Entre a morte lenta, sofrida, dolorosa e a possibilidade de pronta extinção do sofrimento, na certeza do fatal resultado próximo, qual é a melhor solução? A pergunta tem figurado com constância no noticiário. Foi dramatizada, dias atrás, pelo falecimento do rei Hussein, da Jordânia, precedida de longo sofrimento. Milhões de pessoas passam pela mesma dor, minuto após minuto, mas a agonia do monarca hachemiata deu destaque ao tema.
A resposta da pergunta inicial encara a vida como fato do indivíduo e da sociedade. Compreende valores éticos e religiosos, além dos valores jurídicos de sua inviolabilidade, que, aqui, nos interessam mais diretamente. Envolve, ainda, valores éticos do médico (a persistência da vida a todo custo) e eventualmente antiéticos, dos interesses econômicos decorrentes (quanto mais dure o paciente, mais ganharão os encarregados de o tratar, pessoas ou instituições).
No plano do duro direito, a inviolabilidade da vida prepondera, muito embora esquecida quando se trata (sempre em termos da lei) da aplicação da pena de morte aos condenados, nos países que a admitem.
No Brasil há, além do direito à vida, o direito geral à saúde, com tratamentos e remédios apropriados, como obrigação do Estado para todos os desprovidos de recurso e como direito pessoal dos que disponham de meios, na inter-relação entre a vida dos pacientes e os encarregados de preservá-la.
A alternativa, posta no primeiro parágrafo desta coluna, situa o problema entre a distanasia e eutanasia. Manter a vida é assegurar o funcionamento do cérebro e do coração, enquanto reste um sopro de sobrevivência possível. Mas vida é a manutenção dela com alguma dignidade. O que dizer da sobrevivência vegetativa, sem sentir, ver, ouvir coisa alguma?
Na avaliação individual, sentimental ou religiosa de quem acompanhe o doente, há a angustia do procedimento a adotar, especialmente quando atingido por doença incurável ou vitimado por grave acidente. Dominam nessa hipótese as condições do atingido, como aconteceu com o iatista Lars Grael, que parecia condenado a morte, mas já esta de retorno ao esporte.
Nos conjuntos da muitas alternativas, a serem consideradas caso a caso, as ações possíveis compreendem a ortotanásia (desligar as máquinas, deixando que o organismo resolva, sozinha, suas dificuldades), a distanasia (predomínio da vontade médica não desligar, só agindo quando autorizado por parentes do paciente em coma, como parece ter acontecido com Husseim) e a eutanásia (antecipação deliberada da morte na dicotomia trágica entre o sofrimento do paciente e o resultado próximo, inafatável).
Esgotados todos os recursos médicos possíveis, não havendo alternativa a considerar, em termos dos conhecimentos disponíveis no plano da ciência e sendo grave o sofrimento do paciente, verificada a inutilidade do prosseguimento da vida, reconheço que há ponderáveis razões emocionais em favor da eutanásia. Pensando o direito, ela é inaceitável, porquanto ninguém está autorizado a tirar ou abreviar, voluntariamente e por ação, a vida do outro, sejam quais forem as condições deste.
No mundo ocidental, não chegamos ao tempo da eutanásia por decisão individual, o que também se confirma em nossa Constituição: o direito à vida é inviolável. Contudo, não se pode desconsiderar o componente trágico que a decisão envolve.
SE GOSTOU DO TEXTO MANDE MENSAGEM.