Caro colega,
A questão ventilada é deveras interessante e merece comentários.
Inicialmente, consigno e assevero que o não pagamento de honorários periciais, poderá ensejar a preclusão da prova.
Todavia, o fato de a prova eventualmente considerar-se preclusa, por conta do não pagamento de honorários periciais, jamais enseja revelia. Isto porque a revelia e conseqüente presunção de veracidade dos fatos lançados pelo Autor, somente se verificaria, caso inexistisse defesa, na modalidade contestação.
Creio que tenha sido apresentada contestação e, desta premissa estou partindo, para as aduçoes ulteriores.
Com efeito, apresentada contestação em que os fatos narrados na inicial devem ter sido impugnados especificamente (Princípio da Impugnação Específica, art. 302, CPC), falece razão a se sustentar revelia, na acepção técnica enunciada na legislação adjetiva.
Assim, em não sendo efetuada a perícia pelo fato do fabricante não haver efetuado o depósito das custas periciais, NÃO se presumem verdadeiros os fatos alegados pelo autor, mas, de outro lado, poderá motivar a PRECLUSÃO da prova, ou seja, perda de oportunidade de se praticar determinado ato processual que, no caso em tela, consiste na produção de prova pericial.
Porém, muito há de se considerar.
Nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, há expressa previsão de ser direito básico do consumidor, a inversão do ônus da prova, quando vislumbrada verossimilhança das alegações (em linhas gerais, aparência de verdade) OU quando for o consumidor hipossuficiente, ou seja, a parte mais fraca na relação de consumo, devendo-se averiguar, outrossim, suas condições econômicas e jurídicas para dessumir-se se há ou não indigitada hipossuficiência.
Uma vez constatada a verossimilhança das alegações OU a hipossuficiência do consumidor, nas lições de Tania Lis Tizzoni Nogueira, é DEVER do Juiz proceder à inversão do onus probandi, não ficando ao seu alvedrio conceder ou não tal inversão. Está o Juiz, portanto, obrigado a fazê-lo (poder-dever).
O caso em análise revela inequívoco acidente de consumo, de sorte a estar sob incidência de responsabilidade pelo fato do produto e não pelo vício, especificamente art. 12 do microssitesma jurídico que cuidou de disciplinar as relações de consumo.
Nesta senda de argumento, vale enaltecer que a regra de responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto é objetiva, implica verberar, prescinde-se a investigação de culpa lato sensu (dolo, imperícia, imprudência e negligência), bastando o CONSUMIDOR demonstar (i) dano; (ii) defeito do produto e (iii) nexo de causalidade entre o defeito do produto e o dano produzido.
Aliás, a adoção da responsabilidade objetiva é regra estabelecida no CDC, encontrando exceção quando se tratar de profissionais liberais (art. 14, §4º, CDC) e, mesmo quanto a estes, em se tratando de obrigação de resultado, a responsabilidade também remanesce sob a luz objetiva, consoante precisas lições do emérito processualista e um dos redatores do Ante Projeto do CDC, Professor Nelson Nery Junior.
Assim sendo, quis o legislador pátrio efetivar o postulado constitucional de "defesa do consumidor" (art. 170, V, CF), conferindo-lhe verdeiro manto de proteção, de modo a propiciar maior segurança nas relações de massa, o que motivou a promulgação da Lei 8.078/90.
O art. 12 do CDC, indubitavelmente, foco de incidência ao caso sub examine, merece ser dissecado, com escopo de se enfrentar a questão, mas, dado o escasso tempo que possuo para "navegar na internet", não poderei muito me estender, pelo que peço escusas ao colega.
Em apertada síntese:
Nos termos do §3º, do art. 12, do CDC, o fornecedor SÓ não será responsabilizado quando PROVAR: (i) que não colocou o produto no mercado; (ii) que embora haja colocado, o defeito inexiste; (iii) culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Tratam-se das excludentes ou eximentes de responsabilidade, de maneira que a responsabilidade civil do fornecedor, SOMENTE será afastada quando este PROVAR as circunstâncias dirimentes elencadas em numerus clausus no dipositivo legal em apreço.
Dessarte, urge palmar que ao fabricante caberá PROVAR a existência de situações que a excluem do dever indenizatório, sob pena de, em não o fazendo, sobejar-lhe aludida prestação.
Após estas considerações, passo a responder às indagações do colega:
1)Pergunta: Caso o fabricante não efetue o depósito mencionado, não haverá como ser efetuada a perícia?
Resposta: Em vista de eu não conhecer e muito menos ter compulsado minuciosamente os autos que compõe o processo mencionado por V. Sa, restringirei minhas respostas à regra geral.
Assim, caso o fabricante não efetue o depósito mencionado, efetivamente, NÃO haverá como ser realizada a prova percial (uma vez que o pagamento de honorários perciais é pressuposto ao início do mister do expert), de modo que deixará o fornecedor de buscar PROVAR as eximentes de responsabilidades em que se fulcram a defesa apresentada, o que enseja, em tese, o dever de indenizar. Portanto, poderá ser considerada PRECLUSA a produção da prova pericial.
Tenha-se em mente, ademais, que caso o fabricante tenha meios de demonstrar a inexistência de sua responsabilidade (art. 12, §3º, I,II ou III) e restando acolhida tal tese pelo magistrado, exsurgirá a improcedência do pleito inicial, o que inquina o vencido ao pagamento de custas, honorários advocatícios e DESPESAS PROCESSUAIS (honorários periciais, por exemplo), valendo analisar a Lei 1.060/50 quanto à obrigatoriedade de pagamento de sucumbência, quando descaracterizado o estado de pobreza.
2) Pergunta: Em não sendo efetuada a perícia pelo fato do fabricante não haver efetuado o depósito das custas periciais, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pelo autor?
Resposta: Não. Consoante exposto retro, somente na inexistência de defesa (especificamente na modalidade contestação) do Réu, validamente citado, é que surgirão os EFEITOS da revelia, valendo anotar que revelia NÃO É PENA, como se constata ser assim usualmente designada na prática forense.
Obtempero, por derradeiro, que o fornecedor (Réu no feito), caso seja discorde quanto à estimativa de honorários periciais, deve insurgir-se quando absurda a importância pecuniária ventilada pelo expert, com base nos critérios que informam a própria estimativa. Assim, vale analisar a Tabela de Honorários do CRM-SP (Conselho Regional de Medicina de São Paulo) ou mesmo do CFM (Conselho Federal de Medicina) para utilizá-la como supedâneo à irresignação.
Porém, não se entremostra razoável a postura do fornecedor de pretender NÃO depositar a cifra referente aos honorários periciais, sob a alegação de não concordância. Deve-se, como já dito, pleitar a minoração dos honorários periciais, caso sejam vultosos e desprovidos de amparo que o justifiquem, valendo, acima de tudo, analisar-se a natureza da perícia médico-legal a ser perpetrada.
Ademais, é cediço que o fornecedor de produtos, em regra, goza de substancial poderio econômico frente ao consumidor, o que NÃO justifica a radical postura de NÃO pagar honorários periciais por mera discordância.
No mais a mais, impedir a realização de prova pericial por entender elevado o valor de honorários periciais somente PREJUDICARÁ sobremaneira o seu próprio cliente que poderá, eventualmente, suportar condenação pecuniária substancial, a qual poderá ser amainada ou mesmo elidida, pela produção da tão malfadada prova pericial.
Espero que estes lacônicos comentários sejam úteis ao colega e este é meu humilde e modesto parecer acerca da questão suscitada.
Abraço,
André Luis Adoni.