O sujeito ativo dispara arma de fogo diversas vezes contra a vítima, com "animus necandi", não vindo no entanto a vítima a falecer, entrando porém em coma. Passado certo tempo o autor foi condenado por homicídio tentado, vindo tal sentença a transitar em julgado, quando finalmente a vítima morre, consumando-se assim o crime de homicídio, exaurindo-se as consequências do ato do autor, pode haver a reabertura do processo neste caso "in pejus" do réu? pode o MP aditar a denuncia ajustando-a a nova realidade? porque?

Seria interessante que as respostas e teses fossem fundamentadas, afinal haverão indubitáveis contradições e inevitáveis posições contraditórias e sem tal fundamentação não se conseguirá convencer quem pensa diferente.

Devo dizer que tenho a minha posição sobre tal cirncunstância porém ela não é pacífica nem na doutrina e nem sei se existe alguma jurisprudência sobre fato parecido.

Respostas

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    Guilherme da Rocha Ramos Segunda, 08 de maio de 2000, 8h58min

    Edwayne,

    Sem querer divagar demais, acredito que, resumidamente, a solução dada ao problema apresentado acha-se insculpido na Carta Magna, art. 5º, XXXVI, ad litteram:

    "Art. 5º. (...)
    ...........................................................
    XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada."

    Disso, colega, infere-se que se a sentença condenatória da tentativa de homicídio transitou em julgado, fez coisa julgada, e como tal o processo não poderá ser reaberto para prejudicar o agente, ainda que a morte (consumação) tenha ocorrido. Parece-me que o dispositivo constitucional só tem exceção, apresentada pela própria Constituição, como não poderia deixar de ser -- art. 5º, XL ("a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu") --, quando se tratar de lex mitior posterior (abolitio criminis e novatio legis in mellius), pois já aqui a liberdade é galgada a bem jurídico que transcende a própria irrecorribilidade das decisões judiciais transitadas em julgado.

    Na mesma esteira das idéias, poderíamos, até, chegar à ilação de que, sem embargo da condenação por tentativa de homicídio, como ela transitou em julgado, o réu passaria a ter o direito público subjetivo de liberdade contra eventual decisão que pudesse vir a apená-lo por crime consumado. Mas essa tese de "direito público subjetivo de liberdade", no Direito Penal, é contestada por juristas de envergadura (vide, p. ex., o magistério de: BRUNO, Aníbal. Direito Penal - Parte Geral. Rio de Janeiro: Forense), embora muitos a admitam atualmente.

    Acredito, assim, Edwayne, que no caso em tela jamais poderá haver prejuízo para o réu, pois então ter-se-ia uma situação em que a liberdade humana subjazeria às formalidades processuais, o que, data venia quem comigo discordar, é vedado pela Constituição Federal de 1988.

    Um abraço!

    Guilherme da Rocha Ramos.

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    Edwayne A A Arduin Segunda, 08 de maio de 2000, 21h19min

    Ola colega Guilherme:

    Meu ponto de vista é coincidente com o teu, já vi opiniões em contrário, porém acredito que a coisa julgada, mesmo que havendo superveniência de fatores que modifiquem o crime, como foi o caso, não pode afetar a estabilidade das decisões, senão até mesmo novas provas poderiam tornar instáveis demais os processos e as consequentes decisões já encerradas pelo trânsito em julgado, o mundo jurídico se tornaria uma incerteza, obrigado pela participação e espero quem sabe opiniões, fundamentadas, em contrário ou complementando a nossa.

    um abraço.

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    Mônica Maria Coimbra de Paula Terça, 09 de maio de 2000, 11h38min

    Caríssimos colegas debatedores, Edwayne e Guilherme,

    Inicialmente, gostaria de parabenizá-los pela qualidade do debate desenvolvido.
    Concordo em fundo com a opinião de ambos, ousando discordar, no entanto, quanto a fundamentação.
    Querido Guilherme, de fato o artigo 5o, inciso XXXVI da Carta magna resguarda a coisa julgada. Porém, a coisa julgada, como você certamente sabe não é absoluta no Processo Penal e, diga-se de passagem , nem no Processo Civil (ação rescisória).
    No Processo Penal a coisa julgada é desafiável via Revisão Criminal, admissível nos casos do artigo 621 do CPP, requerida em qualquer tempo, antes ou após a extinção da pena.
    É neste ponto, Guilherme, que creio, s.m.j., melhor se fundamenta sua resposta. A Revisão Criminal no Brasil, ao contrário de outros Estados (v.g.: Alemanha e Dinamarca) só é possível pro reo e nunca pro societate.
    Portanto, Guilherme, sua conclusão e a da colega Edwayne é acuradíssima: “jamais poderá haver prejuízo para o réu, pois então ter-se-ia uma situação em que a liberdade humana sbjazeria à formalidades processuais” A única observação que, modestamente, gostaria de fazer é que este fato, na meu entende, não “é vedado pela Constituição Federal de 1988”, neste caso específico. Me explico: A Revisão Criminal, pro reo, era prevista expressamente na natiga ordem constitucional. Na atual CR/88 não houve previsão expressa para a Revisão Criminal pro reo, permanecendo esta tão somente em nível infra-constitucional.
    Esta fato abre guarda, no pensar de alguns doutrinadores (v.g.: MIRABETE), para que seja instituída em nossa ordenamento a Revisão Criminal pro societate. Data venia, tendo em vista que o princípio reinante em nosso Processo Penal é o favor rei (com as exceções da pronúncia o do oferecimento da denúncia) acho impraticável a perpetração de Revisão Criminal em favor da sociedade no Brasil. Gostaria, inclusive, da opinião dos brilhantes colegas sobe tal questão.
    Em relação aos questionamentos da colega Edwayne: se há possibilidade de reabertura do processo ou aditamento da denúncia, entendo, obviamente, face a minha resposta anterior, que não.
    O aditamento da denúncia não é possível face a preclusão temporal, uma vez que a sentença já transitou em julgado.
    A reabertura do processo em desfavor do acusado, s.m.j., só é possível nos casos de impronúncia no júri. Se eventualmente este exemplo dado pela colega girasse acerca de uma hipótese de impronúncia, seria possível a reabertura do processo, vez que nesta não há que se falar em coisa julgada, e sim em preclusão pro judicato (coisa julgada formal), podendo o Tribunal do Júri decidir contra aquilo que ficou assentado na pronúncia. Mas na impronúncia não ocorre, por evidente, o trânsito em julgado (por isso, exatamente que não desafia Revisão Criminal), e permanece o acusado no “limbo” podendo o processo ser reaberto em qualquer momento e em seu desfavor.
    Concluindo, entendo impossível a reabertura do processo ou o aditamento da exordial acusatória, pelas razões supra analisadas.
    Qualquer outra reforma em malefício do acusado também é impossível face a impossibilidade, em nosso ordenamento jurídico-penal de Revisão Criminal pro socitate.

    Agradeço a oportunidade do debate, aguardo as considerações dos colegas.
    Um abraço cordial a todos debatedores e beijo para você, Guilherme.

    Mônica Maria

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