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Democracia e instituições do poder público

Democracia e instituições do poder público

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Discute as relações do poder privado e das instituições públicas.

Jurgen Habermas em várias de suas obras fala da colonização do mundo da vida pelo poder administrativo e pelo dinheiro. Estas “instituições” fora da democracia condicionam a vida das pessoas, fazendo com que estas repitam, na maioria das vezes de forma não-consciente, em razão da absorção das idéias econômicas e administrativas, uma lógica de vida que as afasta, pouco a pouco, de seus próprios ideais de vida boa e feliz[1].

O que trato aqui é de uma forma que se aproximaria, sem me permitem, do poder administrativo habermasiano. O condicionamento pelo dinheiro fica em segundo plano. O que conta é o poder institucional exercido pelas instituições privadas não-democráticas sobre as públicas e legítimas.

O que se pode ver, hoje, é que esta lógica tem-se repetido cotidianamente. Instituições fora da democracia[2], não-democráticas, eleitas em “pétit comité”, agem de forma a condicionar as decisões das instituições públicas[3]. Por trás de um veludo democrático e de defesa do cidadão, da república, da verdade e da democracia, algumas instituições fazem valer suas idéias, privadas, em detrimento de toda a coletividade. O poder exercido sobre as instituições públicas é tamanho que estas não tem, muitas vezes, como reagir. E os poucos que o fazem, até porque boa parte dos membros destas mesmas instituições pouco ou nada se preocupa com o outro, muitas vezes são rotulados, discriminados e, algumas vezes, até processados.

É evidente que não há como, de forma direta, dizer e apontar o dedo. Basta que o leitor observe o mundo que o cerca. Se as decisões tomadas em todos os âmbitos das instituições públicas são de interesse coletivo ou se levam em conta, em alguns casos, algum poder que as condiciona. Fala-se em assédio moral, pressão no trabalho. Mas a pressão havida pelo poder não-democrático sobre as instituições e grupos públicos de defesa e resguardo dos direitos da coletividade pode sim equiparar-se a tal.

Sei que não é fácil resistir. O “loby” circula por entre os corredores e pode ser tamanho que não permita reação contrária. Condicionar o outro, que tem o poder legítimo para decidir, a decidir de forma a favorecer o interesse privado e de um pequeno grupo, na maioria das vezes não-democrático, é uma forma quem sabe de corrupção. Não aquela de desvio de dinheiro. Mas corrupção dos costumes e dos conceitos de democracia e de inclusão do outro.

É por isso que proponho que o leitor passe a observar mais e de forma mais atenta as instituições públicas. Proponho que preste atenção nas decisões vindas das instituições públicas e que busque saber quem está próximo destas instituições. Que leia nas entrelinhas e que, uma vez em havendo indício de condicionamento da decisão, que haja e que discorde. Não são casos estes de prisão, processo, mas sim de indignação e repulsa.

Comecemos este debate. Isso é democracia.

[1] Adaptação ao que entendo do texto habermasiano que se refere à colonização do mundo da vida pelo poder administrativo e pelo dinheiro.

[2] Entenda-se democracia como goverdo em que o povo exerce a soberania.

[3] Utilizo-me de “instituições públicas” pois que, embora muitas vezes o nome deixe a entender tratar-se de poder, pelo condicionamento ao poder administrativo em especial, deixam de ser poder, sem perder, contudo, seu caráter institucional.


Autor

  • Rafael da Silva Marques

    Juiz do Trabalho titular da Quarta Vara do Trabalho de Caxias do Sul;<br>Especialista em direito do trabalho, processo do trabalho e previdenciário pela Unisc;<br>Mestre em Direito pela Unisc;<br>Doutor em Direito pela Universidade de Burgos (UBU), Espanha;<br>Membro da Associação Juízes para a Democracia

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