Recusa de perícia médico-legal.
Bom dia
Por favor, sou médica legista e, às vezes, eu e meus colegas temos dificuldade durante o exame pericial. A vítima, menor de idade e acompanhada dos pais, recusa-se a fazer o exame. Trabalho com sexologia forense e, por vezes, os pais resolvem abrir um BO para verificar virgindade da filha, ou mesmo para denunciar namoro da filha menor. No momento do exame, a menor não colabora, não permite o exame. Gostaria de saber o que pode ser feito, se "quem manda" são os pais ou a menor, se podemos conter a menor a força ou mesmo sedar com anestésicos, com pedido e autorização dos pais, ou se a menor tem o direito de recusar o exame e coleta de material. Conversamos com vários legistas, e cada um tem uma opinião, mas resolvi entrar neste fórum para ouvir a opinião dos senhores, os verdadeiros conhecedores da lei penal.
Grata pela atenção de todos e desculpe pelo português (vocês advogados escrevem melhor que médicos, com certeza).
Por questão ética médica V.Sa. há que se recusar a proceder contra a vontade da paciente.
Em especial quando se trata de capricho dos pais (saber sobre a maculinidade himenal) em razão de mero namorico
O procedimento médico legal só é pertinente quando afeto a prova técnica para instruir processo inquérito atinente a comprovação de crime, por exemplo: estupro, lesão corporal, etc.
Quando for assim, capricho dos pais, o ideal é deixar a medicina de lado e partir para a psicologia, conversando com a menor e depois com os seus genitores sem qualquer procedimento invasivo.
Em um caso desses, desvirtuamento da prática médico legal, sérias consequências podem surgir para o profissional, em especial se a invasão gerar sequelas (lesões, choque anafilático, etc.) e danos morais.
O ideal, como ocorre na transfusão de sangue de "Testemuhas de Jeová" que se recusam ao procedimento, é munir-se da autorização judicial a despeito da autorização dos pais.
Boa sorte!
Ok, grata pela atenção. Mas o problema nosso é que o delegado emite um requerimento de exame nestes casos, pois a família abre um BO. Como o senhor comentou: "O procedimento médico legal só é pertinente quando afeto a prova técnica para instruir processo inquérito atinente a comprovação de crime, por exemplo: estupro, lesão corporal, etc." Nestes casos, como houve BO, o delegado manda a vítima para nosso serviço para fazer o exame justamente para instruir o inquérito policial, para constituir prova técnica. Até mais e obrigado.
Como a Senhora deixou claro agora que o Delegado manda a VÍTIMA então não se trata de verificar o rompimento himenal em razão de namoro e sim de crime.
Em caso de simples namorico e capricho da família a Sra. pode se recusar a realizar o exame quando a susposta vítima for maior de 14 anos e consentiu no relacionamento pois, com isso, a ordem do Delegado é ilegal e ordem ilegal pode ser desobedecida.
Entra ai a psicologia.
Por outro lado quando se tratar efetivamente de um crime, em especial sexual, pode-se realizar o procedimento com expressa autorização dos representantes legais a despeito da recusa da vítima caso ela seja menor de 18 anos.
Leia-se com expressa autorização autorização escrita e assinada.
Código de Ética Médica
Art. 6° - O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano, ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade. Art. 7° - O médico deve exercer a profissão com ampla autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços profissionais a quem ele não deseje, salvo na ausência de outro médico, em casos de urgência, ou quando sua negativa possa trazer danos irreversíveis ao paciente.
Capítulo III - Responsabilidade Profissional
Art. 32 - Isentar-se de responsabilidade de qualquer ato profissional que tenha praticado ou indicado, ainda que este tenha sido solicitado ou consentido pelo paciente ou seu responsável legal.
É vedado ao médico: Art. 46 - Efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo iminente perigo de vida.
Art. 48 - Exercer sua autoridade de maneira a limitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a sua pessoa ou seu bem-estar.
Este é o mais importante e referente ao uso de sedativos:
Art. 52 - Usar qualquer processo que possa alterar a personalidade ou a consciência da pessoa, com a finalidade de diminuir sua resistência física ou mental em investigação policial ou de qualquer outra natureza.
É vedado ao médico: Art. 56 - Desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente perigo de vida.
Art. 63 - Desrespeitar o pudor de qualquer pessoa sob seus cuidados profissionais.
Ok. Novamente, abusando da sua atenção ao meu questionamento, vamos lá, uma caso que aconteceu conosco, sem sitar nomes: A vítima tinha 12 anos de idade, teve relação consensual com namorado com mais de 18 anos de idade. A familia soube, foi na delegacia, o delegado acatou e abriu um BO. A vítima e os pais foram encaminhadas ao nosso serviço com o devido requerimento de exame sexológico. A menor não permitia o exame, chegando inclusive a agredir a mãe e o pai. Os pais cogitaram sedação com anestésicos para o exame e devida doleta de material. Neste caso, o que devemos fazer? Ficamos "no meio do tiroteio", com o pedido do delegado e a vontade da família de um lado, e a negação da menor, que chegava a agredir os pais com a mera tentativa de colocá-la na mesa para o exame do outro lado. A família pode nos processar por não termos feito o exame? Podemos "ir para a corregedoria" por não termos acatado o pedido do delegado? Podemos sedar a menor, ou contê-la a força.
Novamente, muito grata pela atenção.
Nesse caso, especificamente, menor com 12 anos, a ordem do delegado é lícita.
Com 12 anos resta configurado o crime de estupro.
Vossa Senhoria ao agir está amparada por excludentes de ilicitude, inclusive no ambito administrativo - corregedoria, crm, etc.
A responsabilidade da autoridade que requereu o exame é mínima, cumpre o dever legal, a Vossa idem. . Cumpre Vsa. o dever legal e ordem hierárquica.
Use, de preferência com aval do delegado, oficicie, ligue, comunique, e ipeça força policial.
Força física - leia-se camisa de força - com auxilio de força policial isenta V. Sra. de quelaquer responsabilidade.
No entanto o uso de substâncias entorpecentes é vedado, tanto por força de Vosso Estatuto quanto por força da lei de drogas.
Então precavendo-se comunique o fato ao responsável pela ordem, cumpra-a usando de força necessária de preferência com auxílio de força policial, respeite a integridade da paciente, cuidado com a provocação de lesões e vai em frente, faça o exame.
Volto atráz em minha última opinião.
O Estatuto da Criança e do Adolescente não permite qualquer tipo de violência ou coação na execução de quaisquer medidas.
Sua vontade e integridade se soprepõem, inclusive, sobre os direitos coletivos.
Continua, portanto, o impasse.
Espero que alguém ligado aos órgãos protetivos e/ou Autoridades nos auxilie nesta situação.
Mantenho, então, o posicionamento de que o profissional deve se recusar ao procedimento quando for necessário o emprego de força, coação e violência.
justificando a recusa fundamentada no ECA e no Estatuto da Medicina V. Sra. estará livre de qualquer responsabilidade.
Entendo que na recusa da menor, impossibilitada fica a hipótese do referido exame, já que é vedado o uso de qualquer violência contra a menor. O inquérito policial e futuro processo penal deverá seguir instruído com provas outras.
Fundamento: As ações negativas (diferentemente das positivas) acerca do próprio corpo sobrepõe-se ao pátrio poder e sobrepõe-se ao poder de imperium (ou defesa da coletividade). É óbice intransponível. Tal somente poderia ser violado, amparado em excludente. Tal se permitido seria abuso tão ou mais vil do que o presumido estupro. Tal controle sobre o corpo é parte integrande do princípio da dignidade humana, e como já disse, não se alcançam pelo pátrio poder ou pelo poder do Estado.
Lembrando que o Dr. Vanderley com certeza tem maior propriedade na área penal e que, fundo minha opinião pautado num raciocínio principiológico.
Obrigado. Nossa preocupação é, justamente, fundamentar uma alegação amparada por leis, para evitar futuras brigas e desgastes entre médica legista-pais-examinada, como aconteceu no caso em questão, onde mãe e filha começaram a se agredir, chegando inclusive a entortar a dobradiça da porta e tirar a porta do nosso consultório do prumo. Com o amparo das leis, podemos interromper a discussão, mostrar a fundamentação legal e tirar a família do consultório, sem medo de retaliações por parte da família, principalmente, e do delegado que pediu o exame.