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Suicídio institucional

Suicídio institucional

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“Policial atira em ambulante que tomou-lhe o spray de pimenta e a corregedoria de policia vai apurar se o tiro foi acidental, ou não”. O que está acontecendo com as instituições e com a sociedade?

“Policial atira em ambulante que tomou-lhe o spray de pimenta e a corregedoria de policia vai apurar se o tiro foi acidental, ou não”.

Quando o Estado tem sua sociedade como inimigo algo precisa ser feito urgente. Esse Estado sofre de esquizofrenia e precisa de tratamento. Sociedade e Estado são os mesmos entes. São duas faces da mesma moeda. Um real e outro fictício, criado para representar o coletivo e por ele desenvolver políticas públicas que possibilitem o bem estar desta sociedade.

Nos últimos tempos o Estado voltou-se contra a sua sociedade. Voltou-se contra si mesmo em uma espécie de loucura institucionalizada. Imagine você em conflito com você mesmo. O que acontece? Comigo acontece assim. Me olho no espelho, me odeio desde logo, critico-me dos pés a cabeça, coloco-me defeito em todas as partes do corpo e por derradeiro sinto vontade de me eliminar, de dar um fim no sofrimento que me acomete. É o que está acontecendo com o Estado que nos representa em sociedade.

O Estado quer nos eliminar. Quer acabar com a possibilidade de nos unirmos para reivindicarmos em face dele. O Estado se arma contra si próprio. E essa autoagressão produz as maiores aberrações que um aglomerado de pessoas pode produzir.

A sociedade organizou-se nesses últimos tempos para reivindicar políticas públicas de inclusão. O Estado, ente fictício que fique claro, ou seja, comandado por um representante eleito, que também faz parte dessa sociedade, combateu todos os tipos de levante com uma violência inadmissível em tempos de paz. O braço armado do Estado, munido de armamento dito “não letal” produziu ferimentos capazes de interromper para sempre funções essências do ser humano, tal como a visão. Todos esses atos sob as luzes fracas de um candeeiro institucional que mais produz sombra que claridade. Traços de uma política ditatorial que nunca se apagou por completo.

No Rio de Janeiro ou em São Paulo, as maiores cidades do país, o Estado representado por policiais truculentos e despreparados, (não é culpa deles, diga-se de passagem, pois também são vítimas dessa política), elimina os integrantes do corpo social com uma facilidade tão assustadora, que me causa dúvidas se vivo em um Estado Democrático de Direito. Mesmo que a Constituição me garanta esse estado, na prática o medo me consome. Posso ser a próxima vítima de nossa representação, ou seja, de mim mesmo enquanto parte do coletivo. Isso é desesperador!

Daí não suportar ler uma notícia que me afirma que um policial em São Paulo, após dominar um ambulante, que fazia uma manifestação pelo direito de trabalhar, pelo direito ambulatorial, atira em outro que tomou-lhe o spray de pimenta.

Um ambulante contido por, aparentemente, quatro policiais acuados, enquanto outro ambulante, inconformado com a situação, toma o spray de pimenta da mão do policial que fazia a retaguarda. Consequência: é assassinado pelo Estado perante seus representados. E a primeira manifestação estatal é no sentido do tiro acidental. Tiro acidental?

Há um pensamento inconsciente de insatisfação generalizada em todos os campos e quando não conseguimos dar vazão as nossas ansiedades, nossas ansiedades procuram vazão onde houver furo Real. O furo Real deste episódio foi durante a fiscalização da “operação delegada” em São Paulo. E a falta de preparo desses profissionais por não saber contornar o inesperado leva a atuação.

A Falta de preparo institucional é geral Brasil a fora. Basta ver o noticiário e fazer a estatística.

Nosso país precisa deitar em um divã e analisar-se ou cometeremos suicídio institucional em todo momento de conflito social.


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