Ana Paula,
embora não me lembre de já ter visto alguma decisão judicial tratando do tema (e certamente há) em relação a crianças, entendo que a restrição é ilegal e discriminatória, afrontando a Constituição Federal e até mesmo o ECA. Há diversas normas que poderiam ser citadas, mas vejo talvez como as mais importantes, as seguintes.
A Constituição, no que interessa, assim preceitua:
"Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(...)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, IDADE e quaisquer outras formas de discriminação."
"Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança (...) com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."
A seu turno, estatui o ECA:
"Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária."
"Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais."
"Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor."
De uma leitura conjugada dos dispositivos transcritos, pode-se perceber que o ordenamento proíbe qualquer tipo de discriminação fundada na idade da pessoa. Não se pode atingir um dos objetivos fundamentais do Brasil - o bem de todos, sem discriminação em razão de idade (art. 3º, IV, acima) quando se restringe o direito de moradia a uma família pelo simples fato de terem um filho pequeno.
Em se tratando de crianças, pela razão inerente de serem seres que necessitam de uma maior proteção, a lei prevê que TODOS (Estado, Família e Sociedade) são (ou deveriam ser) responsáveis pelo pleno desenvolvimento e cuidado dessas crianças.
O dono de um imóvel levado ao mercado para locação, como é óbvio, está inserido como membro da sociedade, e por isso mesmo submete-se aos mandamentos legais de não-discriminação contra crianças. Ele não é obrigado a locar o seu imóvel, tendo por base o seu direito de propriedade, também com sede constitucional.
Mas se resolve fazê-lo, não pode se valer de critérios discriminatórios, com base na idade de um dos membros da família que ali vai residir, para fechar ou não fechar o negócio. E nem se diga que ele, como dono do imóvel, tem a prerrogativa de contratar com quem ele bem entender.
O direito de propriedade não é absoluto, e deve ser exercido com base em sua função social. Função social, resumidamente, é o exercício da propriedade de modo harmônico com com os anseios da coletividade, de modo produtivo, trazendo dividendos sociais a todos que a ela pertençam.
Se se puder admitir a possibilidade do locador se negar a alugar o imóvel a um casal, ou a uma mãe ou a um pai separados, que tenham filhos pequenos, também teremos que admitir que ele possa negar a locação do imóvel a um negro, a um judeu, a um índio, a um portador de necessidades especiais, a um obeso, a alguém que use óculos, que tenha uma verruga, que seja muda... o que seria totalmente absurdo.
E nem se diga que com essa restrição o dono do imóvel busca evitar algum dano que a criança possa causar ao imóvel, ou algum outro tipo de transtorno como barulho ou incômodo. Existem regras das quais ele pode se valer em caso de dano no seu imóvel, de modo que ele pode receber indenização por aqueles eventualmente causados.
Quanto à questão dos animais, a situação é outra, e tem de ser vista caso a caso. A restrição pode se afigurar legítima caso se trate de animal que, pelas suas características, possa oferecer algum tipo de risco ou incômodo aos vizinhos. Imagine um animal extremamente feroz, que oferece risco de fuga, ou até mesmo um animal extremamente barulhento, que incomode toda a vizinhança.
Nesses casos, o proprietário pode restringir a posse desse animal no seu imóvel, pois ele (dono do imóvel) pode até mesmo vir a ser condenado solidariamente com os inquilinos em caso de eventual processo judicial movido por algum vizinho que, por exemplo, se sinta incomodado pelo barulho ou mau cheiro provocado pelo animal.
Temos de considerar também o porte do animal e o tipo de imóvel que está sendo locado. Normalmente pensamos em cães e gatos de pequeno porte. Mas poderíamos imaginar, por exemplo, a locação de um apartamento onde o futuro inquilino possua um pastor alemão ou um labrador. Sabemos que esses animais demandam espaço, e seria até mesmo crueldade manter referidos animas confinados em um apartamento.
Caso essas circunstâncias não estejam, presentes, a restrição, pura e simples, a meu singelo entender, também é desprovida de razoabilidade.
Espero ter contribuído, mesmo que um pouquinho, com a discussão.