SE UMA MULHER EM POSSE DE UMA ARMA DE FOGO, OBRIGA UM HOMEM A TER CONJUNÇÃO CARNAL À FORÇA COM OUTRA MULHER (ESTUPRO), QUEM RESPONDE PELO QUÊ? JÁ QUE O HOMEM NÃO PODE RESPONDER, POIS FOI OBRIGADO E COAGIDO, A MULHER NÃO PODE RESPONDER POR ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR, JÁ QUE ESSE ARTIGO EXCLUI CONJUNÇÃO CARNAL, RESPONDERIA ELA PELO "ESTUPRO", MESMO SENDO O ESTUPRO CRIME PRÓPRIO QUE SÓ PODERIA SER PRATICADO PELO HOMEM?

Respostas

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    Guilherme da Rocha Ramos Domingo, 27 de maio de 2001, 0h29min

    Boa Noite!

    Com relação à sua indagação, bastante perpicaz por sinal, posso mandar-lhe, se for de sua conveniência e aceitação, artigo jurídico por mim encontrado na internet, que versa exatamente sobre o assunto.

    Em tese, porém, admito a possibilidade de responsabilidade criminal da mulher por estupro, já que, na hipótese por você aventada, houve autoria mediata, e, ademais, como o art. 30 do CP deixa claro que as elementares de caráter pessoal do agente se comunicam, em evidência (mas isso é apenas uma tese, Bessa) é admissível estupro praticado pela mulher.

    Já outros autores, como "ninguém mais" que Zaffaroni, creditam a possibilidade de lesão corporal tão-somente, excluindo a admissibilidade de estupro.

    Cordialmente,

    Guilherme da Rocha Ramos.

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    Amáfi Terça, 29 de maio de 2001, 9h58min

    Manda o artigo para mim também.

    Uma Abraço Guilherme

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    Amáfi Terça, 29 de maio de 2001, 9h58min

    Manda o artigo para mim também, para que eu possa colocar em meu site

    Uma Abraço Guilherme

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    Mônica Maria Coimbra de Paula Sexta, 01 de junho de 2001, 14h51min

    Caros Colegas.

    Interessante o questionamento do colega. Não vou debater mas tão somente "palpitar".
    Conheço o entendimento de Zaffaroni demonstrado pelo colega Guilherme, mas com todo respeito de quem está somente palpitando tenho lá minhas dúvidas se ele seja de efetiva justiça no caso concreto. Colegas,estudar parte geral em nível hipótetico pode ser até aprazível, mas a lei penal, teologicamente foi elaborada para servir ao caso concreto.
    A afirmação do colega é correta, existe uma das causas clássicas de exclusão de conduta (a coação física) com relação ao homem. Sem conduta não há tipo, sem tipo não há crime.
    O homem, no caso, é mero "instrumento" por isso a posição de Zaffaroni no sentido de admitir a lesão corporal e não o delito.
    Então questiono: se a mulher ao invês de usar o "instrumento-homem" hovesse usado de um objeto para constranger a vítima sexualmente, não responderia por atentado vilento ao pudor?
    Então porque usando o "instrumento-homem" responde apenas por lesão corporal?
    Não posso, a princípio, concordar com a tese do colega Guilhereme que invoca o artigo 30 porque não consigo sinceramente vislumbrar hipótese de participação do homem, por razão de uma das causas de exclusão de conduta, qual seja a força irresistível.
    Acho mais prudente que a mulher responda por estupro por uma questão de justiçã e interpretação lógica da lei, mas não sei qual seria o melhor argumento técnico, porque não consigo conceber a tese de que neste caso as circustâncias de caráter pessoal se comuniquem, uma vez que não vejo com quem comunicar porque o homem a meu modesto entender não está praticando delito.
    Abraços
    MÔNICA

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    NARA MAGALHÃES Sábado, 02 de junho de 2001, 14h41min



    Esta questão já foi alvo de discussão em sala de aula e a explicaçao do professor foi parecida com a interpretação de Mônica, disse ele que ,no crime de estupro são duas as elementares: constranger mulher a conjunçao carnal e mediante violencia ou grave ameaça .No caso em questão a mulher pratica o tipo penal através do instrumento-homem ,neste caso ela é autora do crime de estupro contra a outra mulher ."STF: Tanto comete o crime quem o pratica diretamente como aquele que, pela ameaça da arma de fogo, submete a vítima a ação direta de terceiro "(RT 550/404).STF :"E co-autor do estupro quem, portando arma, contribui para aterrorizar a vítima enquanto outrem a possui sexualmente " (RT 543/466).

    Com ou sem a participação dolosa do homem, pode a mulher ser autora do crime de Estupro .

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    Roberto Domingo, 03 de junho de 2001, 12h52min

    Caros debatedores.

    Venho também na simples condição de palpiteiro para acrescentar uns pequenos dados que entendo de relevo.

    Esta discussão já foi bolada por mim e eu simplesmente enlouqueci meus colegas de estágio na época da faculdade... e realmente as discussões foram acirradíssimas, sendo que uma das considerações, embora hilária, foi realmente interessante...

    Vejam só, o ato de conjunção carnal necessita de um certo... digamos... estímulo por parte do homem. Ele tem, por outras palavras, necessidade de que o homem esteja excitado, e isso só depende de um estímulo dele mesmo, pois ele não pode ser obrigado a ficar excitado. Assim, se ele se excita, passa a "querer" a conjunção e, como sabe que a mulher está constrangida, pratica o crime de estupro. A mulher que tem a arma, assim, vira CO-AUTORA do crime praticado pelo homem, e é disso que a jurispruência trazida pelo colega acima fala...

    Entretanto, entendo possível a autoria mediata quando a coatora se utiliza de uma arma pra constranger a mulher e usa um alienado mental como "agente material inimputável". Neste caso, ela realmente pratica o crime contra ela... mas... E CONTRA ELE? Afinal... ele também foi exposto à conduta antijurídica...

    ...e está e uma questão que eu deixo para vocês...

    Abracos.

    Roberto.

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    Patrícia Rodrigues Ribeiro Segunda, 02 de julho de 2001, 11h56min

    Muito bom, senhor Roberto,

    deixou-nos os cordões e não explicou como fiar!!!!! Brincadeira, Roberto. Mas gostei muito de seu comentário. Ainda não tinha pensado sob este ângulo.
    Ficarei mais atenta quanto V.Exm. se pronunciar.
    Abraços,
    Patrícia

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    Leopoldino Alves Cardoso Sexta, 06 de julho de 2001, 2h31min

    O dolo para a pratica do estupro foi da mulher que usou o homem para tal, responde por prática de estupro e ameaça contra o homem. Se a mulher, vitima, for feia e o cara conseguir praticar a conjunção carnal, com uma arma de fogo apontada para a sua cabeça pensante,além de ser muito macho deve entrar com um pedido de indenizaçao

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    ANDRE STUDART Quarta, 15 de agosto de 2001, 20h22min

    Prezados Colegas, escrevi sobre o tema em debate um artigo. Esta ele disponibilizado em alguns sites, inclusive no JUS. De qualquer modo, para facilitar colaciono-o. Se possível, gostaria que me enviassem respostas e comentários. Grato. Abraços.

    SUJEITO ATIVO NO CRIME DE ESTUPRO

    André Studart Leitão
    acadêmico de direito na Universidade Federal do Ceará

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    1. INTRODUÇÃO

    O crime de estupro, previsto no art. 213 do Código Penal Brasileiro, ocorre quando, mediante violência ou grave ameaça, constrange-se a mulher à conjunção carnal. Ou seja, para que o tipo penal seja configurado em sua completude são imprescindíveis o constrangimento, a violência ou grave ameaça e, por fim, a conjunção carnal.

    Destarte, a doutrina e jurisprudência pátrias, quase absolutamente, entendem que apenas o homem, ressalvados os casos em que a mulher aparecer como co-autora ou partícipe, pode praticar o delito, porquanto somente ele pode manter conjunção carnal com a mulher.

    Sucede que o estatuto penal não determina essa exclusividade, na medida em que o verbo, núcleo da conduta delituosa, não é estuprar, mas constranger. Com efeito, casos há em que a mulher, sozinha, pode praticar o crime. Assim ocorre, p. ex., quando uma mulher, sob a ameaça de morte, obriga um outra mulher à conjunção carnal com outro homem qualquer.

    Há ainda os casos de autoria mediata, em que a mulher figura, dentro do crime, como autora ao lado de um homem não culpável pela sua conduta (partícipe), vez que agiu em razão de coação moral irresistível (CP, art. 22) ou porque era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (CP, art. 26). Nessas situações, a mulher, diante da recente Teoria do Domínio do Fato, de Damásio de Jesus, aparece como única autora, porquanto somente ela tem o domínio do fato criminoso. Os eventuais outros agentes são, tão-somente, partícipes.

    Ante o exposto, mediante um estudo essencialmente doutrinário e principiológico, almeja-se, com o presente trabalho, fazer emergir um entendimento mais moderno no tocante à autoria do crime de estupro, tema ainda marcado pelo conservadorismo do Código Penal de 1890, que dispunha, em seu art. 268: "Estuprar mulher virgem ou não, mas honesta."

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    2. ANÁLISE DOS ELEMENTOS CONFIGURADORES DO TIPO

    O Direito Penal tem, no princípio da legalidade, um de seus pilares, porquanto, na medida em que visa a limitar o poder repressor do Estado, aparece como elemento fundamental à ordem e à segurança jurídica, razão pela qual ganhou ênfase constitucional.

    Por conseguinte, para que uma conduta seja entendida como crime, é imprescindível a sua perfeita adequação à previsão legal. O tipo penal deve ser preenchido em sua totalidade. E, para que isso seja possível, diante da infinidade de possíveis condutas criminosas, a lei, ao descrever o delito, deve restringir-se a uma definição objetiva e precisa, delineando, assim, os elementos configuradores do tipo, quais sejam: os objetivos, subjetivos e normativos.

    2.1. Elementos objetivos ou descritivos do tipo

    Referem-se à materialidade do ilícito penal, observando, mais especificamente, a execução, o lugar, o tempo etc. Trata-se de um verbo transitivo, núcleo do tipo, eventualmente acompanhado de referências ao sujeitos ativo e passivo, ao objeto, ao lugar, ao tempo ou à ocasião e aos meios empregados.

    2.2. Elementos subjetivos do tipo

    Trata-se de elementos concernentes ao estado anímico do agente, como o fim desejado e a intenção. São os elementos subjetivos do injusto, que aparecem, no Código Penal, em diversas oportunidades, tais como: no art. 131 ("com o fim de"), no art. 161, § 1o, I ("em proveito próprio ou de outrem"), no art. 234 ("para fim de comércio") etc.

    2.3. Elementos normativos do tipo

    Diferentemente do que ocorre nos elementos objetivos e subjetivos, que devem ser analisados caso por caso pelo magistrado, nos elementos normativos, cuida-se de pressupostos do injusto típico que podem ser determinados tão-só mediante juízo de valor da situação de fato.

    Podem apresenta-se sob duas formas diversas: uma referente a termos jurídicos (documento, certidão, atestado, função pública etc) ou extrajurídicos (mulher honesta, dignidade, moléstia etc) e outra sob a forma de franca referência ao injusto (indevidamente, sem justa causa, sem as formalidades legais etc).

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    3. SUJEITO ATIVO E CONCURSO DE PESSOAS

    Sujeito ativo, no dizer de Mirabete, "é aquele que pratica a conduta descrita na lei, ou seja, o fato típico."

    Tal definição, todavia, desconsidera a freqüente hipótese do concurso de pessoas, previsto no art. 29 do Código Penal Pátrio. Segundo esse, pratica o crime quem, de qualquer modo, concorre para a sua configuração. Com efeito, mui amiúde, há agentes que, apesar de não praticarem literalmente a conduta prevista no tipo, têm participação determinante ou apenas acessória no desenvolvimento das fases do crime.

    Como, entretanto, diferenciar o autor do partícipe quando da ocorrência dos casos concretos? Muitas divergências na doutrina pátria há no tocante à diferenciação entre autor e partícipe. Para alguns, não há qualquer diferença, vez que todos são autores (Teoria extensiva). Para outros, o autor é tão-somente o executor material (Teoria restritiva). E, finalmente, vem surgindo a Teoria do domínio do fato, de Damásio E. de Jesus, segundo a qual, "autor é quem tem o controle final do fato, domina finalisticamente o decurso do crime e decide sobre sua prática, interrupção e circunstâncias". (Teoria do Domínio do Fato, Damásio de Jesus, pág. 17) .

    Portanto, diferentemente do autor, o partícipe não tem o domínio do fato, na medida em que o delito não lhe pertence. Realmente, aparece ele apenas como um colaborador, que instiga, auxilia ou incita, ou mesmo um instrumento, meio para a configuração do crime. Diante disso, seu comportamento é dispensável, substituível, dentro da cadeia dos atos ilícitos, e, por isso, contrariando, parcialmente, a moderna estrutura do crime, não há que se falar, dentro da análise do fato típico, em nexo de causalidade com relação a partícipes. É o que escreve Damásio:

    "Na verdade, o princípio do nexo causal só pode servir à consideração do fato cometido pelo autor material. Mas não se presta às outras formas do concurso de pessoas, que devem ser regidas pelo dogma da tipicidade."

    (...)

    "(...) o partícipe responde pelo fato ainda que sua contribuição não seja causal. Se causal, como veremos, detendo o domínio o fato, não será considerado partícipe, e sim co-autor"

    (...)

    "A participação está ligada à tipicidade e à conduta e não ao nexo de causalidade" (Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas, 1999, Damásio de Jesus, págs. 11 e 12)

    No tocante à autoria, essa, na teoria do domínio do fato, de Damásio de Jesus, abrange:

    1o) Autoria propriamente dita

    2o) Autoria intelectual

    3o) Autoria mediata

    4o) Co-autoria (reunião de autorias)

    3.1. Espécies de autoria

    3.1.1. Autoria propriamente dita

    O agente age sozinho, sem quaisquer espécies de participação de terceiros. Ele, por si só, executa materialmente o verbo típico.

    3.1.2. Autoria intelectual

    Nessa espécie de autoria, o sujeito não executa o verbo típico, porém, planeja e imagina os atos que levarão ao crime. Trata-se, por exemplo, do mandante nos crimes de homicídio que, sem efetuar comportamento típico, planeja e decide a ação delituosa.

    3.1.3. Autoria mediata

    Ocorre quando alguém utiliza-se de outrem como instrumento, meio, para praticar o fato criminoso, devendo, pois, a somente ele ser atribuída, a responsabilidade, sanção penal, porquanto é ele quem possui o domínio da vontade do executor. Inclui as seguintes hipóteses:

    a)ausência de capacidade penal do instrumento por embriaguez ou doença mental (art. 62, III, do CPB)

    b)coação moral irresistível ou obediência hierárquica (art. 22 do CPB)

    c)erro de tipo escusável determinado por terceiro, em que o instrumento age sem dolo (art. 20, § 2o , do CPB)

    d)erro de proibição invencível (art. 21, caput, do CPB)

    3.1.4. Co-autoria

    Na co-autoria, há "a prática comunitária do crime" (Damásio de Jesus). Cada um detém o domínio das condições do crime. Há a divisão de tarefas, de modo que o crime, essencialmente, depende dos atos de ambos. Pode ser direta, quando todos os sujeitos realizam o ilícito (Lesão corporal, em que dois agentes lesionam a vítima), ou funcional, quando existe divisão de tarefas (um segura a mulher, enquanto o outro estupra).

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    4. O CRIME DE ESTUPRO E SEUS ELEMENTOS

    Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça. Trata-se do crime de estupro, um dos crimes contra a ordem sexual, previsto no art. 213 do CPB.

    4.1. O verbo constranger (Elemento objetivo do tipo)

    Constranger significa forçar, obrigar, sendo, assim, necessário o dissenso da vítima, ou seja, para que o crime esteja configurado deve haver a resistência inequívoca da vítima, explicitando o desejo de evitar o ato. Exige-se que a vítima se oponha com veemência ao ato sexual. Destarte, a negativa tímida, bem como o silêncio descaracterizam o estupro.

    4.2. O sujeito passivo, a mulher (Elemento objetivo do tipo)

    Somente a mulher pode ser sujeito passivo do crime de estupro, independentemente de sua conduta perante a sociedade, ou seja, não importa que se trate de mulher honesta ou prostituta; ou ainda mulher virgem ou deflorada; ou mesmo de casada, solteira, viúva ou divorciada etc.

    4.3. Conjunção carnal (Elemento normativo do tipo)

    Trata-se da cópula normal, ou seja, o relacionamento sexual normal entre homem e mulher, com a penetração, completa ou incompleta, do órgão masculino (pênis) na cavidade vaginal. Note-se que a lei deixa claro que outros atos libidinosos ou relações sexuais anormais, como o coito anal, oral, não configuram o crime ora comentado. Importa ainda ressaltar a não exigência de desvirginamento e ejaculação.

    4.4. Violência ou grave ameaça (Elemento normativo do tipo)

    Tal elemento pode, então, assumir a forma de violência moral ou física. Nessa, deve haver o emprego de força física necessariamente contra a vítima, não valendo, pois, para a caracterização do estupro, violência contra coisas ou terceiras pessoas. Por sua vez, na violência moral, há a ameaça, que deve ser séria, grave, realizável e, por conseguinte, capaz de impor medo à vítima ao ponto de fazê-la ceder. A ameaça, diferentemente, do que ocorre na violência física, pode ser dirigida a terceira pessoa, consistindo, em tal caso, em mal prometido a pessoa ligada à ofendida, fazendo com que essa ceda para evitar a concretização de tal ameaça. Independe a justiça ou injustiça do mal ameaçado.

    4.5. O elemento subjetivo do tipo

    Não traz a lei qualquer fim especial almejado pelo agente. Dessa forma, a análise subjetiva do ilícito está restrita à vontade de constranger, obrigar, forçar a mulher com o desejo de manter conjunção carnal com a vítima.

    Tal elemento é fundamental na apreciação do estupro, porquanto é definitivo na apreciação das possíveis condutas: tentativa de estupro e atentado violento ao pudor, quando os atos preparatórios poderão ser os mesmos. Nesses casos, somente a intenção do agente determinará o enquadramento penal. Assim o é quando: caso um agente seja surpreendido por policiais quando ameaçava gravemente mulher à prática sexual. Qual haveria de ser o enquadramento penal? Nessa situação, em querendo o autor manter conjunção carnal, haveria tentativa de estupro, caso contrário, desejando relação anal ou oral, ou qualquer ato que não a conjunção carnal, haveria a tentativa de atentado violento ao pudor.

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    5. SUJEITO ATIVO NO CRIME DE ESTUPRO

    Passemos agora a analisar o entendimento de alguns dos principais doutrinadores pátrios.

    5.1. Damásio de Jesus

    "Somente o homem pode ser sujeito ativo do crime de estupro, porque só ele pode manter com a mulher conjunção carnal, que é o coito normal." (Direito Penal, 13a ed., Vol. 3, pág. 95)

    "A mulher, por sua vez, não pode ser sujeito ativo do crime de estupro. Em hipótese de concurso de agentes, porém, pode sae partícipe." (Direito Penal, 13a ed., Vol. 3, pág. 96)

    5.2. F. Mirabete

    "Somente o homem pode praticar o delito, uma vez que só ele pode manter conjunção carnal com a mulher. A expressão refere-se ao coito denominado normal, que é a penetração do membro viril no órgão sexual da mulher. Nada, entretanto, impede a co-autoria ou participação criminosa; assim, mulher pode responder pelo ilícito na forma do art. 29 do CP. É possível a co-autoria até por omissão daquele que devia e podia agir para evitar o resultado típico." (Código Penal Interpretado, Mirabete, ed. 2000, pág. 1244)

    5.3. Celso Delmanto

    "Sujeito ativo: Somente o homem."(Código Penal Comentado, Celso Delmanto, 3a ed., pág. 349)

    5.4. Maria Stella Villela S. L. Rodrigues

    "Sujeito ativo: é o homem." (ABC do Direito Penal, Maria Stella Villela S. L. Rodrigues, 11a ed.,, pág. 284)

    5.5. Nossa posição

    Diante do exposto, facilmente conclui-se que a imensa maioria da doutrina pátria entende que apenas o homem pode ser sujeito ativo, uma vez que somente ele pode manter conjunção carnal.

    Todavia, data vênia, não estamos de acordo com o posicionamento dos eminentes juristas. Isso porque o Direito Penal deve trabalhar com os elementos que são postos no tipo penal, analisando-os sempre em conformidade com a estrita legalidade.

    Sucede que há uma tênue diferença entre interpretar em conformidade com a lei penal e interpretar restritivamente. Com efeito, a interpretação restritiva ocorre quando se reduz o alcance da lei para que se possa encontrar sua vontade exata. Mirabete explica:

    "Ao se afirmar que o art. 28 se refere apenas à emoção, à paixão e à embriaguez 'não patológicas', a fim de harmonizá-lo com o disposto no art. 26 e seu parágrafo, está-se limitando o alcance daquele dispositivo para que não contradiga o determinado por este. Não fosse essa interpretação, poder-se-ia aplicar o artigo 28, II, punindo-se o agente, e, ao mesmo tempo, isenta-lo de pena, nos termos do art. 26, caput. Na expressão 'venda em hasta pública' contida no art. 335 deve ser excluída aquela realizada judicialmente, inserida no art. 358 como objeto de crime contra a administração da Justiça" (Manual de Direito Penal, Mirabete, 13a ed., pág. 50)

    Ou seja, a interpretação restritiva deve ser utilizada pelo jurista tão- somente quando a lógica sistemática exigir, na medida em que visa, essencialmente, a sanar eventuais conflitos dentro do Código.

    Por consectário, dentro da análise acerca do sujeito ativo do crime de estupro, concordamos com a opinião do penalista local Ernando Uchoa Sobrinho ao dizer que não há inserido, no tipo penal "Constranger mulher à conjunção carnal mediante violência ou grave ameaça", qualquer determinação no sentido de que somente o homem pode praticá-lo. Realmente, o verbo, núcleo da conduta delituosa, não é estuprar, como era no Código de 1890 (Art. 268: "Estuprar mulher virgem ou não, mas honesta."), mas constranger, verbo que pode ser praticado por qualquer pessoa, inclusive a mulher.

    Destarte, pode a mulher aparecer como autora do crime de estupro sem a necessidade de haver concurso de agentes, bem como aparecer como autora única em um concurso de agentes em que todos sejam partícipes.

    Passemos, agora, a analisar os casos em que é possível a mulher aparecer como autora no crime de estupro.

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    6. MULHER COMO SUJEITO ATIVO NO CRIME DE ESTUPRO

    6.1. O Perfeito Enquadramento Penal

    O professor Ernando Uchôa questiona:

    "(...)qual seria o crime praticado pela mulher "A" que aponta umas arma e, sob a ameaça de morte, constrange outra a ter com um homem uma relação sexual?"

    O caso em comento é resolvido tão-somente através da tipicidade, que é a concretização de uma ação ou omissão prevista como crime. Com efeito, a mulher "A", com o uso de arma de fogo, passou a "constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça". Isto é, a mulher "A", ao apontar a arma à mulher "B", passou a constranger essa à conjunção carnal com um homem, qualquer que seja, sem que desejasse. Detinha, pois, o pleno domínio do fato criminoso e, por conseguinte, deve ser apontada como autora do crime de estupro.

    Realmente, os elementos objetivos, subjetivos e normativos do tipo foram preenchidos com perfeição. Note-se ainda que não há, no Código, qualquer observação no sentido de que a pessoa que realize o constrangimento seja a mesma que deva ter relação sexual. Dessa forma, a mulher sozinha realizou o verbo do tipo. Não há que se falar em concurso de agentes, visto que o homem, no exemplo apontado, sequer tinha conhecimento do constrangimento. Agiu ele de boa-fé, pensando que a mulher entregava-se por vontade própria. Em verdade, apenas serviu de meio, instrumento, para a configuração do delito. Não constrangeu ele a mulher a conjunção carnal.

    6.2. Autoria Mediata no Crime de Estupro

    6.2.1 Coação irresistível (art. 22 do CPB)

    A coação pode utilizar-se da via física ou da via moral (grave ameaça). No caso do art. 22 do CPB, a melhor doutrina afirma trata-se somente da coação moral, porquanto a coação física irresistível retira a própria voluntariedade do ato, por conseqüência, não há o comportamento e, logo, não há crime. Ademais, a ameaça deve ser irresistível, e pode ser dirigida contra terceira pessoa que não o coato, como, por exemplo, um parente.

    A coação exclui a culpabilidade e não se confunde com o estado de necessidade, excludente de antijuridicidade. Realmente, no estado de necessidade, não há constrangimento algum, o indivíduo, para salvar direito próprio ou alheio, realiza a conduta típica. Note-se ainda que, na grande maioria dos casos, a coação exige uma relação tríade, formada pelo coator, que obriga, o coato, que é obrigado e, finalmente, a vítima. Excepcionalmente, pode apresentar apenas duas pessoas, o coator e o coato. Exemplo: aquele constrange esse a praticar ato obsceno em local público.

    Quanto aos efeitos penais, a coação transfere logicamente a responsabilidade penal somente ao coator que, então, deve sozinho responder pelo fato típico e antijurídico, com a agravação da pena prevista no art. 62, II. Ademais, deve responder, em concurso formal, pelo crime de constrangimento ilegal (art. 146), por haver coagido o executor do delito. É a nossa posição. In contrario sensu, há a opinião de Celso Delmanto, verbis:

    "Discordamos do entendimento de que ainda haveria concurso formal com crime de constrangimento ilegal (CP, art. 146). Tal solução é inadmissível, em vista de resultar em dupla punição pelo mesmo fato e em razão das regras específicas dos arts. 22 e 62, II." (Código Penal Comentado, Celso Delmanto, 3a ed., pág.39)

    Destarte, quando uma mulher ameaça irresistivelmente um homem, mediante, p. ex., a utilização de arma de fogo, à prática sexual carnal com uma outra mulher, esse não deve responder pelo estupro, porquanto não há culpabilidade, ou seja, não há possibilidade de considerar, perante a sociedade, esse homem culpado pela prática criminosa. O crime houve, todavia, diante da grave ameaça (uma das causas que excluem a exigibilidade de conduta diversa), não há o juízo de reprovabilidade. Por consectário, a responsabilidade do crime migra somente para o coator, no caso em comento, a mulher, que deve, então, responder, em concurso formal, pelos delitos de constrangimento ilegal e estupro, vez que foi ela quem constrangeu mulher à conjunção carnal.

    Sucede que, apesar de haver praticado o crime, o coato não pode ser autor do delito, porquanto ele não detinha o domínio do fato, das condições do delito. Realmente, é o que escreve Damásio em seu recente livro Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas, verbis:

    "(...) autor é quem tem o controle final do fato, domina finalisticamente o decurso do crime e decide sobre sua prática, interrupção e circunstâncias ("se", "quando", "onde", "como" etc)." (Teoria do Domínio do Fato no Concurso de Pessoas, Damásio de Jesus, 1999, pág.16)

    Portanto, diferentemente do que a doutrina pátria entende, há a possibilidade de a mulher aparecer, no concurso de agentes, como autora, enquanto o(s) outro(s) agente(s), apenas como partícipe(s).

    6.2.2. Induzimento ao inimputável (art. 26 do CPB)

    São inimputáveis, de acordo com o Código Penal, quem, ao tempo da infração era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Ocorre, conforme escrito por Fernando Capez, em razão da existência de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado ou ainda embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior.

    A inimputabilidade trata-se, pois, da incapacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Dessa maneira, o inimputável não deve responder pelo ilícito, apesar de cometê-lo, porquanto da presença de todos os requisitos da estrutura do crime, dentre eles, a vontade de cometer o fato. Com efeito, o inimputável tem o desejo de praticar o crime, só que, ao tempo da infração, não tem a capacidade de entender porque a sua conduta é criminosa (incapacidade de entender o caráter ilícito do fato) ou, então, seu impulso patológico supera seu controle racional (incapacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento).

    Por isso, quando uma mulher convence um inimputável a estuprar outra mulher, ela pratica o crime assim como o inimputável. Só que esse último, da mesma maneira que o coato, não detém o domínio do fato, na medida em que é mero instrumento para a configuração do crime. Trata-se, pois, de outro caso de autoria mediata no concurso de agentes, em que somente a mulher, que induziu o inimputável (partícipe), pode ser considerada autora, porquanto somente ela tinha o domínio do fato.

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    Rodrigo Sampaio Segunda, 08 de outubro de 2001, 13h12min

    Caros colegas,

    Ao analisarmos o elemento normativo do tipo veremos que se torna impossível a mulher ser considerada autora do delito,pois a conjunção carnal consiste na introdução do membro viril masculino na vagina.
    Desta forma, não há de se falar em estupro feminino praticado por mulher.
    Por outro lado, a mulher poderá ser considerada co-autora ou partícipe, dependendo de sua participação para o surgimento do crime.
    Ao homem que foi coagido para realizar o evento caberá a exclusão de ilicitude, uma vez que não houve o dolo específico para cometimento do tipo penal.

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