RATEIO DO CONSUMO DE ÁGUA
O síndico decidiu levar a deliberação de AGO o rateio de consumo de água por número de morador nas unidades habitacionais, alegando que tal decisão visa contemplar aquele apartamento que somente conta com o casal - que é o seu caso -. Interpelado de que essa decisão atropela o que prevê a Lei, o CC e a Convenção do Condomínio, que é por fração ideal, o mesmo afirmou que a água não é considerada "despesa comum". Os moradores preferiram aguardar resposta de Setor Jurídico da detentora do prédio - a União e assim tomar uma decisão final, mesmo esses sabendo que a única alternativa legal é a "individualização de hidrômetros". Qual a posição que devo tomar se o rateio for aprovado da maneira que o síndico insiste, já que na minha UH moram cinco pessoas - somente uma não trabalha, por ser de menor -, a convenção prevê o rateio das despesas comuns por frações ideais (1/12), mas o síndico, somente ele, quer manter o rateio diferenciado?
Primeiramente, registro minha opinião pessoal.
O rateio de alguns componentes das despesas condominiais pela fração ideal, pura e simplesmente, invariavelmente traz prejuízo, ou pelo menos injustiça, a alguns proprietários. E a despesa de água é um exemplo clássico.
Um apartamento onde residam 05 pessoas é, em regra, consumidor de quantidade de água infinitamente maior que um apartamento onde residam duas pessoas. Isso é fato.
Se considerarmos o consumo médio ideal por pessoa, proposto pela ONU, que é de 3300 litros/mês (aproximados 110 litros/dia) um apartamento com dois moradores consumiria 6600 litros/mês. Já aquele com cinco moradores consumiria aproximados 16500 litros/mês. Isso se considerarmos o consumo ideal.
Se, no entanto, considerarmos o consumo médio brasileiro, que é de 200 litros/dia, os mesmos apartamentos consumiriam, respectivamente, 12000 litros/mês (02 moradores) e 30000/mês (05 moradores). Ou seja, o segundo apartamento consome 150% a mais de água do que consome o primeiro. Mas certamente, monetariamente falando, não paga os mesmos 150% a mais por isso.
Basta pensarmos que, utilizado o critério da fração ideal, se ambos os apartamentos (onde moram duas ou cinco pessoas) tiverem o mesmo tamanho (mesma fração ideal), ambos pagarão exatamente o mesmo valor sobre a água, embora um deles consuma em média, como demonstrado, 150% a mais de água que o outro.
Quer dizer: para cada 100 litros consumidos pela unidade que tem dois moradores, a unidade que possui cinco consumirá 250 litros, pagando ambas - injustamente a meu ver - o mesmo valor.
E o fato de as pessoas trabalharem fora ou não, pouco impacta nessa diferença. Parece uma afirmação óbvia (e acaba sendo) o fato de que o consumo maciço de água ocorre justamente nos curtos períodos em que as pessoas estão em casa.
Basta pensarmos na hora do banho. Um dos maiores "vilões" do consumo é o chuveiro, que consome em média 70% da água gasta em uma residência, ocorrendo justamente nesses períodos em que as pessoas estão em casa. Fora a quantidade maior de pessoas escovando os dentes, dando descargas, bem como a quantidade maior de roupas, vasilhas e outros utensílios a serem lavados. Uma casa onde morem cinco pessoas, regra geral, lava mais roupas e vasilhas que uma casa onde morem duas.
Embora o Código Civil não vede esse modo de cobrança, esse critério de medir o quanto cada um vai pagar de água em função do número de moradores traz alguns inconvenientes.
Primeiro porque isso trará para o síndico o ônus de, periodicamente, ter de apurar se o número de moradores nos apartamentos se manteve estável.
Ou seja: se não veio morar algum parente que aumentou esse número... ou se houve a saída de algum morador, o que reduz o consumo... se os moradores ficaram fora durante o mês, ou parte dele (férias), se não receberam visitas que aumentassem o consumo em dado mês... Aí alguém pode dizer: "mas isso são hipóteses esporádicas, que não ocorrem o tempo todo..." Ocorre que se o critério for o número de pessoas consumindo água, se algum morador exigir que haja essa verificação, ela terá de ser feita, para que não haja burla ao procedimento de cobrança.
E outra: e se metade dos apartamentos ficar vazia? Se o critério de cobrança é a quantidade de moradores/consumidores no apartamento, esses apartamentos simplesmente não poderão ter cobrança de água, pois terão ZERO moradores, e consequentemente ZERO consumo. E adivinhe onde vai recair o custo da diferença desse não pagamento? Nos demais moradores, óbvio!
Partindo para o ponto prático, se o gasto com a água não é considerado despesa comum, como alegou o síndico, não sei mais o que pode ser...
A Lei do Inquilinato traz o rol das despesas que se tem por ordinárias (ou comuns), aplicando-se também nas relações que não sejam de locação:
"Art. 23 (...)
§1º Por despesas ordinárias de condomínio se entendem as necessárias à administração respectiva, especialmente:
(...)
b) consumo de água e esgoto, gás, luz e força das áreas de uso comum;"
Desse modo, gasto com água é despesa ORDINÁRIA (COMUM), uma vez que é despesa corriqueira, despesa do dia a dia condominial, para a qual devem concorrer todos os condôminos, do modo como estipulado na convenção (seja por meio de fração ideal ou outro meio escolhido e lançado na convenção).
Se houver regular aprovação do modo de rateio de despesas, pela assembleia, decidindo que não mais será fração ideal, a essa decisão se submetem os condôminos.
O critério mais justo é que houvesse medidores separados para cada unidade.
Quando resolvemos morar em condomínio, ao invés de casa, temos bônus (em tese maior segurança, maior conforto, redução de despesas em função do rateio) mas também temos ônus. E infelizmente essa impossibilidade de rateio justo de despesas é um desses ônus. O que não dá é querer auferir os bônus e não querer suportar os ônus.
Os dados que citei sobre o consumo de água podem ser vistos na íntegra em: http://www.sabesp.com.br/CalandraWeb/CalandraRedirect/?temp=2&temp2=3&proj=sabesp&pub=T&nome=Uso_Racional_Agua_Generico&db=&docid=DAE20C6250A162698325711B00508A40