mormente no que concerne ao narcotráfico, onde aquelas são recrutadas diariamente nos "morros". O ECA foi criado para uma realidade social divergente da nossa; Dizer que HOJE uma criança com 11 anos não sabe distinguir (principalmente nas grandes cidades) entre o que é socialmente correto conforme os padrões legais e o que é moralmente errado, é um paradoxo. O fluxo de informações é tão vasto e circula em tão elevada velocidade, ainda que muitas não tenham acesso direto a tais informações, que pais tornam-se peças de museu em comparação ao gabarito de tal juventude. Há grandes lacunas na CONSTITUIÇÃO FEDERAL, as leis são arcaicas, incluindo o ECA. Para o legislador o critério para analisar a capacidade de entendimento da criança/adolescente é o fator "BIOLÓGICO", falha grave. Por que não o fator BIO-PSICOLÓGICO? eles cometem sim, CRIMES, porém é travestido com o nome de ATO INFRACIONAL, não recebendo uma devida punição, perenizando a CRIMINALIDADE, formando verdadeiros MARGINAIS LATENTES. Esta é a realidade brasileira.