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O benefício de prestação continuada (BPC), os direitos dos portadores de deficiência e o serviço social

O benefício de prestação continuada (BPC), os direitos dos portadores de deficiência e o serviço social

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O artigo pretende analisar em que medida os direitos das pessoas com deficiência encontram-se expressos no Beneficio de Prestação Continuada, particularmente no que se refere ao acesso universal e igualitário.

RESUMO: O artigo pretende analisar em que medida os direitos das pessoas com deficiência encontram-se expressos no Beneficio de Prestação Continuada, particularmente no que se refere ao acesso universal e igualitário, com vistas ao papel do assistente social na garantia da efetivação da cidadania deste grupo social historicamente excluído.

PALAVRAS- CHAVE: BPC, cidadania, Serviço Social.

INTRODUÇÃO

Segundo Nogueira (2005), “o desafio de construir, afirmar e consolidar direitos é um tema caro às melhores tradições democráticas e à trajetória histórica das Ciências Sociais”. O profissional de Serviço Social tem como um de seus nortes a garantia do acesso aos direitos legalmente instituídos, no sentido de incluir as pessoas nos benefícios que estes direitos asseguram e traçar estratégias para que possam ser usufruídos efetivamente.

Entretanto, vivemos em uma época de insegurança para os direitos sociais. O mundo globalizado e as idéias neoliberais preconizam um enfraquecimento do Estado, a expropriação de suas atribuições enquanto operador das políticas e programas que garantam a implementação desses direitos, e a transferência dessas responsabilidades para outras organizações ligadas ao capital e que correspondam aos interesses de exploração e acumulação deste último.

As pessoas portadoras de deficiência e as pessoas idosas são segmentos historicamente excluídos do padrão, principalmente depois que o capital inseriu ideologicamente a subdivisão dos seres humanos entre “produtivos” e “improdutivos”. Nas últimas décadas, as discussões em torno da possibilidade de inclusão destas pessoas em ambientes até então tidos como privilégio e espaço das pessoas “produtivas”, ou seja, cujo trabalho possa ser explorado pelo capital, revertendo-os em cidadãos ativos na sociedade, adquiriram muita importância na atuação de profissionais comprometidos com os direitos de indivíduos e de grupos sociais excluídos, inclusive o Serviço Social.

O Beneficio de Prestação Continuada – BPC é uma das formas de garantir a inclusão das pessoas portadoras de deficiência e dos idosos na sociedade, na medida em que se propõe a suprir as carências econômicas da pessoa com deficiência, pretendendo garantir uma renda que venha a assegurar o acesso a meios de prover sua sobrevivência com dignidade.

Porém, como estamos em um período de retaliação dos direitos humanos, podemos observar várias falhas no Benefício de Prestação Continuada, enquanto forma de garantir a inclusão dos segmentos menos favorecidos da sociedade, pois ele se configura em um beneficio excludente, que não assegura o acesso universal e são muito rígidos os critérios para que as pessoas venham a recebê-lo.

O presente artigo pretende analisar alguns aspectos do BPC, enquanto direito garantido pela Constituição Federal de 1988, porém, tratando-se de uma análise mais aprofundada quando a sua abrangência, seu poder de alcance na melhoria da qualidade de vida das pessoas portadoras de deficiência e de idosos com mais de 65 anos. Pretende-se ainda fazer uma correlação do acesso ao BPC com as atribuições do Serviço Social, enquanto uma profissão comprometida com a defesa dos direitos humanos e do cumprimento das leis em beneficio do cidadão.

1. O BPC ENQUANTO DIREITO DE VIVER COM DIGNIDADE

De acordo com a LOAS (Lei nº 8742 / 93), em seu art. 20, “o beneficio de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família”. Ainda de acordo com esta lei, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.

Para adequar-se aos critérios, a pessoa portadora de deficiência ou idosa deve possuir renda familiar mensal per capita inferior a ¼ de salário mínimo.

Este é um beneficio de assistência social, integrante do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), pago pelo governo Federal através do INSS, e assegurado por lei. Segundo o material informativo do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome[1], os beneficiários do BPC ganham autonomia, independência e passam a participar muito mais da vida comunitária. No entanto, para ser incluído no beneficio, as pessoas precisam se enquadrar aos critérios do programa, entre eles, como está disposto no art. 20, inciso 4º, o que determina que o beneficio não pode ser acumulado pelo beneficiário e por pessoas de sua família (que vivam sob o mesmo teto) com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o de assistência médica.

Aos idosos é necessário comprovar que possui 65 anos ou mais, que não recebe nenhum beneficio previdenciário e que a renda familiar mensal é inferior a ¼ do salário mínimo. A pessoa com deficiência segue as mesmas exigências anteriores, com a diferença de que deve comprova a sua deficiência e o nível de incapacidade por meio de avaliação do Serviço de Perícia Médica do INSS.

A família é o eixo –central na sustentação das pessoas portadoras de deficiência. Além de sustentá-las materialmente, são a base afetiva, educativa e subjetiva. No entanto, são muitas as famílias que enfrentam dificuldades na organização econômica e social, principalmente quando são relevantes as condições de baixa renda e vulnerabilidade social.

Sendo assim, além de todas as implicações de ordem subjetiva que a família enfrenta pelo fato de possuir um portador de deficiência na família, que envolve a delicada questão de aceitação e rejeição desta realidade, esta passa por situações de fragilidade quanto à capacidade de manter as necessidades básicas de todas as famílias, e mais ainda quanto a necessidades extras que surgem pela presença de um portador de deficiência na família, que implica em atendimento especial.

Sendo assim, os idosos e PPDs encontram no BPC uma garantia de uma fonte, ainda que mínima, de sobrevivência. O BPC muitas vezes é a única renda do grupo familiar do idoso ou da pessoa com deficiência. Com este recurso é possível manter, no caso dos idosos, uma certa autonomia e independência, na medida em que estes conseguem suprir as suas despesas cotidianas. No caso das pessoas com deficiência, através deste recurso é possível, ainda que precariamente, manter a compra de medicamentos, alimentos, gastos com luz, água, etc. assim, é inegável que o BPC é um direito importante e uma estratégia para garantir a sobrevivência das famílias beneficiadas.

2. A DIFICULDADE DE USUFRUIR O DIREITO AO BENEFICIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA

Sem deixar de reconhecer a importância do BPC para as famílias beneficiadas, como uma estratégia de sobrevivência, por outro lado, precisa-se reiterar que devido aos rigorosos critérios de inclusão neste beneficio, muitas famílias não conseguem ter acesso a ele. Os problemas de idosos e de famílias de pessoas com deficiência vão muito além da dimensão financeira, ou seja, circulam num complexo universo de vulnerabilidade, exclusão e não acesso aos direitos sociais legalmente instituídos pela Constituição Federal de 1988, e regulamentados posteriormente pela LOAS.

Neste complicado universo de vulnerabilidade, existe a indignação das famílias, que mesmo depois de inúmeras tentativas, não obtém êxito no acesso ao BPC. A busca pelo direito que muitas vezes, demora a ser efetivado, passa invariavelmente pelo atendimento do Serviço Social, no processo de encaminhamento da ação judicial.

Embora o acesso a medicamentos seja garantido universalmente pelo SUS – Sistema Único de Saúde, a família em geral precisa arcar com medicamentos para a pessoa portadora de deficiência e também para o idoso, especialmente aqueles de uso contínuo. Assim, pode-se constatar que o Sistema de Seguridade Social não funciona como deveria, pois o BPC deveria ser uma garantia ao exercício da cidadania para os idosos e pessoas com deficiência, sendo uma forma de incluir estas pessoas socialmente, mas acaba tendo de ser usado para garantir o suprimento de outra necessidade que não é sanada pelo serviço de saúde. Nessa perspectiva, um direito é usado para substituir outro que não funciona, e diante disso, cabe questionar até que ponto os direitos sociais saem do papel e passam a ser direitos usufruídos realmente pelas pessoas.

Diante deste fato, pode- se parafrasear Nogueira (2005), quando este argumenta que há uma grande distância entre os direitos sociais formulados e sancionados pela lei, até a sua verdadeira implementação. Este autor aponta possíveis causas para esta defasagem, entre elas, a falta de vontade política de governantes, a interferência do capital no intuito de enfraquecer e desmerecer o Estado perante a sociedade e a ínfima parcela do orçamento público que é aplicada em táticas de fortalecimento dos direitos legais.

As famílias têm muita dificuldade de acesso ao BPC devido aos critérios de seletividade, expressos na delimitação rigorosa da renda: ela deve ser inferior a ¼ do salário mínimo, não podendo nem mesmo ser igual a este valor. Sendo assim, é necessário que a família se encontre quase em condição de miserabilidade para que possa ter acesso ao beneficio, e por causa disso, são muitas as pessoas que ficam excluídas mesmo precisando enormemente do auxílio.

O exame médico pericial também se constitui como um entrave, pois além da dificuldade em passar pelo exame e conseguir enquadrar-se no benefício, as pessoas precisam passar periodicamente pela mesma perícia. Isso engloba os aspectos psicológicos desta medida, pois os idosos precisam estar constantemente comprovando que ainda estão vivos, e a família da pessoa com deficiência, precisa comprovar periodicamente que esta continua com a deficiência, ainda que esta seja permanente. Esta medida se constitui, portanto num mecanismo humilhante e vexatório para o idoso e para a família da pessoa com deficiência.

Acentua-se também a estigmatização de estrangeiros naturalizados ou não, ou mesmo filhos de estrangeiros, sendo que esta condição denota um fator de exclusão. Ou seja, os idosos ou PPDs que são estrangeiros naturalizados, ou os filhos de estrangeiros, ao tentar receber o BPC, encontram dificuldades ainda maiores no seu deferimento.

 E ainda, há a proibição de benefícios cumulativos na mesma família. De acordo com a cartilha informativa do MDS, em relação ao idoso, se existe outro idoso na família que recebe o BPC, este valor não entra no cálculo da renda familiar, mas no caso de pessoas com deficiência, se já existe uma pessoa na família, outra pessoa com deficiência ou idoso que recebe o BPC, este valor entra no cálculo da renda familiar, e impossibilita o acesso.

Segundo Gomes (2001), exige-se comprovação de renda de todos os membros da família, o que acaba condicionando e limitando o direito da pessoa ao benefício, traduzindo, em seu limite, a proibição de que mais de uma pessoa na família tenha o beneficio, tornando-se assim, um benefício “familiar” e não um benefício da Pessoa Portadora de Deficiência.

Segundo Gomes (2001)

[...] sua extrema seletividade estigmatiza o sujeito e o coloca na condição de necessitado, em oposição à qualidade de sujeito portador de direito. Apresenta distorções no que tange sua qualidade de direito, pois não é prestado a todos que dele necessitam, alcançando somente aqueles que vivem abaixo da linha de indigência.

Por outro lado expressa o BPC como o mínimo para a sobrevivência diante das condições de vulnerabilidade socioeconômico. Para as famílias, o BPC constitui fator determinante para a promoção da inclusão/integração social dos PPDs e para o cumprimento do papel de socializar e participante na construção da cidadania dos mesmos.

A definição é por demais seletiva, adotando o que nos parece, o princípio e a lógica da exclusão, quando considera como família incapaz de manter a Pessoa Portadora de Deficiência ou idoso aquela que cada um de seus membros obtenha a provisão de suas necessidades no mercado [...] com ¼ de salário mínimo [...] (GOMES, 2001).

Neste contexto, por vezes, a seletividade na concessão do benefício não se esgota em si mesma e torna-se passível de reclamação judicial, e isso vem a transgredir o princípio de universalização garantido legalmente.

Este, sem dúvida, se constitui num embate polêmico, e colocam em evidência os limites de operacionalização das normas constitucionais. Esta discussão traz o quanto é difícil acessar este direito garantido por lei, uma vez que quando o perito não autoriza o beneficio, o requerente acessa à justiça e são os magistrados que tomam a decisão final.

3. A EXCLUSÃO SOCIAL DE IDOSOS E PPDS NA CONJUNTURA CONDICIONADA PELO CAPITALISMO

A família ou o próprio usuário busca o benefício no intuito de fortalecimento mínimo de sua organização socioeconômica. Porém, a alta seletividade não esgota o problema destes idosos ou PPDs, pois sua condição está atrelada a um processo social relacionado a conjuntura e estrutura social. É neste sentido que ressalta-se a determinação do sistema neoliberal, que caracteriza as minorias como “sobrantes” na conjuntura da sociedade moderna.

O termo “sobrantes” é uma referencia a obra de Castel (2004), quando afirma que:

[...] pessoas que não tem lugar na sociedade, que não são integrados, e talvez não sejam integráveis no sentido forte da palavra a ela atribuído, por exemplo, por Durkheim, ou seja, estar integrado é estar inserido em relações de utilidade social, relações de interdependência com o conjunto da sociedade (Castel, 2004).

Para este autor, estes não estão sendo explorados pelo sistema por serem considerados como “inúteis”, no sentido de não encontrarem um lugar na sociedade com o mínimo de estabilidade.

    O beneficio é extremamente excludente, na medida que para ter acesso a ele, a pessoa precisa comprovar rigorosamente a sua renda, passar por um duro exame médico pericial e ainda, não possuir outro idoso ou PPD na família. Segundo Gomes, estes são apontamentos que põem em análise as normas da previdência, sendo ela um sistema legal de exclusão dos beneficiários.

[...] houve um declínio drástico do acesso de portadores de deficiência no direito depois que se atribui a decisao sobre seu enquadramento somente à avaliação médico-pericial feita por profissionais da área do INSS, com a extinção das equipes multidisciplinares (GOMES, 2001).

De acordo com este processo, a Assistência Social e os usuários deste beneficio são alvo do “[...] desmonte estatal e do precário Estado de Direito Social Brasileiro (Behring, 2003) e a configura um desafio às políticas sociais e aos Serviço Social enquanto mediadores destas. E “ [...] se o BPC conforma o padrão brasileiro do que seja justiça e igualdade, é por sua vez terreno de embate, espaço aberto e por fazer” (Telles apud Gomes, 2001).

Tendo em vista a atuação do Serviço Social nas políticas sociais públicas, através do trabalho do Assistente Social, coloca-o como protagonista de uma relação entre Estado e Sociedade Civil, o que resulta em inacabáveis práticas burocráticas e rotineiras. Infelizmente, dentro deste desafio de colocar em prática as políticas sociais, e promover o acesso à cidadania, por vezes inclui estratégias para “burlar” as leis diante da seletividade dos critérios (YASBEK, 2003). Muitas vezes este tipo de prática nada ortodoxa é necessária para conseguir desempenhar a função primordial de incluir os cidadãos de forma a edificar a sua emancipação humana.

O problema da inclusão ou exclusão de idosos e PPDs no Beneficio de Prestação Continuada não se esgota nos requisitos ou nos diversos fatores de seletividade, mas reside especialmente na incompetência do sistema público em garantir os direitos previstos em lei, e também a elaboração de leis que considerem a realidade dos sujeitos (NOGUEIRA, 2005).

Como aponta Nogueira (2005), o desenvolvimento humano e social legitima-se no acesso aos direitos instituídos ou mesmo na distribuição de bens e recursos para o enfrentamento estratégico das desigualdades e do processo excludente das minorias. No entanto, o acesso a estes direitos está longe de ser universal.

    4. A FUNÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO CONTEXTO DO ACESSO AO BPC

Cabe ressaltar que inicialmente o preenchimento do formulário a ser enviado ao INSS era atribuição exclusiva do Assistente Social, devendo ser por este assinado, atestando a real adequação aos critérios estabelecidos. O INSS só aceitava os pedidos que já viessem com este pré- requisito. Neste contexto, o profissional Assistente Social afiançava este direito garantido às PPDs e Idosos com idade igual ou superior à 60 anos.

Hoje, o formulário pode ser preenchido por qualquer pessoa e assinado pelo responsável pelo sujeito de direito. Conforme a cartilha informativa do MDS sobre o BPC, se a pessoa tem direito ao benefício, “não é necessário nenhum intermediário”, sendo o bastante dirigir-se a agência do INSS mais próxima, munido dos documentos necessários.  Mas ainda assim, os usuários mantem uma grande referência para com o profissional Assistente Social e com as instituições onde a política de assistência social é operacionalizada.

O Serviço Social continua sendo uma grande referência no encaminhamento deste beneficio, sendo ainda procurado para este tipo de preenchimento. Neste encaminhamento cabe ao profissional anexar um “parecer” referenciando a confirmação das condições sócio econômicas do núcleo sócio- familiar da PPD, sob pena de indeferimento pelo INSS.

 Os idosos, as pessoas portadoras de deficiência e suas famílias sentem-se destituídas de condições para o trabalho formal que possibilite a sobrevivência de sua família, e ainda excluídas do BPC, que seria uma forma de contribuir na solução das necessidades cotidianas.

As famílias que possuem PPDs sentem-se inteiramente responsáveis pelo sustento e apoio a estas pessoas, sendo que expressam constantemente uma grande preocupação com o futuro destes, uma vez que não vêem possibilidade de uma vida independente frente a dinâmica atual da sociedade.

Evidentemente que os beneficiários consideram o BPC uma “ajuda” bastante significativa para sua sobrevivência, sendo por vezes a única renda mensal da família. O valor recebido é insuficiente para cobrir todos os gastos, mas é extremamente importante côo subsidio a sobrevivência.  Além da indignação de muitos por não recebê-lo, há a insegurança daqueles que o recebem, pois sabem que estão sujeitos a perdê-lo a qualquer momento, uma vez que a revisão acontece a cada dois anos.

O BPC, na ótica de proteção aos idosos e PPDs determina representação majoritária no sistema de proteção social e assume participação expressiva no orçamento da Assistência. Contudo, é insuficiente para atender as demandas e necessidades básicas das famílias. Nas palavras de Sposati (1991), verificamos uma dupla interpretação deste direito, “uma que é restrita e minimalista e outra que é ampla e cidadã; a primeira se funda na pobreza e no similar da sobrevivência e a segunda em um padrão básico de inclusão”.

Ou seja, por um lado trata-se de um incremento fundamental na renda familiar, mas por outro, não satisfaz todas as necessidades sociais compreendidas nas determinações de uma sociedade, quanto à educação, trabalho, cultura, que permitiriam na inclusão social, propriamente dita, deste segmento.

Cabe aferir que na sociedade brasileira, a garantia formal dos direitos não significa automaticamente poder acessá-los (Gomes, 2001). Nesta perspectiva, o fio conector compreende o exercício da cidadania subentendido na consciência crítica dos cidadãos, elevando-se a condição de sujeitos de sua própria história.

Não obstante, o BPC é um exemplo perfeito desta situação, pois seguindo a ótica capitalista confere um número relevante de excluídos. Como sua própria natureza determina, esse beneficio destina-se a uma população de baixo nível sócio – econômico e cultural, sem peso político, o que aborta as iniciativas de organização coletivas para reivindicação de direitos.

Evidentemente, a atuação do Serviço Social com relação a idosos e a pessoas com deficiência em nenhum momento se restringem ao encaminhamento do BPC, que é apenas uma das formas de inclusão social destes segmentos na sociedade. As ações quanto a este público alvo devem estar articuladas dentro dos processos de trabalho do Serviço Social, no sentido de promover a ampliação da cidadania destas pessoas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com as linhas de pensamento abordadas, pode-se chegar à conclusão de que o BPC é um benefício muito importante para garantir a cidadania de grupos historicamente excluídos da sociedade padrão, como o caso dos idosos e das pessoas com deficiência. Este instrumento torna-se fundamental para o provimento das necessidades básicas de cada individuo e de sua família, como alimentação, medicamentos, entre outras despesas, e assim, garante um mínimo de dignidade para a vida dessas pessoas.

Entretanto, ao observarmos mais atentamente este benefício, percebe-se que ele está longe de ser universal e de incluir todas as pessoas que dele necessitam, devido aos critérios rigorosos de seletividade para ter acesso a ele, além de todos os entraves que as pessoas precisam enfrentar mesmo depois de conseguirem o benefício, para continuarem comprovando a veracidade das informações prestadas, sob pena de perder o benefício.

Acredita-se que esta alta seletividade e rigorosidade nos critérios decorre de um processo que não ocorre apenas por determinação estatal, mas também por um conjunto de fatores externos determinantes. Segundo Nogueira ( 2005), o capital, em seu projeto neoliberal, cria estratégias de diminuição dos direitos sociais que não correspondem a seus interesses de acumulação. Para o capital, quando mais pessoas em condições de produzir, melhor as condições para este acumular mais capital explorando os trabalhadores. E mais, quanto mais trabalhadores, pessoas produtivas, estiverem a disposição no mercado de trabalho, incrementa o exercito industrial de reserva, barateando o custo da mão de obra. Sendo assim, não é do interesse do capital que os direitos sociais sejam efetivados.

Ainda segundo Nogueira (2005), os entraves para a efetivação dos direitos sociais estão expressos na Reforma Estatal, há muito tempo presente na agenda política do país, que pretende unicamente reduzir custos, estando formulada apenas nos campos técnico, administrativo, fiscal e financeiro. Além disso, a fatia do orçamento destinada a garantia dos direitos sociais e por conseqüência, o acesso universal à cidadania, é muito pequena, dada as dimensões territoriais e populacionais do nosso país.

Observando esta conjuntura que liga-se diretamente a questão da defasagem dos direitos sociais, não é difícil perceber o por quê do BPC ser tão seletivo e privilegiar tão poucas pessoas, enquanto há tantas precisando acessar este beneficio.

Ao Serviço Social, enquanto profissional comprometido com a defesa dos direitos humanos, restam poucas alternativas para garantir o acesso das pessoas a este benefício, dadas as limitações da lei, que não podem ser descumpridas. Infelizmente, as determinações legais limitam, no caso específico do BPC, a atuação profissional, restando apenas a parte burocrática, expressa no encaminhamento do benefício, e a insistência nas tentativas de incluir as pessoas, tentando inúmeras e consecutivas vezes.

Além disso, cabe ao Serviço Social informar as pessoas quanto aos seus direitos, fazer a informação chegar até o usuário que por algum motivo ainda não tenha o conhecimento do BPC e por isso, ainda não tenha tentado encaminhá-lo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEHRING, Elaine Rosssetti. Brasil em Contra- Reforma – Desestruturação do Estado e perda dos Direitos. São Paulo: Editora Cortez, 2003.

CASTEL, Robert (Org). Desigualdade e Questão Social. São Paulo, Editora Educ. ,2004.

CONHEÇA MAIS SOBRE O BPC: um direito garantido pela Constituição Federal. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e Ministério da Previdência (material informativo). Disponível em www.mds.gov.br acessado em 29 set. 2008.

GOMES, Ana Lígia. O Benefício de Prestação Continuada: Uma Trajetória de retrocessos e limites. Revista Serviço Social e Sociedade nº 68. São Paulo: Editora Cortez, 2001.

Lei Orgânica da Assistência Social. Lei n° 8742 de 07 de dezembro de 1993.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. O desafio de construir e consolidar direitos no mundo globalizado. Revista Serviço Social e Sociedade, nº 85, jul. 2005.

YASBEK, Maria Carmelita. Classes subalternas e Assistência Social. São Paulo: Editora Cortez, 2003.

SPOSATI, Aldaíza de Oliveira. Os direitos dos (des)assistidos sociais. São Paulo: Cortez: 1991.

SUAS – Sistema Único de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social/ dez – 2004. disponível em www.mds.gov.br acessado em 20 set. 2008.

   


[1] Disponível em www.mds.gov.br acessado em 29/09/12.


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