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    Flávio H. D. Oliveira Sábado, 23 de fevereiro de 2002, 18h27min

    Caro Carlos: transcrevo, abaixo, a resposta que escrevi num debate análogo:

    "Re: 10 %

    Escrito por Flávio H. D. Oliveira,
    estudante de direito - 10p. Estagiário do Ministério Público/MG em Belo Horizonte,
    quarta, 13 de fevereiro de 2002, às 20 h 44 min,
    em resposta a 10 %.

    Cara Melissa:

    Penso que você está certa, em parte. Com base nos fatos que você narrou, a cobrança “dos 10%” foi ilegal.

    Contudo, ao contrário do que você pensa, a cobrança da chamada gorgeta compulsória pode ser lícita sim, desde que observadas as formalidades legais.

    Essa é uma questão muito interessante, mas muitas pessoas não sabem explica-la devidamente. Como nunca me deram nenhuma explicação satisfatória, resolvi pesquisar esse tema. Passo a expor, em síntese, meu entendimento.

    A gorgeja poderá ser cobrada desde que haja acordo ou convenção coletiva válida que a autorize, devidamente registrados nos órgão competentes do Ministério do Trabalho, e que sejam afixadas cópias autênticas de tais instrumento de negociação nos respectivos sindicatos e empresas (restaurantes, etc) envolvidas. Além disso, o consumidor deve ser previamente e efetivamente informado do pleno conteúdo do contrato, sendo certo que o fornecedor deve ostensivamente cientificar o cliente da cobrança da gorgeta. Por isso, é imperioso que o fornecedor escreva no cardápio, em cartazes, placas, etc, que será cobrado a importância de “10%” do valor da conta a título de gorgeta.

    Vejamos o que diz a CLT:

    “Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.” (...)
    “§ 3º - Considera-se gorgeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à distribuição aos empregados.”

    “Art. 614. Os Sindicatos convenentes ou as empresas acordantes promoverão, conjunta ou separadamente, dentro de 8 (oito) dias da assinatura da Convenção ou Acordo, o depósito de uma via do mesmo, para fins de registro e arquivo, no Departamento Nacional do Trabalho, em se tratando de instrumento de caráter nacional ou interestadual, ou nos órgãos regionais do Ministério do Trabalho, nos demais casos.
    § 1º As Convenções e os Acordos entrarão em vigor 3 (três) dias após a data da entrega dos mesmos no órgão referido neste artigo.
    § 2º Cópias autênticas das Convenções e dos Acordos deverão ser afixadas de modo visível, pelos Sindicatos convenentes, nas respectivas sedes e nos estabelecimentos das empresas compreendidas no seu campo de aplicação, dentro de 5 (cinco) dias da data do depósito previsto neste artigo.”
    O §1º do art. 29 da CLT impõe a anotação da estimativa de gorgeta na CTPS do trabalhador.

    Por sua vez, o CDC (Lei 8078/1990) dispõe que:

    Art. 31 A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidades, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

    "Art. 46 Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance."

    Portanto, se o consumidor não for previamente informado da cobrança, não poderá ser cobrada a gorgeta, mesmo havendo acordo ou convenção coletiva.

    De qualquer forma, se o serviço não for bem executado, creio que o consumidor não terá que pagar a gorgeta, mesmo que tenha sido previamente informado da cobrança e que haja acordo coletivo. Isso porque, se o serviço apresentar vício de qualidade, poderá o consumidor escolher uma das alternativas previstas no art. 20 do CDC, entre as quais encontra-se a restituição imediata da quantia paga. Realmente, seria irracional exigir que o consumidor (que não tem que pagar por serviços de má qualidade) seja obrigado a pagar gorgeta por um péssimo serviço.

    “Art. 20 O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
    I – a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
    II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
    III – o abatimento proporcional do preço.
    §1º.- A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente capacitados, por conta e risco do fornecedor.
    §2º. – São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade.”

    Penso de forma ainda mais ousada: se o produto for viciado, não atendendo às legítimas expectativas do consumidor, ainda que o atendimento seja adequado, não terá o cliente que pagar qualquer gorgeta se ele optar pela restituição imediata da quantia paga, na hipótese do §3 do art. 18 do CDC.

    Se quiser, dê uma olhada na reportagem denominada “Taxa de serviço não é obrigatória”, constante no site: http://www.procon.rs.gov.br/not26_11_01_1.htm (Possui algumas informações interessantes, mas seu conteúdo jurídico deve ser aceito com reservas).

    Espero ter ajudado um pouco. É o que penso s.m.j. Lembro que tudo escrito acima não passa de MERA OPINIÃO de um ESTUDANTE DE DIREITO, devendo ser encarado como uma questão acadêmica. Procure a orientação de um bom advogado, promotor de justiça etc, se quiser um parecer válido e mais consistente sobre a matéria.

    Em breve estarei disponibilizando nesse site (jus navingandi) um artigo tecendo alguns comentários sobre o tema enfrentado acima, contendo referência a legislação, doutrina e jurisprudência.

    Até mais, Flávio"

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