Em face da eficácia "erga omnes" da sentença da ação civil pública, é possível o controle incidental de constitucionalidade de normas nesses tipos de ação? Não haveria usurpação da competência do Supremo e instauração de um controle abstrato de normas em primeira instância?

Respostas

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    joão cirilo Segunda, 17 de maio de 1999, 18h55min

    Izabela, boa tarde: No meu entender é impossível a existência de controle de constitucionalidade de leis pelo método difuso em primeira instância.
    Afora as outras opiniões no mesmo e em outro sentido que certamente você vai receber nesta página, pretendo demonstrar o porquê deste meu ponto de vista em outra oportunidade.

    Um abraço.

    João Cirilo

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    Roberto Abreu Quarta, 19 de maio de 1999, 18h27min

    Cara Izabela.

    Indo direto ao ponto, eu diria que a decisão em Ação Civil Pública, ao contrário do que disseste, não apresenta eficácia "erga omnes", mas tão somente "inter partes". De fato, o julgamento da ACP, no meu entender, não obriga àqueles que não participaram do vínculo jurídico-processual instaurado.

    Sendo assim, o controle de constitucionalidade (ao contrário do que diz o Sr. João Cirilo, cuja opinião anseio muito por conhecer) pode ser plenamente exercido pelos magistrados de primeira instância no julgamento de ACP's, interpostos incidentalmente e, assim, objeto de controle difuso.

    Não se trata de controle concentrado por dois motivos: primeiro, não existe eficácia "erga omnes", mas tão somente entre os litigantes. Em segundo lugar, a decisão é prolatada tendo por substrato um processo sobre um caso concreto, onde tal inconstitucionalidade é reconhecida incidentalmente (matéria incidental), enquanto que no controle concentrado não existe caso concreto, já que o objeto da ADIn é a declaração de inconstitucionalidade da lei em tese, e tal objeto é principal em relação ao vínculo jurídico-processual.

    Não procede o argumento daqueles que entendem não ser possível o controle de constitucionalidade por parte dos juízos monocráticos (critério difuso) em face de prever a Constituição que a declaração de inconstitucionalidade de uma lei exige maioria absoluta dos membros da respectiva Casa. Se assim fosse, os Governadores de Estado e o Presidente da República (a quem se reconhece a possibilidade recusa de aplicação de Lei que entenda inconstitucional) estariam obrigados a executar leis inconstitucionais, ainda que conhecessem tal eiva e com ela não concordassem. Outrossim, a própria independência dos juízes lhes faculta, salvo decisão "erga omnes" de Corte Superior, a recusa de aplicação de uma lei inconstitucional, exatamente por este motivo.

    Espero ter enriquecido o presente debate.

    Um grande abraço.

    Roberto Abreu.

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    joão cirilo Quarta, 19 de maio de 1999, 19h50min

    Cordiais saudações,

    Informáramos em outra ocasião que seria impossível, segundo nossa ótica, a existência de controle de constitucionalidade pelo método difuso em primeira instância.

    Ao contrário do afirmado pelo dr. Robero Abreu, não dissemos que é defeso aos magistrados de primeira instância o exercício do controle de constitucionalidade, vez que tal alvitre é-lhes perfeitamente legal: mas devem fazê-lo tão somente pelo método concentrado, isto é, analisando o caso concreto, e produzindo efeitos somente entre as partes envolvidas na lide.

    Nesta oportunidade tentaremos expor melhor nosso ponto de vista, lembrando - aliás na traça de ambos os participantes deste ensaio - que estes assuntos emergem com maior destaque em ações civis públicas patrocinadas pelo órgão ministerial de primeiro grau.

    Nesta espécie de ação normalmente o representante do Ministério Público assenta sua legitimidade, entre outros comandos, no art. 129, III, da Constituição Federal, que tem a seguinte redação:

    Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
    (...)
    III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

    Lança mão, igualmente, do art. 5º da Lei 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) que legitima também o órgão ministerial à propositura de ações com assento na referida lei para as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao consumidor, e a qualquer outro interesse difuso ou coletivo (art. 1º, II, IV).

    E com o advento do Código do Consumidor, (Lei 8.078/90), por meio de seu art. 117, acrescentou-se o art. 21 à Lei 7.347/85, que passou a vigorar com a seguinte redação:

    Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da Lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor.

    O art. 81, parágrafo único, do Código do Consumidor, define o que se entende por interesses ou direitos difusos, interesses ou direitos coletivos e interesses ou direitos individuais homogêneos. E o art. 82 legitima concorrentemente o membro ministerial para a defesa daqueles interesses.

    Entretanto, não se perca de vista que a ação civil pública não é panacéia. É indubitável que tais dispositivos legais dá alicerces ao manejo das ACPs pelo Ministério Público. A questão que deve ser resolvida é a seguinte: confere-a ao órgão de primeiro grau?

    Entendemos que não. Daí nossa afirmativa anterior; com as seguintes razões.

    Quando o Código de Defesa do Consumidor açambarca um número maior de situações, definindo-as e conferindo legitimação a diversas instituições, está com os olhos postos no consumidor. Quando a Constituição Federal fala em direitos difusos e coletivos, obviamente refere-se ao consumidor, porque é especificamente naquele Código que se encontram as definições daqueles direitos constitucionalmente tutelados.

    Assim, pretende-se demonstrar que todas as alternativas jurídicas postas na Lei de Ação Civil Pública pela Lei 8.078/90, são voltadas ao consumidor, isto é, a "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final" (art. 2º da lei 8.078/90).

    É elementar que não se está afirmando a ilegitimidade do Ministério Público para manejar ações de inconstitucionalidade. Porque é diamantino que tem, embora em outra instância.

    Diz o art. 129, IV, da Constituição Federal:

    Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
    (...)
    IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição.

    Neste diapasão, num encadeamento lógico, encontra-se no art. 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo o Procurador-Geral de Justiça como um dos legitimados para a propositura desta espécie de ação. Como se vê, no seio ministerial somente aquele órgão detém competência para argüir inconstitucionalidades pelo método abstrato (ou difuso).

    Este raciocínio resta plenamente endossado pelo TJSP nos autos do mandado de segurança nº 177.513.1/2, em 16/12/92, por votação unânime, tendo como relator o desembargador Fonseca Tavares e publicado na RT nº 694/85, do qual alguns trechos são reproduzidos abaixo:

    "TAXA - Iluminação pública, limpeza pública, sinistro-bombeiro e conservação de logradouro - Previsão em lei Municipal - Ação civil pública proposta pelo Ministério Público visando a suspensão de sua cobrança - Meio inidôneo - Hipótese de ação direta de inconstitucionalidade - Substituição da ação inadmissível - Inteligência do art. 90, § 2º, da Constituição do Estado de São Paulo".


    E no corpo do acórdão:

    "E, no caso, deve evidentemente ser concedida a segurança. Dispõe o art. 129 da CR, em seu n. II que é função institucional do Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia. Mas o n. IV é preceituado que lhe cabe também promover a ação de inconstitucionalidade.
    Ora, aqui sim existe norma específica que não poderá ser desacolhida.
    Não há como substituir uma ação direta de inconstitucionalidade por uma ação civil pública e, além do mais, comporta esta uma medida liminar, a ser concedida pelo própria Juiz da Comarca, quando a matéria deve ser conhecida pelo próprio Tribunal de Justiça, nos termos do art. 90, § 2º da CE.
    Desse modo, não é possível fazer sustar a cobrança de taxas, sob o fundamento de que sejam inconstitucionais.
    A hipótese é, em conseqüência, nitidamente de carência de ação civil pública, e por isso, de concessão do writ impetrado".

    Nesta mesma linha o acórdão proferido no recurso especial nº 171.640-SP, da lavra do Min Ary Pargendler.

    É lição de Nélson Nery Júnior:

    "O objeto da ADIn é a declaração, em abstrato, da inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, com a conseqüente retirada da lei declarada inconstitucional do mundo jurídico por intermédio da eficácia erga omnes da coisa julgada. Assim, o pedido na ACP é a proteção do bem da vida tutelado pela CF, CDC ou LACP, que pode ter como causa de pedir a inconstitucionalidade de lei, enquanto o pedido na ADIn será a própria declaração da inconstitucionaldade da lei. São inconfundíveis os objetos da ACP e da ADIn. (Código de Processo Civil Comentado, 2ª Edição, Editora RT, pág. 1403)

    Como se vê, a competência ministerial em primeiro grau para argüir ofensas a direitos difusos ou coletivos, e bem assim toda a legitimação permitida pelo Código de Defesa do Consumidor voltam-se exclusivamente para as relações de consumo, cuja definição é dada pelo art. 2º daquele diploma.

    Mas nas ações de inconstitucionalidade de lei, a legitimação é da Procuradoria-Geral de Justiça por expressa disposição constitucional. Este entendimento ainda mais se reforça quando se trata de leis tributárias, porque o conceito de tributo dado pelo art. 3º do Código Tributário Nacional, em nenhum momento, sob nenhum aspecto, tem o menor traço de identidade com o que se entende por relação de consumo, em definição haurida do art. 2º do Código de Defesa do Consumidor.

    Por tal razão nossa afirmativa inicial: não existindo coincidência entre a legitimação dada pelo direito material discutido em juízo e a titularidade ativa do autor do feito, é ele carecedor de ação (art. 301, X, CPC), resultando daí que o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito (art. 267, VI), porque o órgão ministerial de primeira instância é parte ilegítima para ajuizar e defender pedidos que versem ações diretas de inconstitucionalidade.

    O que não quer dizer que não tenha competência para apontar e atacar - visando expungir do mundo jurídico - leis inconstitucionais, quando atuar concretamente, caso em que sua atuação não terá efeito "erga omnes"

    Esta é nossa humilde opinião, sempre respeitando - e aprendendo - com idéias contrárias.

    Um abraço,

    João Cirilo

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    Roberto Abreu Quinta, 27 de maio de 1999, 9h19min

    Caros Colegas.

    Pude observar pela nova mensagem do caro amigo João Cirilo que, mesmo sem saber, sempre estivéramos concordando um com o outro. Apenas um equívoco deve ser reparado.

    Caro amigo, observei que o Sr. trata o controle ABSTRATO de constitucionalidade pela denominação de CONTROLE DIFUSO, enquanto o controle de constitucionalidade em um processo de partes, versando um caso concreto, pela denominação de CONTROLE CONCENTRADO. Voila! Eis o motivo de nossa falsa discordância: data venia, o Sr. confundiu a terminologia dos termos. O Controle ABSTRATO de Constitucionalidade é exercido pelo critério CONCENTRADO, e não difuso... o Controle Concentrado, Abstrato ou por via de Ação é aquele de competência do STF e dos TJ's. Por outro lado, o Controle Concreto de Constitucionalidade, pelo critério Difuso, Incidental, por via de Defesa ou Exceção, é exercido por quaisquer órgãos do Poder Judiciário.

    Peço-lhe licença para transcrever as passagens de seu texto onde existe o equívoco terminológico.

    "Ao contrário do afirmado pelo Dr. Robero Abreu, não dissemos que é defeso aos magistrados de primeira instância o exercício do controle de constitucionalidade, vez que tal alvitre é-lhes perfeitamente legal: mas devem fazê-lo tão somente PELO MÉTODO CONCENTRADO, isto é, analisando O CASO CONCRETO, E PRODUZINDO EFEITOS SOMENTE ENTRE AS PARTES ENVOLVIDAS NA LIDE". (O controle de tem eficácia "inter partes, no caso concreto, é o difuso, por via de defesa ou de exceção, tb chamado incidental).

    "Neste diapasão, num encadeamento lógico, encontra-se no art. 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo o Procurador-Geral de Justiça como um dos legitimados para a propositura desta espécie de ação. Como se vê, no seio ministerial somente aquele órgão detém competência para argüir inconstitucionalidade pelo métido abstrato (ou difuso}" (Data venia, o Sr. quis dizer "(ou concentrado)").

    Ademais, o próprio texto que o Sr. colacionou, de autoria do eminente Nelson Neri Júnior, fundamenta tanto a minha opinião quanto à sua, pois ele faz a distinção (magistralmente, no meu entender) entre a Ação Civil Pública que tem como CAUSA DE PEDIR o reconhecimento "incidental" de inconstitucionalidade de uma lei (e aqui a competência do Juízo de primeiro grau é cabal e incontestável), e aqueloutra que tem como PEDIDO o reconhecimento de inconstitucionalidade de uma lei, esta, sim, de objeto manifestamente similar ao de uma ADIn e, portanto, restrita à competência do STF ou TJ, conforme o caso (arts. 102, I, "a" ou 125, § 2.º da CF).

    De resto, concordo integralmente com sua opinião, e friso que jamais dela discordei (posto que, até o momento, não havia sido debatida).

    Ressalvo apenas os pontos que acima levantei.

    Espero comentários.

    Um grande abraço.

    Roberto Abreu.

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