O "sigilo das votações" do Tribunal do Júri é Garantia Fundamental de quem? Réu ou Jurado? A Constituição parece não dizer exatamente de quem, e não diz sequer se o próprio sigilo em si constitui direito ou garantia fundamental, pelo que se faz necessário analisar tal aspecto também. A questão tem pertinência prática, como veremos no decorrer do debate.

Espero respostas.

Um abraço.

Roberto Abreu.

Respostas

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    Mônica Maria Coimbra de Paula Terça, 18 de janeiro de 2000, 16h46min



    Caro colega Roberto,

    Questão interessante esta que traz a baila.
    A CR/88 reconhece no seu artigo 5o, inciso XXXVIII, a instituição do júri e assegura
    1) a plenitude de defesa
    2) o sigilo das votações
    3) a soberania dos veredictos
    4) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

    A plenitude de defesa, sem dúvida é garantia fundamental do réu. A soberania dos veredictos é garantia da ordem pública e da própria instituição. A competência é garantia concorrente, da instituição (no seu interesse, inclusive social) e do acusado, de ser julgado por seus "iguais".
    O sigilo das votações, a priori, me parece estar mais intrinsecamente ligado às garantias individuais dos integrantes do conselho dos sete.
    O sigilo, que é das poucas exceções ao princípio da publicidade, garante a imparcialidade do exame dos fatos que são chamados, os jurados, a realizar no início do julgamento.
    Creio ser este garantia e cláusula pétrea da constituição.
    Recentemente alguns doutrinadores vem questionando a luz da reforma penal se o sigilo das votações não confrontaria o regime democrático de direito, v.g., o Procurador de Justiça gaúcho Lênio Luiz Streck em sua obra Tribunal do Júri. Questiona-se inclusive a constitucionalidade da "sala secreta" em um estado democrático de direitos.
    Porém não acredito que se chegue a tanto e entendo que é salutar a garantia de que o jurado votará em silêncio.
    Tenho certeza que o brilhante colega já tem uma resposta muito superior a minha, aguardo-a.
    Cordialmente.
    Mônica Coimbra.

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    Alexandre Sales de Paula e Souza Quarta, 19 de janeiro de 2000, 3h15min

    Caros Colegas,

    Sou Promotor de Justiça em Brasília e gostaria de compartilhar o ponto de vista de alguém que já atuou no Tribunal do Júri. A meu ver o sigilo das votações é garantia fundamental da instituição como um todo, um meio de alcançar a plena satisfação da Justiça, aproveitando tanto ao acusado - a quem é garantida a imparcialidade do seu julgador já que o mesmo estará livre, em sua consciência para julgar - e ao jurado, representante da sociedade - a quem é garantida a proteção contra influências intimidatórias.

    Enfim, o sigilo da votação tem por escopo assegurar a imparcialidade e a liberdade de consciência com que deve dirigir-se todo julgamento. Em última análise é a confirmação do exercício pleno da democracia, a exemplo com o que acontece nos sufrágios.

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    Roberto Abreu Quarta, 26 de janeiro de 2000, 14h48min

    Carissimos colegas.

    Quero agradecer aos colegas pelas brilhantes considerações e agradecer a estimada amiga Mônica que, mais uma vez, nos brinda com sua percuciente análise dos temas que propomos. Faço minhas, portanto, as palavras do colega Guilherme.

    Cara Mônica, sinto decepcioná-la mas realmente não tenho uma resposta tão brilhante quanto a sua. O questionamento que propus é realmente uma dúvida que tenho. Algo que me instiga mas cuja resposta definitiva ainda não encontrei. Como bem sabe a nobre colega, sou recém-formado e não pude ainda me deter nas leituras sobre temas específicos, restringindo-me tão somente, por enquanto, ao que há de mais geral, já que, na faculdade em si, poucos são os alunos que saem com uma boa preparação. Estou tentanto recuperar um precioso tempo perdido!

    Vamos ao assunto. Achei interessante o posicionamento colacionado de que o sigilo das votações seriam garantia da instituição do juri, ou que seria garantia dos jurados. Entretanto, como ainda me faltam subsídios para adotar um (ou ambos) os pensamentos, gostaria de fazer algumas considerações.

    Em primeiro lugar, parece-me difícil analisar dita garantia como sendo da instituição do juri, considerando a interpretação sistemática cabível no caso. Com efeito, trata-se de dispositivo inserto no rol de "Direitos e Deveres Individuais e Coletivos", pelo que não me parece, à primeira vista, correto o entendimento de que se estabeleceu garantia diretamente aplicável a uma instituição jurídica. Pode-se, claro, apontar o argumento de que a proteção direta da instituição visa a uma proteção indireta dos réus e, assim, ter-se-ia por justificado o pensamento. O argumento é interessante. Garantindo-se a imparcialidade dos jurados que, desconhecida sua intenção de voto, estariam livres de quaisquer pressões, ter-se-ia garantida, indiretamente, a lisura do julgamento de um réu, em benefício deste. Mas, se for assim, então tal preceito estaria sendo flagrantemente violado pelo Código de Processo Penal, pois este prevê que a contagem total (dos sete jurados) será consignada em ata e, principalmente, publicada. Como sabemos, se a contagem for de sete a zero, quer pela absolvição, quer pela condenação, as intenções de voto de todos os jurados serão conhecidas e, assim, a garantia não terá sido validamente assegurada.

    Igual argumento pode elidir um suposto aspecto de tal garantia como sendo direcionada à proteção dos jurados, pois, conhecida sua intenção de voto (através do registro de votação indiscrepante), estariam expostos seus votos e, assim, sigilosa não seria a votação. Por outro lado, por que assegurar tal sigilo como sendo uma garantia para o jurado? Estar-se-ia admitindo que o Tribunal do Juri está mais susceptível a pressões? Por que os julgamentos do Poder Judiciário devem ser públicos e, excepcionalmente, as manifestações do Conselho de Sentença devem ser sigilosas? O sigilo das votações, se, por um lado, não está sendo resguardado de forma correta pela possibilidade de publicarem-se votações indiscrepantes (onde se conhecem todos os votos dos jurados), por outro lado, quebra a unidade do sistema que determina serem os pronunciamentos judiciais públicos, sendo pública a justiça e pública a administração.

    Tal preceito, por outro lado, quebraria a unidade lógica e o sentido teleológico da própria instituição. Sendo o Tribunal do Juri instituído como uma garantia fundamental individual da pessoa, estar-se-ia estabelecendo disposição flagrantemente mais gravosa para o réu com a determinação do sigilo das votações dos jurados, uma vez que o próprio Juiz Togado, sofredor da constante pressão do Estado que é, deve manifestar sua decisão em ato público.

    Bem... está lançado, desta forma, o debate. Creio que, a partir de agora, terei condições de acompanhar os nobres colegas.

    Um grande abraço a todos.

    Roberto Abreu.

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    Mônica Maria Coimbra de Paula Quarta, 26 de janeiro de 2000, 20h44min

    Estimado e brilhante amigo Roberto Abreu,

    Agradeço a oportunidade de debater tema tão apaixonante do direito, qual seja o Tribunal do Júri.
    Tenho plena convicção de que não sou merecedora dos elogios que faz a minha pessoa, bem como os elogios também feitos pelo colega Guilherme, agradeço a ambos.
    Interessante sua colocação no sentido de não entender ser garantia da instituição do Tribunal do Júri o sigilo das votações, vez que inserto este princípio no rol dos direitos e deveres individuais e coletivos da Constituição da República.
    Entendo, modestamente, que a garantia mediata da instituição abrange imediatamente a figura do conselho de sentença e do próprio acusado.
    O conselho de sentença é mais que uma instituição, finalisticamente, ele é a essência da própria sociedade. A sociedade não só tem interesse no Júri, enquanto a maior ofendida, como deve ser tutelada na sua representação a fim de garantir que a evocação que lhe é feita no artigo 464 do CPP seja levada a termo.
    A questão colocada pelo perspicaz colega, acerca da votação indiscrepante, é muito controvertida. É, in casu, o conflito entre a garantia do sigilo das votações e o princípio da publicidade dos julgamentos(que não deixa de ser uma garantia dentro do sistema acusatório), ambos de égide constitucional.
    O sigilo das votações no Tribunal do Júri é uma exceção clássica a regra da publicidade. Não entendo que exista um efetivo conflito mas que tenha o nosso ordenamento jurídico buscado o equilíbrio entre o segredo como garantia e a publicidade como imposição.
    Nos casos das votações unânimes creio que o efeito da sala secreta seja mais psicológico e moral.
    Caro Roberto, é bem verdade, que nos julgamentos em que tive a honra de atuar pela Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais a assistência do plenário encontrava-se quase ao abandono...réu carente não dá IBOPE...risos Porém, não raro, muitos julgamento se arrastam sob o clamor público, a ferocidade da mídia, as lamúrias dos entes da vítima e acusado (ou pela notoriedade do Defensores), e os plenários se incham de assistentes até que seja lida a sentença, independente da hora adiantada! Nestes casos o jurado não poderia ficar ao sabor de tamanha pressão.
    Interessante citar, a título de curiosidade, que na França o entendimento pretoriano leva “a ferro e fogo” o princípio do sigilo das votações. Lá os tribunais, tradicionalmente, anulam os veredictos quando precisarem o número de sufrágios da maioria, em vez de atestarem apenas que ela transcende o mínimo de sete, ou quando condenam com a declaração de unanimidade porque a resposta neste termos dá virtualmente a conhecer a opinião de todos os jurados.
    Creio que o legislador dando esta garantia ao conselho dos sete, aqui no Brasil, quis diferenciá-los sensivelmente do juiz monocrático. É exatamente por isso que se firma o Tribunal do Júri como a instituição mais democrática de nossa organização judiciária, é porque ele é diferente (sensivelmente diferente) do juiz monocrático, senão não teria razão de existir!
    Mas não ouso dizer não a seu questionamento de que se o sigilo das votações seria um indicativo de que o Tribunal do Júri estaria susceptível às pressões. O Júri é soberano mas não é augusto, é humano e sujeito a todas as espécies de pressões quotidianas.
    Prova da falibilidade do Tribunal do Júri é o instituto do desaforamento, inserto no artigo 424 do CPP. Observe-se, por oportuno, que o anteprojeto de reforma do Tribunal do Júri propôs a ampliação destes instituto substituindo a expressão “a requerimento do acusado” pela expressão “a requerimento das partes”, legitimando ainda o assistente do MP para requerê-lo. Nota-se estar patente a suscetibilidade do júri, até mesmo face ao crescimento assustador da criminalidade violenta.
    Só ouso discordar de sua brilhante resposta em um termo, quando afirma : “Sendo o Tribunal do Júri instituído como uma garantia fundamental individual da pessoa, estar-se-ia estabelecendo disposição flagrantemente mais gravosa para o réu com a determinação do sigilo das votações dos jurados, uma vez que o próprio Juiz Togado, sofredor da constante pressão do Estado que é, deve manifestar sua decisão em ato público.”
    Entendo, sem embargos a seu entendimento, que o sigilo é uma vantagem e não um desfavor ao acusado. A uma pois, como o colega já muito oportunamente analisou a votação é consignada em ata e não fica a revelia do acusado, não constitui-lhe surpresa para eventual recurso. A duas, os jurados não motivam sua votação, o que inibe um juízo de valor no Tribunal, vez que votam de acordo com a sua consciência e os diamantes da justiça. A três, o salutar sigilo defende homens e mulheres comuns de pressões, tais quais: a mídia, a opinião pública, etc.; conferindo-os maior segurança e independência, que, ao final, beneficia qualquer acusado e sobremaneira à própria Justiça.
    Um julgamento em um plenário de Júri não é um mero procedimento especial, lá a minha criticada retórica (risos) opera de fato e são envolvidas questões alienígenas ao direito e via de regra psicológicas e porque não dizer emocionais.

    Agradeço a oportunidade de debate. Espero seus brilhantes apontamentos.

    Cordialmente.

    Mônica Coimbra

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    Ronaldo Pinheiro Sexta, 03 de março de 2000, 14h49min

    Caro Roberto:

    Parabenizo-lhe pela preocupação com este importante tema. Muita tinta já foi gasta entre os doutos da área a fim de explicar, a contento, o escopo principal do sigilo nas votações.

    Só para contribuir com uma pequena parcela no debate, consegui enxergar uma falha neste instituto, erigido a garantia fundamental. O problema reside na hipótese de haver unanimidade nas votações, seja condenando, seja absolvendo o acusado, porquanto, nesse diapasão, o teor do voto dos sete membros que compõem o Conselho de Sentença é de uma clareza de doer nos olhos, ou seja, o sigilo tão almejado nem sempre é alcançado !!!

    Fica registrado, modestamente, o equívoco.

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    Andréa Almeida Dantas Domingo, 02 de abril de 2000, 18h01min

    Caro Alexandre

    Acrescentaria aos pontos colocados por vc, como sendo os objetivos visados pelo sigilo nas votações do Tribunal do Júri, a própria integridade física dos componentes do Conselho. O que, como já foi dito pelo colegas, fica totalmente prejudicado nos casos de resultados unânimes, seja pela absolvição do réu, ou seja por sua condenação.

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    Andréa Almeida Dantas Domingo, 02 de abril de 2000, 18h42min

    Meu colega e amigo de longa data....

    Em que pese a relevância do tema central, qual seja "Tribunal do Júri", discutirmos qual teria sido a intenção do legislador no momento da elaboração de dispositivo legal seria o mesmo que discutirmos "o sexo dos anjos". Já deveríamos estar acostumados, ressalte-se, acostumados e não acomodados, com a falta de técnica legislativa com a qual somos obrigados a conviver. Em sua maioria, os responsáveis por tal mister encontram-se despreparados, fazendo com que toda a sociedade responda por suas “tentativas” de fazer leis. A maior prova disso foi a confusão gerada em nossos Tribunais quando da alteração do art. 366 do CPP. A salada que fizeram misturando em um só dispositivo norma de caráter material e processual, criou um verdadeiro burburinho sobre qual seria a forma mais acertada de aplicação da chamada “suspensão do processo”, até que após muitas discussões e decisões divergentes, chegou-se a um denominador comum. E a este, procurou-se atender antes de tudo, o caráter social da norma, fim precípuo do direito.
    Pois bem, para nós, operadores do direito, restou a obrigação de fazermos com que o mundo de normas com que trabalhos seja aplicado de forma equânime, justa, na medida do possível.

    O sigilo nas votações pretendeu acima de tudo garantir imediatamente a integridade física e psicológica dos componentes do Conselho e mediatamente um julgamento imparcial para o réu, mas pecou, no primeiro caso, por não vislumbrar os casos de votação unânime.

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