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DIREITO PENAL DO INIMIGO E O MENSALÃO

DIREITO PENAL DO INIMIGO E O MENSALÃO

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Este trabalho tem por objetivo expor idéias e conceitos de alguns temas atuais ao que concerne o verdadeiro papel do Direito Penal na sociedade.

Artigo de autoria de ANTÔNIO FRANCISCO SARAIVA OLIVEIRA, acadêmico de Direito da UNINORTE/AC.

Resumo

Este trabalho tem por objetivo expor idéias e conceitos de alguns temas atuais ao que concerne o verdadeiro papel do Direito penal na sociedade, a decisão que a mídia tem em relação a casos envolvendo personagens marcantes no cenário nacional, enfatizando a Ação Penal 470, que midiaticamente falando foi o maior caso de corrupção política do país.
Abordaremos simploriamente, no entanto concisamente o então Direito Penal do Inimigo, que torna?se cada vez mais presente no cenário jurídico nacional, tendo em vista a falta de conhecimento da sociedade ao discutir temas de grande repercussão. 

Breve histórico do Direito Penal atual

A mídia, no final do século passado e início do atual, foi a grande propagadora e divulgadora do movimento de Lei e Ordem. Profissionais não habilitados (jornalistas, repórteres, apresentadores de programas de entretenimento, etc.) chamaram para si a responsabilidade de criticar as leis penais, fazendo a sociedade acreditar que, mediante o recrudescimento das penas, a criação de novos tipos penais incriminadores e o afastamento de determinadas garantias processuais, a sociedade ficaria livre daquela parcela de indivíduos não adaptados.

Não é necessária estatística para afirmar que a maioria das sociedades modernas, a do Brasil dramaticamente, vive sob o signo da insegurança. O roubo com traço cada vez mais brutal, ‘seqüestros-relâmpagos’, chacinas, delinqüência juvenil, homicídios, a violência propagada em ‘cadeia nacional’, somados ao aumento da pobreza e à concentração cada vez maior da riqueza e à verticalização social, resultam numa equação bombástica sobre os ânimos populares. 

O convencimento que a sociedade tem sobre a má atuação do Direito penal é feito por intermédio do sensacionalismo, da transmissão de imagens chocantes, que causam revolta e repulsa no meio social. Homicídios cruéis, estupros de crianças, presos que, durante rebeliões, torturam suas vítimas, corrupções, enfim, a sociedade, acuada, acredita sinceramente que o Direito Penal será a solução de todos os seus problemas.

A partir dessa breve citação de uma dos artigos do autor de Direito Penal Rogério Greco podemos observar que através do que prega a mídia e aqueles que se fazem conhecedores da ciência criminal e entendem ser simples a solução dos problemas da sociedade, nos fez buscar a solução de todos os nossos males no Direito Penal, algo que não lhe é de incumbência, o que acarreta descrédito no mesmo. Diante isso cabe ressaltar o verdadeiro papel do Direito Penal que por sua vez tem apenas caráter punitivo e não reformador

O estado social está sendo deixado de lado cada vez mais para dar lugar ao estado penal. Investimentos na educação, saúde, transporte publico de qualidade, lazer, esporte e qualidade de vida são relegados a segundo plano dando prioridade a meios menos eficazes como o setor punitivo.

Traçar uma rota de fuga para a criminalidade torna-se cada vez mais difícil, tendo em vista a égide que tem o infrator em nosso pais, no entanto, a busca  incessante por essa rota é necessária para o momento em que estamos vivendo. A sociedade clama por justiça, pela punição de seus transgressores.

A justiça é indispensável para a construção de uma sociedade mais equilibrada, pautada em pilares sólidos. É de competência de o estado garantir ao povo a justiça, quando se fala em ser justo temos que compreender a palavra em sua plenitude, tendo em vista que ser justo não é apenas ser punitivo e sim garantidor.
               
              Direito Penal do Inimigo

Seria a divisão da sociedade em classes: os cidadãos e os inimigos do Estado, estes por sua vez seriam esquecidos pelos princípios e garantias fundamentais que regem o direito, pois os mesmos agem por impulso, de acordo com sua periculosidade e aqueles, que são os “cidadãos” viveriam com as garantias, pois agem por acaso não porque são perigosos. É definida uma classe dos inimigos do estado (Traficantes, homicidas de carreira, os que pertencem a organizações criminosas, terroristas, etc...).

Quem elaborou essa teoria foi o professor alemão Günter Jakobs, na secunda metade da década de 1990. Segundo ele um indivíduo que não admite ser obrigado a entrar em um estado de cidadania não pode participar dos benefícios do conceito de pessoa. E é que o estado natural é um estado de ausência de norma, quer dizer, a liberdade excessiva tanto como de luta excessiva. Quem ganha a guerra determina o que é norma, e quem perde há de submeter-se a essa determinação.
Ainda segundo o autor da teoria, existem pessoas que decidiram se afastar do estado:

“Há pessoas que decidiram se afastar, de modo duradouro, do Direito, a exemplo daqueles que pertencem a organizações criminosas e grupos terroristas. Para esses, “a punibilidade se adianta um grande trecho, até o âmbito da preparação, e a pena se dirige a assegurar fatos futuros, não a sanção de fatos cometidos”(JAKCOBS, Günter D. Penal do inimigo)
Manuel Cancio Meliá, analisando a proposta de Jakobs, esclarece:

“Segundo Jakobs, o Direito penal do inimigo se caracteriza por três elementos: em primeiro lugar, se constata um amplo adiantamento da punibilidade, quer dizer, que neste âmbito, a perspectiva do ordenamento jurídico-penal é prospectiva (ponto de referência: o fato futuro), em lugar de – como é habitual – retrospectiva (ponto de referência: o fato cometido). Em segundo lugar, as penas previstas são desproporcionadamente altas: especialmente, a antecipação da barreira de punição não é tida em conta para reduzir em correspondência a pena ameaçada. Em terceiro lugar, determinadas garantias processuais são relativizadas ou, inclusive, suprimidas.” (MELIÁ, Cancio)

 Conclui-se então que o Direito Penal do inimigo torna-se cada vez mais perceptível nos dias atuais. Observamos isso na Ação Penal 470 julgada pelo STF.            
                
                Ação Penal 470 e Direito Penal do Inimigo

Um dos maiores escândalos da política brasileira tem repercussão nacional através dos veículos de comunicação, que por sua vez tem o papel de divulgar as noticias, algo de grande relevância para a sociedade, no entanto, por decorrência da falta de conhecimento do povo facilita para a mídia a manobra de pensamento,  o que Bourdieu chamava de poder simbólico:

“O poder simbólico é um poder de construção da realidade que tende a estabelecer uma ordem gnosiológica, ou seja, o sentido do mundo supõe um conformismo lógico, uma concepção homogênea que torna possível a concordância entre as inteligências. Destarte, os símbolos são instrumentos de integração social. Enquanto instrumentos de conhecimento e comunicação eles tornam possível o consenso acerca do sentido social que contribui fundamentalmente para a produção de ordem social.” (BOURDIEU, Pierre).

Bourdieu traça sua teoria para demonstrar o poder exercido pela superestrutura (classe alta) em relação infra-estrutura (classe baixa) através dos veículos de integração social. Podemos relacionar tal teoria a realidade, tendo em vista a função da mídia no caso da AP 470, onde foi decisivo a participação dos meios de comunicação na formação de idéias da sociedade.

Sendo determinante o poder exercido pela mídia houve a separação ou por assim dizer a distinção da classe política, o que viola o ordenamento jurídico nacional, pois, mesmo sendo acusados e até mesmo condenados todos têm o direito de serem julgados da mesma maneira, sem haver qualquer tipo de violação dos princípios e garantias fundamentais do Direito, sendo eles: o principio da presunção de não-culpabilidade, principio da isonomia, onde é assegurado que todos somos iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza.

Por fim não há que se falar em inimigos do Estado, pois, todos são passiveis de erros, independente de qual for, temos o Direito, assim assegurado pela nossa Carta Magna. Direito a ampla defesa, duplo grau de jurisdição e como garantia fundamental à classe política o foro privilegiado deve ser visto e aceito. Se contrariarmos todos esses direitos estaremos negando nosso ordenamento, nossa constituição e ao nosso Estado democrático de Direito.


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